segunda-feira, 31 de agosto de 2020

É ASNEIRA DE MAIS. OUTRO DIA EU CONTINUO.

 Palavrão a palavrão: de onde vieram as asneiras – Observador

O tempo me exaure, ou melhor, a falta dele.  Mas nada se compara ao cansaço na alma de acompanhar as notícias de um país que, outrora, foi alcunhado de “país do futuro” e que hoje, não é sequer o país do presente. O presente (como o passado) da nação brasileira é permeado por injustiças sociais, desrespeitos à Constituição, direitos vilipendiados, e como se não bastassem-desgraça pouca é bobagem-discursos presidenciais insuperáveis pela baixeza, pelo cinismo e desimportância.

Na semana passada, uma criança de apenas dez anos esteve na pauta das discussões cotidianas, tanto em redes sociais, como nos bate-papos de alguns corajosos nas ruas. Corajosos ou insensatos, apesar do comércio em muitas cidades funcionar, o número de doentes pela Covid-19 persiste e o de mortos ultrapassa os 120.000 óbitos. 

As investigações policiais deram conta de que a criança era violentada pelo padrasto desde os seis anos de idade, e agora, aos dez estava grávida, sendo autorizado pela justiça que fizesse o aborto. Como se não bastasse a violência por que passou a menina, desde sempre, foi violentada mais vezes após o crime vir à tona; quando uma fascista com tornozeleira eletrônica divulgou aos quatro cantos o nome da criança, do médico e do hospital, e  uma matilha de desocupados delinquentes fundamentalistas foram ao hospital impedir a interrupção da gravidez, sob os gritos de “assassina”, direcionados à infância violentada; quando uma professora posta nas redes sociais que a menina gostava de “dar”.  

Enquanto o país se distraía com a tragédia vivida pela pobre menina, as barcas com toras de madeira amazônica atravessavam os rios, o desemprego batia recorde em cima de recorde, os índios, nas aldeias, morriam de fome e de doença, os moradores em condição de rua congelavam no frio (...)

O presidente da nação intencionando mostrar a sua popularidade em meio ao caos, cumprimenta e abraça seguidores que o bajulam em palcos estrategicamente montados. Numa dessas investidas, põe no colo um anão, acreditando ser uma criança, e promove uma das cenas mais patéticas já protagonizadas por um presidente da República. Ao perceber que não se tratava de um infante, aterrorizado pelo constrangimento, joga o anão nos braços de um dos seus assessores. Ah, Bolsonaro! Eu te odeio, mas você me faz rir muito, sentimentos contraditórios que me tensionam e me divertem. Meu psicólogo não está dando conta. Nem eu.    

Em outro momento, proferindo discurso vazio e populista, no Nordeste do Brasil, informa à população brasileira que é “imbrochável” e que não usa aditivos para sua vida sexual. A nação ouviu isso mesmo? Sim. Mais uma estripulia do Circo de Horrores institucionalizado pelo miliciano. No momento em que o escutei, fiquei a esbravejar telepaticamente com a natureza: Tu é lá perfeito coisa nenhuma? Antes essa praga com faixa presidencial fosse infértil! E não deixasse descendentes corruptos, inescrupulosos, cínicos e demagogos, como o 01, 02, 03 e,  certamente, o 04 – como o miliciano se refere aos filhos – além da pobre menina sempre de cara amarrada. Devo confessar que me compadeço dela. Já imaginaram o quão difícil é nascer numa família de “machos” que tem profundo desdém por tudo o que representa o feminino? Basta lembrar das diversas vezes em que o presidente fundador do “Clã das Rachadinhas” atacou as jornalistas, deputadas e até a presidenta Dilma Roussef, com um ódio e palavreado comuns aos misóginos. Agora, após mais uma semana agitada, submerge o caso da pastora Flordelis. Calma! Não estou dando conta. Fica para a próxima.   

domingo, 30 de agosto de 2020

PENSE NISSO: ESTÃO ESTUPRANDO O BRASIL.

Mulher é estuprada ao aceitar carona - Jornal TodoDia

Quando Bolsonaro disse à deputada Maria do Rosário “que não a estuprava porque ela não merecia”, o Brasil foi estuprado. Quando, ao votar no impeachment da presidenta Dilma Rousseff, dedicou seu voto aos militares de 64 e citou Carlos Alberto Brilhante Ustra, responsável por torturas no DOI-Codi, o Brasil foi torturado. Quando defendeu que mulheres deveriam ganhar menos por engravidarem, foi machista, misógino e atacou todas as mulheres. Quando a ministra Damares Alves debocha das mulheres e diz que a igualdade de gênero incentiva agressões porque se a menina é igual logo aguenta apanhar, está estimulando a violência contra as mulheres e meninas.

O Brasil foi estuprado por Bolsonaro e a gangue que governa o país. Governa, não, desgoverna. Eles não se envergonham de ser mentirosos, incompetentes e de estarem destruindo tudo, imbuídos no fundamentalismo político e religioso, nas ideologias fundamentalistas e na perversidade. Eles expõem as vísceras do que há de pior, de mais baixo e grotesco nesse governo, que estimula todos os tipos de preconceito, arbítrio e as violências contra as mulheres, meninas, LGBTIs, negros, pobres e trabalhadores.

Uma menina de dez anos foi estuprada. O fato veio à tona e ocupou as redes e manchetes, causou muita indignação. A forma como esse triste fato virou manchete e, posteriormente, os dados dessa criança foram vazados, demonstra a barbárie e a falta de política do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Ministério que mandou uma equipe para a cidade de São Mateus no ES, portanto, tinha os dados, endereço e outras informações da criança. Como esses dados chegaram nas mãos da bolsonarista e extremista Sara Fernanda Giromini (Sara Winter) quem tem que apurar e explicar é o Ministério Público do Espírito Santo, que precisa punir os culpados e todos os que tentaram transformar essa tragédia em palanque político.

Todos os envolvidos no ataque à criança, sem exceção, precisam ser punidos severamente. O estuprador, que já está preso, mas também aqueles que vazaram as informações; os que foram para a porta do hospital ameaçar os médicos e hostilizar a criança; a bolsonarista Sara Winter, que cometeu crime ao violar os artigos 143 e 247 do Código Penal e do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente.). Não esqueceremos esse crime e nenhum outro cometido contra as mulheres e meninas. Vamos cobrar sempre a punição dos envolvidos – esse recado vai para Damares Alves.

Não foi apenas essa menina. Várias outras meninas indefesas e vulneráveis são estupradas. A cada hora cerca de quatro meninas, de 10 a 14 anos, são violentadas no Brasil. São números de uma perversidade monstruosa, que demonstram a inexistência de qualquer política de combate e enfrentamento a essa violência, a esse crime hediondo.

São seis abortos por dia em meninas entre 10 e 14 anos. Em 2018, o Brasil registrou recorde de casos de estupro, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública – cerca de 180 pessoas foram violentadas por dia, num total de 66 mil casos anuais de violência sexual no país. Destes 81,8% das vítimas do sexo feminino e 18,2% do sexo masculino, sendo 50,9% de raça negra e 48,5% de raça branca.

Os casos de violência sexual só crescem. A cada onze minutos uma mulher é estuprada, a maioria meninas de até 14 anos. Se forem considerados os abortos legais, os espontâneos e outros tipos, na faixa etária de 10 a 14 anos, em 2019 foram 1.871 casos. São números de guerra e de uma dor que é invisibilizada pela sociedade, onde a vítima torna-se culpada, os violadores estão muito próximos à vítima, na maioria das vezes moram ao lado, ou até na mesma casa. Uma tragédia!

sábado, 29 de agosto de 2020

MENOS RELIGIÃO E MAIS ESPIRITUALIDADE.

Espiritualidade é mais simples do que parece: é colocar o amor em movimento  - Blog do Prem Baba 



Um dos fatores de evasão de católicos da Igreja ou indiferença à pratica religiosa é o fato de muitos fiéis adultos não possuírem outra formação na fé senão a que receberam na infância via família e catequese. Assim, quando as pernas crescem a calça curta já não serve...

