quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

EM QUE LUGAR VOCÊ ESTÁ?

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“Do lado de quem você está?”. Eis uma interrogação que provoca e contribui para revelar configurações partidárias que presidem relacionamentos. Inscreve-se nesse questionamento a tentativa humana de demarcar lugares – o que por vezes, evidencia velada pretensão de poder, que também se assenta na segurança do corporativismo dos aliados. A definição de “lado” hospeda a ilusória sensação de se estar “em casa”, confortavelmente, sem adversários por perto. Um equivocado sentimento de segurança que, não raramente, se fundamenta nas configurações sempre frágeis e limitadas de uma ideologia qualquer.

A interrogação - “do lado de quem você está?” - alimenta ainda a curiosidade, um dos fermentos nas disputas. Esse questionamento cabe, na medida certa, quando se trata de torcidas esportivas ou disputas partidárias, até mesmo do discernimento sobre interesses que se tem. Quer-se sempre saber o “lado” daqueles que exercem altos cargos nas esferas públicas e privadas, de pessoas com significativa projeção social e política, dos formadores de opinião. Mas é importante sublinhar: o desmedido apego à questão “do lado de quem você está?” pode impedir a vivência da unidade, que exige a inclusão da diferença, possibilidade real de enriquecimento em todos os aspectos.

E, para a superação de possível morbidez quando se move somente pelo que é partidário - considerando cenários da política, por exemplo - é preciso responder a questão sobre “o lado de quem você está” de forma diferente. Tomar partido em variados campos, a exemplo da política, pode ser força propulsora na sociedade, mas não se deve buscar apenas defender e reforçar determinado “lado”, ideologia ou discurso que privilegia a identificação de alguma referência simbólico-cromática.

“Do lado de quem você está?”. É possível uma resposta diferente, ao se lançar olhar atento e interessado sobre a sociedade, identificando os seus cenários, no exercício qualificado da cidadania: estar junto dos mais pobres, condição que alicerça o humanismo solidário. E os discursos que comprovadamente estão do lado dos pobres ultrapassam umbrais de academias ou de diretórios partidários, pois sempre serão seguidos de hábitos, de gestos e de atitudes dedicados aos que mais sofrem. Essa prática testemunhal, sem risco de simplesmente reforçar ou requentar falas, é o verdadeiro lado - sem a parcialidade que apenas gera divisões entre grupos e pessoas. Ao invés disso, estar com os pobres sustenta a unidade.

A prática testemunhal, na proximidade junto aos que mais precisam, sinaliza distanciamento de lógicas perversas: a busca por acumular sempre mais riquezas sem ter a coragem de dedicar-se à partilha, à generosidade; o apego ao privilégio de integrar instâncias de decisão e exigir, dos outros, somente dos outros, a adoção de rumos novos. A prática testemunhal guarda a força da coerência necessária para a superação de todo tipo de exclusão e de preconceito. Sabe-se do risco de se apegar a um determinado lado, achando-se no direito de ser indiferente e até de odiar os que estão em outro lugar. Esse apego é característica dos que apenas querem justificar privilégios, alcançar comodidades tranquilizadoras da consciência de seu próprio grupo, ampliar espaços de atuação, inclusive misturando religião e opções confessionais com interesses políticos espúrios.

A interrogação intrigante, “de que lado você está?”, continuará a ser repetida, e mal ou bem respondida, até que um qualificado tecido civilizatório se constitua e a cidadania não seja pautada pelas parcialidades, nas hegemonias, mas na unidade edificada e mantida pela justiça. Hoje, diante da ausência de entendimentos mais lúcidos, torna-se importante identificar “lados” para, a partir do convencimento, promover adesões ao caminho que leva a correções dos funcionamentos da sociedade, dominada pelo consumo e pela ganância.

Esse rumo a ser buscado exige a clareza para compreender que vale menos o lugar ocupado a partir do campo ideológico. O importante é estar junto dos pobres, assumindo um lado que exige coragem para defender direitos e promover a justiça, o território da solidariedade. Nesse horizonte, a partir da tarefa, compartilhada por todos, de se construir um mundo melhor, pode valer a sugestão de substituir a intrigante interrogação “de que lado você está?” por um exercício de autorreflexão. Avaliar, para além das ideias, a própria participação na mudança requerida. Assim, torna-se possível responder, com mais clareza, nova interpelação: “em que lugar você está?”.

terça-feira, 28 de janeiro de 2020

ALEM DE NOS O QUE MAIS TEM NAS PRAIAS?


