domingo, 25 de dezembro de 2022

QUERO UM ANO NOVO

 


Quero um Ano Novo onde, se Deus quiser, todas as crianças, ao ligarem seus apetrechos eletrônicos, recebam um banho de Mozart, Pixinguinha e Noel Rosa; aprendam a diferença entre impressionistas e expressionistas; vejam espetáculos que reconstituem a Balaiada, a Confederação do Equador e a Guerra dos Emboabas; e durmam após fazer suas orações.

Quero um Ano Novo em que, no campo, todos tenham seu pedaço de terra, onde vicejem laranjas e alfaces, e voejem bem-te-vis entre vacas leiteiras. Na cidade, um teto sob o qual reluz o fogão de panelas cheias, a sala atapetada por remendos coloridos, a foto colorida do casal exposta em moldura oval sobre o sofá.

Espero um Ano Novo em que as igrejas abram portas ao silêncio do coração, o órgão sussurre o cantar dos anjos, a Bíblia seja repartida como pão. A fé, de mãos dadas com a justiça, faça com que o céu deixe de concentrar o olhar daqueles aos quais é negada a felicidade nesta terra.

Um Ano Novo Feliz com casais ociosos na arte de amar, o lar recendendo a perfume, os filhos contemplando o rosto apaixonado dos pais, a família tão entretida no diálogo que nem se dá conta de que a TV e os celulares são aparelhos mudos e cegos num canto da sala.

Desejo um Ano Novo em que os sonhos libertários sejam tão fortes que os jovens, com o coração a pulsar ideais, não recorram à química das drogas, não temam o futuro nem se expressem em dialetos ininteligíveis. E que compareceram às urnas em outubro para resgatar as políticas públicas de proteção social, a redução da desigualdade social, a autoestima do povo brasileiro e a soberania nacional.

Espero um Ano Novo em que cada um de nós evite alfinetar rancores nas dobras do coração e lave as paredes da memória de iras e mágoas; não aposte corrida com o tempo nem marque a velocidade do tempo pelos batimentos cardíacos.

Um Ano Novo para saborear a brevidade da vida como se ela fosse perene, em companhia de ourives de encantos.

Quero um Ano Novo em que a cada um seja assegurado o direito do emprego, a honra do salário digno, as condições humanas de trabalho, as potencialidades da profissão e a alegria da vocação.

Rogo por um Ano Novo em que a polícia seja conhecida pelas vidas que protege e não pelos assassinatos que comete; os presos reeducados para a vida social; e que os pobres logrem repor nos olhos da Justiça a tarja da cegueira que lhe imprime isenção.

Um Ano Novo sem políticos mentirosos, autoridades arrogantes, funcionários corruptos, bajuladores de toda espécie. Livre de arroubos infantis, seja a política a multiplicação dos pães sem milagres, dever de uns e direito de todos.

Espero um Ano Novo em que as cidades voltem a ter praças arborizadas; as praças, bancos acolhedores; os bancos, cidadãos entregues ao sadio ócio de contemplar a natureza, ouvir no silêncio a voz de Deus e festejar com os amigos as minudências da vida – um leque de memórias, um jogo de cartas, o riso aberto por aquele que se destaca como o melhor contador de anedotas.

Desejo um Ano Novo em que o homem jamais humilhe a mulher; a professora de cidadania não atire papel no chão; as crianças cedam o lugar aos mais velhos; e a distância entre o público e o privado seja espelhada pela transparência.

Quero um Ano Novo de livros saboreados como pipoca, o corpo menos entupido de gorduras, a mente livre do estresse, o espírito matriculado num corpo de baile ao som dos mistérios mais profundos.

Espero um Ano Novo cujo principal evento seja a inauguração do Salão da Pessoa, onde se apresentem alternativas para que nunca mais um ser humano se sinta ameaçado pela miséria ou privado de pão, paz, saúde, educação, cultura e prazer.

Um Ano Novo em que a competitividade ceda lugar à solidariedade; a acumulação à partilha; a ambição à meditação; a agressão ao respeito; a idolatria ao dinheiro ao espírito das Bem-Aventuranças.

Aspiro a um Ano Novo de pássaros orquestrados pela aurora, rios desnudados pela transparência das águas, pulmões exultantes de ar puro e mesa farta de alimentos despoluídos.

