sábado, 22 de fevereiro de 2020

O CRESCIMENTO DIGITAL E SEUS PROBLEMAS III

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Continuamente a toda velocidade

No entanto, tanto os operadores de rede, como os provedores de acesso à internet, a exemplo da Orange, Bouygues ou SFR (Sociedade Francesa de Radiotelefonia), ou mesmo esses gestores de centros de dados que são os provedores de conteúdo como Netflix, Google ou Facebook, todos procuram a todo custo combater “o risco de latência” para o usuário. Isto é, o tempo que os dados levam para carregar e, portanto, a página da web ou o vídeo a ser exibido em nossos terminais. Para conseguir isso e poder responder a qualquer momento a uma demanda muito alta, eles inflam exageradamente a sua infraestrutura. “As infraestruturas são muito grandes, seja pelo número de servidores nos centros de dados ou pela largura da banda das redes de comunicação”, resume Laurent Lefèvre, do Inria.

Em consequência, muitas dessas máquinas funcionam continuamente a toda velocidade mesmo quando são pouco ou nada utilizadas. “Porque, mesmo que um servidor não seja usado, ele consumirá em energia o equivalente a 50% de seu consumo no momento de pico de atividade, observa Laurent Lefèvre. Além disso, alguns equipamentos de rede têm uma carga elétrica constante, independentemente de seu uso”.

O modem é um exemplo perfeito. Pelo fato de muitos deles não serem equipados com um simples botão liga/desliga, eles operam 24 horas por dia, mesmo quando são usados apenas uma parte do dia. Essa hiperdisponibilidade dos equipamentos também se reflete na falta de adaptação da rede aos ciclos de consumo, “embora possa haver uma sazonalidade em certos usos digitais, entre o dia e a noite, a semana e o final de semana”, acrescenta Laurent Lefèvre.

Uma economia sem limites

De fato, o digital foi construído com o desejo de oferecer um serviço cada vez mais eficiente e rápido, mas com muito pouca ou nenhuma consideração de seu peso energético e ambiental. “Do lado dos fornecedores, ninguém realmente agiu sobre a necessidade de projetar limites físicos para a economia digital”, disse Hugues Ferrebœuf, gerente de projetos digitais do The Shift Project. Ao mesmo tempo, o setor tem sido alimentado por ganhos constantes em eficiência energética. E para uma mesma ação, é preciso hoje uma quantidade de energia bem menor do que ontem.

Ou seja, dá para baixar o consumo de energia? Não, porque você precisa confiar no poder dos “efeitos rebote”, que são muito importantes no universo digital. De fato, assim que se torna mais barato energética e economicamente realizar uma determinada ação, a lógica seria que o consumo de energia diminua. Porém, acontece o contrário: por ser mais barato, intensificamos os usos! “Entre 2014 e 2018, para um mesmo dado transportado na rede móvel, conseguimos mobilizar cinco vezes menos energia, mas ao mesmo tempo transportamos sete vezes mais dados”, explica Marc Blanchet, diretor técnico e do sistema de informação da Orange. Fazer um uso mais eficiente em termos de energia não leva automaticamente a menos consumo, mas o contrário.

O reino da obsolescência

A implantação próxima do 5G mostra isso. A rede móvel de quinta geração, que deve entrar em operação nos próximos anos, é o resultado de uma inovação tecnológica, mas promete aumentar ainda mais o consumo de dados. “Uma velocidade multiplicada por dez e um tempo de transmissão dividido por outro tanto”, afirmam seus promotores. Se os contornos dessa tecnologia ainda não estão completamente definidos, nem as consequências ambientais conhecidas, é certo que isso vai gerar uma intensificação de usos. Mas também vai acelerar a troca da internet fixa pela internet móvel. No entanto, a rede móvel consome muito mais energia do que a rede fixa, pois é necessário transmitir um sinal de uma antena que deve passar através de paredes espessas e não trazê-lo através de cabos para um modem. O regulador francês de telecomunicações, a Arcep, diz que, comparada à fibra ótica, a rede móvel consome cerca de dez vezes mais energia para a mesma quantidade de dados transportados.

“Além disso, cada salto tecnológico acelera a obsolescência de equipamentos e o 5G não vai fugir disso”, acrescenta Frédéric Bordage. Uma das razões para a crescente pegada ecológica da tecnologia digital é a rápida renovação de equipamentos. Os franceses mudam de smartphone em média a cada dois anos, enquanto em 88% dos casos eles ainda funcionam. O motivo? “Os serviços digitais estão ficando mais pesados e os aparelhos estão tendo dificuldades para rodá-los. Portanto, eles ficam mais lentos ou não podem se atualizar”, resume Liliane Dedryver, gerente de projetos digitais da France Stratégie. Isso é chamado de fenômeno da “obésiciel” – uma contração de obesidade e programa. “O número de recursos para um mesmo serviço está aumentando constantemente, acrescenta Laurent Lefèvre, e acima de tudo com recursos não modulares, que não podem ser desativados”. A simples reserva de um bilhete pode ser acompanhada pela geolocalização do cliente, a memorização do histórico de suas buscas e de suas compras...

Os terminais devem ser cada vez mais poderosos para acompanhar esse ritmo frenético. Apesar das melhorias para potencializar o desempenho dos modelos mais antigos, os fabricantes estão lançando continuamente novos produtos com uma pegada de carbono mais alta que as versões anteriores. Entre o iPhone 4, lançado em 2010, e o iPhone X, comercializado em 2017, a pegada de carbono aumentou 75%, passando de 45 g para 79 g de CO2.

Baixa reciclagem

Com essa renovação, nossos armários estão cheios de smartphones e computadores antigos. Porque no final da vida útil, esses resíduos nem sempre acabam na lixeira apropriada. A taxa de coleta de celulares é de apenas 49% na França, em comparação com 95% para computadores. O balanço global é ainda mais fraco, pois apenas 20% do lixo eletrônico de todos os aparelhos é coletado. Além disso, coletar não significa necessariamente reciclar.

Desde a produção até a morte, o digital é tudo menos um serviço imaterial e renovável. “Ao levar muito pouco em conta seus limites ambientais, parte da inovação atual não é compatível com o mundo de amanhã”, estima Jean-François Marchandise, diretor de pesquisa e previsão da Fundação Internet Nova Geração (Fing). Uma ironia para um setor que quer transformar nossas vidas.

Publicado anteriormente por Justin Delépine.

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