domingo, 27 de maio de 2018

ESTAMOS NA ERA DO ESPÍRITO

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É mania, quase uma obsessão, do intelectual, sobretudo do historiador e do filósofo, dividir e fazer as devidas distinções, mas também, classificar, unificando o diferente, para melhor compreender. Devemos isso a Platão, sobretudo, que sabiamente dizia que conhecer é dividir e unificar, separar e juntar. Não é só uma ou outra coisa, são as duas coisas. Assim, dividimos a história em antiga, medieval, moderna e contemporânea. Ou dividimos a história do pensamento, mais ao sabor dos filósofos, em paradigmas: do ser, da consciência e da linguagem. Ou, ainda, em pré-modernidade, modernidade e pós-modernidade. Cada uma dessas classificações é já uma divisão e uma unificação de características que as definem.

No campo teológico e religioso não é diferente. Há um relativo consenso em pensar a história da experiência religiosa, pelo menos no judaísmo cristão ocidental, em três eras: a era do Pai, a era do Filho e a era do Espírito Santo. Alguns falam em era da fé, era da crença e era do Espírito.

A era do Pai seria a era da antiga aliança (AT), a era do Filho seria a era do cristianismo (NT) e, na continuidade, a era da Igreja e a era do Espírito seria a era da realização da boa notícia, do evangelho, num tempo pós-Igreja. Isso para ficar com o essencial. Possivelmente cada era comporta no seu interior as três eras, o que tornaria a tese ainda mais instigante, mas impossível de ser detalhada aqui...

Importa sublinhar o que definiria a nossa era, a era do Espírito. Se a era do Pai se baseia na criação, queda e restauração pela lei e a justiça, a era do Filho se definiria pelo amor, mas também, no período da Igreja, sobretudo depois de Constantino, pela hierarquia, doutrinas, normas morais, verdades intocáveis, crenças de toda ordem dentro de uma estrutura religiosa constituída como uma esfera do ser, separada e acima das outras esferas do mundo, tal como política e a economia. Pertencer a essa estrutura, à Igreja, é ser salvo, estar fora dela é já a perdição. Haveria assim, duas estruturas, a Igreja e o resto do mundo. O mundo é a perdição, a Igreja a salvação. Daí a síntese de Santo Cipriano: “extra Ecclesiam nulla salus”- fora da igreja não há salvação.

Como isso ressoa no nosso tempo? Num tempo de pluralismo de experiências religiosas como é o nosso, reafirmar que fora da Igreja não há salvação é, no mínimo, extemporâneo. Cada um se salva dentro da sua religião e igreja, e elas são muitas. Essa é a consciência do espírito do nosso tempo. Mas, é mais que isso. Há uma consciência crescente que Deus é que salva e Ele não respeita limites religiosos, hierarquias, dogmas, doutrinas, muros. Deus age livremente e sem intermediários, diretamente em cada corpo vivo de coração e cérebro pensante. Ora, é exatamente isso que se compreende por Era do Espírito, qual seja, Deus que “sopra onde quer” (Jo, 3,8).

O tempo do Espírito é o tempo da livre espiritualidade, para além das estruturas das religiões. As pessoas dizem: “sou uma pessoa espiritual, mas não tenho religião e não frequento igreja”. Isso é cada vez mais comum. É fato que há uma mistura sem fim de espiritualidades e, inclusive, algumas sem encarnação e com um sincretismo típico de uma lógica de supermercado que oferta todos os produtos e cada freguês enche o carrinho com o que achar conveniente. Mas, como não admitir que o Espírito age onde quer? Quem somos nós para conter a sua força transbordante?

Os movimentos carismáticos e espirituais de nosso tempo, que livremente se manifestam, são um sinal visível Deus invisível agindo pelo seu Espírito. Quem pensa a partir da estrutura, hierarquia e doutrinas, pode não se sentir confortável e até resistir a reconhecer o valor de uma espiritualidade para além dos muros das instituições, mas não é prudente desconhecer o fenômeno e, muito menos, se comportar como aquele que olhando para a realidade e percebendo que ela não se adequa a seu pensamento, ao invés de mudar de pensamento diz: pior para a realidade! Esse fenômeno vale, inclusive, para o mundo da política que, não mais se limita aos institucional, aos partidos, às ideologias. Em ambos, tanto na religião quanto na política, vale o lema de Espinosa: “nem rir, nem chorar, compreender”.

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