terça-feira, 17 de abril de 2012

VIDA EM PLENITUDE

Nosso atual modelo hegemônico de sociedade, baseado no consumismo e na acumulação do lucro, encontra-se em crise. De cada três habitantes do planeta, dois vivem entre a pobreza e a miséria. Todas as formas de vida estão ameaçadas pela degradação ambiental. Apesar disso, mais de 6 mil culturas e 500 milhões de pessoas resistem à modernidade neocolonialista que o paradigma anglossaxônico insiste em nos impor.
O Fórum Social Mundial cunhou a utopia de “um outro mundo possível”. Ora, melhor falar em “outros mundos possíveis”, abertos à pluralidade de etnias e culturas. O que nos exige uma atitude iconoclasta, de derrubar os mitos da modernidade capitalista, como mercado, desenvolvimento e Estado uninacional, fundados na razão instrumental.
Ao questionar as lógicas mercantilistas, desenvolvimentistas e consumistas, contribuímos para desmercantilizar a vida. Sabemos todos que, em nome do deus Mercado, água, florestas, mares e demais bens da Terra, deixam de ter valor de uso para ter apenas valor de troca. Até as relações pessoais são sempre
mais mercantilizadas.
“Vida em plenitude” nos exige resgatar a sabedoria dos povos originários, numa atitude relacional e dialógica com a natureza e os semelhantes. Abaixo a cultura do shopping, do consumismo desenfreado! Agora, trata-se de viver bem, e não de viver melhor que o vizinho ou de acordo com as imposições do grande oráculo do deus Mercado: a publicidade.
“Viver bem” é poder pensar, discernir e decidir com autonomia; promover a interculturalidade e a diversidade linguística; admitir a variedade de formas de democracia; favorecer os autogovernos comunitários; socializar o poder.
Os povos originários, como as nações indígenas que se espalham pelo Brasil, sempre foram encarados, por nosso citadino preconceito, como inimigos do desenvolvimento. Conheço sumidades acadêmicas que defendem a integração dos índios ao nosso modelo de sociedade urbana. Ora, este nosso modelo é o grande inimigo daqueles povos.
Frente à crise da civilização hegemonizada pelo capitalismo, é hora de se construírem novos paradigmas. Isso implica valorizar outras formas de conhecimento; integrar o humano ao natural; respeitar a diversidade de cosmovisões; desmercantilizar e socializar os meios de comunicação; e opor a ética da solidariedade à competitividade.
Se a secularização da sociedade descarta cada vez mais a ideia de pecado, urge introduzir a da ética, a fim de ultrapassar esse limbo de relativização dos valores que tanto favorece a corrupção, a ridicularização do humano, a prepotência de quem se julga único portador da verdade e não se abre ao direito do outro, à diversidade e ao diferente.
Uma revista inglesa propôs a um grupo de leitores verificar, durante três meses, quais os produtos estritamente necessários para que cada um se sentisse feliz. Todos, sem exceção, concluíram que se ampliou o orçamento familiar ao constatar o alto índice de supérfluos até então consumidos como necessários.
“Vida em plenitude” significa estar aberto e relacionar-se com o Transcendente, a natureza e o próximo. Não basta, porém, abraçar essa atitude como mera receita de autoajuda. É preciso transformá-la em projeto político, de modo a reduzir a desigualdade social e universalizar o acesso de todos à alimentação, à saúde, à educação e aos demais direitos básicos.
Ao contrário do que pregava o teólogo Adam Smith, é fora do Mercado que
reside a salvação.


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