Ao longo de toda a história da humanidade, sempre se manteve acesa uma inquietação em desejar saber qual e quem seria o primeiro; quem estaria no princípio, a desencadear a vida e o desenvolvimento posterior do mundo. Tantas teorias desenhadas pelo esforço humano são dignas de louvor, outras apenas são lembradas como tentativas, mas na verdade a pergunta continua.
O certo é que não podemos desconhecer as possíveis teorias e nem cair na ingenuidade. Porém, para nós cristãos, no princípio não foi nem a noite, nem o caos, nem a força, nem a luz e nem a ação. Foi a Presença que cria novas presenças e relaciona-se com elas no amor criador.
No princípio foi a presença. A realidade da presença gera um sentimento, cria uma atitude e se manifesta num comportamento singular diante da vida. Essa presença atua na voz da palavra criadora e, em tudo e para tudo, cria vínculos e estreitas relações. Tudo, na criação de Deus, está entrelaçado em mútua dependência. Uma presença clama por outra presença.
Não é exagero dizer que uma das mais dignas qualidades humanas é a capacidade de ser e estar presente num vivo relacionamento positivo, contagiante e construtivo. Deus-Presença nos fez à sua imagem e semelhança para sermos também presenças. Francisco de Assis entendeu bem essa vocação e missão de ser e marcar presença. Seu grande senso do concreto e do imediato o fazia sentir-se sempre presente diante de Deus, a quem via em todos os seres e acontecimentos, presente diante de alguém ou algo com seu alto senso de fraternidade, presente diante dos animais e coisas que tanto respeitava e a quem dava o doce nome de irmãos e irmãs.
Cada pessoa tem seu próprio rosto e sua específica personalidade. Cada animal tem sua própria missão. Cada coisa tem sua própria significação e cada circunstância seu próprio valor, já que tudo é graça.
São tantas as virtudes que qualificam a presença, mas uma delas que mais merece destaque é a cordialidade que se traduz em sintonia, respeito, atenção e cortesia. A presença cordial vai transformando o que é opaco e obscuro em luminosidade e transparência. É por este motivo que, junto a esse tipo de presença, todos se sentem bem e todos gostariam de conviver.
Enquanto, na atualidade, parece aumentar a multidão dos solitários e as relações frias e impessoais com o mundo virtual, a categoria “presença” se torna cada vez mais importante e necessária. O calor humano, a ternura das relações redimidas e a presença solidária, como em nenhum outro tempo, se fazem necessárias. Na medida em que aumenta a frieza e a indiferença, o impessoal e o anonimato, também aumenta o clamor por presenças humanas maternais que saibam amparar e promover a vida.
quinta-feira, 4 de dezembro de 2014
terça-feira, 2 de dezembro de 2014
JUNG E A ESPIRITUALIDADE.
Poucos estudiosos da alma humana deram mais importância à espiritualidade do que Jung. Via na espiritualidade uma exigência fundamental e arquetípica da psiqué na escalada rumo à plena individuação. A imago Dei ou o arquétipo Deus ocupa o centro do Self: aquela Energia poderosa que atrai a si todos os arquétipos e os ordena ao seu redor como o Sol o faz com os planetas. Sem a integração deste arquétipo axial, o ser humano fica manco e míope e com uma incompletude abissal. Por isso escreveu:
“Entre todos os meus clientes na segunda metade da vida, isto é, com mais de 35 anos, não houve um só cujo problema mais profundo não fosse constituído pela questão da sua atitude religiosa. Todos em última instância estavam doentes por terem perdido aquilo que uma religião viva sempre deu, em todos os tempos, a seus seguidores. E nenhum curou-se realmente sem recobrar a atitude religiosa que lhe fosse própria. Isto está claro. Não depende absolutamente de uma adesão a um credo particular, nem de tornar-se membro de uma igreja, mas da necessidade de integrar a dimensão espiritual.”
