A muitos chocou ver Dilma em companhia de Collor e Sarney. Porém, ao observador
mais atento não escapa o alcance do gesto. Trata-se de um preito de fidelidade à
democracia e à liberdade. Mesmo se os que isso representam não são afinados
ideologicamente com seu governo.
Nas mãos da Comissão da Verdade, uma tarefa árdua,
porém bela: mergulhar nos porões dos anos de chumbo, a fim de investigar o
paradeiro dos desaparecidos durante este tempo. Trata-se de expor à luz do dia
aquilo que a sombra e a mentira procuraram esconder. Assim fazendo, a Comissão
poderá prestar um imenso serviço às novas gerações de brasileiros. E poderá,
sobretudo, devolver a paz e a serenidade às famílias e amigos que têm que lidar
constantemente, cotidianamente, com a angústia de uma ausência insepulta.
Explicitando os objetivos da Comissão, a presidente afirmou: “O grupo deve
esclarecer casos de torturas, mortes, desaparecimentos forçados, ocultação de
cadáveres.” Radiografar o movimento que colocou o país sob o regime do terror e
do medo, iluminar todos os processos que se encontram escondidos nas sombras da
ambiguidade e da tergiversação, eis o que se espera da Comissão criada em 16 de
maio.
Parece importante repetir para que não seja esquecido. Não se trata
aqui de canonizar a vingança, o ódio. Nem se programa uma repetição da violência
que já fez derramar tanto sangue e tantas lágrimas. Ao contrário, a motivação
profunda na criação desta Comissão é ajudar o povo brasileiro a caminhar para um
verdadeiro processo de reconciliação.
Pois não existe reconciliação possível
se a verdade continua cativa da injustiça e amordaçada por um silêncio ignóbil.
Não é possível caminhar para um processo maduro e sereno de recuperação da paz
se as vítimas não puderem chorar seus mortos, saber onde estão, dar-lhes
sepultura e inscrever seus nomes para sempre na memória que tece a trama da
história.
Se não for buscada a verdade a todo custo e com todo empenho, o
país continuará devedor das vítimas e de sua memória ferida, de seus familiares
perpetuamente enlutados. Sua história não estará ainda passada a limpo. Pelo
menos não totalmente.
Naquele tempo, Jesus de Nazaré encontrava-se diante do
representante de César, a um passo da morte. Após declarar que viera ao mundo
para dar testemunho da verdade e que todo aquele que era da verdade ouvia a sua
voz, escutou a pergunta: “O que é a verdade?”
A resposta foi o silêncio.
Diante da pergunta que revelava a não escuta da revelação anterior era inútil
falar e insistir. Silenciosamente o Cordeiro de Deus selou seu destino
testemunhando a Verdade com a paixão e morte de cruz. Mas aqueles que o viram
morto e depois o experimentaram vivo entenderam que a verdade estava com ele e
passaram a ser suas testemunhas. E proclamaram aos quatro cantos do mundo o
poder libertador dessa verdade.
Assim esperamos que aconteça com a
recém-criada Comissão da Verdade. Que não recue, que não tema, que avance com
coragem e firmeza em sua importante tarefa. O Brasil merece a devolução de sua
história saneada pela verdade que liberta. A Comissão da Verdade é a condição de
possibilidade de que isso aconteça. Obrigada, presidente.
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