Um Ano Novo que seja o último da Era da Fome.

Desejo um Feliz Ano Novo de muita saúde e paz aos meus pacientes leitores – os que concordam e também os que discordam.

Rogo por um Ano Novo que jamais fique velho, assim como os carvalhos que nos dão sombra, a filosofia dos gregos, a luz do Sol, a sabedoria de Jó, o esplendor das montanhas do Rio Grande do Sul, a literatura de Machado e Rosa.

Desejo um Ano Novo tão novo que traga a impressão de que tudo renasce: o dia, a exuberância do mar, a esperança e a nossa capacidade de amar. Exceto o que no passado nos fez menos belos, generosos e solidários.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

NATAL

 


Neste Natal, não quero o Papai Noel das promoções comerciais, das ceias pantagruélicas, dos presentes caros embrulhados em afetos raros. Quero o Menino nascido esperança em um pasto de Belém, e Maria a cantar que os abastados serão despedidos de mãos vazias e os pobres, saciados de bens.

Não quero o Papai Noel do celofane brilhante das cestas de produtos importados e das garrafas nas quais os néscios afogam tristezas rotuladas de alegrias. Quero o Menino palestino em busca de uma terra onde nascer e viver, o Menino judeu arauto da paz aos homens e mulheres de boa vontade, o Menino poupado da estupidez das guerras.

Neste Natal, dispenso abraços protocolares e sorrisos sob medida, sentimentos retóricos e emoções que encobrem a aridez do coração. Quero o amor sem dor, a oração só louvor, a fé comungada com sabor de justiça. Não quero presentes dos ausentes, a litúrgica reverência às mercadorias, a romaria pagã aos templos consumistas. Quero o pão na boca da criança faminta, o acolhimento aos refugiados, a paz aos espíritos atribulados, o gozo de contemplar o Invisível.

Neste Natal, não quero troca de produtos entre mãos que não se abrem em solidariedade, compaixão e carinho despudorado. Quero o Menino solto no mais íntimo de mim mesmo, a semear ternura em todos os canteiros em que as pedras sufocam as flores. Quero o silêncio indevassável do mistério, o canto harmônico da natureza, a mão que se estende para que o outro se erga, a fraternura de amigos abençoados pela cumplicidade perene.

Neste Natal, não me interessam as oscilações dos índices financeiros, as promessas viciadas dos políticos, os cartões impressos a granel, cheios de colorido e vazios de originalidade. Quero as evocações mais ternas: o cheiro do café coado pela avó, o som do sino da matriz, o rádio Philco exalando sabonete Eucalol, enquanto a babá me via brincar no quintal.

Não quero as amarguras familiares que se guardam como poeira nas dobras da alma, as invejas que me alienam de mim mesmo, as ambições que me tornam tristes como as galinhas, que têm asas e não voam. Quero os joelhos dobrados no átrio da igreja, a cabeça curvada ao Transcendente, a perplexidade de José diante da gravidez inusitada de Maria.

Neste Natal, não irei às ruas febris dos mercadores de bens finitos, não disfarçarei em algodão a neve que se amontoa em meus dessentimentos, nem prenderei falsas sinetas no frontispício de minha indiferença. Quero o segredar dos anjos, a alegria desdentada de um pobre reconhecido em seu direito, a euforia imaculada de um bebê acolhido em braços amados. Não viajarei para longe de mim mesmo. Mergulharei no mais profundo de mim, lá onde as palavras se calam e a voz de Deus se faz ouvir como apelo e desafio.

Neste Natal, não entupirei o meu verão de castanhas e nozes, panetones e carnes gordas. Porei sobre a mesa Deus fatiado em pão, a entornar vinho em cálices alados, e convidarei à festa os famintos de bem-aventuranças. Não rezarei pela bíblia dos que professam o medo, nem acenderei velas aos guardiões do Inferno. Não serei o alpinista de cobiças desmedidas, nem o coveiro de utopias libertárias. Desfraldarei sobre o telhado a bandeira de sonhos inconfessos e semearei estrelas no jardim de meus encantos, lá onde cultivo essa doce paixão que me faz sofrer de saudades do que é terno.

Neste Natal, não aceitarei os brindes de mãos que não se tocam, nem irei às ceias dos que se devoram. Não comerei do bolo que empanturra corações e mentes, nem deixarei que a aurora do Menino me surpreenda empanzinado de sono.

