quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Impedir os câmbios

O objetivo é impedir a transformação comunicativa em curso, cujo significado mais preciso é o da recuperação dos espaços públicos midiáticos. Venezuela recupera o espaço radioelétrico como um bem público antes seqüestrado por oligarcas da comunicação vassalos da ditadura petroleira norte-americana e começa a fortalecer sua tv e rádio públicas, a comunicação comunitária é um fator democrático e soberano tangível na pátria de Bolívia, instala-se uma poderosa indústria de cinema, a "Villa del Cine", clássicos da literatura internacional como "Dom Quixote", recebem tiragem na casa dos milhões e são distribuídos gratuitamente. Até "Contos", de Machado de Assis, mereceu na Venezuela uma tiragem de 350 mil exemplares, quando aqui no Brasil a tiragem padrão de livros é de apenas 3 mil exemplares. E nossa indústria gráfica tem uma capacidade ociosa de 50 por cento....

As mudanças percorrem os Andes, e a Bolívia forma uma Rede de Rádios dos Povos Originários, lança um jornal público, "Cambio" que, em apenas seis meses de vida, já vende tanto quanto o maior jornal privado que tem décadas de privilégios de mercado, nas quais apoiou todos os numerosos golpes de estado no país. No Equador a novidade avança pela TV e Rádio públicos, cria-se um Conselho de Comunicação, há uma revisão dos critérios para novas concessões atacando os privilégios para as oligarquias tradicionais, que se consideravam portadoras de algum "direito divino" para comandar a radiodifusão. A Argentina quebra o monopólio do Grupo Clarim, reestrutura, fortalece e qualifica a TV e Rádio públicos fundados na era peronista, reservando espaços iguais na radiodifusão para o setor privado, o setor público-estatal e também para a sociedade organizada, que terá direito a um terço do fazer comunicativo. Nicarágua e Uruguai também fortalecem legislações que expandem e qualificam o papel da comunicação pública. Estas mudanças estão na mira do império...

É neste pano de fundo que ocorre a Confecom no Brasil, com a oposição da Sociedade Interamericana de Prensa, entidade fundada pela CIA, e com seus jornais afiliados repetindo, esbaforidos, que "vem aí a censura estatal", além de publicarem todo e qualquer tipo de ofensas aos governantes eleitos pelo voto das grandes massas pobres, chamando Evo Morales de narcotraficante, Hugo Chávez de psicopata e a Lula de analfabeto e outras baixarias. Se dissessem "cuidado, podemos perder nossos privilégios", ou "a ditadura de mercado sobre a mídia está em risco", ou "vamos ter que aceitar o absurdo de dividir a comunicação com o setor público e a sociedade", talvez estivessem divulgando possibilidades mais realistas sobre o que está verdadeiramente em curso, mesmo que ainda muito embrionariamente. E com barreiras imensas a serem transpostas. Se Cristina Kirchner teve maioria parlamentar suficiente para aprovar uma lei democrática de comunicação, o mesmo não ocorre aqui no Brasil, pois a heterogênea base aliada de Lula possui forte e inconfiável presença de radiodifusores.

Ainda com todas estas evidentes ações de intervenção dos EUA contra as mudanças em curso ou contra aquelas que apenas começam a ser desenhadas, como no Brasil, há quem defenda, inclusive no chamado campo progressista, exemplos de práticas de comunicação norte-americanas, ao invés de buscarmos elaborar as linhas mestras para construir nosso próprio modelo de informação e comunicação, presidido pelo princípio da soberania informativo-cultural.

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