sexta-feira, 10 de maio de 2013

O PAPA FRANCISCO E A TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO.


Muitos se têm perguntado se, por vir da América Latina, Papa Francisco é adepto da teologia da libertação. O importante não é ser da teologia da libertação, mas da libertação dos oprimidos, dos pobres e injustiçados. E isso ele o é com indubitável claridade.
Este, na verdade, sempre foi o propósito da teologia da libertação. Primeiramente vem a libertação concreta da fome, da miséria, da degradação moral e da ruptura com Deus. Depois, em segundo lugar, vem a reflexão sobre este dado real: em que medida aí se realiza antecipatoriamente o Reino de Deus e de que forma o cristianismo, com o capital espiritual herdado de Jesus, pode colaborar, junto com outros grupos humanitários, nesta libertação necessária. 
Esta reflexão posterior, chamada de teologia, pode existir ou não. O decisivo é que o fato da libertação real ocorra. Mas sempre haverá espíritos atentos que ouvirão o grito do oprimido e da Terra devastada e que se perguntarão: com aquilo que aprendemos de Jesus, dos Apóstolos e da doutrina cristã de tantos séculos, como podemos dar a nossa contribuição ao processo de libertação? Foi o que realizou toda uma geração de cristãos, de cardeais a leigos e leigas, a partir dos anos 60 do século passado. E continua, pois os pobres não cessam de crescer e seu grito já se transformou num clamor.
Ora, o Papa Francisco fez esta opção pelos pobres, viveu e vive pobremente em solidariedade a eles e o disse claramente numa de suas primeiras intervenções: “Como gostaria uma Igreja pobre para os pobres”. Neste sentido, o Papa Francisco está realizando a intuição primordial da Teologia da Libertação e secundando sua marca registrada: a opção preferencial pelos pobres, contra a pobreza e a favor da vida e da justiça.
Esta opção não é para ele apenas discurso, mas opção de vida e de espiritualidade. Por causa dos pobres, tem se indisposto com a presidenta Cristina Kirchner, pois cobrou de seu governo mais empenho político para a superação dos problemas sociais que, analiticamente, se chamam desigualdades; eticamente, representam injustiças; e teologicamente constituem um pecado social que afeta diretamente ao Deus vivo - que biblicamente mostrou estar sempre do lado dos que menos vida tem e são injustiçados. 
Em 1990 havia na Argentina 4% de pobres. Hoje, são 30%. Para uma pessoa sensível e espiritual como o Papa Francisco, tal fato representa uma via-sacra de sofrimentos, lágrimas de crianças famintas e desespero de pais desempregados. Isso faz-me lembrar uma frase de Dostoiewski: “Todo o progresso do mundo não vale o choro de uma criança faminta.”
Esta pobreza, tem insistido com firmeza o Papa, não se supera pela filantropia mas por políticas públicas para que devolvam dignidade aos oprimidos e os tornem cidadãos autônomos e participativos. Não importa que o Papa não use a expressão “teologia da libertação”. Importa é que ele fala e age na forma de libertação.
É até bom que o Papa não se filie a nenhum tipo de teologia. Seus dois antecessores assumiram certo tipo de teologia e se apresentavam como expressões do magistério papal.
Sabem os historiadores que a categoria “magistério” atribuída aos Papas é uma criação recente. Começou a ser empregada pelos Papas Gregório XVI (1765-1846) e Pio X (1835-1914) e se fez comum com Pio XII (1876-1958). Antes “magistério” era constituído pelos doutores em teologia e não pelos bispos e pelo Papa. Estes são mestres da fé. Os teólogos são mestres da inteligência da fé. Portanto, aos bispos e Papas não cabia fazer teologia: mas testemunhar oficialmente e garantir zelosamente a fé crista. Aos teólogos e teólogas cabia e cabe aprofundar este testemunho com os instrumentos intelectuais oferecidos pela cultura em presença. Quando Papas se põem a fazer teologia, não se sabe se falam como Papas ou como teólogos. Cria-se grande confusão na Igreja; perde-se a liberdade de investigação e o diálogo com os vários saberes.
Graças a Deus que o Papa Francisco explicitamente se apresenta como Pastor e não como doutor e teólogo. Assim é mais livre para falar a partir do evangelho, de sua inteligência emocional e espiritual, com o coração aberto e sensível, em sintonia com o mundo hoje planetizado.

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