Conheço muitos cristãos que não leem a Bíblia por uma razão óbvia: nada entendem do texto. E não sabem onde buscar ajuda. A Igreja Católica dispõe de poucos leigos, religiosas e padres capacitados para administrar cursos bíblicos. Uma das mais promissoras iniciativas é o CEBI (Centro de Estudos Bíblicos) com seus cursos e publicações, mas infelizmente pouco valorizado pela hierarquia da Igreja Católica.

A maioria dos padres conhece apenas noções de lições de seminário, em geral utilizadas para reforçar tradicionais conteúdos devocionais. Muitos não suportam questionamento dos fiéis e, por isso, não se atrevem a ministrar cursos. Preferem o monólogo do sermão de missa, pois ali não convém à assembleia fazer perguntas e muito menos contestações.

Hoje em dia, os estudos bíblicos estão de tal modo avançados que muitos fiéis talvez se sentissem abalados em sua fé se enfocassem os relatos evangélicos à luz das pesquisas mais recentes e destituídos de invólucros míticos. A avalanche devocional recobriu de tal modo os personagens bíblicos, como o próprio Jesus, que fica difícil encará-los como humanos.

Muitos cristãos ainda creem em um Deus cruel que, ofendido por nossos pecados, exigiu que a sua ira divina fosse aplacada por um sacrifício igualmente divino: a morte de seu filho na cruz!

Mas qual pai se compraz de ver seu único filho crucificado?

Como Jesus perdeu a vida todos sabemos: assassinado. Por quê? Não era ele uma pessoa tão boa, espiritualizada, que "passou a vida fazendo o bem", como diz o evangelista João? Quem haveria de querer matá-lo?

Ora, Jesus nada tinha dessa figura angélica alimentada por eflúvios piedosos. Era "sinal de contradição". Colocou-se ao lado dos injustiçados. Denunciou os ricos e as autoridades de seu tempo. Incomodou os opressores. Não admitiu que corresse dinheiro no Templo, casa de Deus transformada em "covil de ladrões".

Por isso, foi assassinado por dois poderes políticos: o romano e o sinédrio judaico. Pilatos e Caifás. Morreu como prisioneiro político.

Nada disso interessa a quem deturpa o Evangelho e sonega seu conteúdo para alimentar uma religiosidade de consolação, e não de compromisso; de evasão, e não de engajamento; de fuga do "vale de lágrimas", e não de inserção amorosa e libertadora no mundo.

A fé necessita de alimento sólido. Não se nutre adultos com papinhas de bebê. Daí o fato de muitos católicos migrarem para Igrejas nas quais a compreensão teológica da Palavra de Deus é trocada por interpretações míticas que reforçam a apatia diante das mazelas sociais. Já que não se tem acesso aos serviços de saúde, ao menos se espera confiante o milagre da cura e se deposita a fé e a poupança no pregador que promete prosperidade em curto prazo. Caso ela não venha, pode ter certeza de que você ainda não cortou definitivamente seus vínculos com o diabo...

Menos religião e mais espiritualidade...

sexta-feira, 28 de agosto de 2020

PARA PENSAR: A IMPORTÂNCIA DO ESCREVER

 

escrever | Livros só mudam pessoas - Part 6

Não é à toa que psicanalistas e orientadores espirituais ao longo da história aconselharam seus pacientes e orientandos a escrever suas experiências. A intenção é provocar uma anamnese e ajudar a lidar com sentimentos em revolta ou movimentos interiores desencontrados. Por vezes, escrever é também instrumento de resistência e mesmo sobrevivência a sofrimentos que vão além do suportável e ameaçam o equilíbrio psíquico e a continuação da vida biológica.

Assim é que mulheres judias durante a Segunda Guerra Mundial, em meio ao horror do holocausto nazista, encontraram na escrita um modo de resistência para continuar vivendo em meio ao sofrimento e à dor, sob contínua ameaça da morte. Foi esse o caso da judia convertida ao catolicismo e monja carmelita Edith Stein; da filósofa judia agnóstica Simone Weil, a qual, possuída pelo Cristo e morta aos 34 anos, deixou uma obra que preenche 19 volumes; assim igualmente a jovem judia também agnóstica Etty Hillesum, que morta aos 29 anos de idade em Auschwitz, deixou três volumes de um diário e algumas cartas, impressionando o mundo com a profundidade de suas experiências místicas, e finalmente da adolescente Anne Frank, que passou vários meses escondida em um prédio de Amsterdam durante os quais escreveu um diário que, após sua morte no campo de Bergen-Belsen, tornou-se mundialmente conhecido como hino de esperança na humanidade em meio à desumanidade do nazismo.

Foi a escrita também a salvação da escritora estadunidense Joan Didion, que vivia positiva parceria com o marido John, também escritor, e derramava sua maternidade amorosamente sobre a filha adotada, Quintana. Tudo foi interrompido pela morte brusca de John com um fulminante infarto, seguida pela morte de Quintana, acometida por uma série de problemas de saúde rapidamente agravados com sucessivas hospitalizações. O caminho encontrado por Joan para lidar com o luto foi escrever. E enquanto sua saúde se fragilizava pelo pouco que se alimentava e pela tristeza que a consumia, escreveu o romance "O ano do pensamento mágico", sucesso de vendagem nos Estados Unidos.

Joan Didion escreveu este livro após a morte de Quintana, mas o livro narra apenas a doença da jovem e não sua morte. Esta será enfrentada através do texto, dois anos depois, com o livro "Noites azuis" (Blue nights). Ali, enfim, a escritora faz a passagem do luto de volta à vida. E declara que sem a escrita isso não teria sido possível.

A escrita de si é algo que o ser humano pratica há séculos e em muitas circunstâncias. Os grandes autores de ficção transportam a seus personagens suas inquietudes e sofrimentos. Assim exorcizam seus medos e ajudam os leitores a identificá-los e com eles lidar.

Em situações limite, a escrita é o meio pelo qual a vítima encontra forças para resistir ao carrasco e eventualmente triunfar sobre ele. A escrita conserva a narrativa da experiência, da dor, do desespero. E também registra a esperança que conserva a vida em movimento mesmo sob a ameaça inexorável da morte e da destruição.

Escrever é um ato de afirmação da vida. Quem escreve diante de um projeto de morte que se abate sobre si próprio, desafia esse projeto reafirmando a vida, que teima em acontecer mesmo sob o tacão da ameaça e da violência. É igualmente testemunha de um futuro. Escrever é produzir algo que as gerações futuras poderão ler. É registrar as próprias experiências e oferecê-las como laboratório onde outros e outras poderão elaborar as suas.

Diante da efemeridade das coisas e do tempo, a escrita igualmente é terapêutica por ser algo que permanece, que é fixado para não ser perdido. No caso das escritoras que mencionamos, as quatro judias europeias e a estadunidense, a morte – própria e alheia - interrompeu suas vidas. Mas a escrita as sobreviveu. As sobrevive. E não deixa se perder na noite dos tempos suas preciosas experiências e admirável resistência.

Outros poderão ler e aprender. A leitura será um revisitar doloroso ou gozoso do registro produzido pelas testemunhas que vivenciaram os fatos e os narram e interpretam. E assim se poderá não repetir chacinas, tragédias. E, mais do que isso, criar universos novos onde a vida triunfe sobre a morte. É por essa razão que escrevo todos os dia.

DEIXE ECOAR NO CORAÇÃO O DESEJO DE QUERER A LUZ.

 luz que te quero - Foto de Paracuru, Ceará - Tripadvisor

"Quero a luz" é a expressão de um desejo a ser operado pela força de princípios inegociáveis, a exemplo da preciosa recomendação do apóstolo Paulo, em sua carta aos Romanos: "Não te deixes vencer pelo mal, vence antes o mal com o bem". É incontestável, sabe-se muito bem, que em toda tentativa de vencer o mal com o mal, o resultado da batalha é a derrota ainda maior. Nesse horizonte se desenha preciosa lição com força de remédio ante os dramáticos cenários que pesam sobre os ombros da humanidade: somente o bem pode derrotar o mal. É essa também a receita terapêutica para sanar realidades feridas pelos constantes combates fratricidas que enfraquecem instituições no seu interno, multiplicam as violências, validam preconceitos, a exemplo das posturas racistas e excludentes.