Sairei na noite feliz guiado pela estrela dos magos, dançarei aleluias entre as sendas da Via Láctea e, pela manhã, injetarei poesia em cada raio de sol para que todos acordem inebriados como se fossem borboletas livres do casulo

segunda-feira, 12 de dezembro de 2022

MUNDO A DERIVA.


Até meados do século XX, a mobilidade humana era muito restrita. As pessoas mantinham vínculos comunitários mais estreitos. Relacionavam-se, por toda a vida, com familiares, amigos, frequentadores da mesma igreja ou do mesmo clube. Se viagens ocorriam, eram periódicas, e quase nunca para lugares muito distantes dos limites da cidade. Avós, pais e irmãos moravam, quase todos, próximos uns dos outros. Isso reforçava os elos comunitários, a autoidentidade, o senso de agregação. Os laços de sangue falavam mais alto que o padrão de vida ou o nível de cultura.

Tudo isso ruiu com a mobilidade geográfica facilitada pela pós-modernidade. O barco que conduzia o clã familiar congregado foi de encontro aos penhascos da sociedade consumista e se estilhaçou. Todos ficaram à deriva.

Hoje, nessa enorme gaiola de cimento e ferro, chamada prédio de apartamentos, o vizinho de porta nada sabe a respeito de quem mora ao lado. Estão todos condenados à perda de identidade, ao anonimato, à estranheza. Enquanto na “aldeia” os olhares eram de familiaridade e acolhimento, agora são de suspeita e medo. Como diria Sartre, o outro é, potencialmente, o inferno. Como preservar a autoestima se a pessoa não se sente estimada?

Soma-se a isso um novo fator que agrava a ansiedade, a solidão, as atitudes narcísicas: a aldeia digital. Assim como as pessoas buscam grupos com os quais se identificam (clube, igreja, associação, núcleo cultural etc.), elas também se inserem em vários nichos internáuticos no esforço de se afirmarem socialmente. O ser humano não pode prescindir do olhar benfazejo do outro. Mas o espaço cibernético é substancialmente narcísico. A pessoa posta algo – mensagem, foto, meme etc. – como quem joga um peixe no lago cercado de pescadores. Ansiosa, quer saber quem fisgou a sua postagem, se interagiu e de que maneira. E mergulha no círculo vicioso da digitação constante.

Se no espaço urbano, onde os laços familiares estão geograficamente distanciados, prevalece a desconfiança, no virtual isso se torna mais acentuado. Como no paradoxo do gato de Schrodinger, o outro com quem você se relaciona pode ser e pode não ser ele. E, como é natural, cada um busca ser reconhecido dentro daquela bolha. Quando alguém posta é também em busca de si mesmo. O smartphone funciona como um espelho, no qual bilhões esperam ver a sua imagem melhorada. E o retorno, muitas vezes, é a desconstrução de quem postou. Ninguém ingressa na arena de boxe para presenciar a luta, e sim para esmurrar o outro até que ele seja aniquilado. E isso é mais fácil quando o outro é um estranho. O outro, nessa arena virtual, é sempre um concorrente, e não um parceiro.

Daí a usina do ódio, das fake news, de tudo que faça um sobressair sobre os outros. A emoção prevalece sobre a razão. E a imposição sobre o diálogo. Não se procura ter parceiros e, sim, seguidores. Milhões de pequenos ditadores emitem a sua verdade sobre o mundo, ainda que seja uma clamorosa mentira, e assim fuzilam virtualmente todos que se lhe opõem.

Um exemplo dessa tendência de isolamento e agressividade é a crescente venda de veículos utilitários (SUVs), próprios para zonas rurais, nas classes altas de áreas urbanas. Além de não serem adequados para trafegarem na cidade, criam nos passageiros uma sensação de proteção e poder. Muitos adicionam à marca modelos com expressões típicas de conflito e belicismo: Defender (defensor), Raider (agressor), Crossfire (fogo cruzado), Tracker (perseguidor), Compass (renegado), Kicks (chutes).

