sábado, 29 de abril de 2017

UM POUCO DE CINEMA



A produção é de 1985. Para uns, um filme antigo. Para outros, um clássico do cinema. Sem dúvida, um filme autoral, Como, aliás, a maioria dos dirigidos por Woody Allen. Para uns, um gênio. Para outros, um psicopata que transfere para seus personagens – muitos interpretados por ele mesmo – suas neuroses pessoais.

Me coloco na lista dos que gostam de seus filmes. Verdade que nem todos são geniais. Mas ninguém pode ser genial o tempo todo... Dentre os mais de 40 filmes por ele dirigidos, um dos que mais me fascinam pela sensibilidade no trato do tema e dos personagens, é “A Rosa Púrpura do Cairo”. O roteiro é simples: durante a Grande Depressão, uma garçonete (Cecília, vivida por Mia Farrow, então esposa do diretor) que sustenta o marido bêbado (Monk, por Danny Aiello), desempregado, violento e grosseiro, costuma fugir da realidade assistindo sessões seguidas de seus filmes prediletos. Ao assistir pela quinta vez o filme "A Rosa Púrpura do Cairo", ela tem uma grande surpresa. O herói (Tom Baxter, interpretado por Jeff Daniels) sai da tela e lhe oferece uma nova vida.

Se o roteiro é simples, o tema é complexo. Para os dois, Cecília e Tom, na medida em que a relação avança, trata-se de solucionar o dilema entre viver no mundo real, mesmo cheio de dificuldades, ou entregar-se à felicidade num mundo irreal que, ao ser adentrado, destruiria a identidade de seu personagem.

O filme é de 1985. Naquele tempo – pré-história para as novas gerações! – as fronteiras entre o real e o imaginário eram bem estabelecidas. A internet estava engatinhando e Marc Zuckenberg, o criador do Facebook, ainda não tinha completado um ano... Mas a problemática continua muito viva e atual: vale a pena a felicidade quando ela vive da fantasia e destrói a própria identidade?

Em tempo: o título deste texto faz explícita referência à música “Somos quem podemos ser” do Engenheiros do Hawaii. Coincidentemente, uma música antiga. É de 1988! Se não aconteceu, podia ter acontecido: para compor a letra, Humberto Gessinger se inspirou no “A Rosa Púrpura do Cairo” de Woody Allen. Se alguém tiver intimidade com o Humberto, poderia perguntar e nos esclarecer a duvida...

sexta-feira, 28 de abril de 2017

PARA EVITAR UM NOVO GOLPE DE ESTADO.

O eminente jurista Fábio Konder Comparato numa entrevista na Carta Capital de 12 de abril de 2017 ponderou que face à desmoralização dos dirigentes políticos e da corrupção generalizada “é bem possível outra intervenção extralegal para impedir a continuação disso tudo; não está fora de cogitação um novo golpe de Estado”.

Os agentes desse novo golpe seriam, segundo Comparato, “os empresários (a minoria rica) e os proprietários por um lado, e por outro, os principais agentes do Estado. Para agentes de Estado deduzo que se trataria do Ministério Público, da OAB e acrescentaria ainda a Polícia Federal e alguns ministros do STF.

Meu temor é que os grupos acima citados utilizem a mesma estratégia que vigorou em 1964: as oligarquias usaram o poder militar para dar um golpe de classe como foi mostrado de forma irrefutável por René Dreifuss: na sua tese de Glasgow:”A conquista do Estado, ação política, poder e golpe de classe” (Vozes 1981, 841 pp.):”o que houve no Brasil não foi um golpe militar, mas um golpe de classe com uso da força militar”(p.397).

A barafunda total da atual política, corroída pela corrupção de cima abaixo, desmascarada pelas delações da Odebrecht (outras ainda virão) torna a continuidade do atual governo altamente problemática. A ilegitimidade do presidente e de grande parte dos parlamentares das duas Casas, sob acusação de graves delitos, torna vergonhosa a celeridade conferida às mudanças, claramente anti-populares e até anticonstitucionais.

Esse golpe pode ser dado a qualquer momento, pois os empresários estão eles mesmos se sentindo prejudicados especialmente nos níveis costumeiros de alta acumulação. Resta saber se os militares aceitariam tão espinhosa tarefa. Mas eles se sentem os guardiães da República, pois foram eles que puseram fim à Monarquia. Em momentos tão graves como os atuais, poderão se sentir urgidos, mesmo a contragosto, a assumir esta responsabilidade nacional.

Se isso ocorrer, provavelmente um triunvirado de generais assumiria o poder, fecharia o congresso, mandaria prender os principais políticos acusados de corrupção, não poupando, apenas dando uma forma privilegiada ao presidente Temer, aposentaria coercitivamente Gilmar Mendes o mais parcial dos ministros do STF, obrigaria a renúncia dos governadores implicados em corrupção e instauraria um regime de “purga” dos corruptos e de seus aliados e empresários corruptores e contaria, seguramente, com o apoio da imprensa conservadora que sempre apostou num golpe. Isso não é contraditório com a política dos órgãos de segurança dos USA, especialmente sob Donald Trump pois estaria a serviço “full spectrum dominance”. O que viria depois, seria uma incógnita pois o poder é um dos arquétipos mais tentadores da psiqué humana. Os militares poderiam não querer mais sair do poder assumido.

Outra saída, ainda dentro do marco democrático, seria a convocação para esse ano ainda de eleições gerais, pois o sujeito originário do poder é o povo que, ao escolher seus politicos, lhes conferiria legitimidade. A Lava Jato continuaria com sua devassa enchendo os tribunais de processos, nas várias instâncias do judiciário.

Uma outra via seria a anulação pelo TSE da candidatura Dilma-Temer, seguida de uma eleição indireta pelo Parlamento de um novo Presidente. Não saberíamos que força teria ele, uma vez que foi eleito de forma indireta, com uma base parlamentar amplamente desmoralizada e sob vários processos criminais.

Uma terceira via, mais radical, seria inspirada pela Comissão da Verdade da Reconciliação da África do Sul, coordenada pelo bispo Desmond Tutu que aqui apresento como viável. Ai se tratava de conhecer a verdade sobre os crimes cometidos contra a população negra por dezenas de anos não excluídos também crimes perpetrador por negros.

Três eixos estruturavam o processo: a verdade, a responsabilização e a justiça restaurativa e curativa. Tudo era feito sob o arco de um valor cultural comum que nos falta: o Ubuntu que significa: eu só posso ser eu através de você. Esse valor conferia e confere coesão à sociedade da Africa do Sul, pois de saída supera o individualismo, típico de nossa cultura ocidental.

A verdade tinha a dimensão factual:conhecer os fatos como se passaram. Outra dimensão era a pessoal: como a pessoa subjetivamente sentia o crime cometido. A terceira era a social: como a sociedade interpretava e discutia a gravidade dos crimes. Por fim, a verdade restaurativa e criativa: reprovação moral do passado e disposiçãode construir uma nova memória.

A anistia era concedida àqueles que reconheciam publicamente a responsabilidade pelos crimes cometidos. A confissão pública de seus atos era a grande punição moral. É a anistia pela verdade que possui uma função restaurativa e curativa: refazer o tecido social e dispor-se a não mais cometer os mesmos crimes sob o lema: “para que não se esqueça e para que nunca mais aconteça”. Para crimes contra a humanidade havia a punição legal conveniente e não vigorava a anistia.

Discutia-se então e ainda hoje se discute: se a lei não pune os que transgrediram, não desvalorizaria a própria noção do império de lei, base de um Estado de direito?

Aqui, em vista do Ubuntu, de manter a coesão e não deixar chagas abertas, chegou-se a um compromisso pragmático entre a dimensão política e a dimensão do princípio.

Logicamente, existe uma ordem legal, necessária sem a qual a sociedade se torna caótica. Mas ela repousa sobre uma ordem ética e axiológica. Esta foi invocada. Isso implica ir além do discurso jurídico e político e entrar no campo antropológico profundo, dos valores que dão um sentido transcendente à vida pessoal e social. Trata-se de um ato de confiança no ser humano de que ele é resgatável. Foi o que mostrou Hannah Arendt em Jerusalém por ocasião do juízo e condenação de Eichmann, o exterminador de judeus sob o regime nazista. Ela arrolou o valor do perdão, não propriamente como valor religioso, mas como capacidade humana de poder livrar-se da dependência do passado, e inaugurar uma nova página da história coletiva.

Tais procedimentos poder-se-iam aplicar ao caso brasileiro. Marcelo Odebrecht e seu pai Emílio Odebrecht reafirmaram que praticamente todos os políticos (com exceções conhecidas por sua inteireza ética) se elegeram pela via do caixa 2. O caixas 2 é tipificado como crime pelo artigo 350 do Código Eleitoral e pelo artigo 317 do Código Penal. Foi o que tem repetido muitas vezes a Presidente do STF.

Pelo fato, porém, de a corrupção ter-se generalizado e afetado a grande maioria dos partidos, poder-se-ia aplicar uma anistia nos moldes da Comissão da Verdade e da Reconciliação da África do Sul. Todos os que se valeram do caixa 2 viriam a público, confessariam tal crime e manifestariam o propósito de não mais recorrer a este expediente para eleger-se. A revelação de seus nomes e sua confissão pública seria uma verdadeira punição moral.

Outra coisa, entretanto, é a a propina recebida de empresas com promessa de dar-lhes vantagens legais e a corrupção como desvio de dinheiro público, aos milhões e milhões, a ponto de levar à falência um estado como o Rio de Janeiro. Aqui se trata diretamente de crimes que devem ser adequadamente julgados e punidos e mais que tudo recuperar para os cofres públicos o dinheiro roubado. Neste âmbito ocorreram crimes de lesa-humanidade como os 300 milhões desviados da Saúde do Rio de Janeiro que, obviamente, tem prejuficado milhares de pessoas, levando muitas à morte. Para esses cabem as penas mais severas.

Este caminho seria altamente humanitário, reforçaria nossa democracia que sempre foi de baixa intensidade e traria uma atmosfera moral e ética para o campo da política, como busca comum do bem comum.

