quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

SEGREDO OU VERGONHA?

Há 145 anos terminou a Guerra do Paraguai. Durou de 1864 a 1870. Ao longo de seis anos, Brasil, Argentina e Uruguai, instigados pela Inglaterra, combateram os paraguaios. O pretexto era derrubar o ditador Solano López e impedir que o Paraguai, país independente e sem miséria, abrisse uma saída para o mar.
O Brasil enviou 150 mil homens para o campo de batalha. Desses, tombaram 50 mil. Do lado paraguaio foram mortos 300 mil, 20% da população do país. E o Brasil abocanhou 40% do território da nação vizinha. Até hoje o acesso aos documentos do conflito estão proibidos a quem pretende investigá-los. Por quê? Talvez o sigilo imposto sirva para cobrir a vergonhosa atuação de Duque de Caxias, patrono do Exército Brasileiro, que comandou nossas tropas na guerra. E do Conde D’Eu, genro de Dom Pedro II, que sucedeu o duque no massacre aos paraguaios.
Os arquivos ultrassecretos do Brasil podem permanecer sigilosos por 30 anos. O presidente da República pode prorrogar o prazo por mais 30, indefinidamente. Eternamente.
Em 2009, Lula enviou à Câmara dos Deputados projeto propondo o sigilo eterno periodicamente renovado. Os deputados federais o aprovaram com esta emenda: o presidente da República poderia renovar, por uma única vez, o prazo do sigilo, e os documentos considerados ultrassecretos seriam divulgados em, no máximo, 50 anos.
O projeto passou ao Senado. Caiu em mãos da Comissão de Relações Exteriores, cujo presidente era o senador Fernando Collor. E, para azar de quem torce por transparência na República, ele próprio assumiu a relatoria. E tratou de engavetá-lo. Não deu andamento ao debate nem colocou o projeto em votação.
A presidente Dilma decidira sancionar a lei do fim do sigilo eterno a 3 de maio, Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. Naquela data, o relator Collor foi a plenário e declarou ser “temerário” aprovar o texto encaminhado pela Câmara dos Deputados.
Na véspera de ser empossada ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti declarou que Dilma estaria disposta a atender pedidos dos senadores Sarney e Collor, e patrocinar no Senado mudança no decreto para assegurar sigilo eterno a documentos oficiais. A única diferença é que, agora, o sigilo seria renovado a cada 25 anos.
O Congresso estava prestes a aprovar a Comissão da Verdade, que irá apurar os crimes da ditadura militar. Como aprovar esta comissão e vetar para sempre o acesso a documentos oficiais? Isso significa impedir que a nação brasileira tome conhecimento de fatos importantes de sua história.
Collor e Sarney não gostam de transparência por razões óbvias. Seus governos foram desastrosos e vergonhosos. Já o Ministério das Relações Exteriores alega que trazer à tona documentos, como os da Guerra do Paraguai, pode criar constrangimentos com países vizinhos. Com países vizinhos ou com nossas Forças Armadas e personagens que figuram como heróis em nossos livros didáticos?
O sigilo brasileiro a documentos oficiais não tem similar no mundo. Se não for quebrado, a presidente Dilma ficará refém da chamada base aliada. Ontem foi o “diamante de 20 milhões de reais”, hoje o sigilo eterno, amanhã…
Na terça, 14 de junho, retornaram ao Brasil os arquivos do livro “Brasil Nunca Mais” (Vozes), que relata os crimes da ditadura militar brasileira. A publicação, patrocinada pelo Conselho Mundial de Igrejas, foi monitorada pelo cardeal dom Paulo Evaristo Arns e o pastor Jaime Wright.
O mérito do “Brasil Nunca Mais” é que não há ali nenhuma notícia de jornal ou depoimento de vítima da ditadura. Toda a documentação se obteve em fontes oficiais, retirada, por advogados, de auditorias militares e do Superior Tribunal Militar. Microfilmada, foi remetida ao exterior, por razões de segurança. Agora retorna ao Brasil para ficar disponível aos interessados. Muitas informações ali contidas não constam da redação final do livro, da qual participou Frei Beto em parceria com Ricardo Kotscho.
Os arquivos da Polícia Civil (DOPS) sobre a ditadura militar já foram abertos e se encontram à disposição no Arquivo Nacional. Falta abrir o arquivo das Forças Armadas, o que depende da vontade política da presidente Dilma, ela também vítima da ditadura. As famílias dos mortos e desaparecidos têm o direito de saber o que ocorreu a seus entes queridos. E o Brasil, de conhecer melhor a sua história recente.
Um país sem memória corre sempre o risco de repetir, no futuro, o que houve de pior em sua história.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

NÃO CONSIGO, MORREU!

A professora de uma escola primária prometeu a seus alunos um dia especial. As 29 crianças estavam curiosas. Uma vez acomodadas, pediu que guardassem os livros e distribuiu a todos papel e caneta para a tarefa que ia anunciar. Os alunos teriam meia hora para colocar no papel tudo aquilo que se enquadrava nesta frase: “Não consigo”. A tarefa era individual.
Depois de uma pequena pausa, as crianças começaram a escrever as dificuldades insuperáveis, aquelas que provocavam a frase “não consigo”. Cada uma delas assinalou diferentes situações. Não consigo aprender matemática, escreveu uma menina. Não consigo manter meus livros limpos, não consigo acordar de bom humor, não consigo cuidar do meu quarto, não consigo gostar da minha colega ao lado, não consigo comer um chocolate só, não consigo lembrar de rezar à noite foram algumas das frases. Algumas crianças pediram mais uma folha e escreveram mais limitações.
Tempo esgotado, a professora pediu que dobrassem as folhas e colocassem numa caixa de sapatos vazia que ela providenciou. A professora também fizera sua lista. Em silêncio, a turma dirigiu-se ao jardim ao lado da escola. Ali foi aberta uma cova onde a caixa com seu conteúdo seria sepultada. A professora pediu um minuto de silêncio, no qual cada aluno se daria conta que em seu interior repousavam forças gigantescas ainda não acionadas e que Deus o ajudaria superar o medo e as dificuldades. Depois, lentamente, a caixa foi coberta de terra e sobre ela colocado um cartaz: “aqui jaz o Não Consigo”.
Em seguida voltaram para a escola onde cada aluno verbalizou o que sentiu. E para recordar no futuro, foi colocada uma frase na parede, junto à mesa da professora: O Não Consigo morreu e foi sepultado. Quando aparecesse uma dificuldade, os alunos lembrariam a magia daquela manhã e a certeza que tudo poderia mudar. Em seguida, a professora anunciou que o restante do dia seria dedicado a jogos com direito a uma torta com refrigerantes no final. Em casa, cada criança contaria aos pais a incrível notícia: Sabe quem morreu? O Não Consigo.
Na realidade não sabemos a força que temos. E os pais e professores têm a missão de revelar aos filhos e alunos suas possibilidades. Mesmo nos momentos mais difíceis, devem dizer à criança: você pode, você vai conseguir! É possível perder batalhas, mas não podemos perder a guerra. Henry Ford dizia a seus colaboradores: Se você acha que pode, ou se você acha que não pode, sempre terá razão. E com um pouco de humor, alguém explicou: foi lá e como não sabia que era impossível, ele o realizou.

domingo, 22 de fevereiro de 2015

PROPOR CAMINHOS, CLAREAR IDEIAS E ACENDER LUZES.

