terça-feira, 8 de janeiro de 2013

PICARETAGENS & TRANBIQUES


O mundo de hoje pode ser avaliado sem grande esforço ou complicados equipamentos, basta que o internauta examine o conteúdo da sua própria caixa postal. De cada conjunto de dez mensagens de spam, pelo menos três são trambiques. E alguns perigosos. Significa que um terço das mensagens de remetentes desconhecidos é constituído por fraudes ou falsificações, algumas delas disfarçadas em serviço público.
Comunicados da Receita Federal, do Ministério Público, polícias, fóruns judiciais, Detrans e bancos são armadilhas montadas por habilidosos hackers com as piores intenções. Loterias internacionais comunicam fabulosos prêmios, escritórios de advocacia dão notícia de incríveis heranças, entidades filantrópicas pedem contribuições, sheiks e emires querem os préstimos do destinatário, mulheres maravilhosas lhe oferecem suas virtudes – a Spamosfera é um gigantesco conto do vigário, ou lupanar, pronto a agarrar os distraídos, incautos, onanistas e também os espertinhos.
A constatação não visa a engrossar qualquer dos partidos, seitas ou irmandades que se digladiam em torno do acesso à internet. Esse é um debate imperecível, interminável, alheio aos marcos regulatórios e aos códigos internacionais, sempre bem-vindos embora sempre insuficientes.
As venenosas cartas anônimas de outrora, os abomináveis trotes telefônicos ou os incômodos volantes enfiados debaixo de portas não puderam ser evitados nem extintos. Os pasquins no Renascimento ou os sórdidos panfletos distribuídos antes, durante e depois da Revolução Francesa também não conseguiram ser proibidos. Simplesmente cansaram.
Contrafação, bastardia, travestismo e apocrifia existem desde que o ser humano descobriu a liberdade de burlar. Criatividade e enganação são limítrofes, o parentesco é complicado. Marcel Duchamps com o seu famigerado urinol “artístico” teria muito a dizer nesta matéria.
Não existem mídias organicamente desonestas; a internet neste momento é a mais vulnerável porque é a mais nova, não desenvolveu os mecanismos de autoimunização e autopreservação. Ao longo de quatro séculos a impressa depurou-se – o processo é lento, seguro e, sobretudo, endógeno. O que não significa o fim da compulsão trapaceira.
Quando a Amazon, o poderoso entreposto global de produtos culturais, decidiu moralizar as “resenhas” de livros, CDs e DVDs que publicava em seu site para enganar os trouxas, não o fez obrigada por uma sentença judicial. Nem por uma encíclica do Opus Dei. O rigor foi voluntário, autoimposto. A produção de resenhas favoráveis ficara tão acintosa que os executivos da empresa moralizaram o processo para preservar a credibilidade do negócio inteiro. Spams, assim como o telemarketing, vão cansar. O efeito bumerangue é inevitável.

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