Convém escutar os sábios: “É chegado o momento, não temos mais o que esperar. Ouçamos o humano que habita em cada um de nós e clama pela nossa humanidade, pela nossa solidariedade, que teima em nos falar e nos fazer ver o outro que dá sentido e é a razão do nosso existir, sem o qual não somos e jamais seremos humanos na expressão da palavra” (Rubens Alves: “A Escutatória”).




Frei Betto

quarta-feira, 7 de dezembro de 2022

ADVENTO DA FRATERNIDADE,

Cantada em verso e em prosa, a trilogia igualdade, fraternidade e liberdade precisa inspirar e desafiar, cotidianamente, os cidadãos. Desafio e inspiração que equilibram e fecundam a identidade e a missão das instituições responsáveis por configurar as feições da sociedade. Desconsiderar os princípios da igualdade, fraternidade e liberdade é enfraquecer a democracia. Significa também distanciar as relações sociais, políticas e econômicas dos parâmetros de inegociável racionalidade e sustentabilidade. As deteriorações humanas, comprovadas pelos cenários de desigualdade social e violência, são consequências desse distanciamento. Por isso mesmo, os princípios essenciais à democracia permanecem consolidados por legislações em cartas magnas, incorporados em indispensáveis e arrojadas políticas públicas, fecundados por valores culturais. Trata-se, pois, de uma luta prioritária trabalhar pela garantia e exequibilidade dessas importantes bases que são também horizontes inspiradores. Ressalte-se: dentre essas bases, o princípio da fraternidade tem peculiaridades e dinâmicas próprias. É determinado por modos de agir que se relacionam com o que cada pessoa leva no coração, sustentando o exercício cidadão nos parâmetros da vocação missionária de se promover o bem comum, a justiça e a paz. O ser humano é instado a ter no horizonte de seu caminho a responsabilidade de manter acesa a chama do advento da fraternidade.

O advento da fraternidade depende de práticas e de referências importantes, inspiradoras e impulsionadoras de novos ciclos, novas dinâmicas. Assim, é capaz de ajudar a construir novos tempos, qualificando o ser humano para se relacionar com o seu semelhante. Isto significa também gerar mais equilíbrio e justiça social na sociedade. No horizonte do advento da fraternidade surge a pessoa de Jesus Cristo, conforme sempre evidencia a Igreja, de modo novo e apaixonado, especialmente no tempo de preparação para o Natal. A pessoa de Jesus Cristo é a centralidade da celebração do Natal, oportunidade para encontrá-lo. O Mestre é Aquele que vem, inspirando a ida de todos ao encontro Dele. A presença de Jesus carrega, no seu significado e alcance, tudo o que se pode encontrar de bom, propício e fecundo em igualdade, liberdade e fraternidade. Sua mensagem condensa as bases da experiência da fraternidade, que alavanca a vivência da liberdade e da igualdade.

A fraternidade tem uma essencialidade simples. Permite, a partir do coração, reconhecer, valorizar e amar todas as pessoas independentemente de sua proximidade física, do ponto da terra onde nasceu ou reside.

Legislações indispensáveis, para garantir a defesa de direitos e a promoção da justiça, são muito importantes, e precisam de redação assertiva ancoradas nos princípios da igualdade e da liberdade. De modo ainda mais profundo, a fraternidade exige o coração humano, que precisa ser berço-fonte de uma espiritualidade que fecunde a interioridade, produzindo convicções capazes de efetivar a longanimidade de um querer bem universal. Universal sem generalizações, mas abrangente na especificidade de ser irmão e irmã de verdade e efetivamente de todos. O advento do Natal do Senhor carrega a força transformadora da fé, garantindo, incondicionalmente, a competência de enxergar o próximo para além de eventuais afinidades, interesses, programas ou projetos partilhados. A fraternidade humana constitui capítulo central na vida dos discípulos de Jesus, comprometidos com a salvaguarda da criação, unidos a todas as pessoas, especialmente aos mais pobres e necessitados. A fraternidade humana é, pois, um valor transcendente, que fortalece a indispensável e urgente solidariedade, inspirando profecia, lucidez das escolhas e respostas para problemas sociais.

Confrontos raivosos ou imposições não comunicam o amor de Deus, não curam feridas e nem levam a entendimentos iluminadores. A fraternidade é o caminho certo e singular para se alcançar a verdadeira paz interior. Uma fonte de sabedoria que conduz o ser humano à justiça, na via da igualdade e da liberdade. Com o advento do Natal do Senhor fecunde-se a efetivação do advento da fraternidade.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

QUANDO PEÇO "CHUVA" LEVO O "GUARDA-CHUVA".