Um nobre leitor telefonou-me para dialogar sobre os artigos “do Gente, Lugares & Coisas” que escrevo. Dizia-me que eu deveria ser mais polêmico, denunciando e batendo de frente nos que andam atrapalhando a nossa realidade social e nossa história atual. Em sua sinceridade de amigo, afirmava que meus artigos eram muito amenos, leves e pouco provocadores. Achei sua observação sincera e verdadeira! Porém, senti necessidade de clarear para ele qual era a minha razão de escrever assim e não diferente.
Na verdade, a observação de uma pessoa sincera ajuda a firmar as próprias ideias. Estou convencido que, em nossos dias, a polêmica ajuda pouco. Bater de frente para denunciar, facilmente, altera as emoções e cria mais distâncias, deixando o outro lado na teimosia. Gritar contra as trevas não favorece muito a chegada da luz. O tempo da apologética está dando sempre mais lugar ao diálogo. Sermões moralistas não ajudam a mudar convicções e menos ainda comportamentos.
Enfim, polemizar fatos parece não modificar a história. Comecei a me preocupar pelo modo e o conteúdo de falar e escrever a partir de uma experiência vivida.
Um dia destes comecei a observar que, normalmente, quando se ouve alguma denúncia de atitudes e situações, logo se pensa que isso é dito para os outros. “Isto não me atinge!”
Em cada um de nós existe um pouco do fariseu que foi ao templo para rezar. Sentindo-se perfeito, louvava-se a si mesmo, imaginando enganar a Deus. Diminuía os outros para se engrandecer. “Não sou como os demais!” O pior de tudo isso é a tendência de sempre acusar os outros para se declarar inocente.“Os outros merecem ouvir as verdades!”, “Os outros são pecadores!” etc...
Mecanismos de defesa e acusação existem em todos os humanos. Proteger-se pode parecer um direito, mas por outro, pode nos conduzir a um triste fechamento. De qualquer modo, acredito muito que é mais importante propor do que polemizar. Penso que ser polêmico é um jeito de exercer um certo tipo de poder que não liberta e nem anima a caminhar para a verdade.
Propor caminhos, clarear ideias, acender luzes e motivar a reflexão é um modo de acreditar que os outros têm capacidade de elaborar suas convicções e decidir o seu crescimento e suas mudanças. Não se muda ninguém por imposições. Propor é sempre um dever de quem ama e respeita. Até mesmo a salvação da pessoa não vem de uma imposição de Deus, mas de uma proposta revelada plenamente em Jesus Cristo.
Gosto muito de quem ajuda a pensar, de quem não tem a pretensão de querer mudar os outros à força de ameaças. Leio com prazer quem acende luzes de verdade, mais com a beleza do que com a agressão. Decididamente acho melhor propor do que polemizar.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

VOU DESPIR MEUS OLHOS DE TODOS OS PRECONCEITOS.

Na minha meditação deixarei meu corpo flutuar em alturas abissais. Acariciarei uma por uma de minhas rugas, desvelarei histórias, apreenderei, na ponta dos dedos, meu perfil interior.
Não recorrerei ao bisturi das falsas impressões. Nem ao espectro da magreza anoréxica. O tempo prosseguirá massageando meus músculos até torná-los flácidos como as delicadezas do espírito.
Suspenderei todas as flexões, exceto as que aprendo na academia dos místicos. Beberei do próprio poço e abrirei o coração para o anjo da faxina atirar pela janela da compaixão iras, invejas e amarguras.
Pisarei sem sapatos o calor da terra viva. Bailarino ambiental, dançarei abraçado à Gaia ao som ardente de canções primevas. Dela receberei o pão, a ela darei a paz.
Acesas as estrelas, contemplarei na penumbra do mistério esse corpo glorioso que nos funde, eu e Gaia, num único sacramento divino. Seu trigo brotará como alimento para todas as bocas, suas uvas farão correr rios inebriantes de saciedade.
Na mesa cósmica, ofertarei as primícias de meus sonhos. De mãos vazias, acolherei o corpo do Senhor no cálice de minhas carências. Dobrarei os joelhos ao mistério da vida e contemplarei o rosto divino na face daqueles que nunca souberam que cosmo e cosmético são gregas palavras, e deitam raízes na mesma beleza.
Despirei os meus olhos de todos os preconceitos e rogarei pela fé acima de todos os preceitos. Proclamarei o silêncio como ato de profunda subversão. Desconectado do mundo, banirei da alma todos os ruídos que me inquietam e, vazio de mim mesmo, serei plenificado por Aquele que me envolve por dentro e por fora, por cima e por baixo.
Suspenderei da mente a profusão de imagens e represarei no olvido o turbilhão de ideias. Privarei de sentido as palavras. Absorvido pelo silêncio, apurarei os ouvidos para escutar a brisa de Elias e, os olhos, para admirar o que extasiou Simeão.
Não mais farei de meu corpo mero adereço estranho ao espírito. Serei uma só unidade, onda e partícula, verso e reverso, anima e animus.
Recolherei pelas esquinas todos os corpos indesejados para lavá-los no sangue de Cristo, antes que se soltem de seus casulos para alçar o voo das borboletas.
Curarei da cegueira os que se miram no olhar alheio e besuntarei de cremes bíblicos o rosto de todos que se julgam feios, até que neles transpareça o esplendor da semelhança divina.
Arrancarei do chão de ferro os pés congelados da dessolidariedade e farei vir vento forte aos que temem o peso das próprias asas. Ao alçarem o topo do mundo, verão que todos somos um só corpo e um só espírito.
Farei do meu corpo hóstia viva; do sangue, vinho de alegria. Ébrio de efusões e graças, enlaçarei num amplexo cósmico todos os corpos e, no salão dourado da Via Láctea, valsaremos até que a música sideral tenha esgotado a sinfonia escatológica.
Na concretude da fé cristã, anunciarei aos quatro ventos a certeza de ressurreição da carne e de todo o Universo redimido pelo corpo místico de Cristo. Então, o que é terno tornar-se-á, nos limites da vida, eterno quando a morte transvivenciar-nos.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

SUSTENTABILIDADE.

