sexta-feira, 20 de junho de 2014

A BUSCA DA FELICIDADE

Conceituar o que é família hoje é uma proposta muito complexa já que, apesar de se ter em mente família como sendo o pai, a mãe e os filhos (grupo primário, família nuclear), implica em dimensões bem mais abrangentes, incluindo o escalonamento de gerações além das influências sócio-culturais. É, então, o produto de uma multiplicidade de interações com vínculos de toda a ordem, os quais podem se romper na medida em que vivências mais satisfatórias ou não acontecem.
Este “fio” que une as pessoas e satisfaz as necessidades individuais, refletindo-se no grupo como um todo num processo recíproco de realimentação, é que fornece os elementos para a conceitualização do grupo familiar.
A ideia tradicional de família como um “navio no ancoradouro” firme, baseada em laços consanguíneos com linhagem a ser preservada, bem como preceitos e normas, está em antagonismo com as inovações da família reconstituída, com meio irmão, pai biológico, substituto, 1ª, 2ª, 3ª núpcias, par de gays e lésbicas etc.
Os vínculos se rompem mais facilmente e o processo de readaptação contínua vai acontecendo. Pode-se concluir, contudo, que a família hoje é um “navio andando” e que está procurando equilibrar-se na busca do estabelecimento de vínculos mais efetivos, que sejam capazes de atingir objetivos pessoais e sociais.
Mudanças - Se no século XIX, família era o núcleo onde a preservação da honra, da tradição, dos valores transmitidos através das gerações, deveria ser mantido, independente do “sacrifício” pessoal, hoje a busca da felicidade norteia a caminhada da constituição familiar. É evidente que o ser feliz, a busca do prazer, a fuga da dor fazem parte dos instintos básicos do homem. A família se organizou, através da história, procurando atender as demandas internas e externas, sob a liderança dos pais. Como esta autoridade foi exacerbada, linhas filosóficas e psicológicas de cunho religioso e social foram introduzidas ideologicamente mudando direitos e deveres.
O processo de democratização reforçou o direito dos mais favorecidos e a criança deixou de ser o adulto em miniatura. Aliado a isto, a ideia do “não reprima” porque pode dar problema culpabilizou demasiadamente os pais que, por sua vez, se sentem muito inseguros e sem referências pela ausência de modelos substitutos mais eficazes que possam contribuir de forma mais adequada na educação dos filhos.
Por outro lado, a revolução industrial que colocou a mulher no mercado de trabalho também dificultou a convivência mãe/filho, assim como relação esposo/esposa. Esta minimização relacional oriunda do enfraquecimento dos papeis parentais mais o tempo reduzido para o “estar com”, vem exigindo readaptações por demais complexas a serem cumpridas.
As demandas do mundo moderno criaram tantas necessidades, além das básicas já existentes, que a corrida contra o tempo ocasiona situações difíceis até para as crianças que tentam acompanhar os adultos muitas vezes com pesadas mochilas nas costas.
Perdeu-se o encanto de olhar o outro
Todo o processo evolutivo pressupõe estas duas polaridades: é preciso dar um espaço para o que se vai colocar no lugar de algo que se perde. Claro que este perder tem a nuance de acumular, mas devem ser renovadas as emoções, os objetivos, as tarefas evolutivas para que se cresça. Percebe-se contudo que, como cada etapa da história e de vida parece acontecer mais rapidamente, a sensação e a percepção do homem moderno é a de que há mais perdas do que ganhos. O afã do ter, da busca se transforma num stress que os ganhos não são contabilizados, vividos, degustados, ou melhor, qualificados como deveriam ser, trazendo como consequência a desvalidação da experiência que foi anteriormente dimensionada como algo a ser muito importante. Como tudo isso repercute na família? Perdeu-se o encanto de olhar para o outro e apreciá-lo, os momentos de diálogos acontecem mais raramente, a habilidade de ouvir quase inexiste.
Os vínculos extra-familiares ou através da informática são tão pulverizados e os valores de reciprocidade mais íntima são vividos tão hedonisticamente que precisam ser avidamente repetidos, tornando-se cada vez mais sem sentido. Por que está acontecendo isto? São as circunstâncias? São desvios do caminho do crescimento pelas limitações humanas? É a necessidade de sobreviver? São defesas psicológicas para que o homem esqueça que é finito e não tem valores espirituais que possam dar um sentido à sua existência? É o conceito de felicidade que precisa ser revisto? Será que a ideia de ser feliz no ter, no aparecer, no possuir, no gozar, no usufruir não deve incluir o sufoco, a frustração, a dor e até a morte, desde que tudo seja considerado como algo próprio da contingência humana? Todos nós estamos sabendo de tudo isto e por que não somos capazes de praticar? A proposta não é excluir o que é bom, mas adicionar aquilo que já existe e negamos por não saber lidar.





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