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Um estudo inédito revelou que os banhistas que frequentam as praias no país dividem espaço, a cada trecho de 8 quilômetros (km), com mais de 200 mil bitucas de cigarro, 15 mil lacres, tampas e anéis de lata, 150 mil fragmentos de plásticos diversos, 7 mil palitos de sorvete e churrasco e 19 mil hastes plásticas de pirulitos e cotonetes.
A reportagem é de Flávia Albuquerque, publicado por Agência Brasil, 24-01-2020.

Os dados são resultado da segunda fase do projeto Lixo Fora D’Água, que visa combater as fontes de poluição marinha por resíduos sólidos, coordenado pela Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) e um acordo de cooperação com Secretaria de Meio Ambiente de Santos, com apoio da Agência de Proteção Ambiental da Suécia.

O projeto existe desde 2018 e nesse período identificou que as três principais fontes de vazamento de lixo e resíduos para o mar são as comunidades nas áreas de palafitas, os canais de drenagem que atravessam a malha urbana e a própria orla da praia em sua faixa de areia.

De acordo com o estudo, entre os resíduos mais encontrados e em maior quantidade nas praias estão os materiais plásticos e de forma variada, como plástico filme, pequenos tubos plásticos, hastes plásticas e isopor (52,5%); a bituca de cigarro, responsável por 40,4% do lixo coletado; e borracha, metal, madeiras, embalagens e outros (7,11%).

“Os resultados desse projeto inédito são fundamentais para enfrentar o problema do lixo no mar. Mais do que limpar praias e retirar resíduos do oceano, o plano de ação permitirá às cidades o desenvolvimento de melhores práticas para evitar que os resíduos continuem a poluir o estuário e a orla da praia”, disse o diretor presidente da Abrelpe, Carlos Silva Filho.

Operação Areia Limpa

Com base nos números apurados a Abrelpe decidiu criar a Operação Areia Limpa, que começa no dia 25 de janeiro e dura um mês. Serão escolhidas duas barracas na praia de Santos, litoral de São Paulo, que receberão mobília e assessórios novos, como mesa de apoio com lixeira; taças e copos retornáveis; canudos compostáveis que serão segregados e, ao final do projeto, levados para compostagem; bituqueiras ‘individuais’ de bambu; e carrinho coletor (de 100 litros) para limpeza frequente ao longo do dia. Haverá ainda placas sinalizadoras e um “cardápio” com informações sobre descarte e sobre a operação.

“É a primeira vez que uma ação de prevenção e combate ao lixo no mar é pensada e implementada a partir de estudos metodológicos multissetoriais, com a execução idealizada a partir da prototipagem de soluções que tenham viabilidade econômica, técnica e operacional com vistas à mudança de comportamentos para que se possa alcançar o objetivo maior de reduzir a quantidade de resíduos que vão parar no mar”, explicou Filho.

Indicadores internacionais mostram que cerca de 80% do lixo marinho tem origem no ambiente terrestre. No Brasil, mais de 2 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos vão parar nos rios e mares todos os anos, quantidade suficiente para cobrir 7 mil campos de futebol.

O Projeto Lixo Fora D’Água acontece simultaneamente em outras seis cidades litorâneas: Balneário Camboriú (SC), Bertioga (SP), Fortaleza (CE), Ipojuca (PE), Rio de Janeiro (RJ) e São Luís (MA). Para essas cidades também serão elaborados diagnósticos individualizados. As ações de prevenção, limpeza e monitoramento do lixo no mar serão desenvolvidas e implementadas com base no aprendizado desenvolvido inicialmente em Santos.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

VOLTANDO A REALIDADE


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As festas na passagem de ano se engalanam para, certamente, encobrir a realidade. O íntimo de cada indivíduo, os cenários econômicos, políticos e religiosos mostram aspectos muito diferentes do que se presencia nas comemorações espetaculares. Por isso mesmo, exigem adequado tratamento. Obviamente, a euforia da contagem regressiva, ao se finalizar um ano civil e começar um novo ano, justifica-se pelo nutrimento de esperanças traduzidas com os augúrios de todo tipo. Além de ser uma propriedade do coração humano, esperar um novo tempo se põe como exigência e premente necessidade, especialmente quando se considera os descalabros e descompassos civilizatórios, como o crescimento da miséria, a condição cruel dos refugiados, a prática irresponsável de extermínios de indígenas, moradores de rua, mulheres. Passadas as comemorações, é preciso buscar profundas mudanças que permitam superar esses pesos que recaem, especialmente, sobre os mais pobres e indefesos.

