quarta-feira, 26 de maio de 2010

O QUE É UM LAR HOJE?

O que é hoje um lar? Um espaço de moradia onde cada um se locomove de acordo com seus interesses individuais. No lugar da mesa posta com a família em torno, a geladeira como provedora de abastecimento; no lugar da sala como espaço de convívio, o quarto individual como local de refúgio, onde cada um se esconde entretido com a parafernália eletrônica, como TV e internet, que substitui, pelo relacionamento virtual, a sociabilidade calcada na alteridade.

A solidão deixa de ser um recuo à ação solidária e nutrição cultural para funcionar como abrigo de evasão solitária.
Outra causa de desagregação da família tradicional é o poder exercido pelo império televisivo. A TV é o “terceiro pai” que desempenha forte influência na formação de crianças e adolescentes. Desloca o núcleo familiar da sua relação de alteridade (conversas em torno da mesa, na varanda, na calçada ou no quintal; jogos de tabuleiro ou baralho; recital de música ou teatro improvisado etc) para a confluência de todos rumo à tela de TV. A família real cede lugar à virtual.
A democracia neoliberal - essa que se baseia na aquisição de bens materiais e permite a todos avaliarem seu grau de liberdade segundo sua proximidade ou distância do mercado - impõe-se à família através da TV, anulando os rituais fundados no afeto e na cumplicidade de sangue.
Já não vigora a autoridade paterna a decidir o que, na TV, convém ou não às crianças. Cada um decide, a seu bel prazer, o tempo e o conteúdo de sua voluntária sujeição à TV, em detrimento de diálogo familiar, leitura, oração, diversão, exercício físico ou desempenho social (visitas, teatro etc).
A família atual tende a ignorar seus parentes, não se interessa por eles, embora alimente grande apreço pelos novos “parentes” a quem, quase diariamente, abre portas e corações: William Bonner e Fátima Bernardes; Hebe Camargo e Faustão; Datena e Boris Casoy; e toda a plêiade de heróis e heroínas de telenovelas, programas infantis e desenhos animados.
Esses novos tios e tias têm a vantagem de ser sempre divertidos e educados; não pedem dinheiro emprestado, não bebem as nossas bebidas nem comem a nossa comida; mostram-se sempre saudáveis e risonhos; são ricos e famosos.
Freud ficaria confuso se voltasse hoje. Já não temos necessidade de “matar o pai” ou “odiar o irmão”. Basta discar o número fatal que exclui um “brother” ou trocar de canal a cada vez que aquele chato ou aquela megera aparece no vídeo.
Todas as noites milhões de telespectadores se nutrem abnegadamente dessa sopa de entretenimento - telenovelas, programas humorísticos, esportivos etc. - temperada de tudo isso que falta à sua vida real: o grande amor, a emoção, o desafio, o ideal, a beleza, a roda da fortuna...

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