sexta-feira, 28 de novembro de 2014

A IMPORTANCIA DO OLHAR.

Existem realidades tão nossas, no coração da vida, que nem sempre conseguimos captá-las em sua grandeza. Dizem que só valorizamos a luz quando estamos envolvidos nas trevas; acordamos para procurar água quando temos sede. Um peregrino, vendo um cego passar a seu lado, sentou-se à beira do caminho e começou a imaginar o que faria, o que sentiria e como seria se estivesse em seu lugar. De sua meditação surgiu um encantamento constante pelo dom dos olhos perfeitos e pelo fato de poder enxergar. É digno o gesto de acordar para um novo dia e agradecer a Deus pelo dom do olhar.
No coração da vida acolhemos e contemplamos o olhar como comunicação e como linguagem. Todos os nossos sentidos são janelas e canais de comunicação com o exterior. Porém, a vista exerce um papel especial na vida humana. O olhar constantemente nos encobre e nos descobre, nos abre e nos oculta, nos aproxima e nos separa.
O olhar pode ser diferente, conforme a superficialidade ou a profundeza com que sintonizamos, conforme a carga emocional, intelectual e volitiva do olhar que contempla. Há olhares que matam e olhares que despertam vida, olhares destruidores e olhares criadores, olhares que envenenam e olhares que purificam, olhares possessivos e olhares oblativos, olhares transparentes e olhares turbulentos, olhares indiferentes e olhares acolhedores. Todo o olhar é projeção de nosso eu.
Nosso olho enxerga e, no entanto, é o espírito quem vê: “A lâmpada do corpo é o olho: se teu olho for simples, ficarás todo cheio de luz. Mas se o teu olho for ruim, ficarás todo em trevas. Se, pois, a luz em ti é trevas, quão grandes serão as trevas” (Mt 6,22). Quando a pupila do espírito está purificada todo o universo se faz transparente e acolhedor, porque o olho que vê e o mundo que é visto encontram e revivem sua harmonia e proximidade original. A medida do olhar depende da intenção de quem olha. A partir de dentro projeta-se o olhar e vai pousar sobre as pessoas, os seres e as coisas.
O olhar tem um poder tão fascinante que dele se ocuparam e se ocupam a história da cultura, os mitos e as ciências, a filosofia, a literatura e a religião. Assim como o dom do olhar é magnífico, ao mesmo tempo pode se tornar perigoso. Quando o foco de nosso olhar centra-se em nós mesmos, incorremos no perigo do suicídio como Narciso da mitologia. Quando o foco contemplativo parte do coração e se projeta para fora, começamos a ver bem, porque sintonizamos melhor com o olhar de Deus sobre nós, os outros e o mundo. Na verdade, “só vemos bem com o coração”.
Uma das grandes preocupações da ascese cristã sempre foi o ajuste do nosso olhar. Educar o olhar parece ser um dos empenhos no caminho da santidade. Porém, para podermos educar o olhar, necessitamos educar o coração. Ali está o grande investimento de alguém que busca configurar seu ser com dignidade, conforme a medida da maturidade de Cristo.

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