quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

O QUE QUERO DO ANO NOVO.

Quero um Ano Novo onde, se Deus quiser, todas as crianças, ao ligarem seus apetrechos eletrônicos, recebam um banho de Mozart, Pixinguinha e Noel Rosa; aprendam a diferença entre impressionistas e expressionistas; vejam espetáculos que reconstituem a Balaiada, a Confederação do Equador e a Guerra dos Emboabas; e durmam após fazer suas orações.

Quero um Ano Novo em que, no campo, todos tenham seu pedaço de terra, onde vicejem laranjas e alfaces, e voejem bem-te-vis entre vacas leiteiras. Na cidade, um teto sob o qual reluz o fogão de panelas cheias, a sala atapetada por remendos coloridos, a foto colorida do casal exposta em moldura oval sobre o sofá.

Espero um Ano Novo em que as igrejas abram portas ao silêncio do coração, o órgão sussurre o cantar dos anjos, a Bíblia seja repartida como pão. A fé, de mãos dadas com a justiça, faça com que o céu deixe de concentrar o olhar daqueles aos quais é negada a felicidade nesta terra.

Um Ano Novo Feliz com casais ociosos na arte de amar, o lar recendendo a perfume, os filhos contemplando o rosto apaixonado dos pais, a família tão entretida no diálogo que nem se dá conta de que a TV e os celulares são aparelhos mudos e cegos num canto da sala.

Desejo um Ano Novo em que os sonhos libertários sejam tão fortes que os jovens, com o coração a pulsar ideais, não recorram à química das drogas, não temam o futuro nem se expressem em dialetos ininteligíveis. E que compareçam às urnas em outubro para resgatar as políticas públicas de proteção social, a redução da desigualdade social, a autoestima do povo brasileiro e a soberania nacional.

Espero um Ano Novo em que cada um de nós evite alfinetar rancores nas dobras do coração e lave as paredes da memória de iras e mágoas; não aposte corrida com o tempo nem marque a velocidade do tempo pelos batimentos cardíacos.

Um Ano Novo para saborear a brevidade da vida como se ela fosse perene, em companhia de ourives de encantos.

Quero um Ano Novo em que a cada um seja assegurado o direito do emprego, a honra do salário digno, as condições humanas de trabalho, as potencialidades da profissão e a alegria da vocação.

Rogo por um Ano Novo em que a polícia seja conhecida pelas vidas que protege e não pelos assassinatos que comete; os presos reeducados para a vida social; e que os pobres logrem repor nos olhos da Justiça a tarja da cegueira que lhe imprime isenção.

Um Ano Novo sem políticos mentirosos, autoridades arrogantes, funcionários corruptos, bajuladores de toda espécie. Livre de arroubos infantis, seja a política a multiplicação dos pães sem milagres, dever de uns e direito de todos.

Espero um Ano Novo em que as cidades voltem a ter praças arborizadas; as praças, bancos acolhedores; os bancos, cidadãos entregues ao sadio ócio de contemplar a natureza, ouvir no silêncio a voz de Deus e festejar com os amigos as minudências da vida – um leque de memórias, um jogo de cartas, o riso aberto por aquele que se destaca como o melhor contador de anedotas.

Desejo um Ano Novo em que o homem jamais humilhe a mulher; a professora de cidadania não atire papel no chão; as crianças cedam o lugar aos mais velhos; e a distância entre o público e o privado seja espelhada pela transparência.

Quero um Ano Novo de livros saboreados como pipoca, o corpo menos entupido de gorduras, a mente livre do estresse, o espírito matriculado num corpo de baile ao som dos mistérios mais profundos.

Espero um Ano Novo cujo principal evento seja a inauguração do Salão da Pessoa, onde se apresentem alternativas para que nunca mais um ser humano se sinta ameaçado pela miséria ou privado de pão, paz, saúde, educação, cultura e prazer.

Um Ano Novo em que a competitividade ceda lugar à solidariedade; a acumulação à partilha; a ambição à meditação; a agressão ao respeito; a idolatria ao dinheiro ao espírito das Bem-Aventuranças.

Aspiro a um Ano Novo de pássaros orquestrados pela aurora, rios desnudados pela transparência das águas, pulmões exultantes de ar puro e mesa farta de alimentos despoluídos.

Um Ano Novo que seja o último da Era da Fome.

Desejo um Feliz Ano Novo de muita saúde e paz aos meus pacientes leitores – os que concordam e também os que discordam.

Rogo por um Ano Novo que jamais fique velho, assim como os carvalhos que nos dão sombra, a filosofia dos gregos, a luz do Sol, a sabedoria de Jó, o esplendor das montanhas de Minas, a literatura de Machado e Rosa.

