domingo, 11 de fevereiro de 2018

AMIGOS DE COLEÇÃO.


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Quero deixar imediatamente claro: este texto não fala de coleção de amigos. Muito pelo contrário: amigo de coleção é o ex-amigo, que a gente guarda num cantinho da memória e vai, com o pensamento, visitar de vez enquanto, cultivando a melancolia, a saudade, a tristeza, o rancor, o alívio, a satisfação.

A gente nunca sabe quanto tempo uma amizade pode durar. É preciso jogar-se de cabeça, esperando que seja para sempre, na alegria, na tristeza, na cumplicidade, no apoio, no cuidado, no aviso. Mas nada é garantido. A única certeza é que ex-amigo ficará para sempre nessa condição, cutucando os nossos sentimentos. Ex-amigo não permite a elaboração do luto, quando a gente menos espera ele reaparece, mas o abraço fica suspenso no ar.

O lado positivo da coleção de ex-amigos está no fato de nos oferecer a oportunidade para não cometer os mesmos erros com outros. À medida que a coleção aumenta, o catálogo das emoções se amplia. Há amigos que a gente perde porque perdemos o endereço, trocamos de escola, de casa, de trabalho e de país. São ex-amigos que ensinam o sentido da saudade. Outros, a gente perde porque cresce e em nossas vidas já não cabe a cumplicidade incondicionada, cada um precisa assumir as próprias responsabilidades e deixar de ser gregário. São ex-amigos que ensinam o valor das nossas escolhas. Há amigos que a gente perde porque a vida é complicada e não oferece oportunidade para compartilhar experiências, um almoço, um feriado. São ex-amigos que nos revelam o significado da solidão, que permitem que a gente aprenda a lidar com isso. Há ex-amigos que nos colocam diante da raiva e exigem que a gente descubra um modo para reconhecer, conviver e domar esse sentimento. Há ex-amigos que pioram com o tempo, em vez de envelhecerem como vinho de qualidade, mostram o seu lado mais azedo. Eles nos pedem paciência e às vezes desafiam os limites da nossa paciência. Com eles descobrimos o que significa dizer não, entendemos o valor do ponto. Há ex-amigos que nos surpreendem e nos decepcionam. Eles nos fazem perceber o sentido exato da traição e podem oferecer ótimos exemplos dessa arte que caleja e põe à prova a nossa confiança e a nossa capacidade de apostar de novo, apesar das probabilidades.

Os meus amigos de coleção têm um grande valor para mim. Conservo na memória, cultivo a tristeza, a decepção, mas também os bons momentos, as experiências vividas. Ex-amigos são parte da estrada e da história, na mesma medida dos amigos. Não, não é para comparar, porque amigos são aqueles que certamente já passaram por dificuldades, resistiram e ficaram ao nosso lado, embora tantas coisas tentem continuamente separar as pessoas. Claro que os amigos são especiais. Entretanto, ex-amigos também são. Como um sonho que não deu certo, mas no qual a gente aposta todas as fichas. Porque apenas sonhos podem se tornar realidade. Ainda que se concretizem em outras amizades, o ex-amigo é a vitória da persistência, é a derrota que se torna uma semente de futuro.

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