Impressiona o quanto se gasta com fogos de artifício, incalculável é o consumo de comida – para além da necessidade – e de álcool. As festas na passagem de ano estão distantes da realidade de diferentes cenários sociais. Muitos parecem buscar a alegria não na expectativa de um tempo novo, mas no espetáculo que reúne fogos, comida e bebida. Enxerga-se na festa, equivocadamente, a possibilidade de fazer surgir a novidade esperada, o futuro que se quer. Essa reflexão não é juízo moralista - descabido e inassimilável nas celebrações festivas da passagem do ano. Trata-se de indicação que pode ajudar a perceber que, além das festas, é preciso avançar na busca pelos caminhos capazes de levar a nova etapa civilizatória.

Ora, sempre haverá festas, que são também importantes contribuições para compor o tecido da cidadania, constituir a dimensão interior que sustenta condutas e inspira sentimentos de solidariedade a partir de um encantamento pela vida, que não se pode perder, pois levaria a uma falta de graça suicida. A baixa estima pela vida corrói interioridades, inviabiliza percepções para se viver qualificadamente, prejudica o cumprimento de obrigações e posturas que podem contribuir para avanços sociais, econômicos e políticos. O aspecto fantástico das luzes e cores, mesmo sendo um fenômeno efêmero, é beleza que marca o caminho inaugurado pela contagem de uma nova série de dias vindouros, mas também pode esconder uma essencialidade interior que, se for desconsiderada, leva a situações desastrosas.

O ingrediente perigoso e ilusório que esconde e, ao mesmo tempo, indica haver uma baixa estima pela vida é revelado nas festas que substituem o encontro familiar, a troca da solidariedade, pela ostentação de roupas e maquiagens, na simples busca pela aceitação dos outros em vez de se cultivar laços verdadeiros de amizade, no comer e beber exageradamente enquanto se conversa sobre veleidades. A sociedade contemporânea - descompassada social e politicamente, mesmo cultural e religiosamente, encobre e, ao mesmo tempo, é vetor de baixas estimas, que levam a revoltas, ao desrespeito a princípios éticos e ao fomento de todo tipo de violência. Abre-se mão da simplicidade, da sobriedade e do equilíbrio, remédios que curam indiferenças, dissabores e a falta de gosto pelo altruísmo e pela vida.

Em oposição às ilusões, a espiritualidade proporciona uma qualificação interior para que se tenha coragem de voltar à realidade, sempre, de novo, a cada dia, e, ao reconhecê-la, humanizá-la. Assim, contribuir na superação dos descompassos e manipulações que continuam a dizimar a humanidade. Quando o ser humano alicerça-se somente na razão, não consegue avançar na direção de um mundo melhor. Fracassa, ou até joga lama sobre o que já conquistou, por falta de qualificado humanismo que formata hábitos, práticas e posturas cidadãs. O resultado é sempre a vida ameaçada, como revelam tantos acontecimentos recentes, já vividos neste novo ano.

A volta à realidade é exercício cotidiano para a confecção de um novo tecido civilizatório, na contramão de prepotências de chefes de Estado, de escolhas criminosas em instâncias ou instituições. É considerar a necessidade urgente de se desmontar esquemas estruturais e conjunturais, também individuais, dos muitos que não querem renunciar a seus privilégios e, consequentemente, passam por cima da dignidade humana e do bem comum. Desafio e exigência, voltar à realidade, sem medo de sua crueza e a partir do sonho de transformá-la, é passo decisivo para um novo humanismo, integral: cultivando uma vida simples, a coragem sábia para enfrentar adversidades com alegria, promovendo o bem, a justiça e a paz.

quarta-feira, 22 de janeiro de 2020

OBRIGADO, PAULO GUEDES, OBRIGADO DE VERDADE!

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Por Eric Nepomuceno: "O governo de Jair Messias está coalhado de pessoas cuja capacidade de surpreender o mundo é insuperável.

Agora foi a vez, de novo, de Paulo Guedes, o ex-funcionário da ditadura de Augusto Pinochet, a mais sanguinária do Chile e uma das mais sanguinárias da história contemporânea desta Nossa América.

Falando em Davos, na Suíça, no encontro anual que reúne mandatários, ministros e os donos do dinheiro do planeta, Guedes saiu-se com uma explicação sensacional.

Sabedor que seu atual patrão é visto no mundo inteiro como um inimigo inoxidável do meio-ambiente, Guedes tratou de esclarecer a verdade dos fatos. Ou seja: a pobreza, e não Jair Messias e sua cambada, é a maior inimiga do meio-ambiente.

Os pobres destroem o meio-ambiente porque precisam comer. Como é que ninguém, absolutamente ninguém, se deu conta dessa obviedade?

Devo admitir que nem o patético ministro do Meio-Ambiente, Ricardo Salles, seria capaz de ser tão esclarecedor.