A atual crise da política brasileira, obnubilando qualquer futuro esperançador, nos obriga a pensar e abusar saídas possíveis que evitem uma convulsão social de consequências imprevisíveis. É o sentido destas minhas reflexões.

quinta-feira, 27 de abril de 2017

EM DEFESA DA VIDA

Nesses últimos dias a mídia, escolas, igrejas, secretarias de saúde, órgãos públicos e tantos grupos se manifestaram sobre a série “13 Reasons Why” (Os treze porquês), série americana disponível gratuitamente aos assinantes do serviço de streaming Netflix. E sobre o jogo Baleia Azul (Blue Whale), que consiste em um jogo clandestino em que no qual são dadas instruções que estimulam atividades autodestrutivas para jovens e adolescentes. Diante dessa ameaça à vida, tomo a liberdade de escrever a respeito da necessidade da formação integral e integradora da juventude.

Ao olhar o significado etimológico da palavra ‘jovem’ descobri que sua origem vem do latim “juvare”, que significa literalmente “ajudar, socorrer”. Também “levar pela mão, juntar, congregar”. Quando socorremos alguém levamos alegria, proteção, vida. Na formação grego-romana a criança não era valorizada por não ter capacidade física e mental para ajudar, mas quando começava a servir, ou seja, ao chagava na fase adulta mudava o olhar sobre seu valor e importância.

Essa visão é muito comum ainda hoje em algumas comunidades no tocante a presença, capacidade e efetividade da juventude. Por outro lado, os pais, por vezes, trabalham duro para dar o melhor para os filhos e esquecem de oferecer o essencial e o importante, isto é, o afeto, tempo, carinho, atenção, amor.

Hoje parece urgente refletir como as crianças, adolescentes e jovens das comunidades de fé estão sendo atendidos através da catequese, grupos de jovens etc. Também como acontece o processo de acompanhamento nessas fases? Como andam os investimentos afetivos e efetivos no cuidado para com a juventude?

É muito fácil gritar aos quatro ventos em socorro da juventude diante de um jogo que vem ceifando suas vidas. Contudo, parece que estamos atingindo apenas a ponta do iceberg e não indo na causa do problema. Toda pessoa desde o ato da concepção até o final da vida natural passa por diversas fases. Em cada uma tem suas necessidades. Por isso pergunto: Por que tanto descrédito dos adultos em relação à força da juventude? Quais são os incentivos disponíveis e viáveis no processo continuo da formação integral e integradora da juventude? Pois, muitas vezes, tantas iniciativas juvenis para o bem são tolhidas pelo descrédito e falta inclusive de apoio!

quarta-feira, 26 de abril de 2017

QUEM VIVE O AMOR?

Sobre o amor muito se fala, muito se escreve, muito se canta, muito se poetisa, muito se filosofa, muito se teologiza, mas, e viver, quem mesmo vive o amor?

É certo que o amor e a beleza nos salvam e nos suspendem do chão da banalidade do mal, e sem essas duas experiências existenciais a vida seria um erro. Mas, onde reina o amor? Onde reina o amor, Deus aí está! Mas onde reina o amor? Em qual chão a sua semente germina livremente? A pergunta permanece: onde reina o amor? Mas uma coisa é certa, onde reina o amor, Deus aí está! O amor é um outro nome para Deus. Se te faltar fé em Deus, mas tiveres fé no amor, então Deus aí está.

Os gregos tinham três palavras para falar do amor. Os gregos sabiam das coisas. As três palavras captam experiências diferentes. A linguagem nesse caso diz do ser.

As três experiências captadas em três conceitos ou palavras são: Philia, Eros e Ágape.

Philia é o amor de amizade. Philia é o amor sem desejo sexual, sem posse, sem ciúme, sem outro objetivo a não ser o bem de estar juntos, conversando, rindo, contando histórias, passeando, festejando, apoiando-se e estando presentes nas vitórias e nos fracassos, nas alegrias e nas tristezas. A Philia, a amizade, diz Aristóteles, é uma única alma habitando em dois corpos. O que interessa mesmo na amizade é a alma. O corpo do outro pouco conta, pois na amizade não se deseja o corpo do outro, mas sua alma, seu espírito, seu modo de ser, seu gênio, seu humor e sua beleza interior.

O Eros, por sua vez, diziam os gregos, é o amor de desejo, amor de atração. Desejo é essa capacidade humana de ir além, de transcender, de ir ao encontro do outro, do totalmente outro. Sim, pois desejo é desejo de algo que nos falta e se nos falta buscamos alcançar. Por outro lado, o Eros é também o impulso e desejo do corpo do outro, é desejo sexual que implica em posse, resultando em ciúme, pois a posse não tem segurança e o outro sempre pode nos escpar. O Eros é o amor conjugal, em vista da família, dos filhos, e o amor dos amantes.

O Ágape, diziam os gregos, de linhagem cristã, é o amor de oblação. É o amor caritas. É o amor desinteressado. É o amor misericórdia, diz o Papa Francisco. É interessante que o Papa Francisco fale mais de misericórdia do que de amor. Mas o sentido é o mesmo. Talvez melhor seria falar em amor, porém, misericórdia dá concretude ao amor. Misericórdia significa dar o coração ao mísero, ao que precisa, ao miserável. Amor de misericórdia é o amor de Jesus. Ele não só amou os amigos ou os filhos do Eros, os do sangue-família, mas amou a todos, inclusive a mim e a ti, que sequer conheceu. E amou os que aparentemente não merecem amor, os inimigos, os delatores.

Francisco de Assis entendeu bem o que é o amor misericordioso, o amor cristão. Ele é exemplo mais alto do amor ao frágil, ao pobre, aos animais, ao cuidado com a natureza. Jesus e Francisco de Assis eternizaram o amor Ágape, o amor misericordioso.

São Paulo dizia que pode nos faltar a fé e a esperança, mas que não nos falte a caridade. A caridade, outro nome do amor, é o outro nome de Deus. Se achares que já não há razão em crer em Deus, mas continua amando, então Deus aí está. Onde reina o amor, Deus aí está!

terça-feira, 25 de abril de 2017

ELEIÇÕES PARA O JUDICIÁRIO JÁ.

A República Brasileira tem três Poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário. Os representantes do Executivo e Legislativo são eleitos pelo sufrágio do povo, enquanto os do Judiciário, do Supremo Tribunal Federal, são indicação do Presidente da República. Só o sufrágio do povo é capaz de constituir a imparcialidade do Supremo Tribunal. Eis uma conquista democrática a ser almejada no presente.

O Supremo Tribunal Federal é a instância máxima do Poder Judiciário que julga questões de constitucionalidade conforme prevê a Constituição Federal. Sendo a instância máxima, sobre suas decisões não cabe recurso a nenhum outro tribunal. O Supremo Tribunal é composto por onze juízes, chamados de ministros. A escolha de um juiz para compor a corte acontece devido a aposentaria ou morte de um dos membros. Diante da crise institucional que se instalou com o golpe parlamentar de 2016, o presidente da República acaba de indicar para ocupar um lugar na corte Alexandre de Moraes, ministro do governo e militante do PSDB. A nomeação é um verdadeiro descalabro para a ética jurídica, política, gerando reações na sociedade em geral.

O líder da oposição, o deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) afirma: "Alexandre de Moraes não reúne nenhuma condição, sob nenhum aspecto, para assumir num período de crise institucional. Quando boa parte do núcleo central do governo é investigada pela Lava-Jato, ministros, e o Temer, estão no centro do escândalo de corrupção. Alexandre de Moraes foi advogado do deputado Eduardo Cunha, hoje preso”. As reações na base do governo Temer vem do maior líder, senador Renan Calheiros (PMDB-AL) que solta o verbo: “não tem se comportado como ministro de Estado, mais chefete de polícia, além de boquirroto que fala demais e dá bom dia a cavalo”.

O Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade de Direito da USP, onde Alexandre de Moraes se formou, reagiu com a nomeação através de uma nota: “Moraes demonstrou ao longo de sua trajetória desrespeito a princípios fundantes da Carta Magna. São constantes declarações e posturas histriônicas e fortemente partidarizadas, o que definitivamente não lhe confere a "reputação ilibada" exigida pelo cargo". O cientista político Luís Felipe Miguel diz: “Moraes é uma personalidade pública marcada pelo apreço à violência policial, pelo desprezo aos direitos e ao direito, pela conivência com abusos". A Rede Globo, a principal responsável pelo golpe parlamentar de 2016, também reagiu: "Michel Temer errou na indicação do ministro da Justiça Alexandre de Moraes para a vaga no Supremo. Temer foi citado na Lava-Jato, vários dos seus ministros também, alguns deles já estão sendo investigados. Esta não é a hora de escolher para o STF alguém da sua copa e cozinha e membro do PSDB".

Com a nomeação o Supremo Tribunal torna-se sempre mais uma facção partidária que julga conforme os interesses dos padrinhos políticos. Somente o povo elegendo os ministros poderá a Suprema Corte constituir a imparcialidade nos julgamentos, aguardar a constitucionalidade da Carta Magna. Eis uma conquista a se buscar para que povo possa pronunciar novamente a palavra democracia.

segunda-feira, 24 de abril de 2017

SEM COMENTÁRIOS A VIDA NÃO TEM GRAÇA.

A mente move o ser humano. Bons pensamentos são o alimento das pessoas. Ocupar-se da atividade de pensar é uma nobre profissão. A história do cristianismo, além de ser um depósito da fé, é um acumulado conhecimento à luz da revelação de Deus, o onisciente. Então, provocar a reflexão é uma ocupação imprescindível para o bem da humanidade.

O homem é um ser pensante. Por pensamentos manifesta sentimentos, sistematiza doutrinas, ideologias e reinventa ideias. Santo Agostinho, em sua atividade de sistematizar o pensamento cristão, explicou: "Por que, portanto, está ordenado na mente que ela deve conhecer a si própria? Suponho que para que possa considerar-se e viver de acordo com sua natureza; ou seja, buscar ser regulada de acordo com sua própria natureza, sob Ele a quem ela deve se sujeitar, sobre as coisas a que ela deve ser preferida; sob Ele por quem ela deve ser governada, sobre as coisas que ela deve governar. Pois ela realiza muitas coisas através de feroz desejo como se se esquecesse de si própria. Pois ela vê algumas coisas como intrinsecamente excelente na natureza mais excelente que é Deus: e quando deveria permanecer firme para que possa desfrutá-las, se volta contra Ele desejando se apoderar destas coisas para si; e não para ser como Ele por Sua graça, mas para ser o que Ele é por si só, e ela começa a se mover e escorregar gradualmente para cada vez menos e menos quando acredita ser mais e mais". A verdadeira atividade do pensamento cristão é ocupar-se no entendimento da natureza humana, esta compreendida à luz da verdadeira sabedoria dada por Deus.