A função principal da religião, melhor, da espiritualidade é nos religar a todas as coisas e à Fonte donde promana todo o ser, Deus. Esse é o propósito básico de seu grandioso livro Mysterium Coniunctionis (Mistério da Conjunção), que Jung considerava seu opus magnum. Pois nele se trata de realizar a coniuntio, traduzindo, a conjunção do ser humano integral com o mundus unus, o mundo unificado, o mundo do primeiro dia da criação, quando tudo era um e não havia ainda nenhuma divisão e diferenciação.
Espiritualidade significa vivenciar esta situação na medida em que é permanentemente buscada, mesmo que não se deixe apreender e se desloque sempre um passo à frente. O drama do ser humano atual é ter perdido a espiritualidade e sua capacidade de viver um sentimento de conexão. O que se opõe à religião ou à espiritualidade não é a irreligião ou o ateísmo mas a incapacidade de ligar-se e religar-se com todas as coisas. Hoje as pessoas estão desconectadas da Terra, da anima (da dimensão do sentimento profundo) e por isso sem espiritualidade.
Para C. G. Jung o grande problema atual é de natureza psicológica. Não da psicologia entendida como disciplina ou apenas como uma dimensão da psiquê. Mas psicologia no sentido abrangente dado por ele como a totalidade da vida e do universo enquanto percebidos e referidos ao ser humano - seja pelo consciente seja pelo inconsciente pessoal e coletivo. É neste sentido que escreveu:
“É minha convicção mais profunda de que, a partir de agora, até a um futuro indeterminado, o verdadeiro problema é de ordem psicológica. A alma é o pai e a mãe de todos as dificuldades não resolvidas que lançamos ao céu.”
A Terra está doente porque nós estamos doentes. Na medida em que nos transformamos, transformaremos também a Terra. Jung buscou esta transformação até a sua morte. Ela é um dos poucos caminhos que nos pode levar para fora da atual crise e que inaugura um novo ensaio civilizatório, assim como o imaginava Jung, mais integrado com o todo, mais individualizado e mais espiritual.
C. G.Jung se mostra um mestre e um guia que nos traça um mapa apto a nos orientar nestes momentos dramáticos que vive a humanidade. Como acreditava no transcendente e no mudo espiritual, será seguramente o capital espiritual, agora colocado no centro de nossas buscas, que nos permitirá viver com sentido a fase nova da Terra e da Humanidade, a fase planetária e espiritual.
“Entre todos os meus clientes na segunda metade da vida, isto é, com mais de 35 anos, não houve um só cujo problema mais profundo não fosse constituído pela questão da sua atitude religiosa. Todos em última instância estavam doentes por terem perdido aquilo que uma religião viva sempre deu, em todos os tempos, a seus seguidores. E nenhum curou-se realmente sem recobrar a atitude religiosa que lhe fosse própria. Isto está claro. Não depende absolutamente de uma adesão a um credo particular, nem de tornar-se membro de uma igreja, mas da necessidade de integrar a dimensão espiritual.”
A função principal da religião, melhor, da espiritualidade é nos religar a todas as coisas e à Fonte donde promana todo o ser, Deus. Esse é o propósito básico de seu grandioso livro Mysterium Coniunctionis (Mistério da Conjunção), que Jung considerava seu opus magnum. Pois nele se trata de realizar a coniuntio, traduzindo, a conjunção do ser humano integral com o mundus unus, o mundo unificado, o mundo do primeiro dia da criação, quando tudo era um e não havia ainda nenhuma divisão e diferenciação.
Espiritualidade significa vivenciar esta situação na medida em que é permanentemente buscada, mesmo que não se deixe apreender e se desloque sempre um passo à frente. O drama do ser humano atual é ter perdido a espiritualidade e sua capacidade de viver um sentimento de conexão. O que se opõe à religião ou à espiritualidade não é a irreligião ou o ateísmo mas a incapacidade de ligar-se e religar-se com todas as coisas. Hoje as pessoas estão desconectadas da Terra, da anima (da dimensão do sentimento profundo) e por isso sem espiritualidade.
