segunda-feira, 27 de novembro de 2017

COMBO OU VENDA CASADA

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Intervalo da tarde. Hora do lanche. Tranco minhas coisas no armário – não há lugar que seja plenamente seguro! – e vou à lanchonete instalada no pátio da Universidade. Instalação nova e reluzente de uma rede internacional de lanches rápidos. “Fast food” é um conceito moderno que dá ares de modernidade à educação. Associação imediata: coma rápido e aprenda rápido.

Olho o cardápio. As opções não são muitas. É um novo conceito: poucas opções, pouco preço. Tem lógica. E tem limites... E tem o combo do dia. Bem mais barato que os outros combos. Sanduíche e coca cola por oito reais. O sanduíche parece ser bom. Um pão “de boa aparência” com 15 centímetros de comprimento recheado com queijo chedar, maionese, presunto, milho e ervilha. Me decido pelo combo do dia. Como não tomo coca cola, solicito ao atendente uma possível substituição do líquido escuro e viscoso por guaraná ou por um suco. A resposta é afirmativa, com a ressalva que o sanduíche então passaria a valer 12 reais. “E o guaraná, quanto custa?” “Quatro reais o copo pequeno e seis o grande...” Total: 16 ou 18 reais. “Como?” pergunto eu com cara de quem não entendeu a matemática ensinada. Sorrindo com o mesmo sorriso da caixa registradora, o atendente me explica: “É o combo!”

Imediatamente me vem à mente o combo da companhia telefônica que fui obrigado a contratar. Eu só queria a banda larga. Vendida isoladamente, eram R$ 199,99 por mês. Com o telefone e TV a cabo, eram os mesmos 199,99. Mas eu não uso telefone fixo e nem assisto TV! “Por que isso?” perguntei eu naquela ocasião ao atendente da companhia telefônica. A resposta foi tão misteriosa quanto a proposta: “É o combo!”

Antes que os outros fregueses começassem a reclamar silenciosamente da minha indecisão, pensei em sair da fila. Mas não queria sair sem antes fazer uma pergunta: “Isso não é venda casada?” “Não”, me responde o atendente com um sorriso tão amarelo quanto o sachê de mostarda sobre o balcão. E me explica didaticamente: “Venda casada é quando você é obrigado a comprar dois produtos juntos. Nós aqui fazemos combo. Você compra se quiser.”

Desisto da fila, caminho uma quadra e vou até um daqueles “xis” tradicionais que só tem no Rio Grande do Sul. Enquanto fico esperando um “xis salada”, nada moderno e que não ajuda a aprender rápido, fico pensando na diferença entre “combo” e “venda casada”. Difícil de entender. Nem o site do PROCON ajuda. Os conceitos são confusos e parece que uma e outra coisa são a mesma coisa. A única diferença é que um é legal e o outro ilegal. Se a empresa anuncia que você tem que comprar os dois produtos conjuntamente, é combo. Se isso não é anunciado, é venda casada.

É mais ou menos como aquela famosa frase do Romero Jucá: “Tem que ter um empeachment.” Junto viria “um grande pacto nacional”, “com o Supremo”, “com o Senado”, “com tudo”, “para deter a sangria”. Os produtos que faziam parte do pacote foram explicitados: “Tem que tirar a Dilma e botar o Michel”. Todo mundo sabia o que se compraria com o golpe. Era um combo completo que foi adquirido pela maioria da Câmara, pelo Senado, pelo Supremo Tribunal Federal e por boa parte da população que se encantou com a propaganda do Pato Amarelo no programa da Ana Maria Braga, no Faustão e no Jornal (Anti)Nacional.

O que muita gente não sabia era o que viria como “venda casada”: fim da legislação trabalhista, impossibilidade de aposentadoria, legalização do trabalho escravo, cortes no Bolsa Família, entrega da Amazônica e do pré-sal a grandes empresas transnacionais, estrangulamento das Universidades Públicas, sucateamento do Sistema Único de Saúde, criminalização dos movimentos sociais, sindicais e das juventudes, exacerbação do racismo, do sexismo, da homofobia... Tudo isso fazia parte do golpe e era escondido da população que, por ignorância ou descuido, comprou os produtos que lhe eram sorrateiramente empurrados goela abaixo. Era venda casada.

Enquanto dou a terceira mordida no “xis salada” ao qual acrescento catchup e mostarda conforme o meu gosto, a moça me traz um copo de suco de abacaxi moído na hora. A escolha foi minha: “xis salada” com suco de abacaxi. E o preço era o mesmo. Nada de combos, nada de venda casada.

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