A discussão de questões relacionadas à realidade e à vida não é papel somente das escolas e universidades, dos fóruns e seminários. Todo espaço é oportunidade de reflexão e de debate. Basta andar em estradas e é comum encontrar pensamentos em para-choques de caminhões. São pensamentos divertidos, românticos, religiosos e também de reflexão, como por exemplo: “Se um dia for falar mal de mim, me chame. Sei de coisas terríveis sobre mim”; “Tudo que você usa já esteve em um caminhão”; “Pobre é igual disco de embreagem: quanto mais trabalha mais liso fica”; “Não é pressa, é saudade”. Em todos há verdade. Em sua maioria são pensamentos identificados com a vida das pessoas, com as condições de trabalho, da profissão. De certa forma, os para-choques são um painel do mundo inteligível, um meio de provocar reflexão.

Aristóteles, o grande filósofo, diz que as ideias surgem das coisas, da experiência sensível, do mundo dos fenômenos contingentes. Visto dessa maneira, os escritos em para-choques podem ser interpretados como provocações filosóficas, políticas, morais, até de um realismo da vida daqueles que aprendem e ensinam pelas estradas. Então, que os sábios das estradas divulguem ideias em prol de um país mais justo para todos os cidadãos e continuem trazendo provocações, diversões e risadas, pois como diz a frase, “A vida não tem graça sem comentários”.

domingo, 23 de abril de 2017

FAZER O BEM

Há momentos em que a sensibilidade torna-se mais aguçada e os gestos brotam espontaneamente da criatividade. A Páscoa, bem como outras solenidades, despertam fortemente a caridade. Um menino, prestes a completar cinco anos, sugeriu que fossem feitos ovos de páscoa para dar às ‘crianças pobres’.

Os pais atenderam ao pedido, emocionados. Quando uma criança sente o desejo de partilhar e volta o olhar para os que mais necessitam, pode-se concluir que ainda o mundo não está perdido, como alguns afirmam. A bondade sempre inquietará corações de todas as idades, despertará o desejo simples e profundo de ajudar, tornará a felicidade ao alcance da mão. Fazer o bem é uma forma inteligente de conduzir a vida.

O egoísmo e o apego material têm deixado muitas pessoas à margem da alegria de viver. A busca pelo sustento ocupa a maior parte das horas de um dia. Não deixa de ser uma preocupação. Porém, a vida não se resume em ter isso ou aquilo. Viver é estar sempre disposto a servir e a querer o melhor também para os outros.

Quando uma criança espontaneamente deseja tornar a Páscoa dos que estão em situação de vulnerabilidade mais feliz, repartir e alcançar presentes é sinal de que teremos pela frente outros tempos, de maior solidariedade e de muito amor. A iniciativa do menino, deixou muita gente feliz.

Como é maravilhoso saber que a bondade pode ser comunicada de geração em geração, acenando para um mundo novo, solidário e alicerçado sobre o bem. Fazer o bem é um jeito simples de garantir a felicidade que tanto buscamos.

quinta-feira, 20 de abril de 2017

QUAL A SAÍDA PARA A FALTA DE ÉTICA.

Pode ser estancada a corrupção que cria relação promíscua entre Estado e interesses privados? Depende. Não bastam leis. É preciso criar mecanismos de rigorosa aplicação das leis. E ainda que existam, seus operadores, como os fiscais da Carne Fraca, podem se omitir graças à corrupção.

Qual a saída? Basta olhar em volta. Todos conhecemos pessoas éticas. Que antídotos têm contra a corrupção? Outrora, os preceitos religiosos. A noção de pecado. Não havia como o fiel se esconder do olho divino. Seus mais íntimos atos, até pensamentos, eram contabilizados pela Providência a favor de sua salvação ou perdição.

A sociedade se secularizou. Na expressão de Max Weber, se desencantou. Ainda que muitos admitam crer em Deus, há quem não dê a menor importância aos preceitos religiosos. Vide a América Latina, o mais cristão de todos os continentes. E, no entanto, o mais desigual e injusto.

Não se pode esperar, portanto, que a sociedade ocidental do século XXI volte à ética fundada na noção de pecado. Onde a solução?

Sócrates deu a resposta. Sabia que a ética de todos os povos que lhe eram contemporâneos, ou que o precederam, derivava de oráculos divinos. Grego, ele também olhou para o céu de sua cultura, o Olimpo. Verificou que, dali, não havia como extrair princípios éticos. O Olimpo era visceralmente antiético. Então Sócrates recorreu a outra fonte: a razão humana. Sua ousadia foi considerada blasfêmia; seu exemplo, herético; e sua culpa, digna da pena de morte. Há, no entanto, quem viva socrática e kantianamente coerente com seus princípios éticos.

Estamos hoje na terceira margem do rio. Saímos da margem da ética baseada na fé e ainda não chegamos à margem da ética fundada na razão.

Esse limbo ético é agravado pela ideologia neoliberal capitalista, que situa os interesses privados acima dos direitos coletivos; a competitividade mais importante que a solidariedade; a apropriação privada dos bens um direito, e uma aberração a socialização dos bens da Terra e dos frutos do trabalho humano.

As ciências ajudariam? Elas se divorciaram da ética. O maior atentado terrorista de todos os tempos, as bombas atômicas atiradas contra Hiroshima e Nagasaki, foram construídas por cientistas altamente qualificados. Como os agrotóxicos que envenenam nossos alimentos, ou a lógica das ciências econômicas, centrada na prevalência do capital privado.

A política também se divorciou da ética. Segundo Lévinas, a política deveria ser controlada pela ética. Porém, transformou-se em balcão de negócios. Daí o pânico dos políticos com os desdobramentos da Lava Jato. A caverna de Ali Babá foi invadida por holofotes.

Ética não é questão de moralismo. É questão de princípios e estruturas sociais. Há quem seja educado com o próximo e, no entanto, procure um jeito de pagar a seus empregados cada vez menos, de modo a acumular mais riqueza. Há quem injete recursos no cassino do mercado financeiro e é incapaz de socorrer com dinheiro um parente ou amigo enfermo.

Não creio em ética dos políticos (ou dos padres, pastores e qualquer outra condição humana). Temos todos defeito de fabricação, o que a Bíblia chama de pecado original. Há que se obter a ética da política, ou seja, criar instituições que, malgrado a fraqueza humana e a vontade de corromper ou ser corrompido, impeçam que o desejo se transforme em ato.

Os princípios éticos devem estar enraizados em uma cultura holística. Ética sistêmica, ambiental, que considere a relação do ser humano com a natureza e seus semelhantes. Ética que resgate a sacralidade da Mãe terra e favoreça a cidadania de direitos, e não de bens.

Tal ética só será possível se ancorada na espiritualidade. Não me refiro à religião, e sim à fonte das religiões: as motivações altruístas que regem a nossa relação com o próximo, a natureza, o Transcendente e consigo mesmo.



Ainda que a pessoa seja ateia, há nela uma emulação espiritual que norteia suas atitudes. O desafio é evitar que essa emulação seja egocêntrica, e lograr que se volte à solidariedade, ao amor, à justiça e à compaixão.

Fora disso, o projeto humano pode ser considerado um rotundo fracasso.

quarta-feira, 19 de abril de 2017

O CAIXA DOIS

Nos últimos dias, temos visto, lido e escutado envolvidos na Lava Jato, como réus, delatores ou testemunhas, tentarem justificar o caixa dois. É como se os racistas de hoje alegassem que brancos discriminarem negros foi um costume que atravessou os 350 anos de escravidão no Brasil, e não se pode erradicá-lo de uma hora para outra...

Caixa dois é crime. É ilegal, escuso e injustificável. Reforça e oficializa a hipocrisia eleitoral: nós votamos, o caixa dois elege! Um recurso abusivo de tornar a democracia mera falácia e entregá-la às mãos do poder econômico.

A fonte do caixa dois evita a doação legal por motivos que se somam: lavar dinheiro; sonegar o fisco; comprar o mandato do político que no futuro garantirá vantagens; e assegurar a vitória eleitoral do beneficiado sobre os políticos que não contam com iguais recursos.

Qual deputado ou senador, prefeito, governador ou presidente ousou contrariar os interesses de quem abasteceu o seu caixa dois? Um corrompe, outro se deixa corromper.



Caixa dois não é caso de política. É caso de polícia.

terça-feira, 18 de abril de 2017

QUEM É O CHEFE.

depois de ouvir o estardalhaço provocado pela mãe de todas as delações, uma dúvida coça-me o pé da orelha.

Emílio Odebrecht é ou não é um chefe de quadrilha?

ora, não foi ele mesmo quem disse que está a delinquir há mais de 30 anos, utilizando-se sempre do mesmo método?

mestre da delinquência, o cabra ainda colocou o filho Marcelo em seu lugar y, por supuesto, ensinou-lhe a arte do ofício.

não nos esqueçamos que um dos corruptores da Odebrecht afirmou que Marcelo Piroca tomou gosto pelo achaque e parecia mesmo sentir prazer em comprar autoridades.

pelas gargalhadas do pai durante as oitivas, percebe-se que Marcelo herdou do hierarca a mesma mórbida patologia.

e parece que não só ele.

os corruptores da Odebrecht, chamados candidamente de delatores, chegam diante da autoridade judicial tranquilos, alguns sorridentes, outros fazem troça, galhofas, gargalham.

são crianças no recreio.

um deles afirmou não ver a hora disso tudo terminar para poder desfrutar de sua aposentadoria, com a grana gorda que recebeu de indenização da Odebrecht.

esse sacana é o mesmo que afirmou, na cara da autoridade, que se desfez de provas jogando o computador no mar de Miami.

com mil diabos!

esses homens de bens também aprenderam com o chefe da organização onde trabalhavam a arte da delinquência.

parece que uma bolada dessa grana, milhões de lascas alojadas ali no departamento da trambicagem, foram surrupiados pelos próprios executivos.

não há uma virgem nessa suruba toda.

no entanto, uns já estão de passagem comprada para algum paraíso tropical. confiantes na impunidade.

talvez inspirados pela fábula do bom ladrão que foi absolvido pelo mestre logo que foi pregado numa cruz, condenado por seus crimes.

pelas ironias que faziam e as piadas que contavam, pareciam convencidos de que o "arrependimento" os absolvia.

esses putos pagaram aquele pastor de araque para ser escada de aécio - grafemos eternamente em minúsculas - no debate presidencial.

a Odebrecht queria mudar os rumos do processo eleitoral, deixando claro, inclusive, que preferiam negociar com a turma do bico recurvo.

não contentes, encheram de bufunfa os bolsos de Cunha e Cunha encheu o Congresso com seus prepostos sempre dispostos, desde que molhassem suas mãos sujas.

foi essa turma que arrancou a presidenta de sua cadeira pelos cabelos.