É de bom tom hoje falar de sustentabilidade. Ela serve de etiqueta de garantia de que a empresa, ao produzir, está respeitando o meio ambiente. Atrás desta   palavra se escondem algumas verdades, mas também muitos engodos. De modo geral, ela é usada como adjetivo e não como substantivo.
Explico-me: como adjetivo é agregada a qualquer coisa sem mudar a natureza da coisa. Exemplo: posso diminuir a poluição química de uma fábrica, colocando filtros melhores em suas chaminés que vomitam gases. Mas a maneira com que a empresa se relaciona com a natureza donde tira os materiais para a produção, não muda; ela continua devastando; a preocupação não é com o meio ambiente, mas com o lucro e com a competição que tem que ser garantida. Portanto, a sustentabilidade é apenas de acomodação e não de mudança; é adjetiva, não substantiva.
Sustentabilidade como substantivo exige uma mudança de relação para com a natureza, a vida e a Terra. A primeira mudança começa com outra visão da realidade. A Terra está viva e nós somos sua porção consciente e inteligente. Não estamos fora e acima dela como quem domina, mas dentro como quem cuida, aproveitando de seus bens, mas respeitando seus limites. Há interação entre ser humano e natureza. Se poluo o ar, acabo adoecendo e reforço o efeito estufa donde se deriva o aquecimento global. Se recupero a mata ciliar do rio, preservo as águas, aumento seu volume e melhoro minha qualidade de vida, dos pássaros e dos insetos que polinizam as árvores frutíferas e as flores do jardim.
Sustentabilidade como substantivo acontece quando nos fazemos responsáveis pela preservação da vitalidade e da integridade dos ecossistemas. Devido à abusiva exploração de seus bens e serviços, tocamos nos limites da Terra. Ela não consegue, na ordem de 30%, recompor o que lhe foi tirado e roubado. A Terra está ficando cada vez mais pobre: de florestas, de águas, de solos férteis, de ar limpo e de biodiversidade. E o que é mais grave: mais empobrecida de gente com solidariedade, com compaixão, com respeito, com cuidado e com amor para com os diferentes. Quando isso vai parar?
A sustentabilidade como substantivo é alcançada no dia em que mudarmos nossa maneira de habitar a Terra, nossa Grande Mãe, de produzir, de distribuir, de consumir e de tratar os dejetos. Nosso sistema de vida está morrendo, sem capacidade de resolver os problemas que criou. Pior, ele nos está matando e ameaçando todo o sistema de vida. Temos que reinventar um novo modo de estar no mundo com os outros, com a natureza, com a Terra e com a Última Realidade. Aprender a ser mais com menos e a satisfazer nossas necessidades com sentido de solidariedade para com os milhões que passam fome e com o futuro de nossos filhos e netos. Ou mudamos, ou vamos ao encontro de previsíveis tragédias ecológicas e humanitárias.
Quando aqueles que controlam as finanças e os destinos dos povos se reúnem, nunca é para discutir o futuro da vida humana e a preservação da Terra. Eles se encontram para tratar de dinheiros, de como salvar o sistema financeiro e especulativo, de como garantir as taxas de juros e os lucros dos bancos. Se falam de aquecimento global e de mudanças climáticas é quase sempre nesta ótica: quanto posso perder com estes fenômenos? Ou então, como posso ganhar comprando ou vendendo bônus de carbono (compro de outros países licença para continuar a poluir)? A sustentabilidade de que falam não é nem adjetiva, nem substantiva. É pura retórica. Esquecem que a Terra pode viver sem nós, como viveu por bilhões de anos. Nós não podemos viver sem ela.
Não nos iludamos: as empresas, em sua grande maioria, só assumem a responsabilidade sócio-ambiental na medida em que os ganhos não sejam prejudicados e a competição não seja ameaçada. Portanto, nada de mudanças de rumo, de relação diferente para com a natureza, nada de valores éticos e espirituais. Como disse muito bem o ecólogo social uruguaio E. Gudynas: “A tarefa não é pensar em desenvolvimento alternativo, mas em alternativas de desenvolvimento”.
Chegamos a um ponto em que não temos outra saída senão fazer uma revolução paradigmática, senão seremos vítimas da lógica férrea do Capital que nos poderá levar a um fenomenal impasse civilizatório.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

ESTÁ GARANTIDO.

O mundo duvidou dos religiosos que diziam saber como controlar a dor e ter respostas do céu para os grandes problemas do mundo. Deveria ter duvidado também dos cientistas que diziam saber controlar o átomo e deter o know how da energia.
Os religiosos prometiam e ainda prometem grandes luzes do alto e os cientistas andaram prometendo pequenos sóis contidos em usinas, cuja explosão controlada e segura traria luz para milhões. Trazer, trouxe, mas a explosão controlada e segura nem é tão controlada nem tão segura.
Se religiosos apressados fazem mal para a alma com suas radiações descontroladas, cientistas apressados acabam esvaziando inteiras cidades e regiões, onde não mais se pode morar, nem entrar, nem plantar, nem criar animais. Suas gigantescas matrizes energéticas soltam demônios de césio ou de plutônio.
Já os religiosos que dizem expulsar alguns demônios, parece que criam outros, entre eles o pior de todos: o do fanatismo e da dependência. Gera o fiel sabe-tudo que não dialoga com ninguém, senão com os da sua igreja ou do seu movimento ultra-hiper-iluminado... Não aceita aprender com os outros porque ninguém sabe mais do que ele!
A boa ciência não promete o que não pode cumprir, não garante o que não pode garantir e não brinca de criar milagres. Também a boa religião... Estes, quando percebem o erro, voltam atrás. Os outros, dão um jeito de prosseguir dizendo que não há como voltar. Da próxima vez acertarão... Foi o que disseram após Three Miles Island e Tchernobil. Em Fukushima outra vez não acertaram. Vão parar de garantir? Mas, se pararem de garantir não haverá mais usinas... Por isso, garantem!

domingo, 15 de fevereiro de 2015

NADA FICARÁ SEM RECOMPENSA.