O mundo inteiro achando que o meio ambiente brasileiro é destruído por mineradoras, por garimpeiros ilegais, por invasores de terras públicas e de reservas indígenas, por madeireiros ávidos, por latifundiários gananciosos e inescrupulosos, todos e cada um deles devidamente estimulados por Jair Messias e a leniência de seu governo, e todos nós, o mundo inteiro e eu, redondamente enganados: o que destrói o meio ambiente é a pobreza, é esse bando de famélicos que devoram árvores.

Claro que de imediato cientistas, ambientalistas, militantes da causa da natureza e as nefastas ONG’s despejaram críticas duríssimas contra Paulo Guedes. Claro que a imagem do Brasil no mundo, que já andava péssima, avançou um pouco mais rumo ao isolamento.

Mas também é claro que quem critica faz parte da grande conspiração contra a soberania nacional, do marxismo cultural que está cada vez mais impregnado em tudo que é lado.

Aliás, por falar em impregnar, Paulo Guedes também defendeu, com a veemência habitual, o uso de agrotóxicos.

Reconheceu que não temos (nem teremos) um meio-ambiente limpo, mas justificou: ‘As soluções não são simples. São complexas’.

Lembro de novo, aqui, o comentário que ouvi há anos de um amigo sagaz: ‘Tem limite para tudo nessa vida, até para saque em caixa eletrônico’.

Pois é: para tudo, menos para o governo de Jair Messias.

Para tudo, menos para a capacidade de disparar imbecilidades aos montes, assombrando plateias mundo afora.

Que Paulo Guedes sente ojeriza por pobres e trabalhadores já tinha ficado mais do que claro. Mas que sua imaginação fosse capaz de chegar a semelhante disparate não deixa de ser uma surpresa.

E eu, cá na minha ignorância, achando que latifundiários, construtores de barragens, desmatadores acobertados tinham a culpa... santa inocência, a minha, que nunca percebi que os mortos de fome derrubam a floresta para fazer salada de folhas e churrasco de troncos...

E eu, pensando que Paulo Guedes jamais passou de ser um economista desprezado por seus pares, e por isso mesmo um ressentido amargado, um ex-funcionário de Pinochet que bem que quis implantar aqui o mesmo regime de previdência que resultou na explosão popular faz pouco tempo e que mantém o governo direitista de Sebastián Piñera acossado contra a parede... Pois eu, cá comigo, achando que Guedes não era nada mais que um sacripanta perigosíssimo, pela sua capacidade de destruir o país... quanta injustiça, a minha.

Obrigado, Paulo Guedes, muito obrigado por ter me trazido a luz. Além de tudo que eu já achava de você, agora sei que sua prepotente indecência e sua imbecilidade não conhecem limites.

segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

O CUIDADOR.


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O cuidado humaniza tanto quem cuida quanto quem é cuidado.

O cuidado é uma atividade essencial para a vida em sociedade. Somos seres sociais só e somente só por que em sociedade cuidamos uns dos outros.

A ideia de contrato social tem como base um acordo de cuidado coletivo. O Estado foi criado para "cuidar" da sociedade, pelo menos no discurso...

Contudo, o cuidado é sistematicamente desvalorizado. Cuidar de crianças, idosos, pessoas com deficiência é visto como desagradável obrigação.

A solução, para quem pode, é pagar, mal, para que alguém cumpra a função. Ou, pior, simplesmente não pagar. Coincidentemente, ou não, quem cumpre o papel do cuidado é a mulher. A babá, a professora da escola infantil, a cuidadora de idosos. A mãe de primeira viagem, a solteira, a avó a doméstica.

E o cuidado humaniza tanto quem cuida quanto quem é cuidado. Pois, mostra que não prescindimos ninguém, pelo contrário, todas pessoas são imprescindíveis.

Visto como um trabalho de segunda categoria, ou ate mesmo um não trabalho, o cuidado reside no imaginário romantizado das tarefas femininas.

Logo, o papel subalterno do cuidado é um sintoma de adoecimento social, também um sintoma de machismo.

sábado, 18 de janeiro de 2020

QUANDO A CONTRADIÇÃO É GRANDE DEMAIS, SIMPLESMENTE CALAMOS

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Uma das realidades mais perversas da história humana foi o milenar estatuto da escravidão. Aí se mostra o que também podemos ser: não só sapiens, portadores de amor, empatia, respeito e devoção, mas também demens, odientos, agressivos, cruéis e sem piedade. Este nosso lado sombrio parece dominar a cena social de nosso tempo e também de nosso país.

A história da escravidão se perde na obscuridade dos tempos milenares. Há uma inteira literatura sobre a escravidão, no Brasil, popularizada pelo jornalista-historiador Laurentino Gomes em três volumes (só o primeiro já veio a lume, 2019). Fontes de pessoas escravizadas são quase inexistentes, pois elas eram mantidas analfabetas. No Brasil, um dos países mais escravocratas da história, as fontes foram queimadas a mando do ingênuo “gênio”Ruy Barbosa, no afã de borrar as fontes de nossa vergonhosa nacional. Daí, que nossa história foi escrita pela mão branca, com a tinta do sangue de pessoas escravizadas.