Nesse cenário se põe a discussão acalorada a respeito de razões. Mas razões não podem ser desvinculadas de princípios. E os princípios são inegociáveis. Ao contrário disso, corre-se o risco de se permitir tudo. Não se pode simplesmente considerar que a batalha em curso seja um conjunto de meras acareações, apenas para deliberar a perspectiva de quem tem razão, agindo como se o conjunto da vida pudesse ser tratado em partes estanques. Em questão está o jogo que envolve o mal, o bem e o amor.

Diante de trágicas experiências, é próprio do comportamento humano procurar identificar as raízes do mal, explicar suas causas e fazer valer dinâmicas para a sua superação. Desafio que se torna ainda mais complexo no contexto da administração do dom precioso da liberdade humana. Assim, incontestavelmente, o bem e o mal ganham o rosto e o nome daqueles que os escolheram livremente. "Quero a luz" deve representar o desejo de, humildemente, se abrir e aprender a gramática da lei moral universal. Na gramática da lei moral está inscrito o compromisso intocável da responsabilidade para com a vida de cada pessoa, considerada dom sagrado, defensável e promovido em qualquer que seja a circunstância, por ser um bem acima de todo e qualquer bem.

Ao contemplar os cenários da sociedade mundial, não se pode camuflar a efetiva difusão de numerosas manifestações sociais e políticas da maldade - da desordem social à anarquia, da injustiça à violência contra o outro - fecundadas pela indiferença e amparadas em relativizações dos valores e dos princípios intocáveis da lei moral. O mundo está afligido por muitos males sociais e políticos, com a eclosão das violências. O investimento permanente na aprendizagem, na prática dos princípios e valores da gramática da lei moral contracena com o exercício do poder. O poder que todos têm, em medidas diferentes, como parte da composição do tecido de sua cidadania, de sua confissão de fé e nos contextos de sua representatividade e responsabilidades interage com os cenários da vida social e política.

No conjunto das muitas obscuridades encontram-se, pois, exercícios equivocados no uso e desempenho do poder. Ora, porque se tem excessivo poder, em instâncias que tomam decisões estreitadas por interesses próprios - não há vontade política de preservar a vida e defendê-la-, ora porque, não raramente, um poder é exercido sem a esperada competência humanística, apenas com o objetivo de usufruir das benesses. Há uma gama de descompassos em andamento no exercício do poder, sem poupar qualquer que seja a instância, da religiosa à judiciária, da instância familiar à política, com passagem pelos desencontros cotidianos de civilidade. Revela-se, assim, a fonte de desmandos, a falta de pudor em fazer valer o que, subjetivamente, se considera oportuno.

As sociedades mundial e local encontram-se numa travessia marcada por muitas agruras, dentre elas as feridas expostas de um poder fragilizado pelas muitas práticas equivocadas, pela incapacidade de se efetivar o que se configura na legislação, a começar pela Constituição Federal. Esse horizonte dos descompassos que envolvem desde opiniões aos seus resultados, comprometendo a vida no seu conjunto, pede uma aprendizagem nova. Isso, para conter a exorbitância no uso do poder, evitando-se a relativização do intocável, a mistura do que é imiscível - dinâmicas que atrasam processos, adoecendo o planeta e as pessoas em disputas figadais por interesses que comprometem o inegociável princípio da solidariedade. Ante o mal crescente e os descompassos, todos estão desafiados a um mea culpa e a um anseio renovado por deixar ecoar no coração o desejo-experiência de querer a luz.

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

PARA TUDO HÁ LIMITES SUPORTÁVEIS.

 

Qual é o Limite de Peso Recomendado: Legislação, Conceitos, NIOSH ...

Quatro sombras escuras pairam sobre um país solar que nunca puderam ser dissipadas pela nossa consciência e inconsciência coletivas: a sombra do genocídio dos povos originários,os donos primeiros destas terras.De seis milhões que eram, sobraram apenas um milhão, a maioria por não suportar o trabalho escravo ou pelas doenças dos invasores contra as quais não possuíam nem hoje possuem imunidade. A sombra da colonização que depredou nossas terras e florestas e nos tornou sempre dependentes de alguém de fora, impedidos de forjar nosso próprio destino.

A sombra da escravidão, nossa maior vergonha nacional, por termos transformado pessoas trazidas de África em escravos e carvão a ser consumido nos engenhos de cana de açúcar. Jamais vistas como pessoas e filhos e filhas de Deus mas como “peças” a serem compradas e vendidas, construíram quase tudo o que existe neste país. E hoje, tidos por preguiçosos e presos, compõem mais da metade de nossa população, jogados nas periferias; suportam o ódio e o desprezo antes imposto aos seus irmãos e irmãs das senzala e agora transferidos a eles com uma violência tal como mostrou o sociólogo Jessé Souza (A elite do atraso:da escravidão à Lava Jato, 2007 p.67) até perderem o sentido de sua dignidade.

A sombra das elites do atraso que sempre ocuparam o frágil Estado, usando-o para seu benefício. Nunca forjaram um projeto de nação que incluísse a todos, apenas, com as artes perversas da conciliação entre os endinheirados, apenas um projeto só para eles. Não bastava desprezar os marginalizados, mas rachar-lhes as cabeças, caso se levantassem, como ocorreu várias vezes na sua heroica história da resistência e da rebeldia.

Quando um sobrevivente dessa tribulação, por caminhos de pedras e de abismos, chegou a ser presidente e fez alguma coisa para ajudar a seus irmãos e irmãs, logo criaram as condições perversas para destruir sua liderança, excluindo-o da vida pública e, por fim, a ele e a sua sucessora apeá-los do poder. Essa sombra ganhou contornos de “procelosa tempestade e noturna sombra (Camões) sob o atual governo que não ama a vida, mas exalta a tortura, louva os ditadores, prega o ódio e larga o povo à sua própria sorte, atacado letalmente por um vírus, contra o qual não tem nenhum projeto de salvamento e, desumano, se mostra incapaz de qualquer gesto de solidariedade.

Estas sombras, por serem expressão de desumanização, se aninharam na alma dos brasileiros e brasileiras e raramente puderam conhecer a luz. Agora criaram-se as condições ideológicas e políticas para serem lançadas ao ar como lavas de um vulcão, feitas de boçalidade, de violência social generalizada, de discriminações, de raiva e de ódio de grandes porções da população. Seria injusto culpar a elas. As elites do atraso se internalizaram em suas mentes e corações para fazer que se sintam culpadas de sua sorte e acabem por fazerem seu o projeto deles que, na verdade, é contra eles. O pior que pode acontecer é o oprimido internalizar o opressor com o projeto enganoso de bem estar, sempre lhes sendo negado.

Pois, no atual momento o “cordial da incivilidade” brasileiro irrompe do coração, mostrando a sua forma perversa de ofensa, calúnia, palavras de baixo calão, fake news, mentiras diretas, ataques violentos a negros, pobres, quilombolas, indígenas, mulheres, LGBT políticos de oposição, feitos inimigos e não adversários. Irrompeu, violenta, uma política oficial, ultraconservadora, intolerante, com conotações fascistoides. As mídias sociais servem de arma para todo tipo de ataque, de desinformação, de mentiras que mostram espíritos vingativos, mesquinhos e até perversos. Tudo isso pertence ao outro lado da “cordialidade” brasileira hoje exposta à luz do sol e à execração mundial.

O exemplo vem do próprio governo e de seus fanáticos seguidores, De um presidente se esperaria virtudes cívicas e o testemunho pessoal de valores humanos que gostaria vê-los realizados em seus cidadãos. Ao contrário, seu discurso é eivado de ódio, desprezo, de mentiras e de boçalidade na comunicação. É tão inculto e tacanho que ataca o que é mais caro à uma civilização que é sua cultura, seu saber, sua ciência, sua educação, as habilidades de seu povo e o cuidado da saúde e da riqueza ecológica nacional.

