segunda-feira, 29 de julho de 2013

A PRIVATIZAÇÃO DO PARLAMENTO BRASILEIRO


O parlamento brasileiro não é republicano. Para ser republicano deveria deixar de ser privativo das classes proprietárias.

O meio milhar de parlamentares de Brasília estão a serviço de um mosaico de interesses econômicos. Apenas menos de cem têm alguma preocupação com o chamado interesse público, fundado em matriz republicana. Esse dado indesmentível é a usina dos sucessivos escândalos que abalam o País. Acrescido do fato de o Poder Executivo ser refém desses interesses particularistas.

Na raiz disso está um formulismo eleitoral que desmembra a maioria conquistada na votação majoritária daquela votação pulverizada obtida na escolha proporcional de deputados.

A chamada governabilidade é fruto bichado que resulta do aliciamento de votos junto aos deputados mais sensíveis à força das prebendas e dos mimos. Tudo fica rebaixado ao nível das sarjetas. A República é apenas um nome, o que conta é a veniaga.

A agudização da crise política, para além da tarefa de separar o justo do meliante, deve apontar as saídas que superem esse quadro histórico de conseqüências degradantes.


Mais que o petismo, o lulismo, que empalmou nominalmente o poder em 2003, paga o preço por ter seguido os passos malditos da tradição brasileira. Não quis ousar fazer a reforma político-eleitoral por comodismo ou por conveniência de alguns quadros e dirigentes (e intelectuais orgânicos dessa condução deletéria) que já eram estranhos às bandeiras do partido. Preferiram a adesão incondicional ao sistema-pântano.

Darwin ensinou que as espécies sempre procuram buscar o seu habitat de origem; podem até migrar, mas um dia voltam para casa. O modelo de alianças adotado para garantir a “governabilidade” reforça a tese de que ninguém contraria a sua natureza, a sua pulsão vital. Não há força racionalista que seja capaz de impedir o impulso primitivo de certos indivíduos.

Thomas Hobbes, no século 17, entendeu que o Estado seria essa força de coerção do “estado de natureza” de indivíduos e grupos. Mas, e quando o Estado está anômico, desprovido de instrumentos e regramentos que coibam a ação continuada dos malfeitores sociais? Ora, há que dotá-lo desses aparatos, sob pena de graves responsabilidades históricas recairem sobre os condutores do Estado, marcando-os com as tintas do esquecimento e do desprezo popular.


A reforma política

A conjuntura crítica que vivemos hoje no Brasil aponta a necessidade de uma reforma político-eleitoral urgente. O modelo político-eleitoral-partidário brasileiro está esgotado, incapacitado para dar frutos sãos, só aberrações e deformidades. A forte influência do poder econômico corrompe as regras do jogo, onde a democracia formal transfigurada é uma caricatura de si própria. A representação pública deixa de ser popular e pública para ser a representação de setores e lobbies de interesses econômico-financeiros, num processo de crescente privatização de blocos inteiros do parlamento brasileiro.
No quadro atual, o presidente da República, embora tenha logrado conseguir cerca de 62% dos votos dos eleitores e, portanto, reunindo numericamente soberania e legitimidade suficiente para desenvolver e implementar seu projeto político, na prática está refém daqueles parlamentares privatizados.

Como superar isso? Com uma reforma política, com as seguintes modificações:

Voto em lista pré-ordenada

Partidos ou federações de partidos apresentam uma lista de candidatos, do presidente da República a senadores e deputados. A lista mais votada elege o presidente e tantas cadeiras no parlamento quanto for o percentual alcançado nas urnas. Se esse sistema eleitoral estivesse vigorando em 2002, o candidato Lula, que então alcançou 62% das preferencias de voto, teria no Congresso 62% de deputados e senadores relativamente ao total de vagas existentes. Estaria, portanto, em tese, assegurado ao Executivo os votos necessários à aprovação democrática dos seus projetos de governo. A lista de candidatos proporcionais seria pré-ordenada, conforme disputa democrática interna nas convenções partidárias, e os critérios de preenchimento dos lugares na lista seria de livre deliberação do partido e seus militantes, ou da federação partidária do qual ele faça parte.


Financiamento público de campanhas

Financiamento público exclusivo de campanhas eleitorais. Estima-se o valor de sete reais por eleitor o custo para o orçamento público de campanhas eleitorais, num total de 900 milhões para um pleito nacional como o do ano de 2002. A estimativa do custo total da campanha de 2002, somando os gastos de todos os partidos em todos os Estados da Federação, foi ao redor de 9 bilhões de reais. Nessas alturas astronômicos voam somente os pássaros agourentos da corrupção e da privatização de mandatos parlamentares.


Auditoria de campanhas

Auditoria pública durante a campanha eleitoral para verificação de balanço e caixa dos partidos. As campanhas seriam auditadas pela Justiça Eleitoral (e outras instituições públicas de apoio) 90 dias antes do pleito, 60 dias antes do pleito, e 30 dias antes do dia da votação geral. As prestações de contas depois do pleito seriam feitas até o trigésimo dia do mesmo, com auditagem geral de todo o processo eleitoral e divulgação na internet dos resultados parciais e totais.

Outras medidas podem ser acrescentadas a esse alinhavo mínimo. Lula, no seu discurso de posse, em janeiro de 2003, falou sobre a necessidade de uma reforma político-eleitoral. Não moveu uma palha para fazê-la, sucumbiu aos desígnios dos acontecimentos que estão lhe abreviando a passagem pela vida pública.

Com ou sem Lula, o Brasil precisa de uma República suficientemente forte para resistir aos ataques de bárbaros e malfeitores. Em Brasília, os primeiros aromas de orégano já prenunciam um grande acordo para acomodar parlamentares faltosos de todos os grandes partidos. Poucos são os apontados e muitos serão os impunes. E somente uma autêntica reforma político-eleitoral pode apontar para horizontes menos sombrios.

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