quinta-feira, 31 de julho de 2014

"O UNIVERSO É UM RELÓGIO..."

Um senhor, cabelos brancos, aproximadamente 70 anos, viajava de trem, com um livro na mão. Um jovem universitário, ao seu lado, sem cerimônia, interrompeu a leitura. E questionou: o senhor ainda acredita neste livro, cheio de crendices e fábulas? O senhor respondeu: é a Bíblia Sagrada, estou lendo o Evangelho de Marcos. Trata-se da Palavra de Deus. Estou errado? Claro que está, é algo completamente superado. A ciência sepultou a religião, Deus é uma teoria inútil e abandonada.
E continuou o jovem universitário: o senhor deveria estudar história e alguma coisa de ciência. A Revolução Francesa, há mais de 100 anos, mostrou a miopia da religião. Somente pessoas sem cultura ainda acreditam em Deus. E do alto de sua pretensa sabedoria, o jovem continuou: a Bíblia, por exemplo, diz que Deus criou o mundo em seis dias, coisa ridícula! Nossos cientistas têm a palavra final, a luz da ciência expulsou as trevas da ignorância e das crendices religiosas.
O universitário desculpou-se por não poder continuar a lição: vou descer na próxima parada, mas gostaria que me deixasse seu endereço e eu enviarei, com urgência, amplo material sobre o assunto. O senhor procurou no bolso um cartão e o entregou ao jovem, que o leu e ficou vermelho de vergonha. O cartão dizia: “Louis Pasteur - Diretor Geral do Instituto de Pesquisas Científicas da Universidade da França”.
O fato é verídico, aconteceu em 1892, e figura na biografia do grande cientista francês. De resto, Pasteur tinha uma certeza, que proclamava aos alunos: “A pouca ciência afasta de Deus, mas, a muita (ciência) nos aproxima dele”.
A fé é uma graça e não depende da sabedoria humana. A Igreja venera pessoas simples, ignorantes até, mas que brilharam intensamente, mas venera também gênios da sabedoria humana que tiveram uma fé profunda. Homens de fé marcaram profundamente a história humana. São Francisco de Assis foi escolhido como a maior figura do segundo milênio. A galeria dos homens e mulheres de fé é muito grande: Dante Alighieri, Teresa de Calcutá, Martin Luther King, Cristóvão Colombo, Tomás de Aquino, Guglielmo Marconi,Catarina de Sena, Gabriela Mistral e tantos outros.
O mito de que a ciência aposentaria Deus, como inútil, ruiu fragorosamente. Nunca a humanidade sentiu tanto a necessidade de Deus quanto hoje. A religiosidade, possivelmente, seja a maior de todas as megatendências deste início do Terceiro Milênio.
Ciência e fé caminham juntas. Max Planck, o grande físico alemão, dizia: para o crente Deus está no começo, para o físico Deus está no ponto de chegada de suas reflexões. E Werner von Braun, físico alemão-norte americano, o pai dos satélites artificiais, garantia: ciência e religião são irmãs. E continuava: a cada descoberta científica nos assombramos diante dos esplendores da Criação. Até o insuspeito Voltaire precisou admitir: “O universo é um relógio, não posso admitir a existência de um relógio sem que haja o relojoeiro”.

terça-feira, 29 de julho de 2014

O PRINCIPIO DA SIMPLICIDADE.

Há padrões de vida que valem para todos os tempos. Há caminhos, leis, maneiras de viver que correspondem às leis da natureza humana, às leis do corpo, da mente e do espírito. Leis e normas que desde os primeiros seres humanos, que viveram há muitos milhares de anos, nortearam a vida de todos. Outros seres humanos, que pertencerão ao futuro, daqui a muitos milhares de anos, seguirão leis e normas, nas mesmas exigências das pessoas do momento presente. Há princípios que são válidos para todos os tempos. Desde o nascer até o morrer. Nascer e morrer já é uma lei que nunca muda. Assim é o comer e o beber, o dormir e o descansar, o procriar e o conviver, o buscar a felicidade, o prazer, a alegria e a realização. Mas, além desses, há princípios vivenciais que ajudam a realizar os grandes princípios da realização humana.
O princípio da simplicidade. O complicado desagrada a todos. A simplicidade faz com que a criatura humana - nós portanto, - tome o caminho do viver com o necessário, sem se embrenhar no complicado caminho do acúmulo materialista. Faz com que tome o caminho do vestir com simplicidade, sem escravizar-se com o prisioneiro caminho da moda, das roupas apertadas e incômodas. Faz com que tome o caminho da alimentação natural e sadia, deixando de lado o mortífero caminho das comidas gostosas e envenenadas. Faz com que trabalhe para viver e não viva para trabalhar, pois a vida é muito mais do que a prisão de uma profissão ou de um trabalho que a torna cega perante o lucro a qualquer preço. O princípio da simplicidade nos faz viver como pessoas livres, donas de si, comandantes da vida e do destino.
O princípio da sobriedade. Ser sóbrio é ser sábio. A sobriedade faz com que todas as pessoas vivam com o necessário para viver bem. Assim todos teriam possibilidade de vida digna. Não haveria acúmulo de bens. A sobriedade faz com que todos se alimentem com o alimento necessário. Não haveria nem famintos e nem doentes por comerem demais. A sobriedade faz com que todos tenham água e bebida suficientes. Não haveria beberrões e nem pessoas sedentas. O princípio da sobriedade perpassa o vestir, o trabalhar, o divertir-se e todas as atividades humanas. É o equilíbrio da vida.
O princípio da austeridade. Austera não é a pessoa séria e que escolhe o sacrifício como modo de vida. A pessoa austera vive a sabedoria de não gastar mais do que ganha, de não comer mais do que o corpo necessita, de não beber além do que o corpo chama, de não entregar-se ao prazer pelo simples prazer, que produz depois o sofrimento. Ser austero consigo mesmo é assumir a responsabilidade dos próprios atos. É saber que cada minuto da vida é importante, e que não pode ser jogado fora, porque pode ser o minuto decisivo. A vida certa é resultado de pequenos princípios que decidem uma grande vida.

segunda-feira, 28 de julho de 2014

JÁ OUVIU FALAR EM REBIMBOCA DA BERIBELINHA?

Ganha um doce quem souber o que significa rebimboca da beribelinha.
Enguiçado numa esquina, o carro de um amigo viu-se socorrido por uma oficina ambulante instalada numa kombi. O mecânico levantou o capô, fez ares de entendido, mexeu daqui, fuçou dali e, peremptório, pronunciou o diagnóstico: “Precisa trocar a rebimboca da beribelinha”. “Quanto custa isto?”, indagou o motorista. “É uma peça rara e cara, mas por cem reais troco para o senhor.”
Feito o acordo, o rapaz enfiou a cabeça no motor e, ferramentas em mãos, iniciou a cirurgia mecânica. Findo o serviço, cinco minutos depois, o carro ligou e o motorista pagou. No dia seguinte, por precaução gaúcha, levou o veículo na oficina da concessionária. Só então soube que não existe rebimboca da beribelinha; o enguiço ocorrera porque soltara o cabo da bateria.
Ora, todos sabemos que existe sim rebimboca da beribelinha. É essa capacidade de certas pessoas explicarem o inexplicável: a defesa de políticos corruptos (basta comparar renda e patrimônio para se tornarem eticamente indefensáveis); a revogabilidade do irrevogável; o ex-presidente ao negar conhecer um jovem apadrinhado por ele; o senador que recorre a notas frias de frigoríficos (com perdão da redundância) para justificar sua dinheirama; a anistia a torturadores que jamais foram punidos; o famoso inquérito de trinta dias para apurar acidentes; o sumiço de drogas apreendidas pela polícia; as propaladas vantagens dos alimentos transgênicos; os anúncios de pedofilia virtual que usam crianças como iscas de consumo; a responsabilidade social de empresas que degradam o ambiente inteiro; os pregadores religiosos insensíveis à miséria circundante; o elegante contrabando de lojas de grifes etc, etc.
Rebimboca da beribelinha é a capacidade de falar sem dizer nada; prometer sem cumprir; governar sem administrar; sorrir sem estar alegre; enfim, roubar o porco e, surpreendido, sair gritando de olho no ombro: “Tira esse bicho daí! Tira esse bicho daí!”
Hoje em dia a rebimboca da beribelinha faz muito sucesso na TV. Tanto que mantém hipnotizados, dia a dia, durante horas, milhões de telespectadores que, além de umas tantas informações dos telejornais, nenhum proveito tiram para ampliar sua cultura, tornar mais crítica sua consciência ou aprofundar sua vida espiritual.
Todos nós temos enguiços na vida, dificuldades, desafios, enfim, peças a serem trocadas e decisões a serem tomadas para saber em que rumo prosseguir. Muitos, acovardados frente aos momentos críticos, apelam para a rebimboca da beribelinha. Reclamam da vida, da realidade, da política do país, do estado atual do mundo, mas nada fazem para mudar esse estado de coisas. Ficam no queixume, alugando os ouvidos de quem está ao lado, destilando ira pela vida fora, à espera de quê? Ora, é evidente, à espera de quem surja e lhes ofereça a rebimboca da beribelinha.
O maior acervo de rebimboca da beribelinha são os arquivos dos parlamentos, nos quais se conservam os discursos de vereadores, deputados e senadores. Quanta empáfia, quanto palavrório, para tão pouco resultado e proveito!
A internet não fica atrás, sobretudo a quantidade de textos, supostamente assinados por autores famosos, que circulam: pura rebimboca da beribelinha. Nada acrescentam à nossa douta ignorância. Enquanto isso, o mundo, lá fora, arde em chamas: guerras, terrorismo, bases usamericanas na Colômbia, gripe suína, narcotráfico, desmatamento da Amazônia, crianças-mendigas improvisadas em acrobatas nas vias dessinalizadas da vida...
Se confissão auricular ainda fosse obrigatória na Igreja, não seria nada mal sugerir ao penitente, em seu exame de consciência, avaliar o quanto seus atos e pensamentos, intenções e palavras, estão repletos de rebimboca da beribelinha.
Deixo a sugestão de se instituir, em clubes e condomínios, empresas e repartições públicas, grupos de amigos e associações, o prêmio anual Rebimboca da Beribelinha. A ser dado a quem, como o meu amigo do carro enguiçado, acredita no primeiro que lhe entuba pelos ouvidos lé com cré.