Para C. G. Jung o grande problema atual é de natureza psicológica. Não da psicologia entendida como disciplina ou apenas como uma dimensão da psiquê. Mas psicologia no sentido abrangente dado por ele como a totalidade da vida e do universo enquanto percebidos e referidos ao ser humano - seja pelo consciente seja pelo inconsciente pessoal e coletivo. É neste sentido que escreveu:
“É minha convicção mais profunda de que, a partir de agora, até a um futuro indeterminado, o verdadeiro problema é de ordem psicológica. A alma é o pai e a mãe de todos as dificuldades não resolvidas que lançamos ao céu.”
A Terra está doente porque nós estamos doentes. Na medida em que nos transformamos, transformaremos também a Terra. Jung buscou esta transformação até a sua morte. Ela é um dos poucos caminhos que nos pode levar para fora da atual crise e que inaugura um novo ensaio civilizatório, assim como o imaginava Jung, mais integrado com o todo, mais individualizado e mais espiritual.
C. G.Jung se mostra um mestre e um guia que nos traça um mapa apto a nos orientar nestes momentos dramáticos que vive a humanidade. Como acreditava no transcendente e no mudo espiritual, será seguramente o capital espiritual, agora colocado no centro de nossas buscas, que nos permitirá viver com sentido a fase nova da Terra e da Humanidade, a fase planetária e espiritual.
sábado, 29 de novembro de 2014
A FORÇA DAS COISAS FRACAS.
As forças da natureza sempre assustaram a humanidade. Vulcões, maremotos, tempestades, raios, secas e enchentes deixam marcas de destruição em toda a parte. Uma fábula, atribuída a Esopo (século VI antes de Cristo), fala da disputa entre alguns dos elementos da natureza. Quem era o mais forte, o vento, a tempestade ou o sol? Nada melhor que um teste. Qual deles seria capaz de arrancar o casaco de um cavaleiro, que seguia apressado, numa manhã medianamente fria?
O vento entrou em ação, inicialmente com rajadas esparsas. Depois com mais violência, derrubando árvores e destelhando casas, mas o viajante continuou firme, apertando ainda mais o seu casaco. Depois foi a vez da tempestade, enquanto o sol se escondia atrás de uma nuvem. Chuva, raios e trovoadas caíram sobre a terra. O cavaleiro abrigou-se da melhor forma possível, firmando o chapéu e abotoando o casaco. Diante do insucesso do vento e da tempestade, o sol deixou a nuvem para trás e começou a iluminar a terra, com seus raios suaves, sorrindo para a natureza. O viajante tirou casaco e continuou tranquilamente sua viagem.
Muitas vezes as aparências são enganosas. As coisas, aparentemente fortes, acabam vencidas pelas coisas fracas. Um enxame de abelhas pode afugentar um leão. Uma pequena porção de fermento contagia a massa. Um sorriso pode desarmar um homem violento.
A natureza nos ensina que as coisas fracas originam as fortes e poderosas. Minúsculos grãos de areia formam o deserto, gotas de água compõem o mar, pequenos tijolos são os componentes de um edifício. O inverso também acontece com as coisas fortes e que são vencidas. Um poema, com inspiração no Talmud judeu, confirma isso. O ferro é forte, mas o fogo o derrete. O fogo é forte, mas a água o apaga. A água é forte, mas o vento a dispersa. O vento é forte, mas a montanha espalha o vento. A montanha é forte, mas o homem derruba a montanha. O homem é forte, mas a morte derruba o homem. A morte é forte, mas o amor de Deus vence a morte.
A violência consegue os primeiros resultados, mas a vitória definitiva é do amor. A bondade, aparentemente fraca, costuma conseguir vitórias estupendas. A própria história da humanidade é prova disso. Contrariando toda a probabilidade, esta história é moldada, não pelos fortes, mas pelos fracos. Num instante de lucidez, Lênin admitiu: “Agora vejo que a Rússia precisava, não de mim, mas de um Francisco de Assis”.
O machado pode derrubar uma árvore ou mesmo uma floresta, mas ninguém pode deter a semente. O ódio pode destruir, mas somente a bondade sabe reconstruir. O apóstolo Paulo proclama: “Só o amor não passa”.