Nunca tanta barbárie, nos últimos cinquenta anos, tomou conta de algum país, como no Brasil, aproximando-o ao nazifascismo alemão e italiano. Estamos expostos à irrisão mundial, feitos país pária, negacionista do que é consenso entre os povos. A degradação chegou ao ponto de o chefe de Estado fazer o humilhante rito de vassalagem e de submissão ao presidente mais bizarro e “estúpido” (P. Krugman) de toda a história norte-americana.

É humilhante constatar que não haja da parte das mais altas autoridades a coragem patriótica para encaminhar, dentro da legalidade jurídica, a destituição ou o impeachment de um presidente que mostra sinais inequívocos de incapacidade política, ética e psicológica para presidir uma nação das proporções do Brasil. Podem fazer-se ameaças diretas à mais alta corte, de fechá-la, de fazer proclamas à volto ao regime de exceção com a repressão estatal que implica e nada acontece por razões arcanas.

As oposições, duramente difamadas e vigiadas, não conseguem criar uma frente compartilhada para opor-se à insensatez do poder atual.

A brutalização nas relações sociais e especialmente entre o povo simples não deve ser imputada a ele, mas às classes oligárquicas do atraso que lograram internalizar neles seus preconceitos e visão obscurantista de mundo. Estas classes nunca permitiram que vingasse aqui um capitalismo civilizado, mas o mantém como um dos mais selvagens do mundo, pois conta com os apoios dos poderes estatais, jurídicos, midiáticos e policiais para abateram qualquer oposição organizada. A “racionalidade econômica” se revela desavergonhadamente irracional pelos efeitos maléficos sobre os mais desvalidos e para as políticas sociais destinadas aos socialmente mais sofridos.

Esse é um texto indignado. Há momentos em que o intelectual se obriga por razões de ética e de dignidade de seu ofício, a deixar o lugar do saber acadêmico e vir à praça e externar sua iracúndia sagrada. Para tudo há limites suportáveis. Aqui ultrapassamos a tudo o que é dignamente suportável, sensato, humano e minimamente racional. É a barbárie instituída como política de Estado, envenenado as mentes e os corações de muitos com ódios e rejeições e levando à frustração e à depressão a milhões de compatriotas, num contexto dos mais atrozes que tiram de nosso meio pelo vírus invisível mais de cem mil entes queridos. Calar-se equivaleria render-se à razão cínica que, insensível, assiste o desastre nacional. Pode-se poder tudo, menos a dignidade da recusa, da acusação e da rebeldia cordial e intelectual.

terça-feira, 25 de agosto de 2020

AS CRIANÇAS NÃO NOS OUVEM, ELAS NOS IMITAM.

 Crianças que não brincam ao ar livre não se preocupam em preservar ...

Você tem alguma memória de brincar na natureza em sua infância? Subir na árvore, deitar na grama, caçar tatu-bola ou construir uma cabana ao ar livre? Infelizmente, é possível que essas memórias estejam em extinção para muitas crianças que vivem no ambiente urbano da atualidade.

Estudos mostram que entre 1997 e 2003 houve um declínio de 50% na proporção de crianças de 9 a 12 anos que passavam tempo em atividades externas nos Estados Unidos. As crianças brasileiras são as que mais passam tempo na frente da televisão e chegam a ficar 90% do tempo em lugares fechados nos grandes centros urbanos.

As consequências dessa desconexão dos pequenos com a natureza estão sendo percebidas, estudadas e colocadas em pauta em diversos contextos e espaços. São levantadas, por exemplo, questões como obesidade infantil, ansiedade, depressão, dificuldades de concentração e menos interação social.

A fala de um dos maiores especialistas da área, entretanto, chamou minha atenção para um aspecto interessante (e preocupante): “Estamos criando um ambiente em que, creio eu, as crianças estão menos vivas.” Richard Louv aponta que um dos principais impactos da desconexão com a natureza é o encolhimento de seu mundo sensorial. Ao invés de terem experiências primárias, diretas e exploratórias com o mundo, crianças estão apenas observando, dialogando e vivenciando o mundo por meio de telas e aplicativos.

As novas tecnologias não envolvem o toque humano e dessa maneira nossos sentidos estão sendo eletrificados e segundo o próprio Louv, corremos o risco de despersonalização da vida humana.

Queremos crianças menos vivas? Tenho certeza que não. Como começar a reverter esse quadro? Nós, adultos, precisamos nos (re)encantar e (re)conectar com a natureza. A grande maioria dos adultos, atualmente, não se sente parte da natureza e a enxerga como um ambiente cheio de riscos, perigos, sujeiras e sem “progresso”. E adivinhem só: as crianças nos observam o tempo todo.

segunda-feira, 24 de agosto de 2020

UMA HISTÓRIA TAL COMO É CONTADA PELOS ÍNDIOS DO AMAZONAS

 

Muda De Buddleia Lilas, Flor Que Atrai Beija Flores !! - R$ 35,00 ...

Em muitas tribos da Amazônia acredita-se que os mortos se transformam em borboletas. Durante o tempo necessário para a purificação, cada qual ganha uma forma adequada. As que se purificam logo, são alvíssimas, com poucas horas de vida e com cores brancas. Penetram diretamente no mundo da felicidade.

As que precisam de mais tempo, são menores, leves e multicores. E as que precisam de muito tempo são maiores, pesadas e com cores escuras.

Todas elas voam de flor em flor, sugando néctar e fortalecendo-se para carregar o próprio peso ao se alçarem ao céu, onde viverão felizes com todos os antepassados e parentes que estão apenas no outro lado da vida. Conta-se naquela floresta a seguinte estória:

Coaciaba, era uma jovem índia, esbelta e de rara beleza. Ficara viúva muito cedo, pois seu marido, valente guerreiro, tombara sob uma flecha inimiga. Cuidava com extremo carinho da única filhinha, Guanambi.

Para aliviar a saudade interminável do marido, passeava, quando podia, pelas margens do rio, vendo as borboletas ou na campina, perto do roçado, onde também esvoaçavam os colibris e outros insetos.

De tanta tristeza, Coaciaba acabou morrendo. Não se morre só de doença, por velhice ou por causa de um vírus maligno da natureza. Morre-se também por saudade da pessoa amada.

Guanambi, a filha, ficou totalmente sozinha. Inconsolável, chorava muito, especialmente, nas horas em que sua mãe costumava levá-la a passear. Mesmo pequena, só queria visitar o túmulo da mãe. Não queria mais viver. Pedia a ela e aos espíritos que viessem buscá-la e a levassem lá onde estivesse a sua mãe.

De tanta tristeza, Guanambi foi definhando dia após dia até que também ela morreu. Os parentes ficaram muito penalizados, com tanta desgraça sobrevindo sobre a mesma família.

Mas, curiosamente, seu espírito não virou borboleta como a dos demais indios da tribo. Ficou aprisionado dentro de uma linda flor lilás, pertinho da sepultura da mãe. Assim podia ficar junto da mãe, como havia pedido aos espíritos.

A mãe Coaciaba, cujo espírito fora, sim, transformado em borboleta, esvoaçava de flor em flor sugando néctar para se fortalecer e encetar sua viagem ao céu.

Certo dia, ao entardecer, ziguezagueando de flor em flor, pousou sobre uma linda flor lilás. Ao sugar o néctar, ouviu um chorinho triste e doce. Seu coração estremeceu e quase desfaleceu de emoção. Reconheceu dentro dela a vozinha da filha querida Guanambi. Como poderia estar aprisionada ai? Refez-se da emoção e disse:

-Filha querida, mamãe está aqui com você. Fique tranquila que vou libertá-la para juntos voarmos para o céu.

Mas deu-se logo conta de que ela era uma levíssima borboleta e que não teria forças para abrir as pétalas, romper a flor e libertar a filhinha querida. Recolheu-se, então, a um canto e, em lágrimas, suplicou ao Espírito criador e a todos os ancestrais da tribo:

-Por amor ao meu marido, valente guerreiro, morto em defesa de todos os parentes, por compaixão de minha filha órfã, Guanambi, presa no coração da flor lilás, eu vos imploro, Espírito benfazejo e a vós todos, anciãos de nossa tribo: transformem-me num pássarinho veloz e ágil, dotado de um bico ponteagudo para romper a flor lilás e libertar a minha querida filhinha.