domingo, 27 de julho de 2014

AS PESSOAS É QUE MUDAM O MUNDO.

Como sublinha Bartolomeu Campos de Queiros, tudo que existe - esta publicação, o computador, a cadeira em que me sento, o cômodo no qual me encontro - foi fantasia na mente humana antes de se tornar realidade. Daí a força da literatura de ficção. Também ela foi fantasia na mente do autor e remete o leitor a uma realidade onírica que lhe possibilita encarar a vida com outros olhos. A fantasia impulsiona todos os nossos gestos, atitudes e opções.
A ficção funciona como um espelho que faz o leitor transcender a situação em que se encontra. O texto desvela o contexto e impregna o leitor de pretextos, de motivações que o enlevam, aquele entusiasmo de que falavam os gregos antigos, estar possuído de deuses, de energias anímicas que nos devolvem ao melhor de nós mesmos.
Toda ficção, narrativa ou poética, é descobrimento, revelação. Somos múltiplos e, ao ler, uma de nossas identidades emerge por força do encantamento suscitado pela quintessência da obra ficcional: a estética.
A literatura ficcional não tem que ser de esquerda ou de direita. Tem que ser bela. Fazer da ficção um palanque de causas é aprisioná-la numa camisa de força, transformando-a num espelho que não reflete o leitor, reflete o autor e seu proselitismo. A ficção não tem de ser engajada, o escritor sim tem o dever ético de se comprometer com a defesa dos direitos humanos neste mundo tão conflitivo e desigual.
O prólogo do evangelho de João, um dos textos mais poéticos da Bíblia, só comparável ao Cântico dos Cânticos, diz que “o Verbo se fez carne”. Na arte literária a carne - a criatividade do autor - se faz verbo. Instaura a palavra, que organiza o caos.
No Gênesis, Javé cria o Universo pelo poder da palavra. Ele se faz palavra, manifestação que nos remete, como na obra ficcional, à transcendência (o autor sobrepassa a cotidianeidade ou lhe imprime novo caráter), à transparência (o texto reflete o que está contido nas entrelinhas), a profundência (a narrativa ou o poema nos convida a algo mais profundo do que percebemos na superfície da realidade).
Ler ficção é uma experiência estática - estar em si e fora de si. Somos alçados ao imaginário, induzidos à experiência da catarse, de modo a oxigenar a nossa psiquê. A estética nos imprime um novo modo de encarar as coisas. Como lembra Mário Benedetti, a literatura não muda o mundo, mas sim as pessoas. E as pessoas mudam o mundo.
A estética literária nos envia ao não dito, à esfera do desejo, suscitando-nos sonhos, projetos, utopias, do encontro com o príncipe encantado (Branca de Neve) ao reencontro amoroso com a opressiva figura do pai (A metamorfose, de Kafka, e Lavoura arcaica, de Raduan Nassar). Como assinala Aristóteles, a poética completa o que falta à natureza e à vida. A arte não se satisfaz com o estado factual do ser. Convida-nos à diferença, à dessemelhança, ao tornar-se.
Suscitar em crianças e jovens o hábito da leitura é livrá-los da vida rasa, superficial, fútil, e educá-los no diálogo frequente com personagens, relatos e símbolos (a poesia) que haverão de dilatar neles a virtude da alteridade, de uma relação mais humana consigo mesmo, com o próximo, com a natureza e, quiçá, com Deus.

sexta-feira, 25 de julho de 2014

AQUELE QUE SERVE, É O MAIS SÁBIO DE TODOS.

Enriquecido pela experiência dos anos, um velho barqueiro transportava eventuais passageiros, de um lado para outro de um rio, largo e caudaloso. Numa das viagens transportou um advogado e uma professora. Acostumado a falar muito, o advogado perguntou ao barqueiro se ele conhecia as leis. E diante da negativa, afirmou: que pena, você perdeu metade da vida.
A professora, não querendo ficar para trás, quis saber se o barqueiro sabia ler e escrever, se conhecia história e geografia. Mais uma vez o barqueiro disse que nunca frequentara qualquer escola. Nesse caso, comentou a professora, está perdendo a metade da vida. Nisto veio uma onda maior e o barco foi lançado num redemoinho. Foi a vez do barqueiro perguntar, aflito: vocês sabem nadar? Ambos, apavorados, disseram que não. Neste caso, avisou o velho barqueiro, vocês estão correndo o risco de perder toda a vida. Porém, nadando com bravura, ele conseguiu salvar os dois de morrerem afogados.
São muitas as versões desta história antiga, mas a conclusão é sempre a mesma. O saudoso Paulo Freire dizia: “Não há saber maior ou menor; há saberes diferentes”. Cada um tem seu saber. E a vida é a maior de todas as universidades para quem quiser aprender.
Dezenas de diplomas não tornam ninguém sábio. Existe uma sabedoria que nasce do coração. Aquele que serve é o mais sábio de todos. O saber é importante, mas precisa ser direcionado. São Francisco de Assis permitiu que seus frades estudassem, não para dominar, mas para servir. “Saber mais para amar mais”, completava o santo.
Jesus foi excelente orador, mas nada deixou escrito. Ele falava em parábolas para que todos pudessem entender. Mais: evitava as sinagogas, dominadas pelos doutores e mestres da lei. Ele preferia os caminhos onde doutrinava as pessoas simples, falando dos lírios, dos trigais, dos pássaros, do pastor que procura a ovelha, do fermento que acaba por contagiar toda a massa.
Vivemos hoje a Sociedade do Saber. O poder concentra-se nas mãos daqueles que mais sabem e muitas vezes usam em proveito próprio o conhecimento. O saber é importante, mas o serviço é muito maior. Há doutores formados em universidades, há iluminados pela escola da vida. E o Evangelho garante: Deus revela sua sabedoria aos pequenos e humildes e a esconde dos orgulhosos. E a história guarda com encanto e admiração homens e mulheres simples, numa certa ótica ignorantes, e deixa de lado sábios e autossuficientes. E a fé, o dom mais precioso, não brota dos livros, mas do coração visitado por Deus.

quinta-feira, 24 de julho de 2014

A IMUNIDADE CONTRA UM MUNDO DE CORRUPÇÃO.