O vento entrou em ação, inicialmente com rajadas esparsas. Depois com mais violência, derrubando árvores e destelhando casas, mas o viajante continuou firme, apertando ainda mais o seu casaco. Depois foi a vez da tempestade, enquanto o sol se escondia atrás de uma nuvem. Chuva, raios e trovoadas caíram sobre a terra. O cavaleiro abrigou-se da melhor forma possível, firmando o chapéu e abotoando o casaco. Diante do insucesso do vento e da tempestade, o sol deixou a nuvem para trás e começou a iluminar a terra, com seus raios suaves, sorrindo para a natureza. O viajante tirou casaco e continuou tranquilamente sua viagem.
Muitas vezes as aparências são enganosas. As coisas, aparentemente fortes, acabam vencidas pelas coisas fracas. Um enxame de abelhas pode afugentar um leão. Uma pequena porção de fermento contagia a massa. Um sorriso pode desarmar um homem violento.
A natureza nos ensina que as coisas fracas originam as fortes e poderosas. Minúsculos grãos de areia formam o deserto, gotas de água compõem o mar, pequenos tijolos são os componentes de um edifício. O inverso também acontece com as coisas fortes e que são vencidas. Um poema, com inspiração no Talmud judeu, confirma isso. O ferro é forte, mas o fogo o derrete. O fogo é forte, mas a água o apaga. A água é forte, mas o vento a dispersa. O vento é forte, mas a montanha espalha o vento. A montanha é forte, mas o homem derruba a montanha. O homem é forte, mas a morte derruba o homem. A morte é forte, mas o amor de Deus vence a morte.
A violência consegue os primeiros resultados, mas a vitória definitiva é do amor. A bondade, aparentemente fraca, costuma conseguir vitórias estupendas. A própria história da humanidade é prova disso. Contrariando toda a probabilidade, esta história é moldada, não pelos fortes, mas pelos fracos. Num instante de lucidez, Lênin admitiu: “Agora vejo que a Rússia precisava, não de mim, mas de um Francisco de Assis”.
O machado pode derrubar uma árvore ou mesmo uma floresta, mas ninguém pode deter a semente. O ódio pode destruir, mas somente a bondade sabe reconstruir. O apóstolo Paulo proclama: “Só o amor não passa”.
sexta-feira, 28 de novembro de 2014
A IMPORTANCIA DO OLHAR.
Existem realidades tão nossas, no coração da vida, que nem sempre conseguimos captá-las em sua grandeza. Dizem que só valorizamos a luz quando estamos envolvidos nas trevas; acordamos para procurar água quando temos sede. Um peregrino, vendo um cego passar a seu lado, sentou-se à beira do caminho e começou a imaginar o que faria, o que sentiria e como seria se estivesse em seu lugar. De sua meditação surgiu um encantamento constante pelo dom dos olhos perfeitos e pelo fato de poder enxergar. É digno o gesto de acordar para um novo dia e agradecer a Deus pelo dom do olhar.
No coração da vida acolhemos e contemplamos o olhar como comunicação e como linguagem. Todos os nossos sentidos são janelas e canais de comunicação com o exterior. Porém, a vista exerce um papel especial na vida humana. O olhar constantemente nos encobre e nos descobre, nos abre e nos oculta, nos aproxima e nos separa.
O olhar pode ser diferente, conforme a superficialidade ou a profundeza com que sintonizamos, conforme a carga emocional, intelectual e volitiva do olhar que contempla. Há olhares que matam e olhares que despertam vida, olhares destruidores e olhares criadores, olhares que envenenam e olhares que purificam, olhares possessivos e olhares oblativos, olhares transparentes e olhares turbulentos, olhares indiferentes e olhares acolhedores. Todo o olhar é projeção de nosso eu.
Nosso olho enxerga e, no entanto, é o espírito quem vê: “A lâmpada do corpo é o olho: se teu olho for simples, ficarás todo cheio de luz. Mas se o teu olho for ruim, ficarás todo em trevas. Se, pois, a luz em ti é trevas, quão grandes serão as trevas” (Mt 6,22). Quando a pupila do espírito está purificada todo o universo se faz transparente e acolhedor, porque o olho que vê e o mundo que é visto encontram e revivem sua harmonia e proximidade original. A medida do olhar depende da intenção de quem olha. A partir de dentro projeta-se o olhar e vai pousar sobre as pessoas, os seres e as coisas.