Tanta foi a compaixão despertada por Coaciaba que o Espírito criador e os anciãos da tribo atenderam, sem delongas, a sua súplica. Transformaram-na num belíssimo beija-flor, leve, ágil, que pousou imediatamente sobre a flor lilás. Sussurrou com voz carregada de enternecimento:

-Filhinha, sou eu, sua mãe. Não se assuste. Fui transformada num beija-flor para vir libertá-la.

Com o bico ponteagudo, foi tirando com cuidado pétala por pétala até abrir o coração da flor. Lá estava Guanambi sorridente, estendendo os bracinhos em direção da mãe.

Purificadas e abraçadas voaram alto, cada vez mais alto até chegarem juntas ao céu.

Desde então se introduziu entre indígenas amazônicos, o seguinte costume: sempre que morre uma criança órfã, seu corpinho é coberto de flores lilás, como se estivesse dentro de uma grande flor, na certeza de que a mãe, na forma de um beija-flor, venha buscá-a para, abraçadas, voarem para o céu, onde estarão eternamente juntas e felizes com todos os antepassados.

OBS: Estes são os povos originais que o governo está deixando morrer pelo covid 19 em nossa rica amazônia.

domingo, 23 de agosto de 2020

EPIDEMIAS: UM NOVO RISCO DO AQUECIMENTO GLOBAL

 

O Perigo das Epidemias Zoonóticas

O despertar de um vírus pré-histórico congelado, o ressurgimento da varíola, a dengue que se instala na Europa, entre outras hipóteses dignas de filmes de catástrofe, estão sendo seriamente estudadas pelos cientistas, preocupados com o risco de epidemias ligadas ao aquecimento global.

A pandemia de Covid-19, com seu vírus sem dúvida procedente de um morcego, expôs os perigos das interferências cada vez mais significativas entre as atividades humanas e a natureza.

Mas o risco de epidemias também pode ser gerado pelas mudanças climáticas, que provocam o deslocamento de mosquitos portadores da malária ou da dengue, e o início do degelo do permafrost, onde micróbios de outras épocas estão presos.

"Nosso maior inimigo é nossa própria ignorância, porque a natureza está cheia de microorganismos", principalmente no permafrost, "verdadeira caixa de pandora", disse Birgitta Evengard, microbiologista da Universidade de Umea, na Suécia.

Uma parte "importante" dos solos permanentemente congelados pode se descongelar em 2100, liberando dezenas ou centenas de bilhões de toneladas de gás de efeito estufa, segundo os especialistas do clima da ONU (Giec).

E não é só isso. "Os microorganismos podem sobreviver em um meio congelado por muito tempo", alerta o professor Vladimir Romanovsky, da Universidade de Alasca, em Fairbanks.

Mamutes e neandertais

Esses organismos revividos atacam somente as amebas. Mas nessas regiões geladas, "os neandertais, mamutes e rinocerontes peludos adoeceram, morreram, caíram. É possível que todos os vírus que causaram seus problemas ainda estejam no solo", alerta o professor Jean-Michel Claverie.

O número de bactérias ou vírus aprisionados é incalculável. O que preocupa é saber se são perigosos e, neste ponto, os cientistas estão divididos.

"O antraz prova que uma bactéria pode dormir no permafrost por centenas de anos e ser revivida", destaca Birgitta Evengard.

Em 2016, na Sibéria, uma criança morreu vítima de antraz mesmo essa bactéria tendo desaparecido da região há 75 anos.

Outros patógenos conhecidos, como os vírus da gripe de 1917 ou da varíola, também estariam preservados nas camadas geladas dos cemitérios árticos onde as vítimas de velhas epidemias foram enterradas.

O "verdadeiro perigo", segundo o professor Claverie, estaria nas camadas profundas que podem ter 2 milhões de anos e que potencialmente escondem patógenos desconhecidos.

Mas, em todo caso, esses patógenos precisariam de um hospedeiro para sobreviver. Um encontro que a mudança climática pode proporcionar.

Doenças tropicais

O aquecimento global pode se tornar também um bom aliado para vírus mais atuais, que já causam estragos no mundo.

Malária, dengue, chikungunya, zika... Alguns mosquitos vetores de doenças tropicais podem chegar à Europa e à América do Norte.

É preciso um hospedeiro, assim como "condições específicas de temperatura para que o patógeno possa se reproduzir no mosquito", diz Cyril Caminade, epidemiologista da Universidade de Liverpool.

Até o momento, o Centro Europeu de Prevenção e Controle de Doenças (ECDC) relatou apenas alguns casos autóctones de doenças que podem ser transmitidas: cerca de quarenta casos de dengue entre 2010 e 2019, dois casos de zika na França em 2019 e várias centenas de casos de chikungunya entre 2007 e 2017, principalmente na Itália.

O Aedes aegypti, principal vetor da dengue, também está sob vigilância.

"Um aumento da temperatura média poderia levar a uma transmissão sazonal da dengue no sul da Europa se o A.aegypti infectado pelo vírus se estabelecer", alerta o ECDC.

Já o risco de retorno da malária nas regiões onde já foi endêmica, na Europa e América do Norte, é menos claro

sexta-feira, 21 de agosto de 2020

A REALIDADE VIRTUAL.

 

Construtivo lança realidade virtual para setor de infraestrutura ...

Agora sabemos para que serve a internet. Para se comunicar, como já era óbvio. Não isola, mas relaciona. Não aliena, mas encoraja. Não elimina a emoção, mas a alimenta. Não é comida, mas sem os pedidos de suprimentos e receitas on-line, seria mais difícil comer agora. Graças ao teletrabalho, as atividades econômicas e administrativas são mantidas. E, assim, o curso na universidade será concluído. Ainda, de acordo com a recomendação do governo da Argentina durante o confinamento, o cibersexo permite relaxar a tensão acumulada.

"Agora entramos totalmente em uma sociedade digital em que já vivíamos, mas que ainda não havíamos assumido."

Manuel Castells

Não haverá volta. Porque o novo normal não será o que conhecíamos. E assim como a saúde pública será nossa garantia de sobrevivência, também será a digitalização completa de nossa organização econômica e social, o que se tornará uma estrutura permanente para manter nossa comunicação em todas as circunstâncias. E a comunicação é a base da vida. “Ah, mas e o fosso digital?” Aqui ainda caminhamos com ideias obsoletas, de duas décadas atrás, quando a crítica social superou a nova realidade tecnológica antes de saber o que era. Bem, veja, para falar apenas da sociedade espanhola, 91,4% dos lares têm acesso à Internet através de um computador. E se contarmos as famílias que têm pelo menos um jovem, elas são 93,3%. Mesmo em cidades com menos de 10.000 habitantes, 74% das famílias têm acesso à Internet. Além disso, naturalmente, temos os locais de trabalho e universidades, onde o acesso e o uso da Internet são a regra.

Mas há algo ainda mais importante: a taxa de penetração das linhas de telefonia móvel por 100 pessoas é de 115%, ou seja, existem mais linhas do que pessoas. 97% das pessoas têm celulares e 87% desses celulares são smartphones, ou seja, um computador com acesso à Internet no bolso. E os antigos? Sim, eles usam menos internet, mas a maioria usa o WhatsApp porque é fácil e permite que eles tenham um relacionamento com a família, amigos e a vida em geral. Isso explica por que 75% das pessoas usam regularmente o WhatsApp.

Em média, uma pessoa passa 5,5 horas por dia online. Ou seja, já tínhamos integrado totalmente (são dados de 2019) a comunicação digital em todas as áreas e é por isso que a transição para novas formas de relacionamento e atividade durante o confinamento foi menos dramática. Em parte, porque este país (a Espanha) possui um bom sistema de telecomunicações e as redes suportaram a explosão do tráfego durante o confinamento, sem incidentes notáveis.