Nossa vida são nossos relacionamentos. É muito antigo o dito da sabedoria popular que diz: “Diga-me com quem andas e dir-te-ei quem és”. A Bíblia é a grande professora, e no livro do Eclesiástico vai ensinando: “Não abandones o velho amigo... Não sinta prazer em estar com os violentos... Afasta-te do homem que tem o poder de matar... Evita a companhia do falador... Viva com os sábios e prudentes... Quanto possível, desconfia de quem se aproxima de ti...”
Fruta sadia no meio de podres se estraga. Geralmente é assim que acontece. Podem existir exceções. A convivência com ladrões torna a pessoa ladra. Nossa sociedade está se tornando uma escola de ladrões. Engana-se com a maior facilidade. A convivência com corruptos vai corrompendo o coração. A política está sendo para o povo brasileiro uma dessas escolas. A convivência com doentes facilmente torna a pessoa doente. A peste pesteia. O vírus da morte vai penetrando o corpo.
Temos o direito de escolher um ambiente sadio. Que todos, ao despertar para um novo dia, possam rezar: “Senhor, livra-me da companhia dos maus e dos mentirosos. Livra-me das pessoas amargas”. Quem não conhece casos de rapazes e meninas que em casa eram de vida ideal, gente fina, nada a reclamar, e que, ligando-se a uma turminha da pesada, se tornaram insuportáveis no ambiente familiar? É a família que não presta? Não! É o novo ambiente escolhido. E quantas pessoas, especialmente jovens, se lançam como num rio em correnteza sem saber nadar, em ondas de mar violento sem saber se defender. Não se pode culpar essa gente indefesa, porque os leões que engolem os indefesos são de garras muito fortes e dentes que tudo devoram. São os adultos e os grupos dos meios de comunicação somados aos grupos do poder econômico, que fazem das pessoas máquinas de produção e de consumo. Especialmente a criança e o jovem se tornaram o seu alvo.
É preciso criar imunidade. Isso desde o ventre da mãe. Isso desde o colo, criando ao redor um clima que favoreça a vida, e que não permita uma invasão na mente e no coração de tantas futilidades que não ajudam a viver sadiamente. A imunidade surge de ambientes sadios de convivência. Imagens bonitas. Mensagens positivas. Clima de vida ameno, sem brigas e sem frieza. Que chovam mentiras, corrupção, enganos, indiferença, amargura, fofoca... tudo isso não importa se a gente consegue criar imunidade contra todo esse ambiente poluído e com cheiro de morte.
Somos nossos relacionamentos. Pessoas alegres e positivas. Pessoas bondosas e generosas. Pessoas de fé e de esperança. Pessoas de trabalho e de lazer. Pessoas de convivência fácil e confiável. Pessoas que se tornam um estímulo de vida. É nesse ambiente que a árvore, que se chama pessoa humana, cresce, se desenvolve e se fortifica.

quarta-feira, 23 de julho de 2014

A HISTÓRIA CRIA UM IMAGINÁRIO E ALIMENTA A CRIATIVIDADE.

Sempre houve contadores de histórias. Os contadores de histórias fascinam as plateias. Dentro de cada história há uma lição de vida. As histórias são conteúdos já experimentados. São experiências que passam de geração em geração. Em nosso momento atual estamos esquecendo de contar histórias. Nosso argumento é que não temos tempo. Também é um fator. Mas, mais do que não ter tempo, a máquina da atividade, somada à pressa da vida, impede de sermos criativos e contadores de histórias. Preferimos comunicar o conteúdo numa frase sem vida e desencarnada. Falamos com conceitos e perdemos o encanto das histórias.
Pai e mãe contando mais histórias. Toda criança gosta de histórias. Aprende através de histórias. A história cria um imaginário, alimenta a criatividade e, acima de tudo, dá uma lição de vida. Os pais devem voltar a contar histórias. O argumento da “falta de tempo” não pode ser tomado em conta. Se a criança não merece tempo agora, então os pais não deveriam ter tido tempo para fazer essa criança. Muitos pais não sabem contar histórias. Não têm jeito, ou não escutam e nem leem histórias. É preciso ler e reler histórias para contá-las, criá-las, recriá-las e passá-las adiante. Ler e ler para não ficar só com histórias do “bicho-papão e do boitatá”. Os pais contadores de histórias encantam os filhos e com mais facilidade os educam, porque em cada história se pode passar uma lição de valores e de pessoas que venceram, que foram boas e fizeram coisas bonitas.
Professores contando mais histórias. É sabido que professor que não sabe passar o conteúdo em histórias é um professor chato. Cansa. Enjoa. Os palestrantes que ficam somente falando de conteúdo e de conceitos cansam. Quando iniciam uma história ou um fato, os olhos novamente se voltam para eles e a plateia fica muito mais atenta. Nas salas de aula devem voltar os professores contadores de histórias. Passar conteúdos através de histórias para que a escola se torne mais simpática e os conteúdos mais fáceis de serem assimilados.
O maior contador de histórias. O mundo é uma história. Esta terra é uma história. Cada criatura é uma história. Cada animal é uma história. Muito mais, cada pessoa humana. Cada pessoa é uma história viva, e tendo vivido bem, pode passar sua história para frente. Mas houve uma pessoa que foi o maior contador de histórias: Jesus Cristo. É só ler os evangelhos. Tudo é ensinado em histórias, ou parábolas. Seu ensinamento foi todo com histórias que davam a lição de como é o Reino dos Céus, de como é a vida em Deus. Muitas vezes ele começa: “O Reino dos Céus é como...” e lá vai uma história, no fim da qual Ele faz a conclusão ou deixa cada pessoa fazer sua conclusão. Ele sabia que as crianças gostam de histórias e nós somos crianças muito frágeis diante da vida e de Deus. Os pais devem ler e reler muitas vezes os evangelhos para contar essas histórias do mestre e professor Jesus para seus filhos.

terça-feira, 22 de julho de 2014

O HUMANO NAO SE PERDEU.

Nunca soube que existisse um Dia do Filósofo. Descobri agora. Segundo o calendário de que no dia 16 de agosto festejam-se aqueles e aquelas que escolheram em suas vidas amar a sabedoria. Sim, pois é isso que, no grego, significa a palavra filosofia. Amor pela sabedoria.
A origem da palavra está na Antiga Grécia, berço da civilização ocidental, onde, em meio à riquíssima mitologia que povoava o panteão de deuses e deusas, alguns começaram a perguntar-se: Quem sou eu? De onde vim e para onde vou? Qual a origem do mundo?
Interpretada comumente como o marco do fim da era do mythos, com o apogeu do logos e da razão, a filosofia, na verdade, desde o início conjugou ambos. Suas origens se encontram em uma interpretação dessacralizada dos mitos cosmogônicos, difundidos pelas diversas religiões. Para os que desejariam uma filosofia completamente “vacinada” contra o mito, aí está uma pedra de tropeço intransponível.
Segundo Aristóteles e Platão, a matéria inicial da reflexão dos filósofos foram os mitos. Estes se tornaram campo comum da reflexão da religião e da filosofia, revelando que a pretensa separação entre esses dois modos de o ser humano interpretar a realidade não é tão nítida como aparentemente se julga.
Nem só razão nem só mitologia, diz a amiga sabedoria que já desde o tempo de Tales de Mileto, 5.000 anos antes de Cristo, nos ensina que o mundo está cheio de deuses. E Platão viria a ser aquele que encontrou a raiz de seus mais belos pensamentos pela meditação dos mitos. Para a filosofia antiga, portanto, o mito dá o que pensar, provoca a razão e a faz produzir sabedoria. A meditação e a interpretação dos mitos serão, então, o que conduzirá o filósofo em sua busca da verdade.
Pois disso se ocupa o filosofar: buscar a verdade. Não poderia haver sabedoria se não houvesse verdade. O bom e o belo são outros nomes da verdade. Verdade que não se rende ao pensamento humano com a evidência laboratorialmente controlada do empirismo, mas vai desvelando seus segredos com o exercício espiritual da busca atenta e amante da filosofia. A filosofia acaba por ser, assim, a porta de entrada para pensar o mistério.
Ao pensar os mitos, o filósofo toca na universalidade das intuições e das experiências ancestrais, referindo a sua pertença comum e originária ao gênero humano. Por isso, os mitos são lugar privilegiado do enraizamento das pessoas e dos povos, conectando-os a seu passado. Tornam-se assim o fundamento da cultura humanista. Contemplando com atenção o mito, o filósofo vai se aproximando da raiz das recorrências humanas, o que lhe permitirá então tocar nas essências, elaborar definições, construir sínteses, montar harmoniosas arquiteturas de conhecimento.
No início, a filosofia se auto compreendia como responsável por tudo que era cognoscivel e, portanto, passível de ser conhecido. Sob sua égide repousava o conhecimento humano em todas as suas especialidades, e até hoje a ela devem sua origem enquanto campos do pensar e do saber: os valores - a ética; a beleza - a estética; a busca da verdade - a lógica.
O tempo passou, o mundo mudou e a filosofia também. Fragmentou-se em muitas especialidades e muitos genitivos. No entanto, ainda é um marco de oposição ao desenraizamento e à atomização da sociedade moderna, alienada justamente porque perdeu o contato com o passado, permanecendo degenerada na busca e fixação em ídolos.
Enquanto houver filósofos apaixonados pela verdade e amigos da sabedoria, podemos ter esperança em que o que constitui o humano não se perdeu. Por isso, é digno e justo saudar e louvar aqueles que hoje continuam cultivando essa amizade e esse amor, impedindo nossa desumanização.

segunda-feira, 21 de julho de 2014

PROVEITOS POLÍTIICOS.

