terça-feira, 2 de agosto de 2016

UM ESTRANHO EM NOSSA CASA

Alguns anos depois que eu nasci, meu pai conheceu uma estranha, recém-chegada à nossa pequena cidade. Meu pai ficou encantado com esta personagem e a convidou a viver com nossa família. Todos estávamos de acordo. Fui crescendo e nunca perguntei sobre o lugar desta estranha em nossa família. Meus pais me ensinaram o que era certo e o que era errado, mas a estranha nem sempre concordava com eles. Ela tinha resposta para tudo o que quiséssemos saber em política, futebol, religião, história e compras. Além disso, era muito divertida.

Ela falava sem parar. Minha mãe, por vezes, ficava chateada e até se retirava da sala. Talvez fosse rezar. O pai não admitia que disséssemos palavrões ou consumíssemos cigarro ou álcool. A estranha permitia tudo isso. Os pais protestavam, mas eram voto vencido. Mesmo assim, ela não foi convida a retirar-se. Aos poucos aumentou sua influência, legislando sobre o certo e o errado, explicando que algumas coisas todo o mundo fazia ou ninguém mais fazia. E recusava maiores explicações: é isso aí e pronto.

Passaram-se mais de 50 anos e ela nunca mais foi embora. Nem mesmo saberíamos viver sem ela. Com uma autoridade cada vez maior, ela não aceita o diálogo: só ela fala, só ela sabe. Seu nome: Televisão. Agora ela tem um esposo que atende pelo nome de Computador e um filho que se chama Celular.

Na realidade, a televisão tem muitos pais. Já pelos anos de 1840 começou-se a estudar a possibilidade da transmissão de imagens à distância. Aos poucos o problema foi sendo resolvido. No ano de 1923, o russo Wladimir Zworykin desenvolveu o tubo de imagem, chamado iconoscópio. Ele é comumente considerado o inventor da TV. As primeiras imagens projetadas datam de 1925 e sua maioridade aconteceu nas Olimpíadas de Berlim em 1936. No Brasil, a primeira transmissão de TV aconteceu a 18 de setembro de 1950. Ninguém tem números confiáveis sobre o número de aparelhos no mundo. No Brasil ela está presente em 96% das residências. Ela é suplantada pelo fogão, presente em 97% das casas.

Saudada como uma universidade doméstica e uma janela para o mundo, ela pode também ser considerada uma caixa de alienação. A estranha – hoje – é a babá, a professora, a conselheira de todos. Ela oferece a todos o mais novo Tratado de Moral. Não faz muito, uma criança de quatro anos matou, com um revólver, uma irmãzinha de seis. Ela não se sentiu culpada, pois viu isto na televisão.

Certamente a estranha não vai ser posta para fora de casa. Mas é importante - é necessário - que os pais não a deixem falar sozinha. Expliquem aos filhos que existem fontes mais verdadeiras da Verdade e - quem sabe – leiam aos filhos a parábola do Joio e do Trigo. O Google informa onde encontrar o texto: Mateus, 13,24.

Nenhum comentário:

Postar um comentário