O duelo, no passado, foi uma modalidade irracional de resolver questões. Os mais diferentes motivos podiam ser resolvidos dessa maneira - problemas afetivos, questões de honra, divergência sobre dívidas... As três principais modalidades de vitória: o primeiro sangue, um dos adversários mortalmente ferido ou mesmo a morte. Assim era lavada a honra. Supostamente o vencedor tinha razão. Na Itália, em fins da Idade Média, dois cavaleiros desafiaram-se em duelo para provar a supremacia de dois poemas. Qual era melhor: Jerusalém Libertada ou Orlando Furioso?
Escrita por Torquato Tasso, Jerusalém Libertada narra a epopeia da tomada da cidade santa na Primeira Cruzada. Ludovico Ariosto – com Orlando Furioso - exalta episódios da Reconquista, quando a Europa expulsou para a África os muçulmanos que se haviam apoderado de Portugal, Espanha e parte da França. As duas obras fizeram muito sucesso e tiveram centenas de edições e os pintores mais célebres deixaram obras-primas envolvendo cenas dos poemas.
No duelo, um dos adversários caiu mortalmente ferido e, antes de expirar, afirmou levar para a eternidade uma grande mágoa: gostaria de ter lido os dois poemas.
É bastante comum a pessoa assumir posições pelo lado emocional. Não conhece a questão, mas faz dela uma razão para viver. São os revolucionários sem causa. Surge um abismo entre a convicção e o fanatismo. Acabam por representar. Assim podem existir teólogos sem fé, moralistas de vida totalmente errada, políticos apenas interessados em seus interesses, ferreiros com espeto de pau. O Evangelho fala dos que dizem Senhor, Senhor, mas não entrarão no Reino, mesmo tendo feito milagres.
Um dos episódios mais intrigantes do Evangelho refere-se à figueira sem frutos. À beira do caminho surgiu uma figueira frondosa. Jesus dirigiu-se a ela, mas ficou decepcionado: não havia sinal de frutos. E aí surge o detalhe surpreendente: não era tempo de figos. Produzir frutos no tempo certo é bom, mas o discípulo do Senhor produz frutos também fora do tempo. É aquilo que escapa ao limite formal do dever. É aquilo que é feito além da obrigação, depois do tempo ou porque alguém deixou de fazer. É a gratuidade. O mesmo Evangelho fala da segunda milha. A primeira milha é a da obrigação, a segunda é a da generosidade. tantos não ficaram na primeira milha e produziram frutos fora da estação. “Somos servos inúteis, apenas fizemos aquilo que devíamos fazer”, é a constatação humilde do empregado fiel. Mesmo assim o Mestre lembra que nem um copo de água, símbolo das menores coisas, ficará sem recompensa.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

DUAS PALAVRAS GREGAS

Mathéin” e “pathéin” são palavras do grego. Fixemos “mathéin” –aprender - e “pathein” - experimentar. É claro que há mais sentidos ocultos nestas duas palavras, mas fiquemos com esses. Entre mathéin e pathéin há um caminho a ser percorrido. O grande filósofo grego Aristóteles dizia que as pessoas iam aos cultos mais para experimentar (pathéin) do que para aprender (mathéin) verdades. Cerca de 2.400 anos depois acontece o mesmo nos templos cristãos, muçulmanos e judeus.
A maioria dos crentes vai experimentar os mistérios. Poucos privilegiam a teologia, o catecismo, o aprendizado. Aprofundam-se no sentir e quase nunca no entender.
A maioria dos pregadores de hoje segue a linha do “pathéin”. Conduzem o fiel para sentir, experimentar, orar em línguas, emocionar-se, pedir curas, abrir os braços, chorar, dançar. Pregam mais o sentir do que o entender, captar, aprender e raciocinar. Desminta-me quem puder. Ligue o rádio e a televisão e verá se a intenção é ensinar a refletir ou a emocionar-se.
Televisão, rádio, congressos e templos estão repletos de “pathéin”. “Sinta e experimente Deus” está mais em voga do que “entenda e compreenda o que a mensagem dizia naqueles tempos e o que nos diz agora”.
Na verdade, a ordem é “confie e beba e não faça perguntas”. Uma boa religião precisa de mais do que isso! Muito mais! Perguntar também é coisa do céu!

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

LUZ!

Há fenômenos positivos que sempre marcaram a história humana. Hoje, com certeza, mais do que nunca! Um desses fenômenos chama-se “necessidade de luz!” Na experiência dos contrastes, quanto mais experimentamos o pior, mais necessitamos do melhor. Quanto mais sombras e trevas aparecem no caminho, mais ansiamos pela luz.
Em muitas áreas do conhecimento e do progresso humanos, novas luzes foram despontando e se tornando claras. Quero citar apenas a conclusão do primeiro rascunho do genoma humano, acontecida no primeiro semestre do novo milênio. O diretor do projeto Genoma, Francis S. Collins, lembra o discurso de Clinton que dizia: “Hoje, estamos aprendendo a linguagem com a qual Deus criou a vida. Ficamos ainda mais admirados pela complexidade, pela beleza e pela maravilha da dádiva mais divina de Deus”.
Tanto empenho e tantas luzes foram e continuam sendo acesas no campo da ciência e da técnica. Tudo isso é louvável e bom! Porém, não está acontecendo o mesmo ao se tratar do sentido da vida, dos ajustes na convivência humana, da capacidade de diálogo no cotidiano da vida, do senso de humanidade e das coisas mais primárias do nosso dia a dia. Os valores éticos e morais estão sendo deixados nos porões e, tantos, até como peças de museu.
Precisamos de luz! É o clamor dos profissionais da educação, que não se veem reconhecidos e ajudados em sua árdua missão de ensinar, educar e garantir uma formação digna que responda às exigências da atualidade. Somado a isso, está o desafio dos destinatários desmotivados a uma educação transformadora e responsável.
Precisamos de luz! É o grito da família que se vê invadida - ou se deixa invadir - por mestres sem verdades e sem futuro das telas de televisão e pela onda de desmonte da família, como santuário da vida.
Precisamos de luz! É também o desejo da criança e da juventude que veem seu futuro envolvido em sombras ou até mesmo nas trevas da desesperança; luzes para o amor se tornar possível e verdadeiro, que não se torne ilusão, traição e solidão; luzes para não precisar se envolver na droga para garantir uma alegria que vai desencadeando tristezas em todos os lados.
Precisamos de luz! É também a expressão que deverá brotar no mundo da política para que realmente se torne a arte do bem comum e não engane o povo na penumbra dos oportunismos interesseiros. Bendita luz que ainda tem coragem de clamar pela “ficha limpa” dos candidatos e exige a transparência de quem quer legislar ou administrar o que é de todos.
Precisamos de luz também em nossas Igrejaa, santa e pecadora, humana e divina. Precisamos de luz para que a vida seja administrada com fé e a fé saiba valorizar a vida. Precisamos de luz para que as esperanças, tenham seu fundamento  e não se fixem em fanatismos personalistas. Precisamos de luz, para que o amor consiga organizar a convivência humana segundo os projetos de Deus. Precisamos de luz em tudo e para tudo, agora e sempre.