“Até quando, ó Catilina, abusarás da nossa paciência?”, indagou Marco Túlio Cícero ao senador Lúcio Sérgio Catilina, a 8 de novembro de 63 a.C., em Roma. Flagrado em atitudes criminosas, Catilina se recusa a renunciar ao mandato.
Cícero, orador emérito, respeitado por sua conduta ética na política e na vida pessoal, pôs em sua boca a indignação popular: “Por quanto tempo ainda há de zombar de nós essa tua loucura? A que extremos se há de precipitar a tua audácia sem freio? Nem a guarda do Palatino, nem a ronda noturna da cidade, nem os temores do povo, nem a afluência de todos os homens de bem, nem este local tão bem protegido para reunião do Senado, nem o olhar e o aspecto destes senadores, nada disto conseguiu perturbar-te? Não sentes que os teus planos estão à vista de todos?”
“Ó tempos, ó costumes!”, exclamou Cícero movido por atormentada perplexidade diante da insensibilidade do acusado. “Que há, pois, ó Catilina, que ainda agora possas esperar, se nem a noite, com suas trevas, pode manter ocultos os teus criminosos conluios; nem uma casa particular pode conter, com suas paredes, os segredos da tua conspiração; se tudo vem à luz do dia, se tudo irrompe em público?”.
Jurista, Cícero se esforçou para que Catilina admitisse os seus graves erros: “É tempo, acredita-me, de mudares essas disposições; desiste das chacinas e dos incêndios. Estás apanhado por todos os lados. Todos os teus planos são para nós mais claros que a luz do dia.”
Se Catilina permanecia no Senado, não era apenas a vontade própria que o sustentava, mas sobretudo a cumplicidade dos que teriam a perder, com a renúncia dele, proveitos políticos. Daí a exclamação de Cícero: “Em que país do mundo estamos nós, afinal? Que governo é o nosso?”
Cícero não temia ameaças e expressava o que lhe ditava o decoro: “Já não podes conviver por mais tempo conosco; não o suporto, não o tolero, não o consinto. (…) Que nódoa de escândalos familiares não foi gravada a fogo na tua vida? Que ignomínia de vida particular não anda ligada à tua reputação? (…) Refiro-me a fatos que dizem respeito, não à infâmia pessoal dos teus vícios, não à tua penúria doméstica e à tua má fama, mas sim aos superiores interesses do Estado e à vida e segurança de todos nós.”
Os crimes de Catilina escancaravam-se à nação. Seus próprios pares o evitavam, como assinalou Cícero: “E agora, que vida é esta que levas? Desejo neste momento falar-te de modo que se veja que não sou movido pelo rancor, que eu te deveria ter, mas por uma compaixão que tu em nada mereces. Entraste há pouco neste Senado. Quem, dentre esta tão vasta assembleia, dentre todos os teus amigos e parentes, te saudou? Se isto, desde que há memória dos homens, a ninguém aconteceu, ainda esperas que te insultem com palavras, quando te encontras esmagado pela pesadíssima condenação do silêncio?”
Catilina fingia não se dar conta da gravidade da situação. Fazia ouvidos moucos, jurava inocência, agarrava-se doentiamente a seu mandato. “Se os meus escravos me temessem da maneira que todos os teus concidadãos te receiam” - bradou Cícero -, “eu, por Hércules, sentir-me-ia compelido a deixar a minha casa; e tu, a esta cidade, não pensas que é teu dever abandoná-la? E se eu me visse, ainda que injustamente, tão gravemente suspeito e detestado pelos meus concidadãos, preferiria ficar privado da sua vista a ser alvo do olhar hostil de toda a gente; e tu, apesar de reconheceres, pela consciência que tens dos teus crimes, que é justo e de há muito merecido o ódio que todos nutrem por ti, estás a hesitar em fugir da vista e da presença de todos aqueles a quem tu atinges na alma e no coração?”
Cícero não demonstrava esperança de que seu libelo fosse ouvido: “Mas de que servem as minhas palavras? A ti, como pode alguma coisa fazer-te dobrar? Tu, como poderás algum dia corrigir-te?” E não poupou os políticos que, apesar de tudo, apoiavam Catilina: “Há, todavia, nesta Ordem de senadores, alguns que, ou não veem aquilo que nos ameaça, ou fingem ignorar aquilo que veem.”
Acuado, Catilina se refugiou na Etrúria e morreu em 62 a.C. Cícero, afastado do Senado por Júlio César, foi assassinado em 43 a.C. Um século depois, Calígula, desgostoso com o Senado, nomearia senador seu cavalo Incitatus, com direito a 18 assessores, um colar de pedras preciosas, mantas de cor púrpura e uma estátua, em tamanho real, de mármore com pedestal em marfim.

domingo, 20 de julho de 2014

O AEROPORTO DE AÉCIO E O COMPORTAMENTO DA MÍDIA.

Algumas pessoas estão eufóricas com a informação, divulgada hoje pela Folha, de que na gestão de Aécio foi construído um aeroporto com dinheiro do contribuinte numa propriedade de um tio dele. 
14 milhões de reais foram gastos na obra, segundo a Folha. 
A euforia que me chama a atenção não é a dos petistas. Esta é previsível, dadas as circunstâncias. 
É a de pessoas para as quais o furo da Folha é a prova definitiva de que a mídia não favorece o PSDB e nem, muito menos, se esmera nas denúncias contra o PT.

Cada um fique com sua crença, mas quem acredita nisso – na demonstração de neutralidade apartidária por conta do aeroporto denunciado – acredita em tudo, conforme disse Wellington.

Observe.

Primeiro, entra aí uma espécie de cota da Folha de notícias negativas para o PSDB. Assim como tem uma cota de colunistas de pensamento independente – para cada Janio de Freitas há vários Magnollis – a Folha tem também uma para notícias.

Faz parte do esforço em manter de pé o slogan com o qual ela conquistou, no passado, a liderança entre os jornais: aquele que afirma que a Folha não tem rabo preso com ninguém.

Muito mais por razões de marketing do que propriamente por razões jornalísticas, a Folha é entre as publicações das grandes companhias jornalísticas a que mais parece se preocupar com a imagem de imparcialidade.

É por isso que, de vez em quando, você vai ler lá coisas como o aeroporto de Minas. É uma característica da Folha, e só da Folha.

Saia da árvores e analise a floresta.

A grande diferença entre uma denúncia contra o PT e uma denúncia contra o PSDB está na repercussão dada pelas demais empresas de jornalismo.

Num caso, quando a vítima das acusações é o PSDB, o assunto vai morrendo, à falta de interesse de jornais e revistas. No outro, quando contra o muro está o PT, são manchetes incessantes, e desdobramentos se multiplicam.

Compare a cobertura dada, algum tempo atrás, à Petrobras, depois da compra de uma refinaria em Pasadena, com o noticiário relativo ao escândalo das propinas do metrô de São Paulo.

O episódio que melhor mostra a distinção no tratamento de temas assemelhados diz respeito à compra de votos no Congresso para que fosse aprovada a emenda que permitia a reeleição de FHC.

Como agora, a denúncia partiu da Folha.

Como o Jornal Nacional, por exemplo, repercutiu a compra? Nos últimos anos, o JN se habituou a pegar denúncias anti-PT da Veja e, na edição de sábado, dá-las com extremo alarido.

Eram amplificados assim, com o mesmo expediente, ataques ao governo petista. O espaço dado pelo JN às acusações levava depois, durante a semana, o resto da mídia – jornais, sobretudo – a se engajar na exploração dos “furos” da Veja.

Este comportamento padrão, repetido metodicamente ao longo de tanto tempo, acabou minando a credibilidade da grande mídia perante a parcela mais esclarecida do público – e não apenas entre petistas.

Alguns detalhes mudaram: a radicalização progressiva da Veja levou os editores do Jornal Nacional a tomarem mais cuidado com o noticiário da revista. Acabou a repetição mecânica.

Mas o processo, em si, continua o mesmo. Notícia ruim contra o PT é, para a mídia, notícia boa. Notícia ruim contra o PSDB é, para a mídia, notícia ruim.

O aeroporto de Aécio, por tudo isso, rapidamente vai sumir do noticiário da mídia nesta semana.

Não porque o assunto não seja importante, mas pelas preferências ideológicas e partidárias das grandes empresas de jornalismo, para as quais notícia é algo definitivamente subjetivo.

QUANDO NÃO SE CONSEGUE DAR ALGUM NEXO.

Não é culpa deles ou delas, mas há uma inteira geração de adolescentes e adultos que não consegue escrever três sentenças sem cometer, no mínimo, cinco erros de concordância. Fiz essa observação a redação de alguns alunos alunos  que, em menos de dois anos, serão formados.
Sentem-se limitados ao escrever, ao usar expressões idiomáticas, ao situar o verbo no singular ou no plural, ao usar substantivos e adjetivos. Transcrevo aqui uma frase, tirada de um aluno de filosofia. Mas eis um pouco do que esse futuro professor disse, ao falar do tema “A Família no Brasil de hoje”.
“Não quero me estender sobre um assunto já tão tratado na tal de mídia e nas igrejas, mas digo que o arquetípico familiar hoje não mais se sustenta, principalmente em se considerando-nos também nós, filhos de uma pequena minoria de poucos que ainda mantêm laços de fidelidade doméstica, mas que nem sempre apreciamos por causa do poder do capitalismo que corrói os laços humanos e pessoais”...
Redações ainda mais sem nexo são divulgadas na mídia. Com professores bem remunerados e com tempo para corrigir as provas e com um sistema educacional que não exigisse o impossível do professor não aconteceria essa chocante constatação.
Na redação de uma coluna de 2.220 toques, com a tolerância para apenas 15 erros de concordância, pontuação e acentuação, cerca de 75% dos alunos de curso superior não passariam. A escola da qual vieram não lhes ensinou a pensar. Em algum momento de nossa história mais recente, alguém neste país achou que o profissional não precisa pensar nem escrever direito e assassinou a língua portuguesa, a filosofia e a arte de raciocinar. Juntar palavras, eles juntam. O que não conseguem é dar-lhes algum nexo.

sexta-feira, 18 de julho de 2014

É PRECISO LIBERTAR-SE DA ESCRAVIDÃO DO CONSUMISMO.