O olhar tem um poder tão fascinante que dele se ocuparam e se ocupam a história da cultura, os mitos e as ciências, a filosofia, a literatura e a religião. Assim como o dom do olhar é magnífico, ao mesmo tempo pode se tornar perigoso. Quando o foco de nosso olhar centra-se em nós mesmos, incorremos no perigo do suicídio como Narciso da mitologia. Quando o foco contemplativo parte do coração e se projeta para fora, começamos a ver bem, porque sintonizamos melhor com o olhar de Deus sobre nós, os outros e o mundo. Na verdade, “só vemos bem com o coração”.
Uma das grandes preocupações da ascese cristã sempre foi o ajuste do nosso olhar. Educar o olhar parece ser um dos empenhos no caminho da santidade. Porém, para podermos educar o olhar, necessitamos educar o coração. Ali está o grande investimento de alguém que busca configurar seu ser com dignidade, conforme a medida da maturidade de Cristo.
No coração da vida acolhemos e contemplamos o olhar como comunicação e como linguagem. Todos os nossos sentidos são janelas e canais de comunicação com o exterior. Porém, a vista exerce um papel especial na vida humana. O olhar constantemente nos encobre e nos descobre, nos abre e nos oculta, nos aproxima e nos separa.
O olhar pode ser diferente, conforme a superficialidade ou a profundeza com que sintonizamos, conforme a carga emocional, intelectual e volitiva do olhar que contempla. Há olhares que matam e olhares que despertam vida, olhares destruidores e olhares criadores, olhares que envenenam e olhares que purificam, olhares possessivos e olhares oblativos, olhares transparentes e olhares turbulentos, olhares indiferentes e olhares acolhedores. Todo o olhar é projeção de nosso eu.
Nosso olho enxerga e, no entanto, é o espírito quem vê: “A lâmpada do corpo é o olho: se teu olho for simples, ficarás todo cheio de luz. Mas se o teu olho for ruim, ficarás todo em trevas. Se, pois, a luz em ti é trevas, quão grandes serão as trevas” (Mt 6,22). Quando a pupila do espírito está purificada todo o universo se faz transparente e acolhedor, porque o olho que vê e o mundo que é visto encontram e revivem sua harmonia e proximidade original. A medida do olhar depende da intenção de quem olha. A partir de dentro projeta-se o olhar e vai pousar sobre as pessoas, os seres e as coisas.
O olhar tem um poder tão fascinante que dele se ocuparam e se ocupam a história da cultura, os mitos e as ciências, a filosofia, a literatura e a religião. Assim como o dom do olhar é magnífico, ao mesmo tempo pode se tornar perigoso. Quando o foco de nosso olhar centra-se em nós mesmos, incorremos no perigo do suicídio como Narciso da mitologia. Quando o foco contemplativo parte do coração e se projeta para fora, começamos a ver bem, porque sintonizamos melhor com o olhar de Deus sobre nós, os outros e o mundo. Na verdade, “só vemos bem com o coração”.
Uma das grandes preocupações da ascese cristã sempre foi o ajuste do nosso olhar. Educar o olhar parece ser um dos empenhos no caminho da santidade. Porém, para podermos educar o olhar, necessitamos educar o coração. Ali está o grande investimento de alguém que busca configurar seu ser com dignidade, conforme a medida da maturidade de Cristo.
quarta-feira, 26 de novembro de 2014
BABEL NÃO FOI UMA MALDIÇÃO.
Se considerarmos que o ser humano surgiu há cerca de 200 mil anos, a cidade é uma invenção relativamente recente. Durante milênios nossos ancestrais viveram como nômades coletores e, aos poucos, as técnicas de reprodução dos alimentos os fixaram como agricultores e pecuaristas. Havia, naquele longo período, relação direta, e até venerável, entre o ser humano e a natureza. Nossos antepassados se alimentavam sem alterar ecossistemas, biomas, biodiversidade.
Essa relação se altera com o advento das cidades. E um dos relatos mais significativos de como isso ocorreu é o episódio bíblico da Torre de Babel .