 

Naquele tempo: Os apóstolos disseram ao Senhor: ‘Aumenta a nossa fé!’ O Senhor respondeu: ‘Se vós tivésseis fé, mesmo pequena como um grão de mostarda, poderíeis dizer a esta amoreira: `Arranca-te daqui e planta-te no mar’, e ela vos obedeceria.

O amigo José Batista, lá das memórias da sua infância, conta uma história que é bem capaz de ajudar na compreensão do Evangelho:

...A seca naquela parte do sertão nordestino já durava mais de ano. Roça perdida, animais em pele e osso. Povo e bicho bebendo do resto da mesma água que resistia no fundo das derradeiras cacimbas. O padre convoca o povo para uma procissão até os pés da Cruz no do morro. Lá no alto o encerramento com a missa implorando pela ansiada chuva. Desde a manhã vão chegando pelas estradas poeirentas homens, mulheres e muitas crianças. Brota gente de toda parte para participar da cerimônia. Ladainhas, terços e variados cantos de súplica são entoados morro acima. Chegados lá no alto o tempo vira de uma vez. Grossas nuvens se aproximam rapidamente. Formam rolos que assustam o bando de crianças ladeando o altar. Várias delas vestidas de anjos. A missa nem começara quando despenca a chuva. Forte e barulhenta ela vem bonita, levanta do chão o agradável cheiro da terra molhada. “Deus é bom!”, grita na alegria o sacerdote para a assembleia. Mais de mil pobres se banhando na água abençoada. É então que ele observa o inusitado. No meio do mar de gente tem um guarda-chuva aberto. Surpreso com o que vê, pergunta ao velho protegido do aguaceiro se ele sabia que iria chover. “Mas o senhor não nos chamou para pedir a Deus pela chuva?” Foi só o que aquele homem lhe respondeu.

O Evangelho de Lucas começa nos falando do pedido dos discípulos para que lhes fosse aumentada a fé. Para que a tivessem a ponto até de provocar a chuva, como o velho da história tinha toda convicção de que viria. E Jesus lhes responde alertando para a pequenez da fé que carregamos. Diz-nos que se ela for aumentada seremos capazes de maravilhas insuspeitadas.

Alargar a fé é o mesmo que nos entregarmos, mais confiadamente, nas mãos de nosso Senhor. Ou, como exorta Paulo a Timóteo, que reavivemos em nós “a chama do dom de Deus”, “guardando o precioso depósito” da fé e do amor no coração.

Aumentar a fé não é abandonar o que precisamos fazer nas mãos do Pai. É fazer tudo, como se cada detalhe só dependesse do trabalho que executamos e confiar plenamente, sabedores de que a obra é dele e que tudo o que é feito de bom é porque Ele está agindo em nós.

Por isto, é necessária a tomada de consciência de que nada do que fizermos será por grandeza, ou mérito próprio. É Deus quem age em cada um, quando construímos algo que torne mais presente o Reino. Fazer o bem é nossa obrigação e é a graça e a bondade do Senhor que nos encaminha para ela.

A fé é sempre um salto no escuro. É um ato de confiança naquele que não vemos, mas sabemos que está conosco, nos protege e acolhe. Por isto, ela não deve permanecer estável, mas viver sempre no dinamismo do crescimento.

Crescer na fé é aceitar que irão ocorrer as dúvidas. Sim, a impossibilidade de enxergar o outro lado gerará a incerteza. Com certeza que a fé pressupõe a dúvida e isto não deve nos causar medo. A dúvida é convite para que entremos mais nos mistérios de Deus, para que estudemos e nos deixemos levar mais pelo seu Amor.

Será na crise que iremos aprofundar as raízes da confiança em Deus no nosso coração. A fé que não experimenta crises, que não se sente interpelada pelas dúvidas, vai perdendo substância. Fica tal qual a árvore que não se enraíza profundamente. Ao primeiro vendaval correrá grande risco de cair. Peçamos ao Senhor que nos dê mais fé, eis que ela é dom, é presente dele para cada um de nós.

Para reflexão:

– Quando peço “chuva” levo o “guarda-chuva”