O povo se queixa de que não tem dinheiro. E não tem. Mas não despertou para a ditadura do celular consumista. São quatro pessoas na família possuindo três celulares. Não têm direito de reclamar a falta de dinheiro. A família se queixa que não há dinheiro que chega, que o salário é pouco, que a crise é grande. São quatro pessoas na família. Duas meninas. Vão ao instituto de beleza. Pintam o cabelo. Compram bijuterias. Fazem maquiagem. Inutilidades. Escravidão do consumismo.
Inversão de necessidades. Pode-se e deve-se viver somente com o necessário. Os pais vão ao supermercado ou à loja com as crianças. Criam necessidades. O que os olhos veem o coração começa a desejar. Para satisfazer os desejos das crianças compra-se supérfluos. E o dinheiro para as necessidades se torna pequeno. Salário pequeno e injusto? Não é verdade. Apenas inversão de necessidades. Sentada na mesa da cozinha a família conversa sobre o necessário e o supérfluo. Metade das compras fica dispensada. O necessário é pouco.
Criação de inutilidades. A cada cinco segundos há no mundo uma criança morrendo de fome. Dados da ONU. E a sociedade se tornou desumana e tão cachorril que a cada segundo há um cachorro sendo levado ao pet shop. Trata-se, pinta-se, faz-se as unhas, perfuma-se cachorros. Compra-se alimentos mais caros do que os adquiridos para as crianças. A cada segundo uma criança é engolida pelo consumismo, viciando-se em exigir dos pais o tênis que viu nos comerciais da televisão, a roupa que não precisa e o alimento que não alimenta. E nesse mesmo tempo de segundo uma criança chora ou fica doente por não ter o necessário para uma vida digna. A cada segundo de tempo há um pai que coloca a mão no bolso e não encontra o dinheiro para o necessário da vida, mas não é capaz de deixar de comprar seu cigarro, sua cerveja, seu cafezinho. Nesse segundo em que vivemos há uma mãe que não tem o necessário para colocar na panela para a refeição da família, mas não tem a força para recusar a compra do produto de beleza que a vendedora apresentou como necessário.
É preciso rir de si. O varredor de rua deve rir de si porque não tem um calçado digno nos pés, mas anda de celular pendurado no cinto. O adolescente deve rir de si, percebendo que deixa de comprar um livro escolar, mas não deixa de beber sua cervejinha ou refrigerante ou de jogar seu videogame.
Consciência do necessário. Só falta isso. No dia em que as pessoas despertarem para o necessário, e se contarem com ele, não faltará dinheiro em casa e sobrará para ajudar os pobres, as comunidades e até para viajar mais em tempo de férias. Libertar-se da ditadura do consumismo é dizer não a tudo o que é invenção dos grupos de interesse, que criam necessidades e enganam o povo com promessas de felicidade e de prazer.

quinta-feira, 17 de julho de 2014

É PRECISO ESCUTAR A NATUREZA.

O mosteiro erguia-se numa região isolada, ao sopé de uma montanha. O ar puro, as árvores, flores, riachos e o silêncio convidavam à oração Numa noite, o irmão Policarpo se encontrava em oração. Apesar do esforço não conseguia se concentrar, atrapalhado pelo coaxar de uma rã. Vendo que seus esforços eram inúteis, o irmão foi à janela e gritou: Silêncio! Eu estou rezando! E como o irmão era um santo, sua ordem foi imediatamente obedecida. Não só a rã, mas todos os seres vivos calaram suas vozes a fim de que o silêncio pudesse favorecer sua oração.
Um silêncio opressivo reinou em toda a parte. Mas outro som inesperado veio então perturbar o monge. Era uma voz interior que lhe dizia: talvez Deus goste do coaxar da rã como da tua recitação de salmos... Espantado, o religioso começou a pensar: o que pode haver de tão maravilhoso na voz da rã que possa agradar a Deus? E a vozinha interior continuou: por que razão achas tu que Deus inventou o som? Fez-se uma luz interior e o irmão foi, novamente, até a janela e gritou: Canta! E o coaxar rítmico da rã tornou a encher o espaço e com ela todas as outras rãs e todos os outros animais e insetos. E a noite encheu-se de uma música divina.
Algumas vezes tentamos rezar a Deus fora ou à margem do mundo em que vivemos. Isso significa enclausurar-se no silêncio e na solidão. Não é assim. Toda a criação canta os louvores ao Senhor e não podemos fazer coisa melhor do que associar-nos a ela. “Todo o ser que respira louva ao Senhor” lembra o salmo 150.
Os mestres de espiritualidade costumavam dizer: ante de entrar na Igreja, deixa tuas preocupações atrás da porta. Parece mais lógico pedir ao fiel: reze em cima das tuas preocupações.
Na realidade, rezar consiste mais em escutar do que em falar. Escutar a natureza, escutar a Palavra de Deus, escutar os gemidos dos que estão sofrendo. O que precisamos é deixar-nos guiar pelo Espírito, que brada dentro de nós, chamando a Deus de Pai. Jesus foi o pregador dos caminhos e suas parábolas estão cheias do cotidiano. Ele fala dos pássaros dos céus e dos lírios do campo, da rede cheia de peixes, dos trigais maduros, dos figos, do fermento...
Discípulo apaixonado do Mestre, Francisco de Assis via no mundo o seu templo, onde percebia, nitidamente, a voz de Deus. E por isso ele cantava junto com a irmã cigarra, com a irmã rã, com o irmão vento. Não podemos pensar que Deus apenas reside no templo. É nas frestas do cotidiano que mais facilmente O encontramos. Rezar não é apenas falar a Deus. Precisamos escutar o salmo da criação. Precisamos - sobretudo - escutá-lo. Isso significa unir fé e vida. Isso significa unir o domingo à semana, unir a prece ao cotidiano.

terça-feira, 15 de julho de 2014

COMEÇOU A CAMPANHA POLÍTICA. OLHO NO CANDIDATO.

Por injustiça social, o sociólogo, advogado e bem-aventurado padre Leão Dehon, que escreveu meditações e livros sobre justiça e misericórdia, entendia a injustiça estrutural; leis que perpetuavam a pobreza, o salário injusto e a exploração dos pobres. Era errado, mas havia interesse em deixar tudo como estava.
Um dia escreveu que se a injustiça social não é pecado, então não se fale de nenhum outro pecado. Achar que só existem pecados pessoais, que só os indivíduos pecam e negar que uma nação tenha escolhido o pecado é ignorar os ensinamentos da Bíblia e negar Jesus.
Um povo que elege um frio assassino; que vota em candidato que anuncia que, se chegar ao poder vai matar; em alguém que promete dar mais dinheiro aos ricos e menos aos enfermos e aposentados; em alguém que jura que vai investir em armas, está optando pela injustiça social. Um povo que apoia leis que favorecem os que tem mais, vota pela injustiça social. Se um povo escolhe esse caminho, peca.
No evangelho de Mateus, Jesus deixa claro o que é um pecado social e o que salva uma alma. Salva-se quem ajuda os que não conseguem sair de algum sofrimento. Quem o causa ou ignora, peca. Quem ajuda, irá para o céu.
Um povo inteiro pode ser culpado de prolongar o sofrimento dos seus pobres, das crianças e dos enfermos. Se aceitarem leis injustas e candidatos errados todos pecam.

segunda-feira, 14 de julho de 2014

A SOCIEDADE ATUAL ESTÁ DOENTE.