Claro que há desigualdade social na sociedade digital. Como há também na sociedade em geral. O surpreendente seria o oposto. Mas você sabe de uma coisa? A desigualdade no acesso à Internet é muito menor que a desigualdade de renda ou riqueza, na Espanha e no mundo. Tal como o estudo que fizeram na UOC com Mireia Fernández-Ardèvol mostrou para toda a América Latina. O motivo é muito simples: a comunicação é o que as pessoas mais valorizam como recurso, pois é essencial para o trabalho, relacionamentos, informações, entretenimento, educação, saúde e qualquer outra coisa.

Claro que existem problemas muito sérios na transição para o digital. Um exemplo: a implementação desigual de redes atualizadas e programas fáceis de usar. Dois setores em particular são tremendamente deficientes: administração pública e educação não universitária. Certamente, ambos os setores progrediram consideravelmente desde o estudo sobre novas tecnologias na Espanha. Na Idade Média (bem, um pouco menos, nos anos oitenta). Mas eles ainda estão consideravelmente atrás de empresas, instituições financeiras, organizações sociais, imprensa, universidade e até pessoas que navegam sem parar no mundo digital.

No mundo digital não estão apenas os chamados nativos digitais (que serão a maioria em algum tempo), mas qualquer um que queira fazer alguma coisa. Talvez com a respeitável exceção de algum humanista que reivindica seu direito à objeção de consciência de viver no mundo cada vez mais digital que criamos. Uma atitude compreensível como reação aos exageros dos profetas da tecnologia se transformou em vendedores de poções milagrosas. Para aliviar seus medos, eles devem consultar a riqueza da pesquisa científica acumulada na Espanha e no mundo. Estudos mostram que o contato direto entre as pessoas não desaparece com a internet, pelo contrário, é estimulado. As duas formas de sociabilidade são cumulativas. E que um uso mais intenso da internet tem efeitos positivos na satisfação das pessoas, porque a internet favorece dois fatores fundamentais que causam essa satisfação: a densidade das relações sociais e o empoderamento pessoal.

Portanto, nosso mundo é e será necessariamente híbrido, feito de realidade carnal e realidade virtual. É uma cultura da virtualidade real, porque essa virtualidade é uma dimensão fundamental da nossa realidade. E quando ameaças como a atual pandemia surgem sobre nossas vidas, podemos nos retirar, adaptar e recomeçar, sempre em direção ao abraço, que, é claro, não podemos e nem queremos virtualizar.

quinta-feira, 20 de agosto de 2020

CAMINHAR PARA ALCANÇAR

Galp publica plano para alcançar igualdade entre homens e mulheres

Dinâmicas que envolvem a disceptação e o consenso marcam o caminho da humanidade - são indissociáveis nas relações institucionais e interpessoais. É preciso, pois, ter a sabedoria para arquitetar o consenso administrando as divergências. A disceptação sinaliza a arte da convivência com diferenças e diversidades, uma característica das sociedades complexas neste mundo contemporâneo. A divergência, enquanto fenômeno social, é indispensável, inclusive para superar as dissensões. Por isso, ao arquitetar consensos é fundamental suportar o confronto de posicionamentos que podem ser até opostos. Importante lembrar: para se chegar ao entendimento, deve haver fidelidade a valores intocáveis, a exemplo do necessário respeito a quem tem perspectiva divergente.

Renunciar à disceptação, em qualquer processo de escolha, decisão ou definição é um equívoco. O consenso não é sinônimo de unanimidade e menos ainda de uniformização. Ao invés disso, trata-se da articulação das diferenças, gerando uma riqueza a partir da administração inteligente e respeitosa de confrontos. Assim deve ocorrer no ambiente acadêmico, nas articulações políticas, na configuração hermenêutica da prática judiciária, nos contextos religiosos e até mesmo no ambiente doméstico. A disceptação, é oportuno lembrar, se fez presente no início do cristianismo e gerou a primeira assembleia da Igreja, narrada pelo evangelista Lucas nos Atos dos Apóstolos. Nessa assembleia, se construiu um consenso que determinou rumos novos na expansão do cristianismo nascente. Também é importante se recordar do apóstolo Paulo que, no areópago de Atenas, estabeleceu um confronto com seus interlocutores para levá-los a novos entendimentos. A meta era conduzi-los rumo à compreensão mais enriquecida a respeito da religiosidade.

Consensos nascem de articulada administração dos confrontos de opiniões, ideias e compreensões. Assim são estabelecidos os tratados de paz, elaboradas as cartas magnas constitucionais, definidas legislações e prioridades, reconfigurados costumes e hábitos. Não menos complexos são os embates inerentes ao exercício da cidadania e da vivência da fé. Uma sociedade participativa e democrática só se sustenta pela prática dos confrontos de opiniões com o objetivo de buscar convergência para formar o consenso. O respeito a princípios intocáveis e a reverência a valores inegociáveis constituem regra de ouro nesse processo. Esses princípios e valores têm força para não deixar ruir a arquitetura dos entendimentos.

Sabe-se do grande risco que se corre, na administração de confrontos, quando prevalece a rigidez. A rigidez revela falta de equilíbrio emocional para lidar com embates e discordâncias. A contemporaneidade, em contraposição aos avanços tecnológicos e científicos, tem sido palco de intolerâncias e de polarizações até patológicas em razão da rigidez. Isso se revela na incapacidade para o diálogo, que exige o respeito às diferenças e a busca pela harmonia, condições necessárias à construção de entendimentos. Não se estabelece consensos sem discordâncias - e não se administra a disceptação sem reconhecer e respeitar as divergências.

Pode até ser mais cômodo partidarizar-se, se fixar em determinado extremo, do que criticamente posicionar-se diante de tema importante. Mas os resultados serão sempre comprometidos, pois é atitude que estimula a intolerância e revela pouca competência para discernimentos. Sociedades, instituições ou grupos que não investirem na competência humana e espiritual para suportar confrontos e se enriquecer a partir das divergências perderão força. Pela fraqueza de seus integrantes, permanecerão incapazes de curar suas feridas, livrar-se de suas evidentes fragilidades e encontrar respostas adequadas para seus desafios. O consenso nunca será fruto do pensamento uniformizador, mas do diálogo em busca da verdade. É hora de superar a incompetência para lidar com confrontos, caminho para se alcançar consensos.

quarta-feira, 19 de agosto de 2020

APAGAR A LUZ POR UM LONGO PERÍODO.

 

Técnica inusitada para Apagar a Luz sem levantar da Cama conquista ...

Ao que parece, com a ascensão do bolsonarismo e a decadência da esquerda e da direita tradicionais, a tendência é que o Brasil viva um longo período de hibernação civilizatória, comum em sua trajetória de expropriação e escravidão.

O bolsonarismo raiz, como estamos experimentando, ainda é uma novidade no campo da ciência política, que ainda precisa se debruçar sobre sua estrutura e desdobramentos.

A história é cíclica e uma alteração na sua rota é completamente compreensível e até saudável, considerando alguns aspectos. O Brasil já passou pelos ciclos econômicos do pau-brasil, cana-de-açúcar, algodão, ouro, café, da borracha.

Após a revolução industrial ter explodido nos principais países, o Brasil entrou nessa era com pequenas indústrias de bem e consumos, até construir empresas do porte da Siderúrgica Nacional, Vale do Rio Doce e a Petrobrás. A literatura, música popular, culinária e a dança, também passam por processos de acordo com os hábitos e costumes de cada época.

Na nossa história recente passamos por retrocessos, como o período do regime militar, que implantou uma ditadura sanguinária e persecutória, onde a tesoura da censura agia de forma deliberada contra o pensamento livre.

A estética atual nos apresenta uma harmonia desagradável no campo da política e no geral. Não é uma condição indissolúvel a esfera política da essência geral. Na ditadura, por exemplo, quanto mais censuravam os artistas, mais eles produziam, mais acrescentavam, e de maneira definitiva para a cultura.

A questão é que a nova ordem política e social, que veio sob as bênçãos de uma pandemia, parece ter entrado em nossa casa, sentado em nossa mesa, sem que notássemos sua presença nauseabunda e repugnante.