A palavra escravo deriva de slavus em latim, nome genérico para designar os habitantes da Eslávia, região dos Bálcãs, sul da Rússia e às margens do Mar Negro, grande fornecedora de pessoas feitas escravas para todo o Mediterrâneo. Eram brancos, louros com olhos azuis. Só os otomanos de Istambul importaram entre 1450-1700 cerca de 2,5 milhões dessas pessoas brancas escravizadas.

No nosso tempo, as Américas foram as grandes importadores de pessoas de África que foram escravizadas. Entre 1500-1867 o número é espantoso: 12.521,337 fizeram a travessia transatlântica, das quais, 1.818,680 morreram a caminho e foram jogados ao mar. O Brasil foi campeão do escravagismo. Só ele importou, a partir de 1538, cerca de 4,9 mihões de africanos que foram escravizados. Das 36 mil viagens transatlânticas, 14.910 destinavam-se aos portos brasileiros.

Estas pessoas escravizadas eram tratadas como mercadorias, chamadas “peças”. A primeira coisa que o comprador fazia para “traze-las bem domesticadas e disciplinadas” era castigá-las, “haja açoites, haja correntes e grilhões”. Os historiadores da classe dominante criaram a legenda que aqui a escravidão foi branda, quando foi crudelíssima.

Basta um exemplo: o holandês, Dierick Ruiters que em 1618 passou pelo Rio relata: “um negro faminto furtou dois pães de açucar. O senhor, sabendo disso, mandou amarrá-lo de bruços a uma tábua e ordenou que um negro o surrasse com chicote de couro; seu corpo ficou da cabeça aos pés, uma chaga aberta e os lugares poupados pelo chicote foram lacerados à faca; terminado o castigo, um outro negro derramou sobre suas feridas um pote contendo vinagre e sal…tive que presenciar –relata o holandês – a transformação de um homem em carne de de boi salgada; e como se isso não bastasse, derramaram sobre suas feridas piche derretido; deixaram-no toda uma noite, de joelhos, preso pelo pescoço a um bloco, como um mísero animal”(Gomes, Escravidão,p.304). Sob tais castigos. a espectativa de vida de uma pessoa escravizada em 1872 era de 18,3 anos.

O jesuíta André João Antonil dizia:”para o escravo são necessários três Ps, a saber: pau, pão e pano”. Pau para bater, Pão para não deixá-lo morrer de fome e Pano para esconder-lhe as vergonhas.

Seria longo enumerar as estações desta via-sacra de horrores pela qual passaram estas pessoas escravizadas; elas são mais numerosas do que aquelas do Filho do homem quando foi torturado e levado ao madeiro da cruz, mesmo passando entre nós “fazendo o bem e curando os oprimidos” (Atos dos Apóstolos,10,39).

É sempre atual o grito lancinante de Castro Alves em “Vozes d’Africa”: “Ó Deus, onde estás que não respondes? Em que mundo, em qu’estrela tu t’escondes/ Embuçando nos céus? Há dois mil anos te mandei meu grito/ Que embalde, desde então, corre o infinito… /Onde estás, Senhor Deus?”

Misteriosamente Deus se calou como se calou no campo de extermínio nazista de Auschwitz-Birkenau que fez o Papa Bento XVI se perguntar:” Onde estava Deus naqueles dias? Por que Ele silenciou? Como pôde permitir tanto mal?”

E a pensar que foram cristãos os principais escravocratas. A fé não os ajudou a ver nessas pessoas “imagens e semelhanças de Deus”, mais ainda, “filhos e filhas de Deus”, nossos irmãos e irmãs. Como foi possível a crueldade nos porões de tortura dos vários ditadores militares da Argentina, do Chile, doUruguai, de El Salvador e do Brasil que se diziam cristãos e católicos?

Quando a contradição é grande demais que vai além de qualquer racionalidade, simplesmente calamos. É o mysterium iniquitatis, o mistério da iniquidade que até hoje nenhum filósofo, teólogo ou pensador encontrou-lhe uma resposta. Cristo na cruz também gritou e sentiu a “a morte”de Deus. Mesmo assim vale a aposta de que todas as trevas juntas não conseguem apagar uma luzinha que brilha na noite. É a nossa esperança contra toda a esperança.

quinta-feira, 16 de janeiro de 2020

FICAR POR AQUI MESMO.


