segunda-feira, 4 de junho de 2018

OS SINOS TOCARAM.

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A cerimônia estava quase se encerrando e os sinos começaram a tocar. Olhei para o relógio: eram 11h30min. As palavras silenciaram, parei por uns instantes, aquela audição me reportou a outros tempos. Du
rante toda minha infância, na ausência de relógio, os sinos dobravam anunciado que o meio-dia estava próximo. Cresci ouvindo o toque dos sinos. Certamente os sinos não anunciavam somente o horário. Seria uma finalidade por demais resumida, diante de tudo o que aquele sonoro badalar pode significar. Foram apenas uns segundos ou minutos, mas a intensidade era tanta que dava a impressão de estar, lá naquele lugar, há muito tempo escutando silenciosamente. Erra drasticamente quem confunde o toque dos sinos com outros ruídos. Sino é sinal, melodia, elevação, recordação, lembrança. Um sino não pode ser comparado com nenhuma outra sonorização. Hoje já não ouvimos frequentemente o toque do sino. Os centros urbanos colecionam variados barulhos. Sem contar que uma grande maioria opta por fones de ouvido, assim escutam somente o que gostam.

Muitas pessoas caminham de cabeça baixa, centradas unicamente nos seus problemas, tendo como cenário apenas o próprio mundo. Não são poucos os que passam longo tempo sem olhar para o céu, sem dar-se conta de que as estrelas continuam brilhando, que as nuvens se fundem e formam figuras, que os raios do sol ainda têm brilho, que a chuva ora é miúda, ora é muito forte. O mundo virtual acaba roubando a melhor parte do tempo, ao ponto de restringir os humanos à condição de inquilinos do planeta. Não basta estar neste mundo, é necessário sentir-se parte da criação. Já que todos utilizam o oxigênio disponibilizado gratuitamente, seria importante apreciar essa obra maravilhosa, a casa comum da humanidade de todos os tempos. A natureza não produz ruídos, emana uma diversidade de sons. Se existem ruídos, estes são produzidos pelos humanos, que inventam máquinas que impactam no silêncio, impedindo ou prejudicando a harmonia.

Quando os sinos pararam de tocar, as palavras tornaram-se desnecessárias. Uma mensagem havia impregnado o coração dos presentes. Por uns instantes, a sensação era de que o céu tinha feito uma visita à terra. Mas como a hora já estava adiantada, era necessário partir. Depois de tantos anos, tive a oportunidade de ouvir novamente os sinos que marcaram minha infância. Os grandes centros urbanos já não aceitam o toque dos sinos. Uma das causas da grande insatisfação, que invade os humanos de todas as idades, pode ser a pouca sensibilidade diante dos sons e dos sinais. A natureza, como um todo, tem muito a ensinar, mas é preciso prestar atenção e saber escutar. O toque de um sino pode aliviar a solidão, renovar a esperança, elevar o pensamento, direcionar o olhar para o céu. Quero continuar ouvindo os sinos das solitárias igrejas e capelas, distribuídas ao longo dos caminhos. Afinal, o sino auxilia na tomada de consciência da única verdade: um dia teremos que partir. A terra não é o endereço definitivo de ninguém. Quem tem sino, certamente tem céu.

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