OS 1% E OS 99%

Anualmente a revista americana Forbes divulga a relação das pessoas mais ricas. Pelo segundo ano consecutivo, o mexicano Carlos Slim, dono da América Movil, aparece como o homem mais rico do planeta. Sua fortuna é estimada em 74 bilhões de dólares. 70 brasileiros possuem mais de um bilhão de dólares. Da lista fazem parte também russos, chineses e indianos, num total de 1.200 nomes.
Nenhuma publicação, por enquanto, divulgou a relação dos mais pobres do planeta, mesmo porque eles se aproximam da casa dos dois bilhões de seres humanos. No entanto, alguns nomes podem ser levantados. O primeiro da lista é Jesus, o filho de José, um carpinteiro. Filho de Deus, abriu mãos de todos os seus privilégios e tornou-se o mais pobre dos seres humanos: nasceu numa gruta, não tinha onde repousar a cabeça e morreu despido numa cruz, fornecida pelo Império Romano. Até seu túmulo foi emprestado.
Em destaque nesta lista aparece Francesco Bernardoni, mais conhecido por Francisco de Assis. Filho único de um rico mercador de panos, entregou ao pai até mesmo suas roupas de corpo e garantiu que nunca mais tocaria em qualquer moeda. O caminho era sua casa e o céu seu coberto. A lista inclui ainda Teresa de Calcutá, a irmãzinha que dedicou sua vida aos mais pobres entre os pobres da Índia. Charles de Foucauld integra a lista. Ele deixou sua casa e carreira para morar com uma desconhecida tribo africana, os tuaregues. Podemos ampliar essa lista com Roger Schutz, o Prior de Taizé, o indiano Mahatma Gandhi, Irmã Dulce e uma multidão de anônimos  que deixaram sua pátria e sua família e deram sua vida em favor dos excluídos.
Não se trata apenas de duas listas: os que mais e os que menos possuem. A questão refere-se à felicidade. Até que ponto 74 bilhões de dólares garantem a felicidade de uma pessoa? É bom não confundir felicidade com momentos de intensa alegria e prazer. Nos mercados, nos shoppings e bolsas de valores, a felicidade não está disponível. Há os que procuram atalhos em busca da desejada felicidade: a droga, a bebida, o sexo, a glória... Eles não garantem a felicidade e deixam, após si, um lastro de frustração e desencanto.
Curiosamente, os integrantes da outra lista – os que menos ou nada possuem – são contemplados com a felicidade. Ela não brota do dinheiro, mas do serviço gratuito e da entrega filial a um Deus-Amor. Foi em Deus que é Pai e nos irmãos, por Ele enviados, que Francisco encontrou e plena, a perfeita alegria. Ele e tantos outros encontram um sentido para a vida.

domingo, 8 de fevereiro de 2015

ENTRE O MAIS E O MENOS.

No livro “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, Machado de Assis descreve um quase desastre: “empacou o jumento em que vinha montado; fustiguei-o, ele deu três corcovos, depois mais três, enfim mais um, que me sacudiu fora da sela com tal desastre que o pé esquerdo me ficou preso no estribo...” O animal ia disparar e, no fim da corrida, certamente sobrariam ferimentos graves ou mesmo a morte. Um homem do povo, com algum perigo, conseguiu pegar a rédea e deteve o animal, possibilitando que seu dono escapasse sem qualquer ferimento.
Passado o susto, sentiu necessidade de recompensar o benfeitor e decidiu dar a ele três das cinco moedas de ouro que carregava consigo. Quando o seu salvador devolveu-lhe as rédeas do animal, a decisão era dar-lhe duas moedas de ouro, que em seguida baixou para uma. Tomou o alforje onde estavam as moedas e ai encontrou um cruzado de prata, que acabou dando ao seu salvador. Despediu-se um tanto constrangido e, pouco depois, ao colocar a mão no bolso, encontrou algumas moedinhas de cobre e refletiu: estes vinténs eu devia ter dado ao que me salvou ... e seguiu o caminho com remorsos pelo seu esbanjamento.
É possível analisar uma vida humana na dialética entre o máximo e o mínimo. Há pessoas que se contentam com o mínimo quando se trata de seus deveres e o máximo quando estão em jogo seus direitos. E acabam criando uma lógica que justifica isso. O escritor Paulo Coelho lembra a capacidade que temos para justificar nossas opções: quando tomamos uma decisão, aparentemente, todas as forças do mundo se unem para nos dar razão.
Os partidários do mínimo estão em toda parte e em todas classes sociais: funcionários públicos, professores, alunos, sacerdotes, pais, balconistas... Fazem – quando fazem – o mínimo estabelecido. Sempre têm alguma justificativa: não compete a mim, terminou o horário, passe outro dia, vou ver o que é possível fazer, vou passar a meu assessor...
O evangelista João nos descreve significativo pormenor no banquete de Betânia: Maria levou quase meio litro de nardo, um perfume muito caro, e ungiu os pés e os cabelos de Jesus. “A casa inteira encheu-se de perfume”, garante o evangelista. Ela não assumiu o mínimo – algumas gotas -, mas abriu o vidro e derramou todo o perfume em seu gesto de ternura ao Salvador. Ela assumiu a medida do próprio Jesus que deu com generosidade seu sangue e sua vida pela humanidade. Mas há uma dimensão em que o mínimo é mais importante que o máximo: pouco basta para viver e nada é suficiente para a ganância. Hoje vivemos a filosofia do consumismo que nos induz a consumir o máximo. Precisaríamos de tão pouco e desejamos tudo. A pessoa mais rica é aquela que se contenta com pouco, a pessoa mais pobre é aquela que tudo possui e ainda deseja mais.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

