sábado, 15 de dezembro de 2018

CONSTRUINDO O INIMIGO


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Quem tem acompanhado as manifestações de violência, atribuídas a “questões políticas”, atualmente, pode ver que muitas delas vêm acompanhadas não de gestos fortuitos, em lances de investidas momentâneas e fugazes. Pode parecer que sim, à primeira vista. Mas, se procedermos a uma análise da conjuntura política atual, retrocedendo um pouco no tempo, veremos que não! Há, na subjacência dos atos violentos, uma arquitetura cuidadosamente organizada que leva esses “instrumentos” (pessoas comuns que, de repente, se tornam violentas porque alguém se posicionou a favor de outro candidato, que não o seu, ou disse algo que o levou a pensar isso ...) – leva esses “instrumentos” a perpetrarem mesmo crimes de morte. Mas por que, exatamente? Haverá apenas uma divergência política?

Sabemos que, na Alemanha nazista, por exemplo, antes mesmo que Hitler acedesse ao poder, caricaturas da figura perniciosa do “judeu” já circulavam há muito tempo. Essa tentativa de canalização da angústia sobre um inimigo bem identificável já é uma forma de responder a uma população inteira, ou parte significativa dela, que se encontra de algum modo fragilizada ou dividida e sem rumo: explica-se de onde vem ou pode vir uma ameaça. A partir da construção desse “medo”, por intermédio de uma figura hostil desenvolve-se o ódio contra esse outro, pernicioso e inaceitável. O ódio não é, neste caso, ingrediente de base, que definiria previamente as relações entre os grupos. É, antes, uma paixão construída, produzida, ao mesmo tempo por uma ação voluntária de pessoas extremosas a partir dos proponentes e por circunstâncias que favorecem sua propagação. No final, esse percurso – da angústia ao ódio – vai contribuir, inevitavelmente para o surgimento do desejo de destruir o que lhe foi designado como causa do medo. Naturalmente, em nível mais amplo, permanece no imaginário, tratando-se de um “desejo”. Mas é um desejo de morte. Vivemos, por exemplo, aqui no Brasil, durante os anos 1960 e 1970 o medo do “comunismo”. O medo do “marxismo”. Esse “medo” foi institucionalizado a partir da figura do “comunista” e do “marxista”. Coloco entre aspas porque é muito possível que a maioria da população desconhecesse, na época, o verdadeiro significado de tais palavras. O inimigo tinha sido criado. E assim por diante.

O perigo parece concentrar-se na igual construção de uns “nós” triunfante e vitorioso que regenera tudo e todos por meio da destruição do “eles” (o “inimigo”, agora no plural). A destruição pode se dar de várias formas: desde uma marca cortada na pele de uma jovem, passando por declarações públicas de homofobia, de incentivo ao uso de armas de fogo pela população, de incentivo à tortura, até uma briga de bar, que resulta em homicídio. Neste sentido, o “inimigo”, construído e identificado, se torna alvo fácil desse “nós” ensandecido e sedento de firmar-se, passando do imaginário para a ação com relativa facilidade.

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