Pensa melhor quem melhor distingue. Quem generaliza e confunde, se engambela e gira em círculo sem direção. A distinção é a festa do pensamento. Onde o senso comum vê como igual, o pensador precisa socorrê-lo e ajudá-lo a ver melhor. Não é pecado pensar. Pecado é errar e fazer o mal por banalidade e por preguiça de pensamento. Viver não é preciso, distinguir é preciso..!
Penso aqui na confusão que incorremos constantemente ao identificar legal com legítimo, legal com justo, legal com ético. Os legalistas, positivistas e fundamentalistas talvez não aceitem, mas o que a lei diz, nem sempre é o que deve ser feito.
O que dá legitimidade a uma norma legal e positiva é a conexão que ela tem com uma norma moral. Só o que uma comunidade histórica real considerar moral, pode ser legítimo legalmente. A lei Maria da Penha, por exemplo, que protege a vítima da violência doméstica e pune o violento, a meu ver, é legal e legítimo porque não há como não considerar que não seja boa para toda a sociedade. O trabalho livre, não escravizado, com correspondente pagamento na forma de salário e com todos os encargos sociais e todos os direitos conquistados pelo trabalhador, por exemplo, férias e décimo terceiro, são legais e são legítimos. Sem entrar no mérito se o valor do salário mínimo é justo, pois aí talvez a discussão seja exatamente o contrário. É bom que se diga, de passagem, que o bom, o justo e o legítimo não são conceitos unívocos e sem ambigüidades e até imprecisões. Talvez por isso os legalistas prefiram a letra fria da lei acreditando que o justo é o que a lei determina e ponto.
Sabemos, contudo, que nem sempre o legal é justo e legítimo. O caso de Antígona é paradigmático. Antígona é o nome de um livro de Sófocles, o mesmo autor que escreveu Édipo Rei e Édipo em Colono. Antígona é uma personagem que dá nome ao livro. Ela é filha de Édipo com Jocasta. Édipo é filho de Laio e Jocasta. Édipo mata o pai (Laio) e casa com a mãe (Jocasta) e tem quatro filhos com a própria mãe. Uma das duas filhas é Antígona. Quando Édipo descobre que a tragédia acontecida em Atenas foi por sua causa, por ter matado o pai e casado com a mãe, ele vaza os próprios olhos e as filhas (Antígona e Ismênia) o leva para fora da cidade. A mãe e esposa de Édipo, Jocasta, se suicida ao saber que ela tinha sido esposa do próprio filho e com ele tinha tido quatro filhos.
Em Tebas permanecem os dois irmãos de Antígona (Etéocles e Polinice). Depois da saída de Édipo quem assume o reino de Tebas é Creonte. Creonte envolto em guerras internas determina em um edito que todos os que lutarem contra seu reino e forem mortos, serão jogados à beira do caminho aos abutres, sem sepultura.
Os dois irmãos de Antígona eram de posições políticas diferentes. Um lutava ao lado do rei e outro contra. Numa batalha um mata o outro. Um recebe honrarias militares e funerais dignos. Outro é jogado ao ar livre na beira da estrada. Antígona não aceita o edito do rei e recolhe o corpo do irmão jogado na lixeira na beira do caminho e lhe dá sepultura com ritos fúnebres condizentes. O rei Creonte descobre o feito de Antígona e a chama para o palácio para lhe dar o castigo correspondente por ter transgredido o edito do rei. O castigo é a morte. O filho de Creonte que era apaixonado por Antígona tentou intervir e dissuadir o pai de executar a lei, mas foi em vão. Então se mata. A mulher de Creonte, vendo o filho morto, também se suicida. Tragédia total.
Na defesa que Antígona faz do ato de ter tirado o irmão da sarjeta e lhe dado sepultura ela diz que o que fizera foi por obediência a uma lei superior a lei dos homens, isto é, ela fez o que fez por causa da lei divina, da tradição, o que hoje chamamos voz da consciência ética. Por obediência a ética, desobedecesse a lei jurídica. Antígona não reconhece legitimidade na lei, no edito, do rei Creonte e em nome de outra lei, mostra a não legitimada da lei positiva. Nem sempre o legal é moral. Nem sempre o legal é legítimo.
O impeachment é legal, mas é ilegítimo, injusto e imoral. Se pelos menos reconhecessem que vazar os próprios olhos seria uma atitude digna, mas não. Hipócritas e sepulcros caiados julgam sem serem julgados. Em pouco tempo teremos um novo governo e um poder legal, mas ilegítimo e imoral. O que dá legitimidade a um governo democrático é o voto popular. Golpe nenhum pode ser legítimo. Pode ser legal, mas não legítimo.