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Certa vez, alguém me questionou: "Mas, e se Deus não existir! Nem céu, nem inferno, nem nada? De que vale ser bom, honesto, cumprir as leis, respeitar as regras, os mandamentos”?

- “Não tento ser bom por conta do depois. Minha ética é para aqui e o agora. Além do mais, ser mal caráter dá muito trabalho. Quanto ao céu, se vier, é lucro”!

Lembrei dessa história porque, hoje, amanheci com antipatia da vida. Não se assuste, todo mundo tem direito a alguma implicância. Pois bem. Eu tô implicado com a vida. Não com essa vida aqui e agora. Essa taí pra gente viver, com seu pacote completo de alegria, tristeza, saúde, doença, fartura e carência. Minha inglisia, hoje, é com a tal da vida depois da morte.

Ô campanha...

O pobre do defunto ainda nem esfriou no caixão e já tem que encarar essa peleja de céu, inferno, purgatório, limbo, reencarnação. Até se reencarnar numa pedra há de virar brita, se misturar com cimento, se fazer alicerce, laje, piso, todo mundo andando em cima, prá lá e pra cá, num movimento sem descanso ou sossego.

E o risco de, pra cumprir carma, reencarnar bolsominion, já pensou?

Não, hoje quero quem me garanta que "morreu, acabou".

Abro mão dessa demanda de vida depois da morte talqualmente, Galdino, o herege oficial da terra de Ariano Suassuna que explicava: "Herege é diferente de ateu. Ateu não acredita em Deus. Eu acredito, só não simpatizo com ele"...

Deus tem andado mesmo bem antipático. Especialmente esse deus dos pastores da teologia da prosperidade e dos padres do Centro Dom Bosco de Proteção à Censura. Mal humorado, amargo, cruel, vingativo, uma calamidade. Com esse deus não quero intimidade...

"Pois - continua o Galdino - se Deus me garantir, até o fim da minha vida, um punhadinho de carne de paçoca, uma lasca de rapadura do Crato, água fresca na bilha, uma rede debaixo da sombra de um juazeiro pra eu me esticar, o céuzinho dele ele pode dar pra quem ele quiser que não me interessa, não"...

Galdino tinha lá, sua razão...

Eu por mim, também tenho ideia de um céu pra me aboletar por aqui mesmo.

Haverá de ter um cinema, ao lado de uma biblioteca, de frente a um boteco onde a cerveja esteja sempre gelada e também o guaraná. E o tira-gosto, que não pode faltar.

Que haja amores, das muitas formas de amores que há.

Uma estrada boa pra querer viajar, uma casa boa pra querer voltar.

Que haja boa música, aquela que eu escolher, pra ouvir ao lado de quem me escolheu.

Que haja belos horizontes bem à minha frente, absolutamente originais, onde o sol invente, a cada dia, um alvorecer e um entardecer que não se repetem jamais.

Um folha de papel, uma caneta.

Que haja gente, que não me falte gente de todas as gentes com quem possa me esbarrar, conversar, aprender e ensinar...

Mas, Rui - reclamaria o Criador – e o que faço com a peruca loura, encaracolada, a camisola branca, de anjo, que pra você está guardada, a harpa e a trombeta?

- Com todo respeito, Senhor, enfia no cu do capeta!

quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

AGUENTA FIRME: ASSUNTO NÃO VAI FALTAR.

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Teve mais uma vez quem pulou sete ondinhas, vestiu branco, saiu carregando uma mala em volta do quarteirão para chamar viagens, comeu lentilhas, chupou caroço de romã. Fora a calcinha, que essa é de praxe. Ah, você usa cuecas? Coloridas? Acredita que já tentei praticamente de todas as cores nessa longa vida? Testei até não usar. Nunca veio, nem o amor da vermelha, nem o dinheiro da amarela, nem... Esse ano para o ano que vem, andei pensando, vou tentar a verde, da esperança. Qualquer coisa direi que estava lutando pelo meio ambiente, contra o aquecimento global, pela legalização, coisas assim...
Tem também a de acender velas, tomar passes, oferecer oferendas, de não comer nada que cisca pra trás, e o que mais? Banho de ervas? Roupa nova? Estourou uma champagne, viu a rolha voar, com aquele estampido bom, abraçou e beijou quem estava por perto, e assim foi a tal noite feliz – sempre acho que é essa a Noite Feliz, não a de Natal, sempre mais envolta em tristezas.

Espero que não tenha acreditado na possibilidade de fogos de artifício não terem barulho. Balela! Só o dia que forem apenas virtuais, projetados, e acredite, a gente vai odiar. Nada como vê-los como são, sempre foram, explodindo em cores, formatos – aquele momento, aqueles poucos minutos especiais em que viramos crianças de novo.

