quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

MIOPIA HISTÓRICA

Claro, a perda de milhões em armamento e drogas corrobora a tese do sociólogo de que o modelo econômico do tráfico focado no território estaria cedendo para uma nova estratégia descentralizadora e menos custosa em termos de vidas humanas e dinheiro. O que a mídia tentou mostrar como fuga covarde dos traficantes, ainda no contexto da invasão da Vila Cruzeiro, na verdade seria uma estratégia de guerrilha bastante comum em outros contextos conflitivos. Aliás, não ter um território fixo e estar pronto para movimentar-se e a seu equipamento a qualquer momento foram a chave do sucesso da Al-Qaeda no Afeganistão. Vale ressaltar que a permanência do Exército Brasileiro em uma situação de combate em território nacional é - ou deveria ser - insustentável do ponto de vista institucional e político, e o BOPE não tem disposição de ser uma tropa de ocupação, e sim de vanguarda e choque.

Contra os discursos das autoridades do Rio de Janeiro, o tráfico ainda parece apostar que esta “guerra” terminará quando as câmeras da TV forem desligadas. Mais ainda, o verdadeiro confronto ocorrerá em seguida e envolverá barganhas e embates com as milícias, cada vez mais organizadas e disciplinadas em torno da ocupação de territórios. No mais, resta perguntar o significado do conceito “guerra ao tráfico”. É uma miopia histórica achar que este tipo de conflito é uma especificidade do Brasil ou do Rio de Janeiro; basta olhar para a tenebrosa história da intervenção norte-americana na Colômbia para ter um quadro trágico dos desdobramentos da ação militar voltada para reforçar a ilegalidade do consumo de drogas. A rigor, o tráfico de drogas é uma atividade econômica e social, e a história nos ensina que declarar guerra a estas atividades sempre resulta em fracassos retumbantes.
Tal qual a “Guerra ao Terror” do governo Bush, não existem objetivos claros definidos para os comandantes militares e não existe um inimigo físico em situação de combate permanente. O que existe, no Rio de Janeiro assim como em Kandahar, é uma massa empobrecida e vitimizada por gangues armadas de um lado e de outro, uma força militar disposta a vasculhar “casa por casa” e com pretensões de ocupar o território a longo prazo.

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