Penso aqui na confusão que incorremos constantemente ao identificar legal com legítimo, legal com justo, legal com ético. Os legalistas, positivistas e fundamentalistas talvez não aceitem, mas o que a lei diz, nem sempre é o que deve ser feito.
O que dá legitimidade a uma norma legal e positiva é a conexão que ela tem com uma norma moral. Só o que uma comunidade histórica real considerar moral, pode ser legítimo legalmente. A lei Maria da Penha, por exemplo, que protege a vítima da violência doméstica e pune o violento, a meu ver, é legal e legítimo porque não há como não considerar que não seja boa para toda a sociedade. O trabalho livre, não escravizado, com correspondente pagamento na forma de salário e com todos os encargos sociais e todos os direitos conquistados pelo trabalhador, por exemplo, férias e décimo terceiro, são legais e são legítimos. Sem entrar no mérito se o valor do salário mínimo é justo, pois aí talvez a discussão seja exatamente o contrário. É bom que se diga, de passagem, que o bom, o justo e o legítimo não são conceitos unívocos e sem ambigüidades e até imprecisões. Talvez por isso os legalistas prefiram a letra fria da lei acreditando que o justo é o que a lei determina e ponto.
Sabemos, contudo, que nem sempre o legal é justo e legítimo. O caso de Antígona é paradigmático. Antígona é o nome de um livro de Sófocles, o mesmo autor que escreveu Édipo Rei e Édipo em Colono. Antígona é uma personagem que dá nome ao livro. Ela é filha de Édipo com Jocasta. Édipo é filho de Laio e Jocasta. Édipo mata o pai (Laio) e casa com a mãe (Jocasta) e tem quatro filhos com a própria mãe. Uma das duas filhas é Antígona. Quando Édipo descobre que a tragédia acontecida em Atenas foi por sua causa, por ter matado o pai e casado com a mãe, ele vaza os próprios olhos e as filhas (Antígona e Ismênia) o leva para fora da cidade. A mãe e esposa de Édipo, Jocasta, se suicida ao saber que ela tinha sido esposa do próprio filho e com ele tinha tido quatro filhos.
Em Tebas permanecem os dois irmãos de Antígona (Etéocles e Polinice). Depois da saída de Édipo quem assume o reino de Tebas é Creonte. Creonte envolto em guerras internas determina em um edito que todos os que lutarem contra seu reino e forem mortos, serão jogados à beira do caminho aos abutres, sem sepultura.
Os dois irmãos de Antígona eram de posições políticas diferentes. Um lutava ao lado do rei e outro contra. Numa batalha um mata o outro. Um recebe honrarias militares e funerais dignos. Outro é jogado ao ar livre na beira da estrada. Antígona não aceita o edito do rei e recolhe o corpo do irmão jogado na lixeira na beira do caminho e lhe dá sepultura com ritos fúnebres condizentes. O rei Creonte descobre o feito de Antígona e a chama para o palácio para lhe dar o castigo correspondente por ter transgredido o edito do rei. O castigo é a morte. O filho de Creonte que era apaixonado por Antígona tentou intervir e dissuadir o pai de executar a lei, mas foi em vão. Então se mata. A mulher de Creonte, vendo o filho morto, também se suicida. Tragédia total.
Na defesa que Antígona faz do ato de ter tirado o irmão da sarjeta e lhe dado sepultura ela diz que o que fizera foi por obediência a uma lei superior a lei dos homens, isto é, ela fez o que fez por causa da lei divina, da tradição, o que hoje chamamos voz da consciência ética. Por obediência a ética, desobedecesse a lei jurídica. Antígona não reconhece legitimidade na lei, no edito, do rei Creonte e em nome de outra lei, mostra a não legitimada da lei positiva. Nem sempre o legal é moral. Nem sempre o legal é legítimo.
O impeachment é legal, mas é ilegítimo, injusto e imoral. Se pelos menos reconhecessem que vazar os próprios olhos seria uma atitude digna, mas não. Hipócritas e sepulcros caiados julgam sem serem julgados. Em pouco tempo teremos um novo governo e um poder legal, mas ilegítimo e imoral. O que dá legitimidade a um governo democrático é o voto popular. Golpe nenhum pode ser legítimo. Pode ser legal, mas não legítimo.
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