Temer, qual um delator da Odebrecht, delatou a si mesmo e disse que se Dilma tivesse feito o jogo de Cunha estaria ele até hoje de vice decorativo.

esses caras atentaram contra a democracia. aí eu te pergunto, serão presos?

ora, direis. ouvir estrelas?

a falcatrua era sistemática.

a Odebrecht não só praticou o mesmo crime com os mais variados partidos políticos brasileiros, como também o fez em diversos países.

e mais, Marcelo Piroca admitiu que já molhou a mão de traficantes e sequestradores.

o que mais falta dizer?

ah, apenas que Emílio assegurou que durante esses mais de 30 anos todo mundo sabia do que era feito a Odebrecht.

Emílio disse todo mundo, a revistaveja, a Folha, o Estadão, os juízes do STF...

eu e você, diligente internauta, é que só ficamos sabendo agora.

e ficamos sabendo também que o Brasil é o único país do mundo que tem uma modalidade de corrupção onde há corruptos e não há corruptores.

segunda-feira, 17 de abril de 2017

DELAÇÕES PREMIADAS OU SUSPEITAS?

Passei pela prisão duas vezes (1964 e 1969-73). Fui submetido a inúmeros interrogatórios diz Frei Beto. O objetivo dos algozes era obter delações. Sem prêmios, exceto livrar-se de mais torturas físicas.

Sob o governo Médici se prometeu liberdade imediata ao preso político que, na TV, arrependesse de suas atividades e louvasse o “milagre brasileiro” do regime militar. Em São Paulo, apenas meia dúzia aceitou a proposta.

As delações aceitas pelos juízes Moro e Fachin merecem ser acolhidas com cautela. Para empresários e altos funcionários públicos, habituados a salários astronômicos e vida nababesca, estar preso é uma tortura. E sabem que o comprimento da língua pode reduzir a extensão da pena. Por isso delatam.

Nenhuma delação pode ser aceita como fato consumado, como ocorria no stalinismo. É preciso apresentar provas de que os delatados de fato transgrediram a lei. Mandaram a ética e os escrúpulos às favas.

Em plena Semana Santa, a lista de Fachin não merece ser encarada como a multiplicação dos Judas brasileiros, a serem sumariamente condenados e malhados. O Direito deve prevalecer sobre as nossas divergências, antipatias e ressentimentos em relação aos políticos citados.

Vale frisar que visceralmente corrupta é a institucionalidade política brasileira, na qual o eleitor vota e o poder econômico elege. A nação espera, há décadas, a profunda reforma que torne a nossa democracia verdadeiramente representativa e participativa.

domingo, 16 de abril de 2017

FELIZ PÁSCOA

A Páscoa, na sua origem hebraica, é um fato político: sob o reinado do faraó Ramsés II, em 1250 a.C., liderados por Moisés, os hebreus se libertaram da escravidão no Egito. Basta isso para que, hoje, ela seja comemorada como incentivo a combater toda forma de opressão, preconceito e discriminação.
Nascemos do mesmo modo; ao morrer, teremos todos o mesmo destino; no entanto, as desigualdades imperam em nosso modo de viver.

A Páscoa, para os cristãos, além do ato político encabeçado por Moisés, é sobretudo a proclamação de que Jesus, assassinado em Jerusalém, venceu a morte e manifestou a sua natureza também divina.

Assassinaram Jesus porque ele queria o óbvio, o que ainda hoje muitos fingem não enxergar: vida em plenitude para todos. Não é preciso saber economia para se dar conta de que há suficiente riqueza no mundo para assegurar vida digna a seus 7 bilhões de habitantes.

A renda per capita mundial é, hoje, de US$ 9.390. Porém, basta olhar em volta para ver nossos semelhantes jogados nas calçadas, catando lixo para se alimentar, morando em favelas, submetidos ao trabalho escravo. Basta abrir o jornal para ler que dois terços da humanidade ainda vivem abaixo da linha da pobreza. E 20% da população mundial concentra 84% da riqueza global.

Páscoa significa passagem, travessia. Domingo, nós, cristãos, iremos à igreja celebrar esta que é a mais importante festa litúrgica. E o que muda em nossas vidas? Vamos sair do nosso comodismo para ajudar a acabar com a opressão? Vamos deslocar a nossa ótica do lugar do opressor para encarar a realidade pelos olhos do oprimido, como sugeria Paulo Freire?

É fácil ter religião e professar a fé em Jesus. O difícil é ter espiritualidade e a fé de Jesus.

Feliz Páscoa, queridos(as) leitores(as)!

sábado, 15 de abril de 2017

ESQUECERAM OS SONEGADORES DA PREVIDÊNCIA?

A reforma da Previdência proposta pelo governo Temer retira direitos dos trabalhadores para defender privilégios dos empregadores e do capital. Se o governo precisa de recursos, por que não pôr fim às desonerações concedidas a bancos, agronegócio e empresas? Desonerar é dispensar de pagar impostos.

Por que não cobra as multas devidas por fazendeiros flagrados por adotar trabalho escravo em suas terras? E por que não divulga mais a lista com os nomes desses criminosos?

Por que não cobra o que devem os grandes sonegadores do imposto de renda? Calcula-se que o montante da sonegação equivale a 13% do PIB. E a sonegação dos encargos trabalhistas ultrapassa R$ 500 bilhões! A informação é da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.

Ao liberar o FGTS, o governo, ao contrário da propaganda, não praticou nenhuma bondade. Quis apenas amenizar a recessão econômica que afeta o Brasil e encher ainda mais os gordos cofres dos bancos, já que grande parte de nossa população está endividada e, assim, as dívidas podem, agora, ser amortizadas.

Muitos trabalhadores, ao correrem à Caixa Econômica Federal, descobriram que seus patrões não recolheram o FGTS. Mais da metade do valor total das contas do FGTS não foi paga pelas empresas. Segundo a CEF, mais de 7 milhões de trabalhadores não receberam corretamente os depósitos a que teriam direito. O valor total devido pelas empresas chega a mais de R$ 24,5 bilhões. Por que o governo não multa esses sonegadores? Por que não os obriga a depositar imediatamente o que roubaram do trabalhador?

O Estado brasileiro está quebrado não por culpa da Previdência, e sim dos juros pagos para rolar a dívida pública. Metade do orçamento da União vai para a dívida pública. Se o governo sanasse sua relação com os bancos, o país entraria nos eixos.

Quando o médico Adib Jatene foi convidado pelo presidente FHC para ser ministro da Saúde, ele exigiu que se garantissem recursos à pasta com a adoção da CPMF (0,38% do valor de cada cheque). O presidente concordou. Mas não cumpriu a palavra. Canalizou boa parte do dinheiro da CPMF para assegurar o superávit primário (dinheiro sagrado dos bancos).

O médico Adib Jatene, em entrevista ao jornalista Josias de Souza, em agosto de 2007, ao ser indagado se pedira demissão do cargo de ministro da Saúde, no governo FHC, por causa da CPMF, respondeu: “Teve relação direta. Eu disse ao presidente que precisava de recursos. Ele pediu para eu falar com o Malan, ministro da Fazenda. Malan me disse que, em dois ou três anos, daria o dinheiro que eu precisava. Eu não podia esperar tanto tempo. Propus a volta do imposto sobre o cheque, o IPMF, extinto em 1994. FHC disse: ‘Não vai conseguir aprovar isso.’ ‘Posso tentar?’ Ele autorizou. Pedi o compromisso dele de que o orçamento da Saúde não seria reduzido. A CPMF entraria como adicional. Ele disse: ‘Isso eu posso te garantir.’ Depois da aprovação, a Fazenda reduziu o meu orçamento. Voltei ao presidente. Disse a ele: ‘No Congresso me diziam que isso ia acontecer. Eu respondia que não, porque tinha a sua palavra. Se o senhor não consegue manter a sua palavra, entendo a sua dificuldade. Mas me faça um favor. Ponha outro no meu lugar. Foi assim que eu saí, em novembro de 1966.”

sexta-feira, 14 de abril de 2017

CRUCIFICADOS: ONTEM E HOJE.

Hoje a maioria da humanidade vive crucificada pela miséria, pela fome, pela escassez de água e pelo desemprego. Crucificada está também a natureza devastada pela cobiça industrialista que se recusa a aceitar limites. Crucificada está a Mãe Terra, exaurida a ponto de ter perdido seu equilíbrio interno que se mostra pelo aquecimento global.

Um olhar religioso e cristão vê o próprio Cristo presente em todos estes crucificados. Pelo fato de ter assumido totalmente nossa realidade humana e cósmica, ele sofre com todos os sofredores. A floresta que é derrubada pela motosserra significa golpes em seu corpo. Nos ecossistemas dizimados e pelas águas poluídas, ele continua sangrando. A encarnação do Filho de Deus estabeleceu uma misteriosa solidariedade de vida e de destino com tudo o que ele assumiu, nossa inteira humanidade e tudo o que ela pressupõe de sombras e de luzes.

O evangelho mais antigo, o de São Marcos, narra com palavras terríveis a morte de Jesus. Abandonado por todos, no alto da cruz, se sente também abandonado pelo Pai de bondade e de misericórdia. Jesus grita:

“Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste? E dando um forte brado, Jesus expirou (Mc 15,34.37).

Jesus morreu não porque todos nós morremos. Ele morreu assassinado sob a forma mais humilhante da época: a pregação na cruz. Pendendo entre o céu e a terra, durante três horas agonizou na cruz.

A recusa humana pode decretar a crucificação de Jesus; mas ela não pode definir o sentido que ele conferiu à crucificação imposta. O crucificado definiu o sentido de sua crucificação como solidariedade para com todos os crucificados da história que, como ele, foram e serão vítimas da violência, das relações sociais injustas, do ódio, da humilhação dos pequenos e do rechaço à proposta de um Reino de justiça, de irmandade, de compaixão e de amor incondicional.

Apesar de sua entrega solidária aos aos outros e a seu Pai, uma terrível e última tentação invade seu espírito. O grande embate de Jesus agora que agoniza é com seu Pai.

