terça-feira, 1 de março de 2011

INTERPRETANDO UM SONHO

Narra a Bíblia que o profeta Daniel (2, 31-36) foi convocado para interpretar um sonho que tanto inquietava o rei Nabucodonosor, da Babilônia: “Era uma grande estátua, alta e muito brilhante. Ela estava bem à frente de Vossa Majestade e tinha aparência impressionante. A cabeça era de ouro maciço; o peito e os braços eram de prata; a barriga e as coxas, de bronze; as canelas de ferro e os pés, parte de ferro e parte de barro. Vossa Majestade contemplava a estátua quando, sem ninguém jogar, caiu uma pedra que bateu exatamente nos pés de barro e ferro da estátua, quebrando-os. Em segundos, tudo desmoronou. Ferro, barro, bronze, prata e ouro ficaram como palha no terreiro em final de colheita, palha que o vento carrega sem deixar sinal. Depois, a pedra que tinha atingido a estátua se transformou numa enorme montanha que cobriu o mundo inteiro.”

A pedra, no caso do mundo árabe, é a ânsia popular de democracia entendida como justiça social e paz. O que pensa um iraquiano vendo seu país há anos dominado por tropas ocidentais que tratam os habitantes como escória da humanidade? O que pensa um afegão vendo aviões ocidentais bombardearem aldeias, matando crianças, mulheres, idosos, sob a desculpa de se tratar de um refúgio talibã?
A pedra é a cultura religiosa, muçulmana, que grassa naqueles países, e que nada tem a ver com o suposto cristianismo do Ocidente. Em nome de Deus e de Jesus, o Ocidente subjugou, durante séculos, a África, a Ásia e a América Latina. Escravizou habitantes, extorquiu riquezas, transferiu para a Europa preciosidades arqueológicas, como a Pedra de Roseta – hoje no Museu Britânico -, fragmento de uma estela de granodiorito do Egito antigo, cujo texto foi crucial para a compreensão moderna dos hieróglifos egípcios. Sua inscrição registra um decreto promulgado em 196 a.C., na cidade de Mênfis, em nome do rei Ptolomeu V.
O pensamento islâmico não distingue a fronteira entre religião e política. Esta deve ser monitorada por aquela. E a autoridade religiosa é encarada, como ocorria no Ocidente medieval, detentora do poder político.
Para tal conjuntura, o Ocidente só conhece uma resposta: armas, guerras, ocupações, subornos e ditaduras. Porque é incapaz de empreender o diálogo inter-religioso, de reconhecer o direito daqueles povos à autodeterminação, de pautar-se por princípios e não pela voracidade obsessiva do mercado por lucro. Se o fundamentalismo islâmico incute em jovens a mística do martírio, introduzindo uma forma de terrorismo incontrolável, o fundamentalismo do mercado incute nos ocidentais a convicção de que igrejas e mesquitas devem ceder lugar aos shopping centers, templos de consumismo e miniaturização do paraíso na Terra.
Eis a pergunta que foi repetida em Dakar, no Fórum Social Mundial, e exige resposta urgente: Um outro mundo é possível?

Nenhum comentário:

Postar um comentário