O Documento Zero da ONU para a Rio+20 é ainda refém do
velho paradigma da dominação da natureza para extrair dela os maiores benefícios
possíveis para os negócios e para o mercado. Através dele e nele o ser humano
deve buscar os meios de sua vida e subsistência. A economia verde radicaliza
esta tendência, pois, como escreveu o diplomata e ecologista boliviano Pablo
Solón, “ela busca não apenas mercantilizar a madeira das florestas mas também
sua capacidade de absorção de dióxido de carbono”. Tudo isso pode se transformar
em bônus negociáveis pelo mercado e pelos bancos. Destarte, o texto se
revela definitivamente antropocêntrico como se tudo se destinasse ao uso
exclusivo dos humanos e a Terra tivesse criado somente a eles e não a outros
seres vivos que exigem também sustentabilidade das condições ecológicas para a
sua permanência neste planeta.
Resumidamente: “O futuro que queremos”, lema
central do documento da ONU, não é outra coisa que o prolongamento do presente.
Este se apresenta ameaçador e nega um futuro de esperança. Num contexto
destes, não avançar é retroceder e fechar as portas para o novo.
Há,
outrossim, um agravante: todo o texto gira ao redor da economia. Por mais que a
pintemos de marrom ou de verde, ela guarda sempre sua lógica interna que se
formula nesta pergunta: quanto posso ganhar no tempo mais curto, com o
investimento menor possível, mantendo forte a concorrência? Não sejamos
ingênuos: o negócio da economia vigente é o negócio. Ela não propõe uma nova
relação para com a natureza. Antes, move-lhe uma guerra total. Nesta guerra não
possuímos nenhuma chance de vitória. Ela ignora nossos intentos. Segue seu curso
mesmo sem a nossa presença. Tarefa da inteligência é decifrar o que ela nos quer
dizer (pelos eventos extremos, pelos tsunamis etc), defender-nos de efeitos
maléficos e colocar suas energias a nosso favor. Ela nos oferece informações,
mas não nos dita comportamentos. Estes devem se inventados por nós mesmos. Eles
somente serão bons caso estiverem em conformidade com seus ritmos e
ciclos.
Como alternativa a esta economia de devastação, precisamos, se
queremos ter futuro, opor-lhe outro paradigma de economia de preservação,
conservação e sustentação de toda a vida. Precisamos produzir, sim, mas a partir
dos bens e serviços que a natureza nos oferece gratuitamente, respeitando o
alcance e os limites de cada biorregião, distribuindo com equidade os frutos
alcançados, pensando nos direitos das gerações futuras e nos demais seres da
comunidade de vida. Ela ganha corpo hoje através da economia biocentrada,
solidária, agroecológica, familiar e orgânica. Nela cada comunidade busca
garantir sua soberania alimentar, articulando produtores e consumidores numa
verdadeira democracia alimentar.
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