Agora que está alojada em nosso quarto, mudou nossa mobília de lugar, rasgou nossos livros e jogou fora nossas roupas, arrumou suas armas nas gavetas e pendurou suas fardas e suas togas nos cabides.

Pensamos em reagir, mas olhamos para nossos filhos e eles cresceram sentados na frente de um computador, não assistiram desenhos do Hanna-Barbera, não jogaram bola na rua e hoje fazem ‘arminha’ com as mãos e odeiam a esquerda. O sinal está fechado para nós, que somos velhos!

E agora, José? Essa geração está indo no caminho das urnas com o legado das redes de Fake News, são os filhos do bolsa família que não conseguimos politizar, negamo-lhes acesso ao pensamento crítico e independente.

Essa geração sem luta e ideologia, ignorada quando devia ter sido priorizada, somada aos que dependem de benefícios paternalistas e populistas, formam a legião sem rosto que está sendo preparada para apagar a luz por um longo período

terça-feira, 18 de agosto de 2020

NÃO É BOM VIVER NESSA REALIDADE.


Medo e ansiedade com a crise do coronavírus? Conselhos dos ...
Em 1974, com a imprensa censurada, quase toda a esquerda morta, presa, clandestina ou exilada, a três meses das eleições a Ditadura tinha altos índices de aprovação segundo a percepção geral. As eleições se avizinhavam.

O resultado das urnas surpreendeu. Em 16 estados foram eleitos senadores do partido da oposição. A ditadura elegeu apenas 8. Surpresa generalizada. O país vivia o “milagre econômico” e, para espanto de muitos, chegaram ao Senado personagens obscuros, desconhecidos, eleitos pelo simples fato de serem candidatos pela oposição, demonstrando o caráter plebiscitário daquelas escolhas eleitorais, realizadas quando o regime militar contava dez anos desde a usurpação.

No ano anterior, temendo novo desastre eleitoral, a Ditadura editou o “pacote de abril”, criando a figura dos “senadores biônicos”, eleitos pelas assembleias legislativas controladas pela Arena, o “maior partido do ocidente”, que apoiava a Ditadura. O regime tentava se manter como podia. O agosto de 1978 foi tenso. Nas eleições de novembro as urnas consagraram novas vitórias da oposição. A quantidade de votos contra o partido da ditadura foi tão grande que em Curitiba foram eleitos três inexpressivos deputados, com votação em torno de apenas mil votos ou pouco mais, carregados pelos votos na legenda do partido de oposição.

As análises dos cientistas políticos da época eram divergentes, mas com o distanciamento histórico percebe-se hoje que a reprovação do governo decorria fundamentalmente da crítica, sussurrada, à maneira de existir imposta pelos militares. Não era bom viver na ditadura.

O agosto de 2020 nos surpreende com pesquisas de opinião indicando uma melhoria nos índices de aprovação ao governo federal, apesar do desastre econômico e da genocida gestão da crise sanitária.

Tenho insistido, nos meus textos e em minhas análises, que não é bom viver em nossa realidade bolsonara. As pesquisas recentemente divulgadas demonstram que o terço do meio encontra-se dividido, entre o terço bolsonarista/lavajatista/cristão, que apoia o neoliberalismo, e o terço da população que foi derrotado nas últimas eleições e que continua fiel aos fundamentos social-democratas.

Mencionei outro dia que não existe o bolsonarismo, como doutrina. Há bolsonaristas, com distintas motivações, que têm em comum o apoio ao líder populista, por se identificarem com o mito encarnado no repugnante jaguara e com determinados aspectos daquilo que ele representa, com uma proposta geral de relações sociais tidas como desejáveis, com uma maneira de existir em sociedade. Sem Bolsonaro não existe o bolsonarismo. Pelo menos por enquanto. Daí a importância de atingi-lo, debilitá-lo, desmoralizá-lo. Mas isso não basta, parece evidente.

Não me parece inteligente apenas opormos o passado ao presente. Pode ajudar, mas é insuficiente. Não era bom viver no Brasil antes do golpe. Não se choquem com essa afirmação. Não era bom por ser pouco, por haver muito ainda a ser feito. Comparado ao que denomino de realidade bolsonara era infinitamente melhor viver na realidade que tínhamos. O Brasil piorou muito desde o Golpe de 2016.

Sobrevivemos em uma realidade inaceitável, sem governo, autoritária, careta, conservadora, que deprecia a razão, a ciência, a cultura, as artes, a solidariedade, que dilapida o patrimônio natural e que destrói o patrimônio público. E que, ao mesmo tempo, supervaloriza o individualismo, o obscurantismo, a religiosidade, o punitivismo, a meritocracia, a ganância e a soberba. Não é bom viver nessa realidade bolsonara.

A ela, cedo ou tarde, depois do fim do auxílio emergencial que vitamina o governo, será oposto um outro projeto de relações entre as pessoas, uma proposta de uma forma alternativa de viver no futuro (não no passado, que não era tão ruim, percebemos agora; nem neste sufocante presente). Uma nova maneira de existir socialmente haverá de ser concebida, pois a atual é ruim, não pode continuar.

Essa proposta alternativa ainda não amadureceu, está em gestação. Seus primeiros efeitos serão visíveis nos resultados eleitorais deste ano, mais tímidos do que gostaríamos, embora identificáveis. Não é bom viver nessa realidade bolsonara. E se não é bom, haverá mudanças. Questão de tempo e de nossa capacidade em articular uma proposta sedutora de existir em sociedade.

As condições econômicas estão rapidamente se deteriorando. O neoliberalismo é incapaz de dar os resultados que promete. O coiso não romperá com Guedes. A arrogância e a soberba dos integrantes do aparato repressivo estatal, dominado pela Direita Concursada, não serão toleradas por muito tempo. O moralismo se esvai a cada evidência de “pecados” dos líderes espirituais, a cada revelação dos desmandos do lavajatismo, a cada descoberta das íntimas relações do governo com as milícias, a cada evidência de corrupção, a cada demonstração de incompetência dos interventores militares na contenção das mortes pela pandemia.

As contradições entre os diversos grupos bolsonaristas aflorarão com a primavera que se seguirá a este tenebroso agosto de tantas incertezas. Por quê? Porque não é bom viver nessa realidade bolsonara.

segunda-feira, 17 de agosto de 2020

FAMÍLIA FELIZ QUE SABE PREPARAR, SABOREAR E COMPARTILHAR.

40 Melhores Ideias de mesa pronta em 2020 | Cobre jarras, Como ... 



Amor é prato difícil de preparar. Em qualquer circunstância. Mas, em família, o desafio pode ser ainda maior. São muitos ingredientes. Reunir todos é um problema. Não é para qualquer um.

Há os truques, os segredos, o imprevisível. Às vezes, dá até vontade de desistir, mas a vida sempre arruma um jeito de nos entusiasmar de novo e reabrir o apetite.

O tempo põe a mesa, determina quem vai sentar-se nas cadeiras, define os lugares. Súbito, feito milagre, o amor está servido.

E como é gostoso!

Entre os ingredientes, alguns podem ter a graça mais saborosa. Outros vem ao ponto, delicados, dando aquele toque que muda o sabor de qualquer receita.

Uns chegam derretendo feito algodão doce. Outros são consistentes como um pudim bem feito. Ou pode ser tudo ao contrário, pois que nessas receitas de amor em família os ingredientes podem se embaralhar, sem perder a magia do sabor.

Então, estão prontos? Ótimo. Por que tá na hora de pôr um avental, pegar a tábua, os ingredientes todos que a vida lhes deu e tomar alguns cuidados.

O primeiro deles: temperos exóticos alteram o sabor do amor. Mas, se misturados com delicadeza, estas especiarias que nos parecem estranhas ao paladar tornam o amor muito mais colorido, interessante e saboroso.

