terça-feira, 17 de setembro de 2013

NÃO TENHO VALOR NENHUM

Depois de ter lido o livro Vendedor de Sonhos e depois de me habituar a ler o romance da vida do dia-a-dia, romance da sociedade moderna, envolvida pelo sonho de produção e de consumo, percebi que nessa sociedade não tenho valor. Sou um marginalizado. Não tenho vez e nem voz. Sou sobra. Ou tenho que me contentar em ser espectador dessa sociedade enganadora, que vive de aparências, onde o ser-pessoa pouco importa; o que importa são os títulos e as posses.
Não tenho conta bancária. Nem cartão de crédito. Nem faço declaração de imposto de renda. Sou lascado mesmo. Quando necessito fazer um documento é isso que me pedem. Não tem valor meu documento de identidade. Meu nome, meu pai e minha mãe, nada dizem. Quer dizer, eu como pessoa, filho de um homem e de uma mulher, não tenho valor. O que conta é ser produto de uma profissão bem remunerada. É ter conta bancária. É declarar os bens que se tem. É dizer “tenho casa, tenho carro, tenho propriedades, minha profissão é tal”. O sistema escravizante e coisificante me reduz a um número e a uma máquina de produção. Porém, teimo em me fazer valer como pessoa, como criatura humana.
Não uso roupa de grife. Nem tênis de marca. Não sou produto da coca-cola. Nem da cervejinha. Nem sou escravo das prateleiras dos supermercados. Sou mais do chão. Dos frutos da terra. O que nasce da mãe terra é vida. O que cai das prateleiras dos supermercados tem cheiro de morte. Não paro diante de vitrines. Sei que criam desejos e criar desejos é tornar-se escravo deles. Os desejos são a fonte da infelicidade. Para muita gente, entre o desejo e a realização, se abre um abismo. O abismo no coração do homem se chama insatisfação.
Não entro em shoppings. Não preciso. Shoppings têm tudo o que não precisamos. Satisfazem os olhos, mas não o coração. Satisfazem os desejos e massacram o bolso. Aos domingos, o shopping se tornou templo e igreja dos corações vazios. Esvaziam-se os templos de Deus e do coração e passeia-se pelos templos da ilusão. Para nossa sorte, continuam ali na esquina os mercadinhos, onde a gente encontra sal e açúcar, feijão e arroz. Não existe isso nos shoppings. São um lugar de tudo e de nada. Lugares cheios de coisas e vazios de vida. Vamos ao mercado da esquina! Ali tem gente para conversar. E tem tudo o que se precisa para a vida.
É preciso escolher a vida. Essa escolha deve perpassar todas as coisas e toda a atividade humana. Aquilo que favorece a vida deve ser escolhido. Aqui entra em jogo a renúncia. Saber renunciar o que prejudica a vida. Dizer não àquilo que os comerciais dizem sim. Ser dono de si mesmo. Comandar-se. Usar do discernimento. Ter em mãos critérios que me ajudam a escolher. Acima de tudo, escolher-me como pessoa humana que tem identidade, mesmo despido de tudo o que a sociedade valoriza e impõe.

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