quarta-feira, 27 de maio de 2020

É PRECISO CUIDAR E TUDO E DE TODOS

cuidar de todos cardiologista - lapinga

No horizonte da Carta "Laudato Si’ está a adoção inteligente e imediata dos parâmetros da ecologia integral, com suas dinâmicas que podem garantir dois bens fundamentais, procurados a todo custo: alegria e autenticidade. Uma alegria que dura e sem a qual não se consegue viver adequadamente. Sem essa alegria, a vida perde sentido, torna-se dolorosamente pesada. Já a autenticidade, outro bem necessário, refere-se à capacidade bonita de se exercer a liberdade sem jamais perder o horizonte da própria identidade. A autenticidade gera razões e iluminações condizentes com o grande dom da vida. O ponto de partida inteligente para alcançar alegria e autenticidade parece ingênuo e, por isso, é irracionalmente desconsiderado: dedicar amorosa reverência aos mais pobres da Terra e atenção particular à Criação de Deus.

Esse olhar sensível dedicado à Criação e aos pobres faz abrir o coração, leva à alma valores nobres, cultiva na interioridade humana bons sentimentos e modula cada gesto na dinâmica inigualável da solidariedade. Quando o ser humano verdadeiramente dedica atenção à Criação e aos pobres consegue perceber prioridades que são indissociáveis: a busca pela paz interior, o respeito à natureza e a consciência do dever de trabalhar na edificação de uma sociedade justa e fraterna, com a defesa dos mais pobres. Essas prioridades precisam nortear a conduta social, política, econômica, religiosa, cultural e cidadã. A paz interior, que todos buscam, exige a vivência das lições de uma ecologia integral, para livrar o ser humano do domínio das idolatrias do lucro e do dinheiro, da indiferença ante os clamores dos empobrecidos. Esse domínio do lucro e da indiferença é raiz do uso desenfreado, extrativista e criminoso dos bens da Casa Comum, da adesão à lógica dos privilegiados que é condescendente com o colapso da vida dos vulneráveis.

Parecerá romântico às mentes teleguiadas pelos endurecimentos que alicerçam as pandemias evocar a atitude de São Francisco de Assis. Ao olhar, enamorado, o sol, a lua, minúsculos animais, ele cantava e, consequentemente, envolvia o seu coração com uma sabedoria solidária e uma reverência nobre dedicada a todos – entendia que todos os seres e elementos do universo são irmãos uns dos outros. Assim, ensina o caráter essencial da simplicidade, frequentemente desconsiderada no mundo contemporâneo, dominado por uma irracionalidade fundamentada na desmedida ambição por dinheiro. Em vez da opção pela simplicidade, prioriza-se o acúmulo de bens que compromete a qualidade de vida, gerando distanciamento de toda gratuidade, o que produz massacres e pandemias.

 É preciso cuidar de tudo e de todos. Eis o apelo da "carta", dever inadiável que deve unir a família humana em busca de um desenvolvimento sustentável. O dom precioso é reconhecer e adotar a inteligência criativa fundamentada nos parâmetros da ecologia integral, para superar a indiferença em relação a graves problemas.

A ecologia integral é o caminho mais adequado a ser seguido pela humanidade no seu desafio de repensar condições de vida e de sobrevivência em um mundo adoecido, com sintomas evidentes nos descompassos políticos e sociais, religiosos e econômicos. Há de prevalecer os parâmetros da ecologia integral, em diferentes contextos. O ponto de partida, antes de se pensar nas cúpulas, instâncias legislativas ou conferências, é a vida cotidiana, a atitude de cada pessoa. Chegou a hora, e de agora não se pode passar, considerados os esgotamentos do mundo e da civilização contemporânea, de novas lições serem aprendidas, necessárias para surgir um novo tempo, broto de esperança. Todos, humildemente, possam assumir a condição de aprendizes, na vivência do que ensina a "Carta Laudato Si".

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