O Pai que ele experimentou com profunda intimidade filial, o Pai que ele havia anunciado como misericordioso e cheio de bondade, Pai com traços de de mãe carinhosa, o Pai cujo Reino ele proclamara e antecipara em sua práxis libertadora, este Pai agora parece tê-lo abandonado. Jesus passa pelo inferno da ausência de Deus.

Por volta das três horas da tarde, minutos antes do desenlace final, Jesus gritou com voz forte: "Elói, Elói, lamá sabachtani: Meu Deus, Meu Deus, por que me abandonaste"? Jesus está às raias da desesperança. Do vazio mais abissal de seu espírito, irrompem interrogações pavorosas que configuram a mais assustadora tentação sofrida pelos seres humanos e agora por Jesus, a tentação do desespero. Ele se interroga:

"Será que não foi absurda a minha fidelidade? Sem sentido a luta sustentada por causa dos oprimidos e por Deus? Não teriam sido vãos os riscos que corri, as perseguições que suportei, o aviltante processo jurídico-religioso a que fui submetido com a sentença capital: a crucificação que estou sofrendo?"

Jesus encontra-se nu, impotente, totalmente vazio diante do Pai que se cala e com isso revela todo o seu Mistério. Jesus não tem mais ninguém a quem se agarrar.

Pelos critérios humanos, ele fracassou completamente. A própria certeza interior se lhe esvai. Apesar de o sol ter tramontado de seu horizonte, Jesus continua a confiar no Pai. Por isso grita com voz forte: "Meu Pai, meu Pai!”. No auge do desespero, Jesus se entrega ao Mistério verdadeiramente sem nome. Ele lhe será a única esperança para além de qualquer segurança. Não possui mais nenhum apoio em si mesmo, somente em Deus que se escondeu. A absoluta esperança de Jesus só é compreensível no pressuposto de seu absoluto desespero. Onde abundou a desesperança, superabundou a esperança.

A grandeza de Jesus consistiu em suportar e vencer esta assustadora tentação. Esta tentação lhe propiciou uma entrega total a Deus, uma solidariedade irrestrita a seus irmãos e irmãs também desesperados e crucificados ao largo da história, um total desnudamento de si mesmo, uma absoluta descentração de si em função dos outros. Só assim a morte é morte mesmo e poderá ser completa: a entrega perfeita a Deus e aos seus filhos e filhas sofredores, seus irmãos e irmãs menores.

As últimas palavras de Jesus mostram esta sua entrega, não resignada e fatal, mas livre: "Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito" (Lc 23,46). "Tudo está consumado" (Jo 19,30)!

A sexta-feira santa continua, mas não possui a última palavra. A ressurreição, como irrupção do ser novo é a grande resposta do Pai e a promessa para todos nós.

quinta-feira, 13 de abril de 2017

SUBIDA A JERUSALÉM

A Quaresma já vai avançada. Daqui a pouco terá início a Semana Santa, que culmina com a celebração da Paixão e da Páscoa. Durante este tempo, a Igreja convida os fiéis à penitência e à conversão, enquanto acompanham Jesus de Nazaré em sua subida a Jerusalém, em seu caminho para a Paixão.

Não se trata de uma prática antiquada e sem sentido para os dias de hoje. Trata-se de um tempo especial de purificação, que prepara para viver o grande mistério da morte e ressurreição do Senhor. E neste processo, a ascese é de fundamental importância, embora a palavra esteja em desuso e possa provocar repulsa ou estranhamento.

Vivemos em uma cultura movediça e cambiante, onde os sentidos são acossados diariamente com estímulos constantes, para nos levar ao consumo desenfreado, à tirania do prazer, à avidez do ter e do possuir, aos quais é muito difícil resistir. Há profissionais talentosos regiamente pagos para descobrir nossas fragilidades, estimulá-las e atingi-las.

Esta cultura transtorna nossa interioridade, pois trabalha fundamentalmente em nossos sentidos, provocando sensações às vezes tão intensas, refinadas e contínuas, que podem entrar em nós sem tornar-se percepções conscientes, e muito menos elaboradas com um pensamento próprio. Há, portanto, para cada um de nós, cidadãos da pós-modernidade, um risco constante de viver permanentemente no fluxo contínuo das sensações que chegam aos nossos sentidos e seduzem nossa imaginação.

Essas sensações começam a circular dentro de nós, nos atraem e passam a formar parte de nosso universo interior. São direcionadas a nossas fomes e sedes naturais, e excitam as fomes e sedes artificiais e fictícias provocadas pelo mercado. Sutilmente ou mesmo grosseiramente, vão se apropriando de nossos sentimentos e de nossas decisões. Esta maneira de viver, submetidos a adicções criadas e mantidas artificialmente, começa a impedir-nos de enfrentar a realidade e seus desafios. Vai gerando em nós alienação, e condutas viciadas e compulsivas.


Na contramão dessa cultura do consumo e do bem-estar, a Igreja propõe a ascese. A palavra grega ascese (ἄσκησις) quer dizer exercício. Trata-se de exercitar-se para recuperar o domínio de si e não ser joguete dócil da propaganda e da cultura de sensações. Exercitar o corpo e o espírito, a fim de não se submeter a todas as adicções que a sociedade apresenta incessantemente.


Sob esta luz, portanto, o jejum tem pleno sentido. Assim também os exercícios físicos na justa medida. Abster-se de comida, de álcool, de fumo e também do uso imoderado da internet e da televisão, do jogo, da droga, do alucinógeno, não apenas permite ao corpo e ao espírito estarem mais disponíveis para a oração e o serviço. O corpo em jejum e adestrado, o espírito vigilante e diligente são terra árida para as compulsões do consumo. Fazem-nos mais livres e dispostos para aquilo que é realmente importante, deixando de lado o que aliena e anestesia.

Tem também sentido a oração, caminho de gratuidade que não controlamos nem manipulamos, onde um Outro absoluto conduz e tem as rédeas de uma experiência que não podemos produzir, mas apenas esperar, dispor-nos, acolher agradecidamente. Em uma cultura onde tudo está ao alcance de um "clic" e se consegue em segundos, entrar mais a fundo nos tempos de Deus, que se move em ritmo de eternidade, é um excelente e sadio exercício.

Assim também o despojamento pessoal expresso na esmola dada ao pobre, na ajuda ao necessitado, em todas as obras de misericórdia: visitar os doentes, vestir os nus, alimentar os famintos e dar de beber aos sedentos, fazer-se presente nos cárceres vários de cada dia, cuidar das crianças, atender os idosos. Tudo isso nos tira de nós mesmos e nos volta para os outros, na contramão de uma cultura que nos ensina que há que guardar, acumular, entesourar, investir, multiplicar os próprios bens.

A razão de ser de todo esse exercício ascético nos será revelada em uma vida mais livre, em um coração mais aberto e disponível para acompanhar Jesus que, à frente de seus discípulos, caminha para Jerusalém, tendo diante dos olhos apenas a vontade do Pai e o desejo de realizá-la. Para segui-lo em uma cultura como a nossa é imprescindível exercitar-se. A Quaresma pretende ser uma ocasião propícia para isso. E mesmo já avançada, sempre é tempo de vivê-la.

O SILÊNCIO

O silêncio pode ser arte, escuta, paz, tranquilidade, fonte de luz e de verdade. O silêncio fala de graça, cura e acomoda. Ele procura a palavra, escuta o dia distante. No silêncio transborda a emoção.

Outras vezes, é furacão em erupção, internamente a perturbar. É angústia sentida, lacuna entreaberta que paralisa o tempo e as emoções, obstaculizando a direção da vida. A perturbação é tamanha que nutrir-se do barulho, para não ouvir o seu silêncio, é uma maneira de fugir de si mesmo.

As feridas curam... Silêncio de estar ali, e ser escuta, para si e para o outro; ser encontro e verdade se entregando ao colo da conexão. É o silêncio de redenção.

Estamos sempre em busca de entendimento. Silêncio demais ou silêncio de menos. Como é bom ficar em silêncio num devaneio, degustando o que se passa ao redor! Como é bom através das palavras se fazer entender, se mostrar presente!

Pessoas silenciosas demais, ruidosas demais. Demais para quem? Quem tem o termômetro?

quarta-feira, 12 de abril de 2017

PARA UMA REFLEXÃO: O SOFRIMENTO.

Já se tentou definir o homem de várias formas. “O homem é um animal racional” (Aristóteles). “O homem é um caniço pensante” (Pascal). “O homem é um ser cuja existência precede a essência” (Heidegger). “O homem é uma paixão inútil” (Sartre). “O homem é uma ponte entre o macaco e o super-homem” (Nietzsche). A lista é longa. Eu acrescentaria mais uma: O homem é um ser que sofre.

O humano é aquele e aquilo que sofre. Um ser humano sem sofrimento não é um humano, é uma máquina. Um homem sem sofrimento é um homem sem história, sem memórias. Sofrer é ser afetado no corpo e tudo o que afeta o corpo e cria fendas no corpo, alarga a alma. As fendas e feridas no corpo alargam a alma, nos habilitando a lidar melhor e nos tornar mais amadurecidos com o mundo. Aquilo que sofremos é o que nos faz melhores e mais fortes. Se não sofremos no estudo, é porque somos displicentes. Se não sofremos no trabalho, é porque somos preguiçosos. Se não sofremos nas relações afetivas, é porque pouco amamos. Somos verdadeiramente o que nos afeta, o que sofremos. O mundo das facilidades é o mundo da superficialidade e do passageiro.

Não estou dizendo que devemos procurar o sofrimento. Não, não devemos procurar o sofrimento e não precisa procurar, ele vem sem pedir licença. Mas também não é aconselhável simplesmente fugir de tudo o que causa sofrimento. Até porque, se fugirmos, ele nos alcançará, pois, na fuga, levaremos junto o corpo, a morada dos prazeres, mas também dos sofrimentos.

A sociedade atual está nos tornando a todos um tanto quanto infantis. Fugimos do sofrimento como o diabo foge da cruz. Todos nos dizem para sermos alegres e felizes, como se fosse uma obrigação, e para isso nos ensinam a evitar o sofrimento. A sociedade do espetáculo, do virtual e do consumo, lida mal com o sofrimento e com o tempo necessário para que o sofrimento se transforme em libertação e em ressurreição. Sofrer e se deixar afetar, dando o tempo necessário para que o sofrimento faça seu percurso e se liberte de nós, nos libertando junto, é altamente saudável. Doentia é a cultura do medicamento e da obrigação de ser alegre a qualquer custo. Doentia e infantil é a sociedade que mascara, esconde, evita e não curte o sofrimento. É isso, é preciso curtir o sofrimento, já que o curtir está na moda...

