terça-feira, 16 de janeiro de 2024

RACISMO AMBIENTAL.


 A injustiça ambiental no Brasil tem cor e a opressão e exploração do capital tem um alvo bem definido.


Quando o reverendo protestante e ativista afro-americano, Benjamin Franklin Chavis Jr, que foi secretário de Martin Luther Kink durante a luta pelos direitos civis dos negros nos USA, cunhou a expressão “racismo ambiental”, ele denunciava que a degradação ambiental tinha um alvo preferencial, que era a população negra norte-americana, negligenciada pela falta de investimentos em saneamento básico nas regiões onde eram maioria. Essas áreas também eram utilizadas para despejos de resíduos tóxicos e nocivos à saúde daquela população. Quando falamos em grilagem ou exploração ilegal de terras indígenas, por exemplo, também estamos falando de racismo ambiental. A omissão do Estado diante do aumento das comunidades em regiões periféricas e a sua ausência administrativa frente a construção de casas em área de risco, também é racismo ambiental, pois ignora as consequências que tais edificações podem trazer ao meio-ambiente e às pessoas que nelas irão habitar.


Observemos com atenção qual a cor predominante das pessoas que aparecem nas imagens, praticamente submersas, sendo arrastadas pelas águas das chuvas ou desabrigadas após uma enchente no Rio de Janeiro. A explicação é simples e continua sendo reflexo da política escravocrata que aqui vigorou por quase quatro séculos, culminando com um pós-abolição onde os africanos escravizados tiveram que se abrigar em regiões precárias e distantes dos grandes centros, por não ter havido uma política de reparação aos danos sociais e humanos que a escravização lhes causou. É inegável que algumas comunidades sofrem mais com a crise climática do que outras, e os impactos dos desastres ambientais provocados por essas mudanças acabam pesando sobre elas. Qual o número de desabrigados em Copacabana, Leblon e adjacências, em comparação com bairros da Zona Norte e Baixada Fluminense? Quantos moradores ou lojistas das ruas da zona sul carioca perderam seus móveis ou tiveram suas propriedades invadidas pelas enchentes?

Ainda sob a égide das causas naturais, os danos ambientais são desiguais entre as classes. Algo que escracha a desigualdade socioambiental e racial na estrutura do país. Quando as escolas municipais e colégios estaduais das zonas mais pobres e periféricas das cidades deixam de receber investimentos do Estado, provocando um sucateamento proposital na educação pública dessas localidades, isso é racismo ambiental. Basta observarmos a diferença de tratamento destinado às escolas públicas situadas em áreas mais nobres. O mesmo vale para hospitais e outros serviços públicos que funcionam melhor em regiões onde o IPTU é mais alto. Quantas ruas sem asfalto temos na Zona Leste de São Paulo e quantas temos em Alphaville? Quantos postes sem lâmpadas temos em Nova Iguaçu e quantos temos em Ipanema? Quantos aterros sanitários ou indústrias poluentes temos em São Conrado e quantos tempos em Queimados? Como a Polícia trata os moradores dos jardins e como ela trata os moradores da periferia?


Enquanto deveriam estar preocupados com o número de desabrigados em função das fortes chuvas, muitos estão preocupados em questionar a existência do racismo ambiental na sociedade ou classificá-lo como mais uma forma de vitimismo identitário. Precisamos debater certas questões de modo mais sério, abrindo mão da infantilidade ideológica que a quinta série deixou em nossa capacidade de interpretar textos e respeitando os fatos que estão bem diante dos nossos olhos. A injustiça ambiental no Brasil tem cor e a opressão e exploração do capital tem um alvo bem definido. É importante demarcar essa questão para que não caiamos no mito da democracia racial (e também ambiental) que visa esconder a natureza do racismo produzido no país. É preciso também falar do processo de gentrificação de alguns bairros e localidades urbanas, de onde as populações pretas e indígenas são retiradas para que o branqueamento da área a torne mais valorizada. O racismo ambiental é mais uma maldita herança do colonialismo nesse país estruturalmente racista.

terça-feira, 9 de janeiro de 2024

NÃO PODEMOS PERDER A ESPERANÇA.

 

A razão moderna se mostrou irracional ao construir o princípio de autodescrição. As próprias religiões, fontes naturais de sentido, participam da crise de nosso paradigma civilizacional e, em muitas delas, vige o fundamentalismo violento.

Em que se agarrar.? O espírito humano recusa o absurdo e sempre busca um sentido que torne a vida apetecida. Resta-nos um único sustentáculo: a esperança. Ela é como uma árvore: ela se verga mas não se quebra. Como nos foi mostrado antropologicamente, a esperança é mais que uma virtude ao lado das outras. Ela representa, independentemente do espaço e do tempo histórico, aquele motor interior que sem cessar nos faz projetar sonhos de dias melhores, utopias viáveis, caminhos ainda não andados que podem significar uma saída para um outro tipo de mundo.

É atribuída a Santo Agostinho, o maior gênio intelectual e cristão do Ocidente, africano do século V da era cristã, a seguinte afirmação que nos poderá, eventualmente, alentar:


Todo ser humano é habitado por três virtudes: a fé, o amor e a esperança. Diz o sábio: se perdemos a fé nem por isso morremos. Se fracassamos no amor, sempre podemos arranjar outro. O que não podemos é perder a esperança. Pois a alternativa à esperança é o suicídio por absoluta falta de sentido de viver.

Entretanto, a esperança possui duas formosas irmãs: a indignação e a coragem. Pela indignação rejeitamos tudo o que nos parece mau e perverso. Pela coragem, empenhamos todas as nossas forças para mudar  o que é ruim em bom e o que é perverso em benéfico.

Não temos outra alternativa senão nos enamorarmos destas duas formosas irmãs da esperança:  indignarmo-nos  e rejeitar firmemente esse tipo de mundo que impõe tantos sofrimentos à Mãe Terra a todos da humanidade e da natureza Se não podemos superá-lo pelo menos resistir a ele desmascarar sua desumanidade. E ter a coragem de abrir caminhos, sofrer pelo parto de algo novo e alternativo. E crer que a vida tem sentido e a ela cabe escrever a última página de nossa peregrinação por esta Terra.

Pense nisso enquanto de digo até o próximo texto.