O PERIGOSO AUMENTO DOS AGROTÓXICOS

Quando começou seu uso intensivo - na década de setenta - os agrotóxicos foram vistos como redenção da agricultura. Cinquenta  anos após, constatamos que o feitiço virou contra o feiticeiro. Chegamos a um ponto onde não parece possível viver sem eles, mas é impossível viver com eles. Inseticidas, fungicídas e herbicidas - somam mais de 15 mil formulações - trouxeram um avanço significativo na produção agrícola. Mas com um preço muito alto a ser pago.
O Brasil ostenta o título de campeão mundial no uso de agrotóxicos, pelo volume total empregado e pela quantidade aplicada por hectare plantado. O Estado do Mato Grosso, que mais produz soja no país, é líder no uso de pesticidas e os maléficos efeitos são imensuráveis.
Um estudo, conduzido pelo pesquisador Josino Costa Moreira, revela as consequências do uso de agrotóxicos, afetando pessoas, segmentos ambientais, ar e animais. O pesquisador documenta a contaminação das águas de rios, chuva e poços artesianos. Também foi comprovada a contaminação de anfíbios que apresentaram deformações superiores em 50% aos que habitam outras áreas. Até a tradicional minhoca é afetada. Quando não morre, tem reduzida sua capacidade de reprodução. Resíduos de agrotóxicos foram detectados no leite materno. Moreira também salienta a maior responsabilidade do agronegócio no usos de agrotóxicos.
Pisamos um terreno movediço e ainda não conhecemos todos os efeitos que podem estar a caminho, afetando o homem e a natureza. Diante deste quadro cada vez mais preocupante, são duas as medidas que precisam ser adotadas. A primeira delas é a educação, conscientizando a população, sobretudo os trabalhadores rurais, para os perigos - nem todos ainda conhecidos - do uso dos agrotóxicos. A segunda é uma fiscalização intensiva por parte dos governantes, algo que, no momento, deixa muito a desejar.

LUZ!

Há fenômenos positivos que sempre marcaram a história humana. Hoje, com certeza, mais do que nunca! Um desses fenômenos chama-se “necessidade de luz!” Na experiência dos contrastes, quanto mais experimentamos o pior, mais necessitamos do melhor. Quanto mais sombras e trevas aparecem no caminho, mais ansiamos pela luz.
Em muitas áreas do conhecimento e do progresso humanos, novas luzes foram despontando e se tornando claras. Quero citar apenas a conclusão do primeiro rascunho do genoma humano, acontecida no primeiro semestre do novo milênio. O diretor do projeto Genoma, Francis S. Collins, lembra o discurso de Clinton que dizia: “Hoje, estamos aprendendo a linguagem com a qual Deus criou a vida. Ficamos ainda mais admirados pela complexidade, pela beleza e pela maravilha da dádiva mais divina de Deus”.
Tanto empenho e tantas luzes foram e continuam sendo acesas no campo da ciência e da técnica. Tudo isso é louvável e bom! Porém, não está acontecendo o mesmo ao se tratar do sentido da vida, dos ajustes na convivência humana, da capacidade de diálogo no cotidiano da vida, do senso de humanidade e das coisas mais primárias do nosso dia a dia. Os valores éticos e morais estão sendo deixados nos porões e, tantos, até como peças de museu.
Precisamos de luz! É o clamor dos profissionais da educação, que não se veem reconhecidos e ajudados em sua árdua missão de ensinar, educar e garantir uma formação digna que responda às exigências da atualidade. Somado a isso, está o desafio dos destinatários desmotivados a uma educação transformadora e responsável.
Precisamos de luz! É o grito da família que se vê invadida - ou se deixa invadir - por mestres sem verdades e sem futuro das telas de televisão e pela onda de desmonte da família, como santuário da vida.
Precisamos de luz! É também o desejo da criança e da juventude que veem seu futuro envolvido em sombras ou até mesmo nas trevas da desesperança; luzes para o amor se tornar possível e verdadeiro, que não se torne ilusão, traição e solidão; luzes para não precisar se envolver na droga para garantir uma alegria que vai desencadeando tristezas em todos os lados.
Precisamos de luz! É também a expressão que deverá brotar no mundo da política para que realmente se torne a arte do bem comum e não engane o povo na penumbra dos oportunismos interesseiros. Bendita luz que ainda tem coragem de clamar pela “ficha limpa” dos candidatos e exige a transparência de quem quer legislar ou administrar o que é de todos.
Precisamos de luz também em nossas Igrejaa, santa e pecadora, humana e divina. Precisamos de luz para que a vida seja administrada com fé e a fé saiba valorizar a vida. Precisamos de luz para que as esperanças, tenham seu fundamento  e não se fixem em fanatismos personalistas. Precisamos de luz, para que o amor consiga organizar a convivência humana segundo os projetos de Deus. Precisamos de luz em tudo e para tudo, agora e sempre.

OS 1% E OS 99%

Anualmente a revista americana Forbes divulga a relação das pessoas mais ricas. Pelo segundo ano consecutivo, o mexicano Carlos Slim, dono da América Movil, aparece como o homem mais rico do planeta. Sua fortuna é estimada em 74 bilhões de dólares. 70 brasileiros possuem mais de um bilhão de dólares. Da lista fazem parte também russos, chineses e indianos, num total de 1.200 nomes.
Nenhuma publicação, por enquanto, divulgou a relação dos mais pobres do planeta, mesmo porque eles se aproximam da casa dos dois bilhões de seres humanos. No entanto, alguns nomes podem ser levantados. O primeiro da lista é Jesus, o filho de José, um carpinteiro. Filho de Deus, abriu mãos de todos os seus privilégios e tornou-se o mais pobre dos seres humanos: nasceu numa gruta, não tinha onde repousar a cabeça e morreu despido numa cruz, fornecida pelo Império Romano. Até seu túmulo foi emprestado.
Em destaque nesta lista aparece Francesco Bernardoni, mais conhecido por Francisco de Assis. Filho único de um rico mercador de panos, entregou ao pai até mesmo suas roupas de corpo e garantiu que nunca mais tocaria em qualquer moeda. O caminho era sua casa e o céu seu coberto. A lista inclui ainda Teresa de Calcutá, a irmãzinha que dedicou sua vida aos mais pobres entre os pobres da Índia. Charles de Foucauld integra a lista. Ele deixou sua casa e carreira para morar com uma desconhecida tribo africana, os tuaregues. Podemos ampliar essa lista com Roger Schutz, o Prior de Taizé, o indiano Mahatma Gandhi, Irmã Dulce e uma multidão de anônimos  que deixaram sua pátria e sua família e deram sua vida em favor dos excluídos.
Não se trata apenas de duas listas: os que mais e os que menos possuem. A questão refere-se à felicidade. Até que ponto 74 bilhões de dólares garantem a felicidade de uma pessoa? É bom não confundir felicidade com momentos de intensa alegria e prazer. Nos mercados, nos shoppings e bolsas de valores, a felicidade não está disponível. Há os que procuram atalhos em busca da desejada felicidade: a droga, a bebida, o sexo, a glória... Eles não garantem a felicidade e deixam, após si, um lastro de frustração e desencanto.
Curiosamente, os integrantes da outra lista – os que menos ou nada possuem – são contemplados com a felicidade. Ela não brota do dinheiro, mas do serviço gratuito e da entrega filial a um Deus-Amor. Foi em Deus que é Pai e nos irmãos, por Ele enviados, que Francisco encontrou e plena, a perfeita alegria. Ele e tantos outros encontram um sentido para a vida.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

O QUE SE QUER É UM FUTURO MELHOR PARA A HUMANIDADE.