Estamos na semana da Páscoa. Semana que celebra a vida, paixão, morte e ressurreição de Jesus. Jesus sofreu intensamente, tanto quanto amou intensamente. Não é justo dizer que a cruz e o sofrimento, ou o sangue jorrado dele na cruz, é o que nos salva. O que nos salva verdadeiramente é o amor que suporta a cruz e o sofrimento até o fim. Viver é isso, um kit completo de vida, paixão, morte e ressurreição. Não dá para criar atalhos para a ressurreição...!Já se tentou definir o homem de várias formas. “O homem é um animal racional” (Aristóteles). “O homem é um caniço pensante” (Pascal). “O homem é um ser cuja existência precede a essência” (Heidegger). “O homem é uma paixão inútil” (Sartre). “O homem é uma ponte entre o macaco e o super-homem” (Nietzsche). A lista é longa. Eu acrescentaria mais uma: O homem é um ser que sofre.

O humano é aquele e aquilo que sofre. Um ser humano sem sofrimento não é um humano, é uma máquina. Um homem sem sofrimento é um homem sem história, sem memórias. Sofrer é ser afetado no corpo e tudo o que afeta o corpo e cria fendas no corpo, alarga a alma. As fendas e feridas no corpo alargam a alma, nos habilitando a lidar melhor e nos tornar mais amadurecidos com o mundo. Aquilo que sofremos é o que nos faz melhores e mais fortes. Se não sofremos no estudo, é porque somos displicentes. Se não sofremos no trabalho, é porque somos preguiçosos. Se não sofremos nas relações afetivas, é porque pouco amamos. Somos verdadeiramente o que nos afeta, o que sofremos. O mundo das facilidades é o mundo da superficialidade e do passageiro.

Não estou dizendo que devemos procurar o sofrimento. Não, não devemos procurar o sofrimento e não precisa procurar, ele vem sem pedir licença. Mas também não é aconselhável simplesmente fugir de tudo o que causa sofrimento. Até porque, se fugirmos, ele nos alcançará, pois, na fuga, levaremos junto o corpo, a morada dos prazeres, mas também dos sofrimentos.

A sociedade atual está nos tornando a todos um tanto quanto infantis. Fugimos do sofrimento como o diabo foge da cruz. Todos nos dizem para sermos alegres e felizes, como se fosse uma obrigação, e para isso nos ensinam a evitar o sofrimento. A sociedade do espetáculo, do virtual e do consumo, lida mal com o sofrimento e com o tempo necessário para que o sofrimento se transforme em libertação e em ressurreição. Sofrer e se deixar afetar, dando o tempo necessário para que o sofrimento faça seu percurso e se liberte de nós, nos libertando junto, é altamente saudável. Doentia é a cultura do medicamento e da obrigação de ser alegre a qualquer custo. Doentia e infantil é a sociedade que mascara, esconde, evita e não curte o sofrimento. É isso, é preciso curtir o sofrimento, já que o curtir está na moda...

Estamos na semana da Páscoa. Semana que celebra a vida, paixão, morte e ressurreição de Jesus. Jesus sofreu intensamente, tanto quanto amou intensamente. Não é justo dizer que a cruz e o sofrimento, ou o sangue jorrado dele na cruz, é o que nos salva. O que nos salva verdadeiramente é o amor que suporta a cruz e o sofrimento até o fim. Viver é isso, um kit completo de vida, paixão, morte e ressurreição. Não dá para criar atalhos para a ressurreição...!

terça-feira, 11 de abril de 2017

CRISTÃOS DA SEXTA-FEIRA SANTA

Infelizmente, os cristãos se identificam mais com o sofrimento e a morte do que com a ressurreição de Cristo. Todos os anos as Igrejas ficam lotadas na Sexta-feira Santa, quando se reflete a paixão e a morte de Cristo, e não participam das alegrias do Sábado de Aleluia.

Ao analisar os últimos acontecimentos da vida de Cristo é conveniente assegurar que a morte não se constitui como uma catástrofe. Sua mensagem, sua vida, paixão e morte se fundem em uma unidade radical. Sua morte violenta numa cruz está implicada nas exigências de sua pregação, pois foi parar na cruz por ter chamado Deus de Pai e por ter sido acusado de agitador do povo.

Os quatro evangelhos do cânon mostram uma longa narrativa da paixão de Jesus. Estes evidenciam sua importância por ser uma narrativa contínua e caracterizar o objetivo salvador da morte de Jesus. Na vida pública de Jesus se percebe as atitudes de confronto em seu ministério com as autoridades que o levaram a prever, de modo indireto e implícito, um julgamento injusto e condenação a uma morte violenta.

A fidelidade à missão e a obediência ao Pai ressaltam um espírito de confiança de Jesus frente ao que esperava. O silêncio até a cruz mostra uma esperança inabalável que mesmo na morte o Pai não o abandonaria. Apesar da experiência de um abandono no momento de sua morte o grito na cruz é de obediência e auto-entrega nas mãos do Pai e não de desespero. O Filho se entrega a morte em plena consciência, obediência e por amor em favor dos homens.

Na época de Jesus faltavam cruzes para os malfeitores e por que é lembrada apenas a morte de Cristo? A morte de Cristo na cruz é apresentada como a grande intervenção e iniciativa de Deus em favor do homem pecador. E esta morte, vista como entrega, é doação e abandono nos braços do Pai em benefício dos homens. Ele morre em lugar do homem pecador e o redime da morte no pecado. Na óptica do mérito, é vida doada aos outros, é caminho para uma vida nova, e ressuscitada. A morte como satisfação é o reparo que o próprio Deus faz na desordem causada pelo pecado na vida humana. Jesus morre na cruz por amor libertando a humanidade do pecado que impede o acesso ao Criador.

A morte de Cristo, portanto, representa o cumprimento de uma vida vivida em plenitude. É sinal supremo do amor que reflete a vontade de Deus em salvar o homem. Na dor e no aparente abandono, fracasso e vitória do pecado, Deus se apresenta mais forte derrotando a morte estabelecendo em seu Filho uma Nova e Eterna Aliança. Nesta perspectiva há uma estreita relação entre morte e ressurreição: o morrer de Cristo é destruição da morte e início de uma nova vida. Mas, infelizmente, a maioria dos cristãos frente ao aparente fracasso humano na experiência da morte não dá o próximo passo para a esperança da ressurreição. Essa é a força transformadora da sociedade hodierna, mas o Brasil como país cristão é ferido pela corrupção, ganância, violência. Cadê a força transformadora dos cristãos? Pois, afirmou Emmanuel Mounier: “Aos cristãos só se pede que eles sejam eles mesmos. É verdade que aí está, sem dúvida, a Revolução

segunda-feira, 10 de abril de 2017

TEMOS A MISSÃO DE CONSTRUIR A PLANETIZAÇÃO.

Hoje há uma forte confrontação com o processo de globalização, exacerbado por Donald Trump que reforçou fortemente “o América em primeiro lugar”, melhor dito, “só a América”. Move uma guerra contra as corporações globalizadas em favor das corporações dentro dos USA.

Importa entender que se trata de uma luta contra os grandes conglomerados econômico-financeiros que controlam grande parte da riqueza mundial na mão de um número pequeníssimo de pessoas. Segundo J. Stiglitz, prêmio Nobel de economia, temos a ver com 1% de bilhardários contra 99% de dependents e empobrecidos.

Este tipo de globalização é de natureza econômico-financeira, dinossáurica; no dizer de Edgar Morin, a fase de ferro da globalização. Mas a globalização é mais que a economia. Trata-se de um processo irreversível, uma nova etapa da evolução da Terra a partir do momento em que a descobrimos, vendo-a a partir de fora, como no-lo testemunharam os astronautas a partir de suas naves espaciais. Aí fica claro que Terra e Humanidade formam uma única entidade complexa.

Impactante é o testemunho do astronauta norteamericano John W.Young, por ocasião da quinta viagem à Lua no dia 16 de abril de 1972:”Lá embaixo, está a Terra, este planeta azul-branco, belíssimo, resplandecente, mossa patria humana. Daqui da Lua eu o seguro na palma de minha mão. E desta perspectiva não há nele brancos ou negros, divisões entre leste e oeste, comunistas e capitalistas, norte e sul. Todos formamos uma única Terra. Temos que aprender a amar esta planeta do qual somos parte”.

A partir desta experiência ficam proféticas e provocativas as palavras de Pierre Teihard de Chardin ainda em 1933:”A idade das nações passou. Se não quisermos morrer, é hora de sacudirmos os velhos preconceitos e construir a Terra. A Terra não se tornará consciente de si mesma por nenhum outro meio senão pela crise de conversão e de transformação”. Esta crise se instalou nas nossas mentes: somos agora responsáveis pela única Casa Comum que temos. E inventamos os meios de nossa própria auto-destruição, o que aumenta ainda mais nossa responsabilidade pelo todo do planeta.

Se bem repararmos esta consciência irrompeu já nos albores do século XVI, precisamente em 1521, quando Magalhães fez pela primeira vez o périplo do globo terrestre, comprovando empicamente que a Terra é de fato redonda e podemos alcançá-la a partir de qualquer ponto de onde estivermos.

Inicialmente a globalização realizou-se na forma de ocidentalização do mundo. A Europa deu início à aventura colonialista e imperialista de conquista e dominação de todas as terras descobertas e a descobrir, postas serviço dos interesses europeus corporificados na vontade de poder que bem podemos traduzir como vontade de enriquecimento ilimitado, de imposição da cultura branca, de suas formas políticas e de sua religião cristã. A partir das vítimas desse processo, essa aventura se fez sob grande violência, com genocídios, etnocídios e com ecocídios. Ela significou para a maioria dos povos um trauma e uma tragédia, cujas consequências se fazem sentir até os dias de hoje, também entre nós que fomos colonizados, que introduzimos a escravidão e nos rendemos às grandes potências imperialistas.

Hoje temos que resgatar o sentido positivo e irrenunciável da planetização, palavra melhor que globalizção, devido à sua conotação econômica. A ONU no dia 22 de abril de 2009 oficializou a nomenclatura de Mãe Terra para dar-lhe um sentido de algo vivo que deve ser respeitado e venerado como o fazemos com nossas mães. O Papa Francisco divulogou a expressão Casa Comum para mostrar a profunda unidade da espécie humana habitando num mesmo espaço comum.

