domingo, 8 de abril de 2018

O CASO DA BERINJELA.

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Ou de como lei e justiça são palavras diferentes.

Lei do desespero: perambular pelas estradas de um vilarejo à procura de lenha para aquecer a casa, não ter emprego e não ter dinheiro para comprar lenha.

Falta de justiça: chegar a uma situação na qual os subsídios existentes não bastam para manter a dignidade mínima, nem pessoal, nem familiar.

Lei da fome: deparar-se com uma horta, ver uma berinjela e pensar no filho pequeno, que não tem o que comer em casa.

Falta de justiça: ser pego em flagrante pelos implacáveis representantes da lei com a berinjela na mão e ser indiciado por isso.

Lei da solidariedade: ser perdoado pelo dono da horta, que se recusa a fazer queixa na polícia por tão pouco.

Falta de justiça: ser levado a processo, mesmo na falta de uma queixa do dono da berinjela, por automatismo da burocracia judiciária, que acolheu o flagrante policial.

Lei da cidadania: ser defendido gratuitamente por um advogado público da acusação de furto de berinjela.

Falta de justiça: ser condenado em primeira e segunda instâncias por juízes cumpridores fiéis da lei.

Lei da resistência: suportar nove anos de processo por uma berinjela que nem chegou ao prato do filho, tendo sido retida pela polícia no momento do flagrante.

Falta de justiça: os italianos pagarem os custos do processo, da acusação e da defesa, que dariam para comprar cerca de 4 toneladas de berinjelas.

Lei da justiça: o juiz de última instância inocentar o réu e recordar aos seus colegas de toga que a justiça italiana já inocentou vários acusados de furto por motivo de necessidade, ou seja, por fome.

Falta de justiça: instrumentalizar a lei, ignorando que o próprio dono não pediu reparação do furto à justiça; instrumentalizar a lei, ignorando a irrelevância do caso; instrumentalizar a lei, ignorando os próprios princípios constitucionais que orientam a nação italiana e preveem a aplicação de punições congruentes com a violação cometida.

Lei da confiança: ir até as últimas instâncias, literalmente, e acreditar que a justiça tarda, mas não falha.

A história da berinjela aconteceu na Itália. O flagrante existiu. O dono da berinjela foi consultado pela polícia. O advogado de defesa foi pago pelo Estado porque o réu estava desempregado. Os juízes das duas primeiras instâncias condenaram o acusado à pena de dois anos de prisão, que ele aguardou em liberdade por ser réu primário. O juiz de última instância inocentou o réu e criticou os colegas das instâncias inferiores. Os recursos estilísticos foram empregados para dar mais dramatização ao caso. Todo o resto é verdade.

Esta história dificilmente teria este epílogo no Brasil. Isso também é verdade. Infelizmente.

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