Após dez anos, parece que finalmente as forças estadunidenses conseguiram encontrar Bin Laden. Parece que é dele mesmo o cadáver do qual se investigou o DNA e que, segundo informações da mídia dos Estados Unidos, jaz no fundo do mar. Parece finalmente que ele não se rendeu e por isso foi morto com dois tiros na cabeça, embora outras fontes digam que a operação na qual o alvo tinha o codinome de “Jerônimo” era pensada para trazê-lo vivo ou morto. 
Parece tanta coisa que não podemos aqui especular o que será ou não completamente verdadeiro de todas as notícias que lotaram as manchetes da mídia internacional no início de maio, após a morte do chefe da Al-Qaeda, considerado responsável pelo ataque às torres gêmeas no dia 11 de setembro de 2001, ser anunciada oficialmente ao mundo inteiro. E não sendo possível averiguar com exatidão aquilo que parece ser, mas pode não ser, melhor ater-nos aos fatos, ou seja, àquilo que se pode, sim, constatar a partir de evidências comprovadas e comprováveis.
Constatável e evidente é a euforia que tomou conta das ruas de Nova York e outras cidades americanas, com centenas de pessoas festejando a notícia. Celebravam o que seria a justa vingança pelas dolorosas perdas sofridas de irmãos, filhos, parentes, amigos; a humilhação da nação pega de surpresa pelo ataque terrorista; o terror que tomou conta do mundo inteiro a partir de 2001, endurecendo a vigilância nas fronteiras do país inteiro.
Igualmente visível e evidente é a atitude orgulhosa e triunfante do governo americano ao exibir o troféu há tanto tempo esperado. As declarações do presidente Barack Obama, responsável pela vitoriosa operação, dão disso testemunho. O presidente anunciou a morte do líder terrorista e declarou que assim a justiça havia sido feita.
Na terça, 3 de maio, o Pe. Federico Lombardi, porta-voz do Vaticano, reagiu ao anúncio da morte de Bin Laden com palavras de extremo bom senso. Após relembrar que para os cristãos não é permitido alegrar-se com a morte de nenhum ser humano, declarou esperar que o fato servisse para relembrar a todos a responsabilidade de cada pessoa perante Deus e os outros. Relembrou que Bin Laden tinha a grave responsabilidade de haver espalhado divisão e ódio, causando mortes de um incontável número de pessoas inocentes e usando a religião com esses objetivos.
O que chama a atenção – na contramão das outras evidências que acima destacamos – é a conclusão do porta-voz do Vaticano, que disse esperar que a morte de Bin Laden não seja uma ocasião para mais ódio e sim para a paz. Chama a atenção por introduzir como outra clave musical em meio ao ruído dos que perderam entes queridos devido à ação terrorista comandada pela Al-Qaeda e dos que se sentiram agredidos pela sua violência. É um tom novo de bom senso e paz em meio ao alerta que espalha o medo no mundo inteiro pela represália que pode vir a partir da morte do líder islâmico.
O que o Vaticano diz no momento em que muitos comemoram a desaparição de um indivíduo fanático e ameaçador à segurança e ao sossego de muitos é o valor infinito e irredutível da vida humana. A ninguém é permitido alegrar-se com a extinção de uma existência que só pertence ao Criador que a originou e amorosamente cuidou. Embora a sociedade deva proteger-se de tais ameaças, isolando-as da convivência social, comemorar a morte de um homem é algo que banaliza o valor sagrado de toda vida humana, por menos virtuosa que seja.
Igualmente nos relembra o Pe. Lombardi que o importante não é acrescentar ódio ao ódio que a vida de Bin Laden já espalhou pelo mundo. Mas, a partir de toda a dor semeada, vivida e sofrida, unir forças para construir um futuro de mais paz e menos violência para a humanidade neste século XXI, marcado dolorosamente pelos fatos ocorridos no dia 11 de setembro. Só assim a justiça de que fala o presidente Obama terá chance de ser realmente feita e consumada. Pois, enquanto a vingança e o ódio forem o motor dos sentimentos, não haverá muita chance de que não se mimetize o passado e que realmente aconteça um futuro melhor para o gênero humano.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

UM POUCO DE HISTÓRIA PARA AJUDAR A ELUCIDAR.

Por que a ação militar que teria matado Bin Laden mereceu o nome de Operação Jerônimo? Prescott Bush integrava, em 1918, a associação estudantil Skull & Bones (Crânio e Osso). Desafiado pelos colegas, invadiu um cemitério apache e roubou o escalpo do lendário cacique Jerônimo.
Dono de terras no Texas, Prescott tornou-se um exitoso empresário de petróleo e amigo íntimo de John Foster Dulles, que comandava a CIA por ocasião do assassinato de John Kennedy, em 1963. Dulles convenceu o amigo a fazer um gesto magnânimo e devolver aos apaches o escalpo de Jerônimo. Bush o atendeu, mas não tardou para os indígenas descobrirem que a relíquia restituída era falsa…


