Após quinhentos anos, nos damos conta de que ambos os infinitos são ilusórios. A
Terra é pequena e finita. O progresso tocou nos limites da Terra. Não há como
ultrapassá-los. Começou o tempo do mundo finito. Não respeitar esta finitude
implica tolher a capacidade de reprodução da vida na Terra e pôr em risco a
sobrevivência da espécie. Cumpriu-se o tempo histórico do capitalismo. Levá-lo
avante acabará por destruir a sociabilidade e o futuro.
O mais grave é que o
capitalismo/individualismo introduziu duas lógicas que se conflitam: a dos
interesses privados dos “eus” e das empresas e a dos interesses coletivos do
“nós” e da sociedade. Teremos alguma saída? Com apenas reformas e regulações,
mantendo o sistema, como querem os neokeynesianos à la Stiglitz, Krugman e
outros entre nós, não. Temos que mudar se quisermos nos salvar.
Para tal,
antes de mais nada, importa construir um novo acordo entre a razão objetiva e a
subjetiva. Para o novo acordo, urge resgatar a razão sensível e cordial para se
compor com a razão instrumental. Aquela se ancora do cérebro límbico, surgido há
mais de duzentos milhões de anos, quando, com os mamíferos, irrompeu o afeto, a
paixão, o cuidado, o amor e o mundo dos valores. Ela nos permite fazer uma
leitura emocional e valorativa dos dados científicos da razão instrumental. Esta
emergiu no cérebro neocortex há apenas 5 a 7 milhões de anos. A razão sensível
nos desperta o reencantamento e o cuidado pela vida e pela mãe-Terra.
Em
seguida, se impõe uma nova centralidade: não mais o interesse privado mas o
interesse comum. Depois a economia precisa voltar a ser aquilo que é de sua
natureza: garantir as condições da vida física, cultural e espiritual de todas
as pessoas. Em continuidade, a política deverá se construir sobre uma democracia
sem fim, cotidiana e inclusiva para que todos sejam sujeitos da história e não
meros assistentes ou beneficiários. Por fim, um novo mundo não terá rosto humano
se não se reger por valores ético-espirituais compartidos, na base da
contribuição das muitas culturas, junto com a tradição judaico-cristã.
Todos
esses passos possuem muito de utópico. Mas sem a utopia afundaríamos no pântano
dos interesses privados e corporativos. Felizmente, por todas as partes repontam
ensaios, antecipadores do novo, como a economia solidária, a sustentabilidade e
o cuidado vividos como paradigmas de perpetuação e reprodução de tudo o que
existe e vive. Não renunciamos ao ancestral anseio da comensalidade: todos
comendo e bebendo juntos como irmãos e irmãs em casa.
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