Segundo cuidado: atenção aos pesos e medidas. Evite exageros. Uma pitada a mais disso ou daquilo e, pronto: pode ser um verdadeiro desastre. Amor em família é prato extremamente sensível. Tudo tem de ser muito bem pesado, muito bem medido. Uma dose a mais de impaciência pode azedar o amor para sempre. Falta de delicadeza e cuidado podem secar a massa do coração e deixá-la dura como pedra.

Terceiro cuidado: No amor, somos todos amadores. Por isso, cultivem amizades para além da família. Coisa boa é uma mesa farta, cheia de amigos ao redor. Amigos verdadeiros podem ajudar se a receita da família ameaça desandar.

Se a vida lhes der uma cebola para descascar e picar não se envergonhem de chorar. Amor em família é prato que emociona. E a gente chora mesmo. Às vezes de alegria, às vezes de raiva, outras de tristeza.

Se o prato principal salgar demais, tem sempre a possibilidade de uma sobremesa chamada perdão. Com um detalhe. Momentos de doçura sempre são mais gostosos de saborear em família...

E, não se esqueçam: cozinha é lugar sagrado na casa de toda família. Cuidado se alguém decidir meter a colher. Às vezes o amor mais saboroso azeda porque alguém, com a melhor das intenções, resolveu meter a colher. Isso às vezes complica, pois cada família tem seu tempero, seu jeito de cozinhar as relações. Há situações em que a melhor opção é o banho-maria. Outras em que é preciso uma boa panela de pressão. Há momentos de fogo brando, outros de panela fervendo. Ouçam os outros, copiem receitas, comparem a lista de ingredientes, aproveitem o que for possível e façam o prato do jeito que a família dá conta.

É que tem gente que acredita na receita de amor perfeito. Bobagem. Ilusão. Amor perfeito só o doce. E há quem não goste.

Tenham calma, paciência. Amor é prato que nunca está inteiramente pronto. E é sempre à moda da casa.

Há amores doces, outros, meio amargos. Há amores apimentadíssimos. Há até os que não têm gosto de nada, tipo assim, um amor diet, que você suporta só para manter a linha.

Seja como for, amor é prato que deve ser servido sempre quente, quentíssimo. Um amor frio é insuportável, impossível de engolir.

Receita de amor em família a gente vai aprendendo aos poucos, improvisando e transmitindo o que recebeu pra quem chegar.

Cata uma palavra ali, um gesto acolá, aprende o sabor e o valor de um carinho, acrescenta uma pitada que faltava, faz uma combinação entre o agridoce das despedidas e dos reencontros, das ausências e saudades.

Enfim, anotem tudo no caderno da memória.

Muito da beleza e do sabor do amor em família se perde na lembrança por falta de cuidado. Pois assim como as verduras na horta “precisam de água, ar, luz e calor, o amor precisa, para viver, de emoção e de alegria. E tem que regar todo dia...”.

Pra terminar, o que este veterano cozinheiro pode dizer a vocês é que, por mais sem graça, por pior que seja o paladar, amor em família é prato que vocês tem que experimentar. Gostaram? Então, saboreiem. Não liguem para etiquetas. Podem lamber os dedos, passar o pão naquele molhinho que ficou no prato, estalar a língua e dizer: que delícia!

A cozinha da vida nos espera. A todos, bom apetite. E aproveitem ao máximo. Amor é um prato que, quando acaba, pode nunca mais se repetir!

Amor: feliz a família que sabe preparar,
saborear e compartilhar!

domingo, 16 de agosto de 2020

MARIA MADALENA.

Maria Madalena: A Igreja continua escondendo o segredo de Madalena ...

Não sou eu quem digo e sim Eça de Queiroz, o grande escritor português que se destacou por, além de seu gênio incontestável, apresentar em seus escritos um impiedoso anticlericalismo. Em seu livro A Relíquia, Eça fala pela boca de um historiador em Jerusalém:

Depois de amanhã, quando acabar o Sabá, as mulheres de Galileia voltarão ao sepulcro de José de Ramata, onde deixaram Jesus sepultado... E encontram-no aberto, encontram-no vazio!... "Desapareceu, não está aqui!..." Então Maria de Magdala, crente e apaixonada, irá gritar por Jerusalém – "ressuscitou, ressuscitou!" E assim o amor de uma mulher muda a face do mundo, e dá uma religião mais à humanidade!

Parece incrível que o tresloucado amor de Maria de Magdala - mais conhecida como Maria Madalena - pelo Nazareno crucificado tenha conseguido esse feito: mudar o mundo e inaugurar uma nova religião. E, no entanto, se lemos bem o Evangelho, sobretudo o de João, poderemos ver que assim é a narrativa.

A desolação reinava entre os discípulos. O Mestre fora morto, executado, deixara um vazio impossível de preencher e a esperança jazia morta no chão. Maria de Magdala chega, então, com a boa nova, o evangelho, a boa notícia: aquele que vocês viram morto está vivo. Ressuscitou!

Não acreditaram nela mas foram ao sepulcro. E o encontraram vazio, em uma ausência grávida da presença pascal daquele que teriam agora que reconhecer de outro modo. A desolação foi dissipada pela esperança renascida e pelas manifestações do Ressuscitado, que confirmariam o anúncio da mulher crente e apaixonada.

Antes da experiência que mudaria a vida dela e de todos, Maria, a de Magdala, também experimentava profunda tristeza. Foi ao túmulo de manhã cedo, apressada e com o coração batendo disparado. Queria homenagear aquele que amava tanto, prestar-lhe cuidados e ungir com perfume seu corpo morto.

Porém, no jardim onde estava o túmulo no qual o haviam enterrado não havia nada, a não ser silêncio e ausência. O túmulo vazio doía mais do que a visão do cadáver que esperava encontrar. E Maria chorou desconsolada. Ao jardineiro que lhe perguntou a razão do pranto, explicou que haviam tirado o seu Senhor e não sabia onde o haviam posto. E pediu: Senhor, se foste tu que o levaste, diz-me onde está que irei buscá-lo.

Ah, a força do amor de uma mulher. Não há impossíveis para ele. Ao longo da vida vimos mães que curam filhos desenganados por médicos; esposas que trazem de volta à vida seus companheiros mergulhados na depressão ou em paralisias várias, mulheres capazes de atravessar estepes nevadas ou desertos escaldantes em busca do encontro com aquele que seu coração deseja.

Não havia obstáculos para Maria naquele momento. Ela iria até o fim do mundo para encontrar seu amado. Bateria em todas as portas, enfrentaria qualquer autoridade, civil ou religiosa, nenhuma intempérie seria dura demais para seu coração apaixonado.

No entanto, não foi preciso, pois o amado em pessoa veio ao seu encontro e disse seu nome: Maria. E ela respondeu: Mestre. Como não gritar então pelas ruas de Jerusalém? Como não proclamar aos quatro ventos que ele ressuscitou? Como não anunciar que a esperança pode renascer e a alegria reinar, pois não é mais necessário buscar entre os mortos aquele que está vivo?

Assim é a história dessa mulher, apóstola dos apóstolos, primeira testemunha da Ressurreição, que inaugura um novo tempo na história da humanidade. Em uma sociedade patriarcal, onde as mulheres não podiam sequer testemunhar em processos jurídicos por não ser válido seu testemunho, Maria de Magdala, de quem Jesus havia expulsado sete demônios, abriu a boca e falou sobre o que viu e ouviu. E seu testemunho mudou a face do mundo.

Creram nela e repetiram e difundiram seu anúncio. E depois muitos e muitas creram neles, transformados de discípulos em apóstolos. E creram por causa dela. No dia 22 de julho, celebramos seu dia, que o Papa Francisco elevou à categoria de Festa para sublinhar sua importância no culto e na liturgia.

Nestes tempos tão tenebrosos, onde tudo parece obscurecer-se e quando os horizontes se atrofiam sobre nossas cabeças, não nos esqueçamos do poder que tem o amor de uma mulher. O amor dessa mulher mudou o mundo. O amor de toda mulher tem potencial transformador e terapêutico. Com seu corpo que é sede da vida, a mulher que ama diz com a paixão de Maria Madalena que a morte não tem a última palavra, pois a vitória definitiva é da vida, que é o outro nome de Deus.