Babel é semantema de Babilônia. Deriva da raiz hebraica “bil”, que significa “confundir”. Narra o texto bíblico que Javé, ao observar Babel, convenceu-se de que os humanos se fechavam em seus próprios e ambiciosos projetos, deixando de acolher os desígnios divinos. “Isso é o começo de suas iniciativas!” – disse o Senhor. “Agora nenhum projeto será irrealizável para eles.”
Segundo o autor bíblico, após o Dilúvio “todos se serviam da mesma língua e das mesmas palavras.” Não havia diversidade de enfoques e opiniões. O ponto de vista de um era o ponto de vista de todos. E a atividade agropastoril igualava as pessoas.
A invenção do tijolo e da argamassa provoca um movimento migratório do campo para a urbe. Os humanos decidem “construir uma cidade” – Babel.
O versículo 4 registra as propostas de construção da cidade e da torre, e destaca o principal motivo de tal empreitada: “Para ficarmos famosos e não nos dispersarmos pela face da Terra.” Não se tratava de obter felicidade, bem-estar, bênçãos divinas. Importava a fama e permanecer segregado, seguro.
A revolução tecnológica representada pelo tijolo (insuperado até hoje) imprime aos humanos a consciência de que não estão mais condicionados pela natureza. A relação se inverte. Agora é o ser humano que condiciona a natureza. Transforma-a em artefato. Desprendido do ciclo da natureza, o ser humano se torna senhor do próprio destino.
Tais avanços enchem os humanos de orgulho. Não satisfeitos de “construir a cidade”, decidem abrir a “porta do deus”, ou seja, erguer “uma torre cujo ápice penetre nos céus”. Aqui o relato expressa duas ambições: a de edificar uma montanha artificial (a torre), repositório da divindade, e a de “penetrar nos céus”, quebrar o limite entre o humano e o divino, o profano e o sagrado, a Terra e o Céu. Já não é a divindade que desce à Terra, é o ser humano que invade o Céu, graças à obra de suas mãos.
Antes que a soberba humana se inflasse ainda mais, Javé confundiu a linguagem dos habitantes de Babel e os dispersou. “Eles cessaram de construir a cidade.” Portanto, Babel não foi maldição. Foi dádiva. Delimitou a ambição humana e revelou ser obra de Deus a diversidade de pontos de vista e opiniões, contrária à identificação entre autoridade e verdade.
Toda essa sabedoria explica a arrogância decorrente, ainda hoje, de avanços científicos e tecnológicos. Queremos ser deuses. Nossa busca de endeusamento e imortalidade se reflete na babel ou confusão reinante em nossas cidades. Não pensamos no comunitário ou coletivo, pensamos no individual e no lucrativo.
Assim, nos gabamos de que o Brasil vendeu, em 2010, mais de 3 milhões de veículos automotores, embora isso agrave a congestão metropolitana, a poluição, os acidentes. Não se investe o suficiente em transportes coletivos, assim como não se planeja o espaço urbano, alvo de especulação imobiliária e vulnerável a fenômenos climáticos decorrentes de desequilíbrios ambientais, o que causa enchentes, desabamentos e secas prolongadas.
Hoje em dia, ganha cada vez mais espaço a proposta de bem viver dos povos indígenas andinos, conhecida como sumak kawsay. Sumak significa plenitude e kawsay viver. Trata-se de viver em plenitude.
Plenitude implica fazer da felicidade um projeto comunitário, coletivo. É saber construir relações de solidariedade, não de competição; de harmonia, não de hostilidade; e estabelecer com a natureza vínculos de parceria cuidadosa.
Para a sociedade capitalista, a natureza é objeto de propriedade e temos o direito de explorá-la e até destruí-la em função de nossas ambições. O capitalismo se norteia pelo paradigma riqueza-pobreza, enquanto o sumak kawsay rompe esse dualismo para introduzir a de sociabilidade e de sustentabilidade, bases fundamentais de um projeto civilizatório. Fora disso, caminharemos para a barbárie.
Essa relação se altera com o advento das cidades. E um dos relatos mais significativos de como isso ocorreu é o episódio bíblico da Torre de Babel .