Nem tudo o que tem aparência de música é música. Barulho não é música e música não é barulho. Música é linguagem de comunicação que se faz através da combinação de sons. Sons que nascem dos sentimentos e emoções. A música expressa a situação emocional, psicológica e espiritual da sociedade em seu momento. A sociedade atual está doente. Há muita confusão e medo em seu interior. Há insegurança e incapacidade de suportar-se. É o medo de si mesmo que se reflete em cada ser humano. E a música expressa esse momento de não suportar-se. Busca-se uma fuga. Uma música feito música, música que se torna canal de escutar-se, torna-se muito perigosa. Ela facilita o interiorizar-se. E sentir-se, conhecer-se se torna muito perigoso e doloroso. É mais fácil abafar as emoções doentias com o barulho, que impede de escutar-se e sentir-se como se está.
As bandas de música são confusas. São especialistas em produzir sons. Os instrumentos perdem a individualidade. Não comunicam e impedem a comunicação. Enquanto uma banda executa sua música é proibido falar. É impossível a comunicação. O que importa é a intensidade do som. É a concorrência entre bandas para ver quem consegue mais volume. São os carros que nas ruas disputam o espaço maior para mostrar seu som. Pela aparência somos uma sociedade de surdos, ou uma indústria de surdos. Já está se tornando obrigatório o exame de audição na admissão ao emprego nas empresas. Parece que esse tema não é poesia. É realidade que machuca muita gente. Escutar uma banda, especialmente uma banda de rock, é encaminhar-se para a surdez e para a insensibilidade do belo e do artístico. A arte não conta. Conta a música consumista que exige que seja assim.
Ser orquestra é ser identidade. O universo é orquestra. Cada astro é um instrumento afinadíssimo que executa sua música em harmonia com todos os outros. E o universo é música, tão música, que se torna silêncio. O silêncio é o máximo da música. Provoca escutar-se. Escutar a música que vem de dentro. Escutar uma orquestra, ser um instrumento numa orquestra, é ser individualidade. É permitir que cada instrumento execute sua música. Todos são escutados. Não há confusão. Não há disputa de volume. É a harmonia. É o respeito de um pelo outro em sua maneira de ser. Assim é a orquestra social. É permitir que cada ser humano se expresse em sua individualidade, se expresse como um ser único e irrepetivel.
Construindo uma orquestra. Todos nesta tarefa. Tarefa para tornar a sociedade uma orquestra de músicos e executores de música. Cada um na sua tonalidade e especialidade. Fazer da música social um ambiente de comunicação e de arte. Música comunicação e não confusão. Música onde a sociedade possa escutar-se em suas dores e alegrias, anseios e desejos de infinito, pois a música é a expressão do infinito que nasce em cada pessoa.

sexta-feira, 11 de julho de 2014

VALORES...O QUE SÃO VALORES?

Um homem caminhava num parque quando um objeto brilhante chamou sua atenção. Deu uma olhada, sem se abaixar, e decidiu: deve ser um pedaço de vidro. E seguiu adiante. Mais tarde, outro caminhante passou pelo mesmo lugar, percebeu o brilho e agiu de maneira diferente. Abaixou-se pegou a pedra, um pouco suja, e viu que era talhada como um diamante. Sua dúvida foi esclarecida, pouco depois, com um joalheiro. Depois de examiná-la com cuidado, esclareceu: trata-se realmente de um diamante de grande valor e com lapidação especial.
Ao longo da vida de cada um aparecem luzes de brilho diferente. Aí surge a avaliação. Há os que desprezam o diamante imaginando ser um imprestável pedaço de vidro. Há também os que recolhem pedaços de vidro e imaginam que sejam diamantes. Verdadeiros diamantes são ignorados e peças sem valor fazem o encanto de muitos.
Cada pessoa, ao longo da vida, organiza sua escala de valores. Coloca no topo aquele que julga ser o valor maior. E a vida das pessoas transcorre de conformidade com os valores escolhidos, verdadeiros ou falsos. Há os que se dão conta ao longo do tempo da fragilidade da escolha. Outros vão com suas escolhas erradas até o fim. É bastante comum colocar a bandeira do clube preferido sobre o caixão. Valerá a pena colocar num time de futebol a razão de uma vida? Na Bíblia lemos o episódio de Esaú que vendeu seu direito à primogenitura por um prato de lentilhas. No período das descobertas, os navegadores europeus ofereciam aos índios espelhos e outras miçangas em troca de ouro puro.
Algumas vezes, nossa escala de valores é dúbia. Temos uma escala ideal, racional, aquela que colocamos no papel quando nos interrogam. E existe a outra escala, a do realismo. É a escala prática, segundo a qual fazemos nossas escolhas diárias. No fim da vida seremos julgados não pela escala ideal, mas pela escala que determinou nossas escolhas.
No ponto mais alto de nossa escala de valores deve estar nosso ideal. É a referência para todos os atos de nossa vida. Pode ser o dinheiro, a vaidade, o prazer, pode ser um clube de futebol, pode ser a família... São Paulo lembra que podemos construir nossa vida com ouro, prata, pedras preciosas, madeira, feno e palha. Paulo insiste num ponto: o único fundamento - o valor maior - só pode ser Jesus Cristo.
Na vida é sempre possível recomeçar. A cada dia podemos reavaliar nossa escala de valores, jogar fora os brilhantes cacos de vidro e procurar os diamantes esquecidos. Depois, a morte tornará definitivas nossas escolhas, boas ou más.

quarta-feira, 9 de julho de 2014

PODEM VOLTAR AS DITADURAS?

Todos os ditadores - de Hitler a Médici, de Batista a Stalin, de Franco a Somoza - passam à história como figuras execráveis, cujos nomes, estigmatizados, se associam às vitimas de seus governos tirânicos. Aliás, Tirano era o comandante da guarda do rei Herodes. Seu nome tornou-se sinônimo de crueldade por se atribuir a ele a execução da ordem real de decapitar, em Belém, todos os bebês, entre os quais estaria Jesus se José e Maria não tivessem fugido com ele para o Egito.
A América Latina carrega em sua história longos períodos de supressão do regime democrático. No século XX, o Brasil conheceu dois: sob o governo Vargas (1937-1945) e sob o regime militar (1964-1985), sem falar dos que governaram sob Estado de Sítio. O paradoxo é que todas as ditaduras latino-americanas foram suscitadas, financiadas e armadas pelo governo dos EUA. Fala-se que nos EUA nunca houve golpe de Estado porque não há, em Washington, embaixada americana...
O recente golpe em Honduras, que resultou na deposição do presidente Zelaya, democrática e constitucionalmente eleito, coloca o governo Obama frente à hora da verdade. Ao receber a notícia, Hillary Clinton, secretária de Estado, vacilou. Talvez tivesse manifestado apoio aos golpistas se o presidente Obama não houvesse reagido em defesa de Zelaya. Ainda assim, os EUA não suspenderam ajuda financeira e militar às Forças Armadas hondurenhas, que sustentam o ditador de plantão.
A política externa da Casa Branca trafega sobre o fio da navalha. Sabe que Zelaya está mais próximo de Chávez que dos falcões usamericanos que ainda comandam a CIA. Esta agência não foi devidamente saneada por Obama. E, agora, tenta justificar o golpe sob o pretexto, infundado, de que o presidente da Venezuela estaria prestes a remeter comandos militares a Honduras para derrubar os golpistas e devolver o mandato ao presidente Zelaya.
A América Latina conheceu significativos avanços políticos nas últimas duas décadas. Após destronar as ditaduras militares e rechaçar presidentes neoliberais - Collor no Brasil, Menem na Argentina, Fujimori no Peru, Caldera na Venezuela - demonstra preferência eleitoral por candidatos oriundos de movimentos sociais, dispostos a disputar o espaço das esferas de poder com os tradicionais grupos oligárquicos.
É verdade que o uso do cachimbo entorta a boca. Alguns mandatários, em nome da governabilidade, não têm escrúpulos em fazer concessões a velhos caciques políticos notoriamente corruptos, representantes de feudos eleitorais marcados pela mais extrema pobreza.
Quando um líder político de origem progressista se deixa cooptar pela oligarquia conservadora o que está em jogo, de fato, não é a propalada governabilidade. É a empregabilidade. Perder eleição significa o desemprego de milhares de correligionários que ocupam a máquina do Estado. Seria, para muitos, atroz sofrimento perder o cargo e, com ele, as mordomias materiais e simbólicas.
Todos sabemos que, hoje, no centro da vida política se sobressai a questão ética. A maioria dos políticos teme a transparência. Por isso, muitos agem por baixo dos panos, promulgam decretos secretos, cumpliciam-se em maracutaias, tratam como de somenos importância o fato de o deputado do castelo usar verba pública em benefício próprio, ou um senador incluir sua árvore genealógica na folha de pagamento custeada pelo contribuinte.
Se não se estancar essa deletéria convivência e conivência de lideranças outrora progressistas com velhos e corruptos caciques, não se evitarão a descrença na democracia, a deterioração das instituições políticas, a perda do senso histórico na administração pública. O que constitui excelente caldo de cultura para favorecer o retorno de ditadores salvadores da pátria.

segunda-feira, 7 de julho de 2014

VITIMA DA FALTA DE LIMITES.