Fez lista de decisões? Escreveu ou ficou só na cabeça, na intenção? Aliás, já pensou ou olhou para ela nesses poucos, mas longos dias, que já correram e ocorreram de forma assustadora? Devo perguntar ainda se já desistiu de algum item e sacou que tinha exagerado, exigindo muito de você mesmo. Acontece. A gente se promete cada coisa!

Ano após ano parece que tudo se acelera, e que os efeitos de Ano Novo estão cada vez mais efêmeros. Antes, aliás, costumava-se dizer por aqui que o ano só começava depois do Carnaval, mas já faz algum tempo que isso mudou, creio que desde que a globalização se instalou de vez entre nós, fazendo o país acelerar para não ficar mais trás ainda do que já está. Fica aí esperando, sem fazer nada, trabalha não, pra ver se as coisas caem do céu.

Bem, você também já ter conferido: que eu saiba, não ganhou a tal Mega da Virada. Esse ano, joguei – e eu nunca jogo na loteria, mas a mulher do horóscopo falou que podia ser, que havia propensão, probabilidades. Não custava nada acreditar. Um ponto, e olhe lá, em cada aposta.

Enfim, as rédeas do destino a gente até segura, mas o cavalo empina sempre em mais direções do que a vã consciência pode explicar. Passou a meia-noite, e já na outra meia-noite estávamos preocupados com o luto da guerra, com o que os dirigentes mundiais se divertem, com os botões que apertam, as ordens que gritam, com as bobagens que proferem aos borbotões, isso sim. Descobrimos ou lembramos que não somos os únicos agentes de nossos caminhos, onde inclusive andamos deparando com tantos seres do mal que dá vontade de nem sair de casa e passar o ano é gritando socorro.

Aguenta firme aí, temos mais 50 semanas. E pelo que já vimos, assunto não vai faltar.

domingo, 12 de janeiro de 2020

VIVER UMA ECOLOGIA INTEGRAL


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A memória é uma reserva técnica e experiencial de lições consolidadas na vivência, a serem aprendidas e, muitas delas, revisitadas. Para isso, exige-se humildade, qualidade daqueles que têm alma de peregrino aprendiz, livre da habitual pretensão humana de acreditar que tudo sabe – cegueira que estreita horizontes e leva, até mesmo, à desconsideração de evidências interpelantes. E o começo de um ano novo depende da memória e de suas muitas lições para que sejam assumidos propósitos capazes de alimentar a esperança.


“A nossa comunidade humana traz, na memória e na carne, os sinais das guerras e conflitos que se sucedem, com crescente capacidade destruidora, afetando especialmente os mais pobres e frágeis. Há nações inteiras que não conseguem libertar-se das cadeias de exploração e corrupção que alimentam ódios e violências. A muitos homens e mulheres, crianças e idosos, ainda hoje se nega a dignidade, a integridade física, a liberdade – incluindo a liberdade religiosa –, a solidariedade comunitária, a esperança no futuro. Inúmeras vítimas inocentes carregam sobre si o tormento da humilhação e da exclusão, do luto e da injustiça, se não mesmo os traumas resultantes da opressão sistemática contra o seu povo e os seus entes queridos”. Torna-se urgente aprender as lições que emergem desses tristes cenários, para a formulação inteligente e humanitária de soluções capazes de dar novo rumo à civilização contemporânea.

No Brasil, dolorosa memória está prestes a completar um ano: a tragédia-crime ocorrida em Brumadinho, no dia 25 de janeiro de 2019. A dor revivida grita como lição, que não pode se restringir a investimentos midiáticos para limpar a imagem enlameada dos responsáveis pela tragédia. Urgente é alcançar a sabedoria que permite reconhecer a necessidade de se viver uma ecologia integral. A partir desse reconhecimento, é possível corrigir disparates que ameaçam o Brasil e o mundo, com ações rápidas e incisivas para derrubar a idolatria do dinheiro – hoje o seu domínio é pacificamente aceito por pessoas e sociedades. Não se consegue considerar, adequadamente, a desafiadora questão antropológica que permeia diferentes dinâmicas sociais: em nome do apego ao dinheiro, que se acumula para além do necessário, tudo se justifica, até a corrupção. O que vale é ganhar sempre mais, mesmo na contramão do bem de quem é mais pobre.

É preciso, pois, reconhecer as contradições do antropocentrismo no cenário contemporâneo, que coloca a razão técnica acima da própria realidade - dilui a força experiencial alicerçada no amor, que transforma, gera esperança e cura. Apegar-se apenas à razão técnica, desconsiderando a força experiencial com fundamentos no amor, conduz pessoas ao caos, por não saberem qual o seu verdadeiro lugar. Sem se autocompreender, de modo qualificado, o ser humano entra em contradição com a sua própria realidade. Aprenda-se a lição: é um erro depositar tanta confiança apenas na dimensão racional. Deve-se ir além e, em todas as práticas cotidianas, hábitos e decisões, investir no rico horizonte da ecologia integral. O ponto de partida é admitir que ninguém, individualmente, é capaz de tudo conhecer, assumindo que se sabe menos do que se pensa saber.

