Três familiares de vítimas do incêndio da boate Kiss estão sendo processados por crime de calúnia.
Promotores ingressaram na justiça contra Sérgio da Silva e Paulo
Tadeu Nunes de Carvalho (respectivamente, presidente e diretor jurídico
da AVTSM – Associação de Familiares de Vítimas e Sobreviventes da
Tragédia de Santa Maria) e Flávio José da Silva, presidente do movimento
Santa Maria do Luto à Luta.
Os três são acusados de colarem cartazes pela cidade com os enunciados:
“Prefeito e Secretários sabiam que a boate estava irregular”; “O
Ministério Público e e seus Promotores também sabiam que a boate estava
funcionando de forma irregular”; “Prefeito, Secretários e Promotores,
todos sabiam que a boate estava irregular e permitiram que continuasse
funcionando até matarem 242 jovens. Quem vai pagar essa conta??”
Os promotores Ricardo Lozza, Joel Dutra e Maurício Trevisan sentiram-se ofendidos.
O incêndio na Kiss matou 242 jovens e deixou mais de 630 feridos. A
tragédia foi uma sucessão de omissões dos poderes públicos que vão desde
documento precário emitido pelos bombeiros usado como Plano de
Prevenção e Combate a Incêndio até funcionamento sem alvará de
localização da prefeitura. De falta de acompanhamento na execução das
obras por parte da engenheira responsável até aplicação de repetidas
multas ao invés da decretação do fechamento do local.
No ano passado o Ministério Público denunciou 43 pessoas por crimes
como falsidade ideológica, fraude processual e falso testemunho com base
no inquérito policial que revelou falsificação de assinaturas e outros
documentos para permitir a abertura da casa junto à prefeitura.
E ninguém pode se indignar pela inércia, má gestão, irresponsabilidade e suas consequências?
A reação dos promotores é um ato desumano revoltante.
Santa Maria (RS) é uma cidade de menos de 275 mil habitantes. Não é
exatamente Nova York. Como podem alegar que não sabiam? Não se pode
alegar isso, é covarde.
Recentemente, o presidente da Volkswagen alemã renunciou por estar no
comando durante um período no qual a empresa burlou normas de emissão
de poluentes. Afirmou que não sabia nem aprovava, mas como era o
comandante e sob ele aquilo ocorreu, renunciava. Óbvio. No Japão isso
também é muito comum.
Mesmo que não se esteja beneficiando diretamente, mesmo que não se
tenha aprovado, deixou passar: é inadmissível. Não tem defesa. É o preço
de se estar no comando. E uma questão de moral os impele a sair. No
Japão não raramente se suicidam.
Por essas bandas tropicais costuma-se tirar o corpo fora, procurar
culpados abaixo de si e ficar nervosinho quando chamado à
responsabilidade.
O incêndio na boate Kiss ocorreu janeiro de 2013. Até agora foram
abertos processos criminais contra oito réus, todos estão respondendo em
liberdade. Já os 8 bombeiros denunciados foram julgados pela Justiça
Militar com o resultado de dois condenados e seis absolvidos.
Só em uma sociedade distorcida é possível relevar a morte de centenas e cobrar por justiça dá cana.
Crime de calúnia tem pena prevista de seis meses a dois anos de
detenção mais multa. Responda com sinceridade, leitor: você se
supreenderia se os familiares das vítimas forem condenados primeiro?
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