Desejo um Ano Novo tão novo que traga a impressão de que tudo renasce: o dia, a exuberância do mar, a esperança e a nossa capacidade de amar
. Exceto o que no passado nos fez menos belos, generosos e solidários.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

OQUE NÃO QUERO NESTE NATAL.

 

Neste Natal, não quero o Papai Noel das promoções comerciais, das ceias pantagruélicas, dos presentes caros embrulhados em afetos raros. Quero o Menino nascido esperança em um pasto de Belém, e Maria a cantar que os abastados serão despedidos de mãos vazias e os pobres, saciados de bens.

Não quero o Papai Noel do celofane brilhante das cestas de produtos importados e das garrafas nas quais os néscios afogam tristezas rotuladas de alegrias. Quero o Menino palestino em busca de uma terra onde nascer e viver, o Menino judeu arauto da paz aos homens e mulheres de boa vontade, o Menino poupado da estupidez das guerras.

Neste Natal, dispenso abraços protocolares e sorrisos sob medida, sentimentos retóricos e emoções que encobrem a aridez do coração. Quero o amor sem dor, a oração só louvor, a fé comungada com sabor de justiça. Não quero presentes dos ausentes, a litúrgica reverência às mercadorias, a romaria pagã aos templos consumistas. Quero o pão na boca da criança faminta, o acolhimento aos refugiados, a paz aos espíritos atribulados, o gozo de contemplar o Invisível.

Neste Natal, não quero troca de produtos entre mãos que não se abrem em solidariedade, compaixão e carinho despudorado. Quero o Menino solto no mais íntimo de mim mesmo, a semear ternura em todos os canteiros em que as pedras sufocam as flores. Quero o silêncio indevassável do mistério, o canto harmônico da natureza, a mão que se estende para que o outro se erga, a fraternura de amigos abençoados pela cumplicidade perene.

Neste Natal, não me interessam as oscilações dos índices financeiros, as promessas viciadas dos políticos, os cartões impressos a granel, cheios de colorido e vazios de originalidade. Quero as evocações mais ternas: o cheiro do café coado pela avó, o som do sino da matriz, o rádio Philco exalando sabonete Eucalol, enquanto a babá me via brincar no quintal.

Não quero as amarguras familiares que se guardam como poeira nas dobras da alma, as invejas que me alienam de mim mesmo, as ambições que me tornam tristes como as galinhas, que têm asas e não voam. Quero os joelhos dobrados no átrio da igreja, a cabeça curvada ao Transcendente, a perplexidade de José diante da gravidez inusitada de Maria.

Neste Natal, não irei às ruas febris dos mercadores de bens finitos, não disfarçarei em algodão a neve que se amontoa em meus dessentimentos, nem prenderei falsas sinetas no frontispício de minha indiferença. Quero o segredar dos anjos, a alegria desdentada de um pobre reconhecido em seu direito, a euforia imaculada de um bebê acolhido em braços amados. Não viajarei para longe de mim mesmo. Mergulharei no mais profundo de mim, lá onde as palavras se calam e a voz de Deus se faz ouvir como apelo e desafio.

Neste Natal, não entupirei o meu verão de castanhas e nozes, panetones e carnes gordas. Porei sobre a mesa Deus fatiado em pão, a entornar vinho em cálices alados, e convidarei à festa os famintos de bem-aventuranças. Não rezarei pela bíblia dos que professam o medo, nem acenderei velas aos guardiões do Inferno. Não serei o alpinista de cobiças desmedidas, nem o coveiro de utopias libertárias. Desfraldarei sobre o telhado a bandeira de sonhos inconfessos e semearei estrelas no jardim de meus encantos, lá onde cultivo essa doce paixão que me faz sofrer de saudades do que é terno.

Neste Natal, não aceitarei os brindes de mãos que não se tocam, nem irei às ceias dos que se devoram. Não comerei do bolo que empanturra corações e mentes, nem deixarei que a aurora do Menino me surpreenda empanzinado de sono.

Sairei na noite feliz guiado pela estrela dos magos, dançarei aleluias entre as sendas da Via Láctea e, pela manhã, injetarei poesia em cada raio de sol para que todos acordem inebriados como se fossem borboletas livres do casulo

 

terça-feira, 21 de dezembro de 2021

TODOS TEM DIREITO Á VIDA.

São tantas lutas inglórias.
São histórias que a história qualquer dia contará….
Uma crença num enorme coração dos humilhados e ofendidos.
Explorados e oprimidos que tentaram encontrar a solução.
São cruzes sem nomes, sem corpos, sem datas.
Memória de um tempo onde lutar por seu direito é um defeito que mata (Gonzaguinha).
10 de dezembro, foi o Dia Internacional dos Direitos Humanos.
São tantas violações dos direitos à vida, à saúde e à proteção social; violências baseadas em gênero e ameaças aos direitos sexuais e reprodutivos; repressão de militantes, censura da imprensa.