Esse processo é um salto para frente no processo da geogênese. Não podemos retroceder e fecharmo-nos, como pretende Trump, aos nossos limites nacionais com uma consciência diminuída. Temos que adequarmo-nos a esse novo passo que a Terra deu, esse super-organismo vivo, segundo a tese de Gaia. Nós somos o momento de consciência e de inteligência da Terra. Por isso somos a Terra que sente, pensa, ama, cuida e venera. Somos os únicos entre os seres da natureza cuja missão ética é de cuidar desta herança sagrada, faze-la um lar habitável para nós e para toda a comunidade de vida.

Não estamos correspondendo a este chamado da própria Terra. Por isso temos que despertar e assumir essa nobre missão de construir a planetização.

domingo, 9 de abril de 2017

A GAIOLA DE FERRO

Ao contrário do liberalismo, o neoliberalismo defende a supremacia do mercado e a redução do Estado a mero operador de interesses corporativos privados. A democracia, entendida como participação popular, é um estorvo para o neoliberalismo. Como certo general brasileiro, não suporta “o cheiro de povo”.

Já em 1975, no Relatório Rockefeller que enunciou as bases da Comissão Trilateral (EUA, Europa e Japão), os autores se queixavam do “excesso de democracia” e admitiam, sem nenhum constrangimento, que só funciona se há certo grau de apatia por parte da população e desinteresse de indivíduos e grupos.

Max Weber nos havia advertido da tirania do mercado que constitui, em nossas vidas – da subjetividade mais íntima à atividade política –, a “gaiola de ferro” da qual não é fácil se livrar. O mercado de tudo se apropria. E transfere a culpa de seus males à responsabilidade do Estado.

Na década de 1960, fome, devastação ambiental, corrupção, desemprego etc. eram apontados como (de)efeitos do capitalismo. Hoje, são atribuídos à inépcia do Estado. Eis o grande vilão responsável por todas as mazelas sociais e econômicas. Daí o açodamento com a aprovação da reforma trabalhista proposta por Temer, de modo a fazer retroceder os direitos trabalhistas duramente conquistados, anular o papel do Estado como árbitro das questões sociais, e restringir os direitos dos trabalhadores às parcas concessões patronais formalizadas em acordos privados.

O neoliberalismo é a nova razão do mundo. Promove a desdemocratização, na medida em que favorece a formação de monopólios e oligopólios. Dos bancos aos meios de comunicação. A pirâmide social e cultural se afunila sempre mais.

No neoliberalismo vigora a teologia da culpa. Em tese, o Deus Mercado oferece a todos iguais oportunidades. Se na prática reina brutal desigualdade, a culpa é daqueles que não souberam evitar o próprio fracasso...

Pergunte a um cidadão comum o que é neoliberalismo. É provável que não saiba responder. Pergunte então o que pensa da vida, do país e do mundo. Certamente expressará essa ideologia do sucesso individual e da supremacia de uns sobre outros, que legitima todo tipo de preconceito e discriminação.

Duas áreas nas quais o neoliberalismo investe pesado são educação e cultura. Os livros didáticos são submetidos à lupa da censura do que hoje se denomina Escola Sem Partido. A cultura é reduzida a mero entretenimento. A grande mídia exalta o mercado e execra o Estado. Se este favorece a maioria da população, isso é populismo. A finalidade do Estado é alavancar o crescimento das grandes empresas, a elevação dos índices da Bolsa de Valores, engordar as corporações financeiras e garantir a segurança do jogo mercantil contra o descontentamento e, quiçá, a revolta dos excluídos de suas benesses (greves, manifestações etc).

O neoliberalismo é uma praga que só pode ser combatida com um antídoto: o neossocialismo ou o ecossocialismo.

sábado, 8 de abril de 2017

ESPIRITO DE PORCO

A expressão “espírito de porco” na língua portuguesa e muito concretamente no Brasil significa uma pessoa ranzinza, rabugenta e negativa, que só vê o lado sombrio das coisas, diz coisas desagradáveis, causando constrangimento com suas atitudes.

Meu sentimento é que esse “espírito de porco” se apossa de muita gente – sem querer fazer injustiça aos porcos - quando observo algumas reações a situações vividas e atitudes visibilizadas do Papa Francisco. Desta vez, concretamente em sua visita a Milão, capital financeira da Itália, situada ao norte do país. Ali o pontífice, ao visitar uma zona pobre da cidade, rompeu uma vez mais o protocolo e utilizou um banheiro público. O gesto espontâneo e tão humano do Papa chamou a atenção do público presente e foi captado por muitas câmeras e presenciado pela grande quantidade de pessoas que ali se aglomeravam para vê-lo.

Nos comentários sobre a notícia, vemos, no entanto, reações totalmente descabidas. Alguns por considerar que o Papa não saberia ordenar suas necessidades fisiológicas antes de sair no espaço público e isso rebaixaria sua figura e sua posição. Imagino que quem fez tal comentário seja puro espírito, da categoria dos anjos e não dos seres humanos, não tendo por isso necessidades a satisfazer nem urgências físicas a atender. E por isso brinda os leitores do periódico com essa pérola.

Ao utilizar o banheiro que se lhe apresentava na ocasião em que seu corpo pedia, o Papa simplesmente demonstrou ser algo a que algumas pessoas ainda não se acostumaram: humano. Como todo ser humano vivo, seu dinamismo corporal funciona. E há ocasiões em que há que respeitar suas exigências. Inclusive quando se é Papa. Ou chefe de estado. Ou Presidente da República. O corpo tem suas razões e algumas delas são imperiosas e iniludíveis.

Por não ter vergonha de sua humanidade nem pretender ocultá-la sob um falso angelismo que o situaria no nível dos seres espirituais e não humanos, o Papa não hesitou em usar o banheiro público, como qualquer outra pessoa o faria. Parece que alguns, possuídos pelo que o vulgo chama “espírito de porco” ficaram chocados com isso.

Ainda em Milão, Francisco teve um encontro com presos na penitenciária de San Vittore. O Papa é muito atento aos encarcerados e várias vezes tem dito que a Igreja deve aproximar-se dessas pessoas para transmitir-lhes o perdão e a misericórdia divinos. Desta vez, porém, o pontífice não se limitou a conversar e almoçar com os detentos. Também descansou brevemente dentro da presídio no quarto do capelão. É a primeira vez na história que um Pontífice descansa e dorme, ainda que por um breve espaço de tempo, dentro de um cárcere.

A aproximação do pastor com as ovelhas feridas e isoladas do convívio com a sociedade para cumprir pena determinada pela lei se faz ainda mais visível e evidente. Ali onde estão aqueles que são considerados uma ameaça à segurança, o Papa não apenas se faz presente, mas dorme e descansa. Em lugar de fazê-lo em uma casa religiosa, na sede da arquidiocese ou mesmo em um hotel, escolhe faze-lo no mesmo lugar onde dormem os presos, em solidariedade concreta com os mesmos. Como se quisesse demonstrar que nada teme estando ali entre eles.

Não poderiam faltar os comentários desairosos e inoportunos diante de um gesto profético desta natureza. Questionamentos do gênero: “Por que vai dormir na cela do capelão e não junto com os detentos?” foram feitos, assim como outros menos convenientes ainda.

O pontificado de Francisco, entre outros muitos frutos positivos, tem tido este de oferecer uma outra visão da pessoa do Pontífice e seu ministério. Despojado de distâncias e afastamentos causados pela solenidade da posição que ocupa, o Papa argentino tem insistido em estar próximo das pessoas, em afeto e solidariedade, mostrando-lhes o rosto de uma Igreja formada por seres humanos, frágeis, finitos e limitados. Mas que a partir dessa fragilidade, é chamada a ser, antes de tudo, solidária.

Os dois episódios que comentamos e provocaram comentários tão inconvenientes trazem à tona uma visão dualista e equivocada sobre como é e, sobretudo, como deve ser o chefe da Igreja. Não é nem deve ser alguém distante, acima das vicissitudes pelas quais passa a humanidade que deseja servir. Ao contrário, em tudo com ela solidário, por tudo desejoso de servi-la, assume plenamente sua condição em seus aspectos mais francamente concretos. Igualmente e mesmo naquilo que tem de mais frágil e vulnerável.

Em suma, não deseja estar em nada separado daqueles que carregam o peso desta humanidade. Mesmo dos que estão mais à margem da mesma e não inspiram segurança, e sim medo. Coerente e inspirado em seu espírito de solidariedade Francisco continua surpreendendo a todos. Mesmo aqueles que, possuídos pelo “espírito de porco”, encontram sempre algo a criticar em seus inusuais e tão humanos gestos.


quinta-feira, 6 de abril de 2017

ESSA TAL FELICIDADE

Atualmente somos 7 bilhões de pessoas circulando sobre o planeta terra e todos com um desejo: ser feliz. Será que a conta fecha? Dá para tantas pessoas serem felizes num planeta com recursos limitados? Ou a felicidade não depende de recursos? Dá para ser feliz sem internet, sem carro, sem dinheiro para uma cervejinha, sem condições econômicas para um plano de saúde, sem dinheiro para usufruir as férias, os bens culturais etc? Será que todos podemos almejar a felicidade ou ela é reservada a alguns e para outros o que sobra é o “vale de lágrimas”? Essas perguntas parecem sem propósito e descabidas. É óbvio que a felicidade é para todos, dirá o leitor, meio sem paciência e quase indignado. O leitor é um sábio... A sabedoria é o caminho da felicidade, diziam os antigos filósofos...

Devemos a Aristóteles a ideia, ainda vigente, de que a felicidade é o fim último a que tendem as nossas ações. Fim último, porque ela não é meio para nada. A saúde é meio, o dinheiro é meio, as coisas e os amigos são meios, mas a felicidade é fim em si mesma. Ninguém deseja ser feliz para, em sendo feliz, alcançar uma coisa além dela. Claro, a felicidade não é um estado da alma duradouro, ela é uma atividade que, inclusive, depende de muitos meios, tais como amigos, beleza, dinheiro etc.

Os estoicos e os epicuristas diziam que a felicidade independe das condições externas, e o que importa mesmo é o estado da alma de serenidade, de controle sobre as paixões, alcançável mesmo em situações adversas de penúria e sofrimento. Para isso é fundamental limitar os desejos, fontes de muitas perturbações. Essa parece ser também a concepção de felicidade esposada pelo budismo.