Um problema que se constata nos jovens de hoje: A FALTA DE LIMITES.
Michael Jackson foi mais uma das vítimas da falta de limites e margens da mídia. No palco, foi poderoso. Profissionalíssimo, era um perfeccionista. Não havia erros. Nas finanças e na mídia, imbatível, até o dia em que começaram a lhe cobrar o preço de sua não conformidade com seja lá o crime de que o acusam. A Justiça diz não ter achado provas. Forte na arte, na vida era de uma fragilidade que dava dó.
Quando morreu, supostamente de overdose de remédios, tinha dominado, como nenhum outro astro jamais o fizera, as técnicas da mídia. Daqui a 20 anos, ele ainda soará inovador e criativo. Ninguém melhor do que ele conjugou o sonoro com o visual. O menino punido pelo pai, pressionado até à exaustão para ser perfeito, tornou-se um dos maiores artistas de toda a história.
Cantor e dançarino de vastos recursos, ele mudou a mensagem do corpo e recriou a dança popular. Mereceu o título de artista pop. Mercadejou e mercantilizou bem. Fez o mundo dançar. Encarnou a festa do corpo e do som. Dominava os passos, o som e os ritmos, mas parecia não ter domínio sobre sua corporeidade: não se aceitava, embora usasse o corpo de maneira esplêndida. Mexeu com ele e com o corpo de bilhões de pessoas, mas acabou, também, mexendo demais no próprio corpo.
Tanto interferiu que o deformou. Na época do botox e do silicone, sirva de exemplo o que se deu com ele. Mas é conselho que o desespero pela estética, mais do que a busca da ética, não será seguido. Não importam as consequências. Quem persegue o corpo perfeito acabará injetando substâncias químicas nele. O preço? Pagam o que for preciso para, por alguns anos, desfilarem como reis e rainhas da era da estética. Michael disse que tinha motivos. Respeitemos sua angústia, mas lembremos aos que acham ter motivos que, mais cedo ou mais tarde, o corpo reage.
De Jackson se pode afirmar que, se soube atuar com o corpo, não soube situar-se com ele. Festejou a vida, mas não soube vivê-la. Quis dela mais do que a vida pode dar. Era controvertido. Processado, tido como inocente, às vezes visto como monstro, julgado à revelia pela mídia que antes o exaltara, inocentado, explorado, perdeu parte de sua enorme fortuna para resolver seus gigantescos problemas.

domingo, 6 de julho de 2014

DEUS É A MINHA DROGA.

Quando Deus ocupa todo o espaço do coração não há lugar para mais nada. Fala-se muito, nos últimos tempos, de drogas pesadas, que desgraçam e devastam a vida de milhões de pessoas. Na experiência humana sentimos que Deus é a única droga que satisfaz o coração. Deus é meu crack. Envolvimento total. Espaço preenchido, sem lugar para mais nada.
O crack de Deus me envolve. Sinto-me envolvido pelo crack da beleza. Onde está a beleza, ali, está a presença de Deus. No espaço da beleza está a casa de Deus. Deus é beleza. Ele é o grande pintor e escultor. Nele nada se repete. Nele estão todas as cores. É o arco-íris perfeito. No coração que sabe contemplar e sentir a beleza não há lugar para uma droga qualquer. Falo de Deus beleza como uma facilidade para deixar-se envolver. Quem não gosta da beleza?
Sinto-me envolvido pelo crack do relacionamento. Tudo é ligação. Deus é relacionamento. O universo é relacionamento. Todos os seres que habitam a terra vivem de relacionamento. Os seres humanos se suicidam quando não conseguem viver o relacionamento. Suicidam-se no trabalho escravo, no materialismo, no alcoolismo e nas drogas, no cigarro e no prazer sexual sem limites, na corrida do dia-a-dia, nos tranquilizantes e em tantos outros anestésicos que vão sufocando a semente do viver. Deus é relacionamento. O universo é relacionamento. O objetivo da vida é ser e crescer no relacionamento. Céu é relacionamento que começa aqui e agora.
Ninguém substitui o Deus-crack. Pode-se fazer do crack-droga um deus para si, onde se é capaz de perder tudo para possuí-la, onde se é capaz até de matar para dar sobrevivência ao vício e às satisfações efêmeras e vazias. A história tem lições claras e trágicas. Quando o coração é vazio de Deus, tenta-se de muitas maneiras preenchê-lo. Mas esse vazio tem dono insubstituível. Nem os holofotes da fama, nem o pódio dos vencedores, nem as passarelas das famosas e famosos, endeusados pela mídia, nem a ganância do poder econômico, político e religioso podem preencher.
Nossa sociedade vive de campanhas erradas quanto à questão das drogas. Criam-se campanhas de policiamento, instalam-se câmeras vigias em todas as partes, utiliza-se a repressão, que acabam levando a nada. Tempo e dinheiro gasto por nada. É preciso chegar na fonte. Dar água viva e pura. Água que se chama amor e família, convivência e respeito, acolhida e doação. Água que se chama despertar em cada criatura a sublime dignidade de ser filha de Deus. Amada de Deus. Querida de Deus. Fica uma pergunta. Como ser essa fonte se as pessoas que propõem essas campanhas também são vazias de Deus? Como ser essa fonte se os podres e as autoridades roubaram e se encheram do poder que somente cabe a Deus?

sexta-feira, 4 de julho de 2014

VAMOS USAR O POUCO DE BOM SENSO QUE AINDA EXISTE

Desde que os seres humanos decidiram viver juntos, estabeleceram um contrato social não escrito pelo qual formularam normas, proibições e propósitos comuns que permitissem uma convivência minimamente pacífica.
Depois surgiram os pensadores que lhe deram um estatuto formal como Locke, Kant e Rousseau. Todos esses contratos históricos têm um defeito: supõem indivíduos nus e acosmicos, sem qualquer ligação com a natureza e a Terra. Os contratos sociais ignoram e silenciam totalmente o contrato natural. Mais ainda, a partir dos pais fundadores da modernidade, Descartes e Bacon, implantou-se a ilusão de que o ser humano está acima e fora da natureza com o propósito de domínio e posse da Terra. Este projeto continua a se realizar mediante a guerra de conquista seguida pela apropriação de todos os recursos e serviços naturais. Atrás sempre fica um rastro de devastação da natureza e de desumanização brutal. Antes se fazia guerra e apropriação de regiões ou povos. Hoje conquistaram-se todos os espaços e se conduz uma guerra total e sem tréguas contra a Terra, seus bens e serviços, explorado-os até a sua exaustão. Ela não tem mais descanso, refúgio ou espaço de recuo.
A agressão é global e a reação da Terra-Gaia está sendo também global. A resposta é o complexo de crises, reunidas no devastador aquecimento global. É a vingança de Gaia.
Não temos outra saída senão reintroduzir consciente e rapidamente o que havíamos deixado para trás: o contrato natural articulado com o contrato social. Trata-se de superar nosso arrogante antropocentrismo e colocar todas as coisas em seu lugar e nós junto delas como parte de um todo.
Que é o contrato natural? É o reconhecimento do ser humano de que ele está inserido na natureza, de quem tudo recebe, que deve comportar-se como filho e filha da Mãe Terra, restituindo-lhe cuidado e proteção para que ela continue a fazer o que desde sempre faz: dar-nos vida e os meios da vida. O contrato natural, como todos os contratos, supõe a reciprocidade. A natureza nos dá tudo o que precisamos e nós, em contrapartida, a respeitamos e reconhecemos seu direito de existir e lhe preservamos a integridade e a vitalidade.
Ao contrato exclusivamente social, devemos agregar agora o contrato natural de reciprocidade e simbiose. Renunciamos a dominar e a possuir e nos irmanamos com todas as coisas. Não as usamos simplesmente, mas, ao usá-las quando precisamos, as contemplamos, admiramos sua beleza e organicidade e cuidamos delas. A natureza é o nosso hospedeiro generoso e nós, seus hóspedes agradecidos. Ao invés de uma trégua nesta guerra sem fim, estabelecemos uma paz perene com a natureza e a Terra.
A crise econômica de 1929 sequer punha em questão a natureza e a Terra. O pressuposto ilusório era de que elas estão sempre aí, disponíveis e com recursos infinitos. Hoje a situação mudou. Já não podemos dar por descontada a Terra com seus bens e serviços. Estes mostraram-se finitos e a capacidade de sua reposição já foi ultrapassada em 40%.
Quando esse fator é trazido ao debate na busca de soluções para a crise atual? Somos dominados por economistas, em sua grande maioria, verdadeiros idiotas especializados - Fachidioten - que não veem senão números, mercados e moedas, esquecendo que comem, bebem, respiram e pisam solos contaminados. Quer dizer, que só podem fazer o que fazem porque estão assentados na natureza que lhes possibilita fazer tudo o que fazem, especialmente, dar razões ao egoísmo e às barbaridades que a atual economia faz prejudicando milhões e milhões de pessoas e que vai minando a base que a sustenta.
Ou restabelecemos a reciprocidade entre natureza e ser humano e rearticulamos o contrato social com o natural ou então aceitamos o risco de sermos eliminados por Gaia. Confio no aprendizado a partir do sofrimento e do uso do pouco bom senso que ainda nos resta.

ONDE FOI MESMO QUE ERRAMOS?