A amizade com Dulles garantiu ao filho mais velho de Prescott, George H. Bush, o emprego de agente da CIA. George destacou- se a ponto de, em 1961, coordenar a invasão da Baía dos Porcos, em Cuba. Malgrado a derrota, tornou-se diretor da CIA em 1976.
Triste com o mau desempenho de seu primogênito como 007, Prescott Bush consolava-se com o êxito dele nos negócios de petróleo. E aplaudiu o faro empresarial do filho quando George, em meados dos anos 60, tornou-se amigo de um empreiteiro árabe que viajava com frequência ao Texas: Muhammad Bin Laden. Em 1968, ao sobrevoar os poços de petróleo de Bush, Bin Laden morreu em acidente aéreo no Texas. Mas os laços de família estavam criados.
George Bush não pranteou a morte do amigo. Andava mais preocupado com as dificuldades escolares de seu filho George W. Bush, que só obtinha média C. Para evitar que o filho fosse convocado para o Vietnã, tratou de alistá-lo na Guarda Nacional.
Papai George incentivou o filho a fundar, em meados dos anos 70, sua própria empresa petrolífera, a Arbusto (bush, em inglês) Energy. Graças aos contatos internacionais que o pai mantinha, George filho buscou investimentos de Khaled Bin Mafouz e Salem Bin Laden, o mais velho dos 52 filhos gerados pelo falecido Muhammad. Mafouz era banqueiro da família real saudita e casara com uma das irmãs de Salem. Esses vínculos familiares permitiram que Mafouz se tornasse presidente da Blessed Relief, a ONG árabe na qual trabalhava um dos irmãos de Salem, Osama Bin Laden.
Em 1988, Salem faleceu, como o pai, num desastre de avião.
Naquele mesmo ano, os soviéticos invadiram o Afeganistão. Papai George, que coordenava operações da CIA, recorreu a Osama, um dos irmãos de Salem, que aceitou infiltrar-se no Afeganistão para, monitorado pela CIA, fortalecer a resistência afegã contra os invasores comunistas.
Os dados acima são do analista italiano Francesco Piccioni. Mais detalhes no livro A fortunate son: George W. Bush and the making of an American President, de Steve Hatfield.
Em 1979, a pedido de George Bush pai, então diretor da CIA, Osama, já com 23 anos, transferiu-se para o Afeganistão para administrar os recursos financeiros destinados às operações secretas da agência contra a invasão soviética àquele país. Preocupado com a ofensiva de Moscou, o governo dos EUA havia liberado a mais alta soma que a CIA recebeu para atuar em um só país: US$ 2 bilhões.
Quando o presidente George W. Bush, após 11 de setembro, enquadrou, como crime anexo ao terrorismo o “aproveitamento ilícito de informações privilegiadas”, sabia do que falava. Tudo indica que, graças a essas informações, Osama Bin Laden montou a sua rede terrorista mundo afora, movimentando recursos através de paraísos fiscais.
Talvez Freud pudesse explicar um detalhe das armas escolhidas pelos terroristas de 11 de setembro: aviões. O pai e o irmão mais velho de Osama Bin Laden morreram em acidentes aéreos, ambos nos EUA.
Se o escalpo de Jerônimo era falso, quem garante que Bin Laden foi mesmo morto no Paquistão? Não seria mais útil agarrá-lo vivo e obrigá-lo a revelar tudo sobre a Al-Qaeda? Não duvido que, em algum porta-aviões dos EUA, Bin Laden esteja sendo torturado para dizer o que sabe. Depois, basta adotar a “solução argentina”: atirar o corpo ao mar. Caso o encontrem boiando em alguma praia, ficam por conta dos afiados dentes dos peixes as marcas profundas.

domingo, 1 de fevereiro de 2015

DUAS PALAVRAS GREGAS: MATHPEIN E PATHÉIN.



Mathéin” e “pathéin” são palavras do grego. Fixemos “mathéin” –aprender - e “pathein” - experimentar. É claro que há mais sentidos ocultos nestas duas palavras, mas fiquemos com esses. Entre mathéin e pathéin há um caminho a ser percorrido. O grande filósofo grego Aristóteles dizia que as pessoas iam aos cultos mais para experimentar (pathéin) do que para aprender (mathéin) verdades. Cerca de 2.400 anos depois acontece o mesmo nos templos cristãos, muçulmanos e judeus.
A maioria dos crentes vai experimentar os mistérios. Poucos privilegiam a teologia, o catecismo, o aprendizado. Aprofundam-se no sentir e quase nunca no entender.
A maioria dos pregadores de hoje segue a linha do “pathéin”. Conduzem o fiel para sentir, experimentar, orar em línguas, emocionar-se, pedir curas, abrir os braços, chorar, dançar. Pregam mais o sentir do que o entender, captar, aprender e raciocinar. Desminta-me quem puder. Ligue o rádio e a televisão e verá se a intenção é ensinar a refletir ou a emocionar-se.
Televisão, rádio, congressos e templos estão repletos de “pathéin”. “Sinta e experimente Deus” está mais em voga do que “entenda e compreenda o que a mensagem dizia naqueles tempos e o que nos diz agora”.
Na verdade, a ordem é “confie e beba e não faça perguntas”. Uma boa religião precisa de mais do que isso! Muito mais! Perguntar também é coisa do céu!

NÃO PODEMOS ABANDONAR O SONHO DE UM MUNDO MELHOR.

Aconteceu que um dedicado professor, estando numa sala de aula tumultuada pelos jovens alunos, desejava passar os conteúdos da disciplina e não conseguia. Depois de algumas tentativas frustradas, quis chamar atenção e motivar os alunos e disse: “Jovens, o futuro do mundo está em vossas mãos!” No momento aconteceu um certo silêncio e um dos meninos gritou: “Por azar dele!” Às gargalhadas, todos saudaram o valente colega.
Um simples incidente ou brincadeira de sala de aula não pode ser critério de julgamento. Porém, não deixa de expressar um pouco a mentalidade de quem não pensa com responsabilidade o seu futuro e o futuro dos outros. Quando se cria um cinismo coletivo vão se corroendo as melhores esperanças. Quando se faz do sério uma brincadeira, a brincadeira pode causar um sério problema.
Não levar a sério a responsabilidade da história parece ser uma doença da humanidade. É mais fácil lamentar as consequências ruins dos fatos do que prevenir com determinação e combater as causas dos males que nos surpreendem.
Em 1983, o presidente do clube de Roma escreveu muito, em tom dramático e pessimista, sobre o futuro do mundo. Seu livro tinha como título: “O futuro em nossas mãos”. Foi acusado de profeta do mau agouro, porém, tudo o que afirmava foi acontecendo, como a grande crise econômica mundial, as epidemias, a decadência dos valores humanos, a corrupção política etc...
Presenciando um futuro de alto risco para a vida no planeta Terra; acompanhando os grandes avanços no campo da técnica e os recuos no campo da ética, um grande pensador ateu, antes da morte, disse: “Só um Deus pode salvar o futuro da humanidade”. Tal pronunciamento ressoou com espanto, sabendo que ele sempre se proclamara um descrente. Por qual razão teria chegado a elaborar essa conclusão?
Quem seria esse Deus? Certamente, o Deus em quem nós cremos pode salvar o futuro da humanidade. Porém, Ele não faz por nós o que a nós compete fazer. Deus é Pai, mas não paternalista. Ele acredita e ama a obra prima de sua criação que somos nós. Este Deus que salvará o futuro da humanidade não desiste de entregar o futuro em nossas mãos.
Para Deus, tudo o que fizermos de bom para favorecer a vida, tudo o que prepara, com responsabilidade, um futuro melhor, se torna um hino de louvor e reconhecimento. Não cremos num Deus ciumento do justo progresso humano. Quando nos tornamos parceiros d’Ele e vamos tecendo com fé e amor os bons dias da história, também vamos confirmando que só em Deus e com Deus se salvará o futuro da humanidade.
Diante do futuro que deverá continuar em nossas mãos, jamais poderemos renunciar ao direito de sonhar com um mundo melhor. Na caminhada da vida somos peregrinos da esperança, porque Deus colocou em nossos corações e no coração do mundo o princípio de toda a esperança: o Cristo Ressuscitado.