sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

O HOMEM TRISTE

Não aconteceu de uma hora pra outra. Entristecer é um itinerário que se faz ladeira abaixo e, como diz o ditado, “pra baixo todo santo ajuda”.

Todo demônio também...

Foi um entristecer gradativo, uma perda inconsciente e progressiva de espontaneidade e alegria que lhe foi tirando cor dos pensamentos, silenciando palavras, atrofiando gestos.

A vida foi ficando cinza...

O sorriso, antes solto, fácil, foi se embotando, a começar pela capacidade de rir de si mesmo. Passou a levar a sério a sua tristeza.

Começou a contabilizar as perdas, mais que as conquistas.

Aos poucos, uma amnésia afetiva foi-se acumulando como poeira, escorrendo do cérebro, qual gelada lava, até seu coração.

Não se lembrava da última palavra de ternura que falara ou ouvira, nem o último gesto de carinho que dera ou recebera.

Por fim, era um homem triste., tornou-se um homem triste...

Algumas pessoas, mais próximas ou mais atentas, até perceberam, mas tinham suas próprias tristezas com que lidar. As tentativas fraternas de consolo, estímulo, incentivo, foram ficando tímidas e morreram dessa inanição que nasce com a impaciência.

Passou a pensar na morte, não como uma ruptura dramática, espetacular, mas como um lenitivo para aquele cansaço. Estava cada vez mais difícil carregar nas costas o peso dos dias.

Sentia saudades de suas crenças e alegrias.

Fora um homem de fé.

Quando a fé se eclipsava, recorria à esperança.

Mas, acima de tudo, apegava-se ao amor, como seu berço, caminho e destino.

Quando o amor lhe faltou, definitivamente, entristeceu...



Eduardo Machado

Nenhum comentário:

Postar um comentário