Advogado brilhante, exercia suas funções numa cidade de porte médio, na Bélgica. Sempre gostara de residir no interior e todos os dias fazia o trajeto de 13 quilômetros que separava sua casa da cidade. Certa manhã convidou seu filho, acadêmico de Administração, para irem à cidade. Enquanto o pai cumpriu suas funções na área da justiça, o filho ficou encarregado de levar o carro para uma revisão. A mãe deu-lhe uma lista de pequenas coisas que precisava comprar. Já na cidade, eles combinaram: nos encontraremos, pontualmente, às 17 horas.
Depois de realizar todas as tarefas o jovem foi para o cinema. Distraiu-se tanto que esqueceu da hora. Correu até a oficina e pegou o carro, mas quando chegou ao local eram quase 18 horas. Naturalmente o pai quis saber a causa do atraso. O moço sentiu-se mal e não teve coragem de revelar que fora ao cinema. Explicou que o carro não ficara pronto e teve de esperar. O que ele não sabia é que o pai havia telefonado para a oficina e de lá informaram que a revisão ficara concluída antes da hora.
As palavras, ditas com tranquilidade, calaram fundo no coração do filho: “Algo está errado no modo como o tenho criado e educado, pois você não teve a coragem de me dizer a verdade. Vou refletir o que fiz de errado. Caminharei os 13 quilômetros que separam nossa casa para pensar sobre isso”. E entregou as chaves para o filho, pedindo que levasse o carro para casa. Vestido com suas melhores roupas, terno e gravata, calçados elegantes, começou a caminhar pela estrada de terra, sem iluminação. O rapaz não teve coragem de deixar o pai sozinho. Conduziu o carro por mais de cinco horas, atrás dele, vendo-o sofrer por causa de uma mentira idiota.
A tentação da desculpa, a tentação de atribuir aos outros a culpa, vem desde o Jardim Terreal. Adão acusou Eva; Eva responsabilizou a serpente. No dia a dia, são infinitas as tentativas de fugir à responsabilidade. Os outros são culpados. Na linguagem popular se garante que as vitórias têm inúmeros pais, mas as derrotas são órfãs. Concretamente, na educação dos filhos é fácil achar responsáveis: a televisão, a escola, as más companhias... Ou mesmo culpar a outra parte. É muito comum a mãe - ou o pai - acusar: veja o que o teu filho fez! Ou no máximo apelam para o plural: Onde foi que nós erramos?
O descaminho de um filho nem sempre é culpa dos pais. Tanto é verdade que surgem as chamadas ovelhas negras, destoando dos irmãos. Nossos erros sempre vêm num contexto muito grande, sendo por vezes difícil indicar a origem. O importante é assumir nossa responsabilidade, por tudo o que fizemos ou deixamos de fazer. Por vezes, substituímos o pronome pessoal “eu” por um vago “a gente”... O Evangelho nos pede para assumir nossas atitudes, pois só a verdade nos fará, novamente, livres.

quarta-feira, 2 de julho de 2014

DEUS NÃO FALA LATIM.

O homem e a mulher são os únicos seres vivos que se contrapõem à natureza. Os demais, das abelhas arquitetas aos macacos africanos que ordenam seus recursos de sobrevivência, são todos determinados pela natureza. Esse distanciamento humano frente ao mundo natural faz a realidade revestir-se de simbolismo e produz a emergência transcendental do imaginário.
Do interesse pelo fogo produzido pelo relâmpago nasce o conhecimento que desperta a consciência. Voltada sobre si mesma, a consciência humana sabe que sabe, enquanto os animais sabem, mas ignoram a reflexão. Através do símbolo e do significado, o ser humano se relaciona com a natureza, consigo mesmo, com os semelhantes e com Deus.
Nasce a cultura, o toque humano que faz do natural, arte. A vida social ganha contornos definidos e explicações categóricas. Do domínio das forças arbitrárias da natureza chega-se às armas que permitem a imposição de um grupo cultural sobre o outro. Porém, cultura é identidade e, portanto, resistência. Mesmo assim, a absolutização de sistemas ideológicos oferece o paraíso, induzindo o dominado a sentir-se excluído por não pensar pela cabeça alheia.
No Brasil colônia, os métodos de catequese cristã introduziam entre os indígenas o vírus da desagregação e, hoje, os donos dos garimpos, das madeireiras e o governo perguntam perplexos por que os povos indígenas necessitam de tanta terra se nada produzem.
A queda dos governos dos países socialistas do Leste europeu assinala não o fim do socialismo, como propaga a mídia capitalista, mas sim da absolutização de sistemas ideológicos. Desabam, com a herança estalinista, todas as estratégias de hegemonização da cultura, e a própria ideia de “evolução cultural”. Não há culturas superiores, há culturas distintas. Agonizam as versões totalizadoras em todos os terrenos da produção de sentido - político, econômico e religioso.
Quem pretender ignorar os sinais dos tempos terá de apelar ao autoritarismo para infundir temor. Sabemos agora que mesmo na América Latina não há uma cultura única, mas uma multiplicidade de culturas - indígena, negra, branca, sincretica - que se explicam por seus próprios fatores internos. Essa polissemia de sistemas de sentido é uma riqueza, embora ameace o poder daqueles que imaginavam restaurar a uniformização medieval.
Há mais de 500 anos da chegada de Colombo às Américas - uma invasão genocida que alguns chamam de “encontro de culturas” -, convém relembrar esses conceitos antropológicos. E agora a democracia impregna também a cultura. Cada homem e mulher, grupo étnico ou racial, descobre que pode ser produtor do próprio sentido de sua vida. O difícil é respeitar isso como valor, sobretudo nós, cristãos, que ainda não sabemos distinguir Jesus Cristo do arcabouço judaico e greco-romano que o reveste e tanto favorece o eurocentrismo eclesiástico.
Felizmente, o próprio Jesus nos ensina a diferença entre imposição e revelação. Impõe-se pervertendo a natureza do poder (Mateus 23, 1-12). Mas revelação significa “tirar o véu”: ser capaz de captar os fragmentos culturais de cada povo e reconhecer as primícias evangélicas aí contidas, como afirmou o Concílio Vaticano II.
Aliás, Deus não fala latim. Prefere a linguagem do amor e da justiça. E esse dialeto toda cultura incorpora e entende.

terça-feira, 1 de julho de 2014

OS DEFEITOS QUE VEMOS NOS OUTROS, QUASE SEMPRE ESTÃO EM NÓS.

Andando por uma estrada do interior, chão batido, altas horas da noite, o motorista sentiu um balanço no carro. E seus piores temores se confirmaram. Apesar das promessas dos vendedores, o pneu estava arriado. E uma desgraça não costuma vir só: estava sem o macaco. A perspectiva era passar o restante da noite no meio do mato, possibilitando até um assalto. Mas uma luz se fez em seu cérebro. Lembrou de ter visto, a três quilômetros, uma pequena oficina mecânica. Lá, certamente, seria possível conseguir o indispensável macaco Trancou o carro e foi caminhando na noite fria e - menos mal - enluarada. Um pensamento surgiu em sua cabeça. E se o proprietário da oficina se aproveitar da situação e quiser cobrar pelo serviço? O macaco era necessário e ele pagaria. Quem sabe, imaginou, ele pedirá trinta reais. E se ele pedir cinquenta? Depois de caminhar um quilômetro, em sua imaginação, o preço foi subindo: cinquenta, cem reais... O Brasil está cheio de gente assim, de gananciosos. E se ele pedir 150 reais? É um abuso, mas não tenho alternativa.
Chegando à oficina, bateu com insistência no portão. O proprietário acendeu a luz e surgiu na janela perguntando o que ele precisava. Com raiva o viajante gritou: pois fique com seu maldito macaco, que eu não vou pagar 200 reais pela sua utilização. E deixando o sonolento dono do estabelecimento sem compreender nada, retornou ao seu carro, à espera do clarear do dia.
Um provérbio popular garante: dize-me o que criticas e dir-te-ei o que és. O Evangelho esclarece: “O olho é a lâmpada do corpo. Se o olho for são, todo o corpo será luminoso” (Mc 6,22). É ainda o Evangelho que recomenda tirar a trave do próprio olho antes de querer tirar o cisco do olho do irmão. Um personagem do livro Os Noivos, de Alessandro Manzoni, garante: tudo é puro para aquele que é puro! Vale a alternativa contrária.
Existe a tentação de atribuir aos outros nossos defeitos. Passamos até por cima dos fatos e imaginamos as intenções. O egoísta está sempre vendo egoísmos nos outros, o invejoso vê inveja em toda a parte. E não faz caso da advertência : não julgueis e não sereis julgados.
O homem sereno e equilibrado verá qualidades nos outros. E quando o erro fica evidente, mesmo assim, encontra desculpas e atenuantes. Os defeitos que percebemos nos outros estão, quase sempre, em nós. Esta é a tendência comum. A maturidade pede que avaliemos as razões profundas, as raízes, dos nossos sentimentos e reações. É deselegante atribuir aos outros os nossos defeitos.