1.323 ativistas dos direitos humanos foram assassinados entre 2015 e 2019 no mundo (Alto Comissariado da Organização das Nações Unidas). A maioria na América Latina: 993 execuções. No Brasil, 174 pessoas foram mortas por defender os direitos humanos.

Guerras, conflitos internos, pobreza, miséria, fome, desemprego, trabalho escravo, concentração de renda, racismo, xenofobia, violência de gênero, homotransfobia, assombram populações inteiras. Dezenas de milhares de pessoas continuam a fugir da violência, da pobreza e da desigualdade. A Covid-19 agravou a situação já precária de pessoas refugiadas e migrantes.

Desastres, exacerbados pelo aquecimento global e por instabilidade climática, afetam severamente, para milhões de pessoas, o exercício dos seus direitos à vida, à alimentação, à saúde, à moradia, à água e ao saneamento.

A destruição da natureza impacta diretamente nos direitos humanos: secas, tempestades, alagamentos, incêndios, ondas de calor. Somente em 2020 foram mortos 227 ambientalistas (Relatório A última linha de defesa – ONG Global Witness). O Brasil aparece na quarta posição, com 20 assassinatos. Levantamento da Comissão Pastoral da Terra aponta que até o final de agosto de 2021, 11 pessoas foram mortas por defenderem seus territórios, o meio ambiente, o acesso à terra e a água. Com o problema da subnotificação, os números são ainda maiores.

A violência com base no gênero (violência doméstica, violência sexual, estupros, feminicídios) é extremamente alta em todo o mundo. Muitos criminosos continuam impunes. Algumas autoridades praticam, elas mesmas, essa violência. É urgente agir para eliminar todas as formas de violência e práticas danosas contra todas as mulheres. Para alcançar a justiça de gênero, é preciso deter os retrocessos dos direitos das mulheres e das pessoas LGBTQI+.

Toda a espécie humana tem direito à vida e à liberdade, à dignidade, à paz, à educação, à saúde, direito à defesa e ao justo julgamento. Esses, entre outros diretos, devem ser garantidos, independentemente da nacionalidade, cultura, sexo, religião, idioma ou ideologia.

domingo, 19 de dezembro de 2021

QUEM SOU EU.

Observação de cunho pessoal de impressões já consolidadas durante o estendido período da pandemia: o envelhecimento acelerado das feições do rosto e do corpo. Expressões do desgaste da rotina imposta, do receio da contaminação generalizada, do desassossego da morte à espreita, do medo da ausência de perspectiva de trabalho, do desalento das relações familiares expostas ao desgaste da convivência obrigatória diária, da tediosa rotina dos solitários, da melancolia crescente pela distância de amigos, afetos e familiares, e, no nosso caso, da depressão e inconformidade com a irresponsável e inaceitável conduta governamental das autoridades máximas do país no agravamento das consequências letais da Covid-19.

De alguma forma, de algum modo, todos carregamos nos semblantes, nas posturas corporais, nos pensamentos, nas ações, ‘sequelas’ advindas da peste do século XXI, já prevista pelos cientistas e especialistas desde muito. Nada que aponte, por ora, para uma descompressão mais permanente, um voltar ao que jamais será como antes, um armistício duradouro. Pelo contrário, temos que nos (re)ver, nos (re)fundar, nos (re)descobrir em temporada de duro combate, em luta constante de preservação da vida, revista e reconstruída em sensibilidade e percepção, mais atenta e perspicaz (tomara) para o que se avizinha.

Tempo de inteireza, tempo de integridade, tempo de entender-se no meio do caos, de encontrar os próprios caminhos e saídas, de manter-se altivo e ativo, de não tergiversar sobre o básico essencial, de dar-se ao respeito e exigir respeito, de entender que as relações demandam equilíbrio e cuidado, que o muito que já foi feito ainda é pouco ou quase nada, que muito há por fazer e por viver, que a sanidade passa pelo amor próprio, pelos outros em dose de equilíbrio e repartição sem cobrança, que amizades sinceras são poucas e que merecem cuidado redobrado e rega contínua, que separar joio do trigo é sinal de sabedoria e maturidade, que o sol é para todos e que seu naco de felicidade passa pela coragem e ousadia de ser e saber-se quem se é.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2021

SEMEIA O BEM.

 

Num de repente, a vida se se fez presente na lembrança de um texto do poeta Alexandre Paredes e que diz:

“Vivemos a maior parte do tempo tão mergulhados em nossos afazeres e preocupações que nem percebemos as maravilhas que a vida nos oferece a cada dia, nas formas mais simples. As dificuldades são enormes, nossos caminhos, às vezes, parecem se fechar e não vemos que a natureza produz, silenciosamente, pequenos milagres a todo instante.

