segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

NÃO CAIR EM TENTAÇÃO

Apesar do calor de mais de 30 graus que teimosamente insiste em aquecer os últimos dias de fevereiro, o ano finalmente começou. O carnaval com suas fantasias, sonhos e sons se foi. As praias pouco a pouco são retomadas pelo silêncio e solidão raramente quebrada pelos lentos passos daqueles e daquelas que já não precisam retornar à cidade e prolongam seu descanso devidamente merecido depois de muitos anos de trabalho.

As escolas retomam suas atividades e seus entornos se enchem de gritos e correrias de crianças que entram e saem em busca do conhecimento e do reconhecimento que ele – todos sonhamos e vendemos este sonho para as futuras gerações – um dia nos dará. As ruas das cidades estão outra vez apinhadas de carros que teimam em empurrar pedestres e ciclistas para fora do espaço urbano. As contas das festas e compras de Natal, fim de ano e carnaval insistem em nos lembrar daquilo que já gastamos e ainda não recebemos.

Dentro de nós, a consciência libertada da euforia do interlúdio estival martela tenazmente as promessas que fizemos para o ano que finalmente está a começar. A promessa de emagrecer, a de chegar mais cedo em casa depois do trabalho e ajudar o companheiro ou a companheira nos afazeres domésticos, a de gastar somente na proporção do salário recebido e não ter que apelar para o cartão de crédito, a de dispor mais tempo para estar com os filhos, com os pais ou com os avós, a de diminuir a quantidade de bebida alcoólica, a de parar de fumar, a de controlar o uso das redes sociais... Promessas que fizemos para nós ou que fizemos para outros, não importa. De qualquer forma, nos incomodam e nos lembram que é preciso recomeçar a vida normal e, trabalhar para que, com um pouco de esforço disciplinado esforço, ela se torne um pouco anormal em relação ao ano que passou.

Afinal, as grandes transformações raramente se dão de forma explosiva, revolucionária, fantástica ou milagrosa. Como nos ensinaram Darwin e Marx, é a acumulação das pequenas mudanças que faz com que, um dia, quando menos esperamos e muitas vezes fora do nosso controle, sejamos tomados pela surpreendente constatação de que já não somos o que um dia fomos e que, contra o renitente pessimismo que muitas vezes afeta o pensamento humano, podemos, sim, contra tudo e contra todos, ser aquilo que sonhamos ser.

Para isto, basta um movimento, um recomeçar, sacudir o torpor do verão que teima em paralisar carne, músculos, ossos e mente e lançar-se, passo a passo – sempre cuidando para não cair na tentação da carreira desabalada que não leva a lugar nenhum – em busca daquilo que sempre sonhamos.

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