segunda-feira, 13 de junho de 2011

LEMBRANDO O MESTRE-ESCOLA ARNO ECKE

Esbelto, de figura elegante, sempre fumando seu palheiro, ele foi um desbravador. Quando os colonos  não tinham mais terras para cultivar nas Colonias Velhas, eles, em grupo, emigraram para  para as terras de Horizontina, notória por ser a sede da mais conhecida empresa de colheitadeiras. Não havia nada, exceto alguns caboclos,  Reinavam as florestas de ipês,angicos e canjeranas  soberbas, a perder de vista.

Os colonos vieram, em caravanas, trazendo seu professor, e uma imensa vontade de trabalhar e de fazer a vida a partir do nada. Ele estudara vários anos em São Leopoldo e acumulara vasto saber humanístico. Sabia latim e grego e lia em línguas estrangeiras. Viera para animar a vida daquela pobre gente. Era mestre-escola, figura de referência e respeitadíssimo. Dava aulas de manhã e de tarde. À noite ensinava português para colonos que só falavam em casa alemão, italiano e polones . Ao lado disso, abriu uma escolinha com os mais inteligentes para formá-los como guarda-livros para fazer a contabilidade das bodegas e vendas da região.
Como os adultos tinham especial dificuldade em aprender, usou  métodos criativos. Como mestre-escola era um Paulo Freire avant la lettre. Conseguiu montar uma biblioteca de mais de  mil livros. Obrigava cada família a levar um livro para casa, lê-lo, formava-se uma roda onde cada um contava em português o que havia lido e entendido. Não ensinava apenas o básico, mas tudo o que um colono devia saber: como medir terras, como tirar os juros, como cuidar da mata ciliar e tratar os terrenos com grande declive. Introduzía-os nos rudimentos de filologia, ensinando-os as palavras latinas e gregas.
Mas era um mestre-escola no sentido pleno da palavra porque não se restringia às quatro paredes. Saía com os alunos para contemplar a natureza, explicar-lhes os nomes das plantas, a importância das águas e das árvores frutíferas.
Naqueles fundos ignotos de nosso país, havia uma pessoa angustiada por problemas políticos e metafísicos. Criou até uma pequena roda de amigos que gostavam de discutir “coisas sérias”, mas mais que tudo para ouvi-lo. Sem interlocutores, lia os clássicos do pensamento como Spinoza, Hegel, Darwin, Ortega y Gasset. Passava longas horas à noite colado ao rádio para escutar programas estrangeiros e se informar sobre a segunda guerra mundial.
Era crítico à Igreja dos padres porque estes não respeitavam os vizinhos, todos protestantes alemães, condenados já ao fogo do inferno por não serem católicos. Opunha-se com dureza àqueles que discriminavam os “negros e colonos ” (os que cheiravam mal).
Sua piedade era interiorizada. Passou a todos um sentido espiritual e ético de vida: ser sempre honesto, nunca enganar e confiar irrestritamente na Providência divina. Morreu, de serviço em função de todos, não mais como professor e escritor mas como Escrivão do Registro de Imóveis. Sabia que ia morrer.  deveriam ter escrito  seu lema de vida na sua tumba: “De sua boca ouvimos, de sua vida aprendemos: quem não vive para servir não serve para viver”.
Este mestre-escola sábio e interiorano era Arno Ecke, meu querido e saudoso amigo, cujo trabalho e importância nunca foi reconhecido pela classe política de Horizontina.



Um comentário:

  1. Olá Rui.
    Você não me conhece, mas lembro de vossa pessoa nos idos de 1970 a 1980, pois acho que era o senhor que levava a sua filha Marcia Fabiola Arend na escola São Lucas, minha colega de escola infantil por muitos anos. Lembro tambem da mãe dela que ia em um Fusca azul. Quanta saudade. Moro a 30 anos no Mato Grosso. Pois é, esta figura ilustre Arno Ecke cheguei a conhece-lo pessoalmente e já sabia de sua importancia histórica para Horizontina. Respeito a história. Se possível postar algumas fotos dessa figura do Arno, para que possa lembrar-me de sua pessoa e que os demais a conheçam.
    Obrigado.
    deJuarezMT
    juarezxavante@hotmail.com

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