Jesus aponta para outro caminho. Se queres ser feliz, faça os outros felizes. A felicidade não depende nem de meios e nem é um estado da alma que está sob nosso controle. A felicidade é um dom do Reino de Deus, alcançável no amor ao próximo. Nesse sentido não há nada mais terapêutico e liberador do que distribuir sorrisos ou cestas básicas aos necessitados, visitar os doentes e presos, curar as feridas do outro etc... Se estás infeliz, então faça alguém feliz e aí a felicidade te sorrirá. Se queres ser feliz, faça o outro feliz. Simples assim!

Para Kant a felicidade não é o que importa. O que importa mesmo é merecer a felicidade e para isso é preciso agir por dever e não com interesse em ser feliz. O que importa mesmo é ser bom, e não ser feliz. Ser feliz teria algo de mesquinho e de interesseiro egoístico. Estranho esse Kant, mesmo que instigante!

De qualquer forma, você já viveu um instante em que desejou que aquela fração de tempo se eternizasse? Você já viveu um instante num lugar em que não desejaria estar em outro? Se sim, então, você sabe do que estamos falando. Não sabe!?

quarta-feira, 5 de abril de 2017

O PAÍS DO FAZ DE CONTA

Faz de conta que temos democracia.

Faz de conta que temos Congresso.

Faz de conta que temos partidos políticos.

Faz de conta que temos parlamentares.

Faz de conta que temos homens públicos.

Faz de conta que temos sindicatos.

Faz de conta que termos movimentos sociais.

Faz de conta que temos LUTA.

Faz de conta que temos imprensa livre.

Faz de conta que temos cultura.

Faz de conta que temos livre-concorrência.

Faz de conta que temos capitalismo.

Faz de conta que temos educação.

Faz de conta que temos escolas.

Faz de conta que temos saúde.

Faz de conta que temos segurança.

Faz de conta que temos Justiça.

Faz de conta que temos moral.

Faz de conta que temos ética.

Faz de conta que temos cidadania.

Faz de conta que temos governo.

Faz de conta que somos uma Nação.

terça-feira, 4 de abril de 2017

O BIOMA PAMPA

O bioma Pampa ocupa 63% do Rio Grande do Sul e constitui os pampas sul-americanos, que se estendem pelo Uruguai e pela Argentina. Marcado por clima chuvoso, sem período seco regular e com frentes polares e temperaturas negativas no inverno. É influenciado pelo clima subtropical e pela formação do relevo, constituído principalmente por planícies. Em virtude do clima frio e seco, a vegetação não se desenvolver, sendo constituída principalmente por gramíneas.

Estimativas indicam valores em torno de três mil espécies de plantas. A fauna é expressiva, com quase 500 espécies de aves. Também ocorrem mais de 100 espécies de mamíferos. O vento é uma das características marcantes do cenário. Porém, a expansão das monoculturas e das pastagens tem levado a uma rápida degradação e descaracterização das paisagens naturais. Em 2002 restavam 41,32% e em 2008 apenas 36,03% da vegetação nativa.

Os primeiros europeus a ocupar o Estado foram os jesuítas espanhóis vindos do Paraguai, fugindo dos bandeirantes paulistas e no século XVIII chegaram os negros. A partir do século XIX surgem as fazendas com caráter de subsistência e comercial.

A mulher assumiu papel importante na conservação do Pampa por serem as responsáveis pelas lidas domésticas, alimentação da família e cuidado com os filhos, enquanto o esposo cuidado do gado do fazendeiro.

A ovinocultura, tanto pelo uso da carne como da lã, ainda é forte na região, mas sua principal atividade continua sendo a criação do gado bovino. O chimarrão, o churrasco, a música de fronteira são riquezas culturais.

Entre os desafios e as fragilidades hoje estão às iniciativas governamentais que contrariam a vocação natural da região para a pecuária e o turismo. Inclui plantios de pinus e eucaliptos que alterara os recursos hídricos, interferem no regime dos ventos e na evaporação. A monocultura, o plantio de eucalipto, acácia e pinus formam o “Deserto Verde”. Nessa região latifundiária há muitas famílias de pequenos agricultores, indígenas e quilombolas que necessitam de apoio e valorização.

segunda-feira, 3 de abril de 2017

CORPO E ALMA EM CONFLITO.

  O corpo pode ser compreendido de vários pontos de vista. Para os cristãos o corpo é algo sagrado, obra do Criador. Para os filósofos gregos o corpo é a prisão das ideias. Na verdade, vive-se a vida num corpo. Por essa razão, o corpo é um espaço de relações humanas, sociais.

Para o filósofo grego Platão o corpo é o espaço que aprisiona a alma. Quase toda a filosofia grega, além de Platão, também defendia esta ideia. Contudo, era algo que se deveria aceitar, mas que não fazia parte da realidade do ser humano. Por conseguinte, rejeitava os sentidos por ser o aprisionamento das ideias, da alma. Por essa razão, nada era mais nobre que a capacidade de pensar. Logo, somente a capacidade racional penetra no conhecimento da realidade além dos limites físicos do corpo.

O cristianismo também contribuiu com este pensamento da filosofia grega. A teologia da cristandade colaborou para esta visão ao pregar que a perfeição humana acontecia pelo espírito emancipado do corpo. Com base nesta teologia as pessoas se submetiam a práticas de mortificação do corpo. Segundo historiadores, São Francisco de Assis jogava-se sobre os espinhos de roseiras, dormia sobre pedras, comia cinzas e passava fome para a mortificação do corpo. Até há pouco tempo praticamente todos os movimentos religiosos ocupavam-se do cilício, do jejum, da abstinência e de outras formas de sacrifício corporal em vista do crescimento espiritual. O cilício era uma túnica, cinto ou cordão de crina que se trazia sobre o corpo para mortificação ou penitência. Isto é, uma veste que mostra desprezo pelo corpo e apreço pela alma.

Quanto a esta visão, na Bíblia não existe a dualidade do ser humano, ou seja,corpo e alma em conflito. Corpo e alma são um todo da vida humana. Daí que a oração de Jesus não é um exercício especulativo da atividade intelectual. Para Jesus o cuidado com a vida corporal é algo sagrado. O corpo não é causador do pecado e do mal. O corpo ocupa um lugar central nas relações humanas. Prova disto é que Jesus cura as pessoas de qualquer doença física e tormenta psíquica, emocional.

Enfim, nossos contemporâneos veem no corpo uma oportunidade de consumo, de estética, de publicidade e de motivo de preocupações da cabeça aos pés. A nova cultura faz do ser humano um escravo do próprio corpo. É um comportamento oposto ao da visão dos filósofos gregos e da doutrina cristã de outrora. No fundo, para a socialização da dignidade humana como um todo é preciso a superação dos extremos das visões sobre o corpo. Logo, olhar para a atitude de Jesus é a condição de superação destes paradigmas. Nele ver que a vida deve estar integrada em todas as suas dimensões. Isto é de suma importância para a valorização das relações humanas, sociais, culturais.

domingo, 2 de abril de 2017

RATOS? TEM QUE EXTERMINAR NO NASCEDOURO.

A corrupção é inerente à história humana. Até no grupo de apóstolos escolhidos por Jesus havia um corrupto: Judas Iscariotes. E quantos de nós podem dizer com sinceridade que nunca roubaram uma manta de avião, sonegaram o imposto de renda, embolsaram o troco excessivo entregue por engano pela caixa do supermercado?

A corrupção decorre da impunidade e da imunidade. Impunidade de empreiteiras, empresas, frigoríficos e bancos que, graças ao caixa dois, tinham (e muitos ainda têm) em mãos juízes, políticos e fiscais. E imunidade assegurada por essa aberração constitucional chamada foro privilegiado, que derruba o princípio angular do direito e legitima a verdade de que nem todos são iguais perante a lei.

Agora, surgiu uma pedra no meio do caminho de corruptos e corruptores: a Lava Jato. Em si, necessária e urgente. É a primeira vez na história do Brasil que políticos graduados e donos de empresas são encarcerados e obrigados a devolver aos cofres públicos parte do que roubaram.

Mas há lisura na Lava Jato? Infelizmente os fatos demonstram que não. Promotores buscam vaidosamente a luz dos holofotes; frequentes vazamentos jamais são investigados e os responsáveis punidos; e as informações contrabandeadas dos autos para a mídia são preconceituosamente seletivas, focando uns partidos e poupando outros...

Porém, no tsunami de corrupção que assola o Brasil, a Lava Jato constitui uma exceção. Onde estão os criminosos descobertos pela Operação Zelotes? Todos soltos. Onde os responsáveis pela catástrofe provocada pela Samarco, em Minas? Todos em liberdade. E as maracutaias do metrô de São Paulo? Debaixo do tapete.

O elitismo é um carrapato que suga privilégios da Justiça. Adriana Ancelmo, mulher do ex-governador Sérgio Cabral, será libertada para cuidar dos filhos de 11 e 14 anos. E quantas outras mães que se encontram encarceradas merecem o mesmo privilégio (termo que decorre de “lei privada”, feita para beneficiar uma pessoa)?

A Lista do Janot, enfim, chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF). Mas também vazou ao cobrir os poucos metros que separam a Procuradoria Geral da República do STF. O que favorece todo tipo de especulação sobre os nomes ali registrados.

E quanto tempo levará o STF para condenar os culpados e absolver os inocentes? Até hoje o STF não levou nenhum político com mandato à cadeia. E no passo de tartaruga que o caracteriza, pode ser que muitos crimes prescrevam...

Acabamos de presenciar a descoberta de mais um nicho de corrupção: os frigoríficos, que entregam carne apodrecida ao consumo da população. Muitos outros nichos existem, alguns ainda serão descobertos.

No entanto, fica uma pergunta: como toda essa montanha de dinheiro roubada pelos réus da Lava Jato transitou do Brasil ao exterior? Levada em mala de turista? A nado? Enfiada em tubos de pasta de dente?

Se o Banco Central tem olhos para qualquer quantia acima de 10 mil reais movimentada entre bancos, como justificar sua cegueira diante de vultosas quantias da corrupção?

Não basta espalhar veneno pela casa para acabar com os ratos. É preciso exterminá-los no nascedouro. Do mesmo modo, enquanto as instituições brasileiras não passarem por profundas reformas, como erradicar o foro privilegiado, os ratos continuarão à espreita, dispostos a aproveitar as múltiplas brechas hoje existentes.