quinta-feira, 17 de agosto de 2017

IMORTALIDADE.

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No livro Homo Deus, Yuval Noah Harari, autor do também consagrado livro Sapiens: uma breve história da humanidade,flerta com uma ideia muito curiosa. Ele sustenta que a humanidade sempre foi atormentada por três inimigos e que, finalmente, agora, se vê liberta: a fome, as pestes e as guerras. É claro que, aqui e ali, ainda se morre de fome, pestes e guerras, mas nada comparado como o que já foi. Por si só essa ideia já é impactante.

Mas, o mais surpreendente é o que, na sua concepção, serão os grandes desafios do futuro, já que esses três já vencemos. Para ele a felicidade, a imortalidade e o desejo de divindade mobilizarão as energias das gerações futuras. Exagero? Claro que sim. Sempre que se faz projeções, sobretudo se forem otimistas, será um exagero. Afinal, no futuro estaremos todos mortos. Mas espera aí, a imortalidade é o exato contrário da ideia que no futuro estaremos todos mortos. Como pensar, então, a imortalidade? Deixemos para outra ocasião a felicidade e a divindade.

Machado de Assis, um gênio da literatura brasileira, tinha uma ideia muito perspicaz, e pouco romântica, do nosso destino comum que responde, mesmo que de forma um tanto cruel, ao nosso anseio por imortalidade. Na dedicatória do seu livro Memórias Póstumas de Brás Cubas, lê-se: “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas”. Sim, seremos imortais, no verme. Supondo que, quando o verme também morrer, um outro vivente o roerá, igualmente, e segue o ciclo...

Quando os gregos entraram em guerra com os troianos, os generais espartanos e atenienses convocaram os cidadãos ao combate. Chegaram até à casa de Aquiles que, confortavelmente, usufruía da vida pacata de todo cidadão com alguma posse e com juventude o suficiente para ser desejado pelas mulheres. Ele resistiu. Não queria entrar numa fria. A mãe dele, contudo, o convenceu a ir para a guerra com um argumento muito provocativo. “Meu filho, disse ela, vai ficar aqui nesse fim de mundo até morrer de velho e sem notoriedade? Essa é a mãe de todas as guerras e quem nela morrer será lembrado por toda a eternidade”. Ele olhou para ela, abraçou-a e foi. Ainda hoje lembramos de Aquiles. Ele vive pelos seus grandiosos feitos, presente em nossa memória.

Sócrates foi acusado de agitar o mundo dos jovens atenienses com suas perguntas que punham em questão a tradição dos valores constituídos. Nada mais revolucionário do que pensar! Ele até dizia que Deus está dentro da gente e não nas forças da natureza, desafiando a religião pública e colocando em perigo a ordem constituída. Foi condenado por uma junta de Juízes a tomar cicuta, um veneno que não se dobra a apelações. Morreu sereno, filosofando e consolando os que ao seu redor choravam e lamentavam a sua partida. Por que? Porque ele acreditava que a alma humana é imortal e resiste à morte do corpo. Morreu feliz, na certeza na imortalidade da alma. Ele hoje seria um discipulo de Allan Kardec...

Jesus também foi acusado de ser um perigoso judeu, metido a líder popular, contra as leis farisaicas da tradição e contra os poderes invasores do império romano, sentenciado, com aplausos do populacho, que preferiu um assassino (Barrabás) a um inocente, à morte de cruz. Ele, diferentemente de Sócrates, não vai para a morte feliz e sereno. Teve calafrios e suou sangue, a ponto de pedir a Deus que o livrasse da angustiante agonia e da morte. Ele era humano, Jesus. E, por conta disso, morreu. Mas Deus, o Pai criador, o Barbudo, surpreendentemente, até mesmo para Jesus, o tira do esquecimento do túmulo e o ressuscita para a vida eterna. Que mistério a Ressurreição!

E agora vem o Yuval Noah Harari e diz que a humanidade gastará suas energias para conquistar a imortalidade. Ora, ora, ora! De que imortalidade ele está falando? Do após morte? Não. Ele está dizendo que a ciência do futuro vai nos livrar do ato mesmo de morrer. Vamos viver para sempre. Híbridos talvez, em simbiose com a máquina, mas livres da morte e eternamente vivos. Como nós modernos somos mesquinhos, não? Não temos uma causa nobre para viver e mesmo assim não queremos morrer. Sequer temos uma boa narrativa mítica ou poética para nos iludir...apostamos na ciência e pronto! Aquiles, Sócrates e Jesus tinham causas nobres que lhe deram sentido à vida e à morte. Mas nós queremos viver, viver e viver... E para que? Para viver, só para viver? Que sentido daremos à vida se não mais morrermos? Que tédio eterno seria vivermos para sempre! Eu prefiro morrer. Não tenho pressa, contudo... Só não gostaria que fosse um verme a me ressuscitar...Um verme não! Pô Machado, um verme não....!

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