A perspectiva da ecologia integral oferece novos sentidos e, assim, possibilita enfrentar adequadamente as diferentes crises que ameaçam o mundo. Oportuno é retomar o significado da ecologia, conceito que remete às relações entre todos os seres vivos no ambiente onde vivem e se desenvolvem. Entre os desafios para fortalecer a harmonia necessária à vida de todas as criaturas está a consideração do risco devastador do consumismo, incentivado por diferentes mecanismos da economia global. Esses mecanismos deturpam as culturas. Debilitam a imensa variedade cultural que é um tesouro da humanidade.

As lições são muitas e exigem humildade, para cada pessoa adotar a condição de aprendiz. E no conjunto de aprendizados necessários, merece destaque a sábia interpelação: “A pior discriminação que sofrem os pobres é a falta de cuidado espiritual”. Seja aprendido o caminho para o cuidado espiritual, necessidade de todos, sem exceção - um rumo para lições e propósitos.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2020

PLÁSTICO: SOMOS O 4º PAÍS MAIS POLUIDOR.

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A pesquisa foi baseada no What a waste 2.0: A global snapshot of solid waste management to 2050, um estudo do Banco Mundial. O WWF analisou dados de mais de 200 países. Estados Unidos, China e Índia, nessa ordem, são os maiores poluidores. Abaixo do Brasil, estão Indonésia, Rússia, Alemanha, Reino Unido, Japão e Canadá. Eles ocupam, respectivamente, do quinto ao décimo lugar.

O Brasil produz 11,35 milhões de toneladas anuais de lixo plástico. Mas recicla apenas 145 mil toneladas, 1,28% do total. O País só não está mais “feio nessa fotografia” graças a Estados Unidos e China, as maiores potências mundiais. Os maiores produtores de lixo plástico, os norte-americanos reciclam 34,6% do lixo plástico. Contudo, a produção anual é alta: mais de 70 milhões de toneladas. Já a China recicla 21,92% das 54,7 milhões de toneladas que produz por ano. Ou seja, esses países reciclam um volume superior ao total de lixo produzido no Brasil. Mas deixam de reciclar um volume ainda maior. Nos Estados Unidos, são mais de 45 milhões de toneladas anuais não recicladas. Na China, mais de 42 milhões.

A média mundial de reciclagem plástica é de 9%. Mas, no ranking dos dez maiores poluidores, não é apenas o Brasil que recicla menos que a média. Índia (5,73%), Indonésia (3,66%), Rússia (3,58%) e Japão (5,68%) também estão bem abaixo dela. Do total de resíduos plásticos produzidos no Brasil, 91% são coletados, segundo o WWF. Mas, no final, quase 8 milhões de toneladas não são reaproveitadas. Vão parar em aterros sanitários. Outras 2,4 milhões de toneladas são descartadas em lixões a céu aberto.

“Nosso método atual de produzir, usar e descartar o plástico está fundamentalmente falido. Os maiores produtores de lixo plástico ainda não conseguiram debelar o problema. É um sistema sem responsabilidade. E atualmente opera de uma maneira que praticamente garante que volumes cada vez maiores de plástico vazem para a natureza”, disse Marco Lambertini, diretor-geral do WWF-Internacional. A instituição deixa claro, no entanto, que plástico não é “inerentemente nocivo”. Gera milhares de benefícios para a sociedade. “Infelizmente, a maneira com a qual indústrias e governos lidaram com o plástico e a maneira com a qual a sociedade o converteu em uma conveniência descartável transformou esta inovação em um desastre ambiental."

Apesar destes alertas em escala mundial, o Brasil ainda não tem qualquer política eficiente em nível de Estado para o problema apesar de ser um dos maiores produtores de lixo plástico. A Política Nacional de Resíduos Sólidos, dos tempos de Lula, é um tremendo fracasso. Hoje, alguns Estados e municípios proíbem certos materiais plásticos, como canudinhos, por exemplo. Mas é muito pouco para o nível da catástrofe que se avizinha. Passado quase um ano da nova administração, o Ministério do Meio Ambiente continua perdido em polêmicas menores com ONGs e ativistas, esquecendo-se de tomar providências para minimizar o problema. E a indústria do plástico no Brasil, apesar de pujante, diz que o problema não é com ela. Enquanto não agimos, a Á
frica lidera o banimento do material no mundo.