quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

COMO DIZ A MÚSICA DE CAETANO VELOSO: O HAITI É AQUI?

Poucos povos no mundo suscitam tanta compaixão como os haitianos. País golpeado por toda sorte de catástrofes aliado a uma extrema pobreza, a meia ilha francófona do Caribe tem sofrido indescritivelmente. Em 2010, toda essa série de desgraças e infortúnios foi sinistramente coroada com o terrível terremoto que ceifou tantas vidas. Entre elas estava a da brasileira ilustre Dra. Zilda Arns.

O Haiti não conseguiu ainda levantar a cabeça depois do terremoto. Desde a catástrofe que arrasou o país e matou mais de 220 mil pessoas, em janeiro de 2010, chegaram vários milhares de haitianos ao Brasil. Falta tudo em seu território e os filhos da terra, em desespero, buscam vida mais humana em outras paragens. Muitos deles e delas aportam no Brasil.
Estima-se em cerca de oito mil o número de haitianos que já cruzaram a fronteira brasileira através de cidades fronteiriças. Pagam às vezes caro aos “coiotes” que os trazem por caminhos escusos e obscuros ao solo brasileiro. No coração e na cabeça, o sonho e a esperança de, enfim, encontrar trabalho, uma vida digna, mais humana, com mais qualidade. Deixaram para trás um país dizimado pelo terremoto. E também o túmulo e a memória dolorosa de parentes mortos na tragédia.
O Brasil emergente povoa suas imaginações e ameaça reeditar em versão “tupiniquim” a conhecida tragédia do “sonho americano”, que em toda a extensão da América Latina tem custado a vida e a liberdade de milhares de migrantes. Mas as ondas que cruzam a fronteira não param. Qualquer coisa é melhor que a fome, que a vida sem perspectivas para a família e os filhos.
O Brasil da Copa do Mundo, das Olimpíadas e da economia aparentemente pujante enche suas cabeças da ilusão de aqui encontrar um mundo de oportunidades.
No entanto, a realidade é bem outra Chegam aqui e não conseguem permanência legal, nem emprego, moradia, ou alimentação. Apenas trocam de calamidade.   Amontoados em abrigos, vão formando com sua presença uma gritante interrogação que faz relembrar a canção de Caetano Veloso: O Haiti é aqui?
Enquanto até 2010 os haitianos cruzavam a fronteira como qualquer turista, a partir de março de 2011 começaram a ser impedidos de fazê-lo. Muitos tiveram que permanecer nas cidades fronteiriças. As autoridades brasileiras passaram a controlar o ingresso e a passagem para a desejada terra.
No dia 10 de janeiro, o governo federal brasileiro anunciou uma série de medidas visando a conter o fluxo do deslocamento de haitianos ao Brasil. Só serão aceitos legalmente os que tiverem visto emitido pela embaixada brasileira em Porto Príncipe. Esta, por sua vez, emitirá apenas 100 vistos de trabalhos ao mês. Só os que estiverem de posse destes vistos poderão aceder ao solo brasileiro. Quem estiver em situação irregular será deportado.
Tampouco se concederá aos haitianos a condição de refugiados políticos. Não é considerada política a razão pela qual deixam seu país e sim de mera vulnerabilidade econômica. A viagem da presidente brasileira ao Haiti, deixa entrever alguma esperança de que este tema venha a ser priorizado.
Provoca imensa tristeza - e vergonha - ver um país como o nosso, que sempre teve atitude favorável à entrada de estrangeiros; que deve, inclusive, a estrangeiros muito de seu desenvolvimento, adotar atitude truculenta para com esse povo tão sofrido.
De que serve um coração se não bate pelo Haiti? - dizia uma canção de Jorge Drexel, composta logo após o terrível terremoto de 2010. E Caetano clamava e convocava: “Pense no Haiti, reze pelo Haiti.” Quando comermos mais de três vezes ao dia, e estivermos dormindo em camas confortáveis, abrigados em casas seguras, cercados por nossos familiares e entes queridos, é bom pensar e rezar pelo Haiti. E mais: pensar e rezar pelo Brasil, para que não entre no caminho de um poder cego e de um capitalismo voraz, que considera indesejáveis seres humanos que buscam seu território para ali trabalhar e viver dignamente. Que o Haiti seja aqui e que o Brasil seja haitiano na acolhida e abertura a esses que vêm saídos da grande tribulação da pobreza e do abandono.

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