quarta-feira, 9 de novembro de 2016

EU DEVIA TER AMADO MAIS.

O dia era normal, não muito diferente dos demais. Mas logo cedo, um refrão veio à mente: ‘eu devia ter amado mais, ter chorado mais, ter visto o sol nascer; devia ter arriscado mais...’ Naquela manhã pensei, muitas vezes, na letra e na melodia dessa sempre atual canção dos Titãs. Há músicas que nos fazem cantarolar o dia inteiro. Talvez seja um jeito de reviver momentos, aguçar emoções, atualizar sentimentos. A vida precisa de música, de letras que falem do que vai nas profundezas da existência. Quanto maior a identificação, mais intenso é o afeto. Em alguns minutos do dia, as pessoas poderiam cantarolar, nem que fossem canções de ninar.

O contexto que envolve e delineia o conteúdo de Epitáfio, música que continua contabilizando tributos aos Titãs, é instigador e curioso. O grupo musical imaginou o que poderia estar escrito no próprio túmulo. Impossível acompanhar a melodia sem abrir espaço à reflexão. A letra não deixa de expressar o lamento por um tempo que não volta e por atitudes que poderiam ter sido diferentes. A constatação é de que os anos passaram, sem que a vida provasse a intensidade. A normalidade dos sinais vitais não é garantia absoluta de que a vida esteja direcionada à plenitude. Não são poucos os que respiram sem gratidão, os que caminham sem eira e nem beira, os que aguardam simplesmente pelo desenrolar dos dias.

Falar da inscrição na lápide do túmulo é estranho. Alguns podem não dar continuidade à leitura. Mas não deixa de ser uma verdade da qual ninguém pode se esquivar. Um dia, talvez, os formatos de reverência à última morada não sejam nada parecidos com os da atualidade. As inscrições ocuparão, quem sabe, unicamente os corações daqueles que provaram a grandiosidade do ato de amar e ser amado. Mas há algo que não quer calar: a vida passa, só permanece a intensidade dos momentos, a coerência dos atos, a leveza dos relacionamentos. Impossível voltar atrás e refazer uma trajetória.

Cada momento é único e um instante pode durar uma eternidade. Tudo seria diferente se houvesse uma opção radical por ser simplesmente humano. A agitação e a insatisfação têm colocado a vida à margem da felicidade. Há dias em que os sorrisos são largos. Em alguns momentos, as lágrimas são abundantes. Não importa. Sempre será possível amar mais, chorar mais, presenciar o espetáculo do nascer do sol, arriscar mais. Se não houver lápide, houve ao menos um coração que não esqueceu, em nenhum instante, de amar profundamente mais.

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