Os noticiários de TV exibem a violência, a corrupção, a catástrofe, o sofrimento, entretanto, as transformações mais belas em nossa vida acontecem sem serem notadas, e os momentos de maior alegria que vivemos não viram notícia.

A maldade humana é como uma noite de tempestade. Por mais terrível, escura e longa que pareça cederá, mais cedo ou mais tarde, à luz do novo dia, que chega serenamente trazendo novas oportunidades de reconstrução da nossa paz interior.

Não te impressiones, pois, pela maneira como crescem a vaidade, a mentira, a hipocrisia e a iniquidade no mundo que te cerca. No fundo, todo mal nasce da ignorância. Há homens cheios da cultura e do saber do mundo que ignoram a paz e desconhecem o amor.

Ilumina o teu horizonte com pequenos gestos de bondade. Por menores que pareçam, são mais fortes do que toda a escuridão reunida.

Projeta luz sobre a tua própria dor, passando a enxergá-la como oportunidade de crescimento e renovação.

O arco-íris nasce do confronto entre a luz do sol e o que chamamos de “tempo ruim”. A chuva, ou o “tempo ruim”, é precioso instrumento da natureza para renovar a vida.

Espalha o otimismo, o quanto puderes. A centelha de esperança que, hoje, acendemos no coração de alguém poderá ser amanhã, um farol a guiar nossos passos quando estivermos perdidos nas tormentas da vida.

Semeia o bem, a paz e a felicidade a todos aqueles que te rodeiam, mas sem fazer-se notado e assim, a felicidade entrará devagarinho em tua vida… sem fazer alarde.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2021

SALVE A ESPERANÇA.

Assim diz a belíssima canção de Gilberto Gil: Louvação. Ali o compositor e recente imortal da Academia Brasileira de Letras, depois de louvar várias situações vitais, louva “a esperança da gente na vida pra ser melhor”. E segue: “Quem espera sempre alcança/ Três vezes salve a esperança”.

Louvemos, pois, a esperança neste início do tempo propício quando o ventre grávido da moça de Nazaré, após o anúncio do Anjo, lateja e pulsa da vida verdadeira feita carne. Louvemos a esperança na vida para ser melhor. Tem que ser melhor por causa da criança que habita o seio da Virgem. Tem que ser melhor por causa do sofrimento do povo, que anseia e clama por dias melhores. Tem que ser melhor por causa da terra, que geme e sofre como em dores de parto vendo seu ventre profanado pelo garimpo e as motosserras.

Começamos o tempo do Advento. Esperamos o que advém, o que se anuncia, o que chega. Depois de todo um ano driblando a doença e a morte, agora esperamos a vida que se faz esperar na alegria, na vigilância e na purificação. Mais do que nunca é preciso esperar. Esperar com paz e com desejo. Esperar com abertura e solicitude. Esperar crendo que, apesar de todas as aparências em contrário, vai acontecer a chegada.

Esperar é preciso. Quem espera sempre alcança. A semente dará seu fruto. Enquanto isso, espera-se o futuro que vive no ventre da mulher. Espera-se um futuro novo, diferente do passado. Ele está chegando e a qualquer momento pode entrar por qualquer fresta de qualquer porta. Três vezes salve a esperança, pois quem espera sempre alcança.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

ADVENTO

Hoje começa oficialmente o Advento.

É um período em que as pessoas se preocupam em limpar e enfeitar suas casas para o Natal.

Mas é muito mais do que isso...

É um período em que devemos fazer faxina também em nossas almas e nossos corações.

Tirar a poeira e teias de aranha da casa, enquanto tiramos os maus sentimentos de nossos corações: ódio, mágoa, ressentimento, inveja, egoísmo…

Afastar os móveis para fazer a limpeza, e também afastar atitudes negativas como pré-julgamento, rejeição, condenação, críticas, grosseria, mentiras, maledicência, avareza, cinismo…

Limpar as janelas e limpar também o olhar, para realmente ver as pessoas à sua volta e prestar atenção aos sentimentos delas e às suas necessidades.

Terminada a limpeza, aí sim, iniciar a decoração.

Encher o coração de amor, ternura, respeito, compaixão e carinho.

Encher-se de atitudes positivas como acolhimento, gentileza, generosidade…

Tentar transmitir às pessoas, próximas ou distantes, sentimentos como autoestima, confiança, paz…

Então, quando o dia de Natal chegar, estaremos preparados para dizer: pode entrar, seja bem-vindo, Senhor Jesus!

( Maria Amélia Ruiz)