Babel é semantema de Babilônia. Deriva da raiz hebraica “bil”, que significa “confundir”. Narra o texto bíblico que Javé, ao observar Babel, convenceu-se de que os humanos se fechavam em seus próprios e ambiciosos projetos, deixando de acolher os desígnios divinos. “Isso é o começo de suas iniciativas!” – disse o Senhor. “Agora nenhum projeto será irrealizável para eles.”
Segundo o autor bíblico, após o Dilúvio “todos se serviam da mesma língua e das mesmas palavras.” Não havia diversidade de enfoques e opiniões. O ponto de vista de um era o ponto de vista de todos. E a atividade agropastoril igualava as pessoas.
A invenção do tijolo e da argamassa provoca um movimento migratório do campo para a urbe. Os humanos decidem “construir uma cidade” – Babel.
O versículo 4 registra as propostas de construção da cidade e da torre, e destaca o principal motivo de tal empreitada: “Para ficarmos famosos e não nos dispersarmos pela face da Terra.” Não se tratava de obter felicidade, bem-estar, bênçãos divinas. Importava a fama e permanecer segregado, seguro.
A revolução tecnológica representada pelo tijolo (insuperado até hoje) imprime aos humanos a consciência de que não estão mais condicionados pela natureza. A relação se inverte. Agora é o ser humano que condiciona a natureza. Transforma-a em artefato. Desprendido do ciclo da natureza, o ser humano se torna senhor do próprio destino.
Tais avanços enchem os humanos de orgulho. Não satisfeitos de “construir a cidade”, decidem abrir a “porta do deus”, ou seja, erguer “uma torre cujo ápice penetre nos céus”. Aqui o relato expressa duas ambições: a de edificar uma montanha artificial (a torre), repositório da divindade, e a de “penetrar nos céus”, quebrar o limite entre o humano e o divino, o profano e o sagrado, a Terra e o Céu. Já não é a divindade que desce à Terra, é o ser humano que invade o Céu, graças à obra de suas mãos.
Antes que a soberba humana se inflasse ainda mais, Javé confundiu a linguagem dos habitantes de Babel e os dispersou. “Eles cessaram de construir a cidade.” Portanto, Babel não foi maldição. Foi dádiva. Delimitou a ambição humana e revelou ser obra de Deus a diversidade de pontos de vista e opiniões, contrária à identificação entre autoridade e verdade.
Toda essa sabedoria explica a arrogância decorrente, ainda hoje, de avanços científicos e tecnológicos. Queremos ser deuses. Nossa busca de endeusamento e imortalidade se reflete na babel ou confusão reinante em nossas cidades. Não pensamos no comunitário ou coletivo, pensamos no individual e no lucrativo.
Assim, nos gabamos de que o Brasil vendeu, em 2010, mais de 3 milhões de veículos automotores, embora isso agrave a congestão metropolitana, a poluição, os acidentes. Não se investe o suficiente em transportes coletivos, assim como não se planeja o espaço urbano, alvo de especulação imobiliária e vulnerável a fenômenos climáticos decorrentes de desequilíbrios ambientais, o que causa enchentes, desabamentos e secas prolongadas.
Hoje em dia, ganha cada vez mais espaço a proposta de bem viver dos povos indígenas andinos, conhecida como sumak kawsay. Sumak significa plenitude e kawsay viver. Trata-se de viver em plenitude.
Plenitude implica fazer da felicidade um projeto comunitário, coletivo. É saber construir relações de solidariedade, não de competição; de harmonia, não de hostilidade; e estabelecer com a natureza vínculos de parceria cuidadosa.
Para a sociedade capitalista, a natureza é objeto de propriedade e temos o direito de explorá-la e até destruí-la em função de nossas ambições. O capitalismo se norteia pelo paradigma riqueza-pobreza, enquanto o sumak kawsay rompe esse dualismo para introduzir a de sociabilidade e de sustentabilidade, bases fundamentais de um projeto civilizatório. Fora disso, caminharemos para a barbárie.
terça-feira, 25 de novembro de 2014
O QUE É SER VOLÁTIL?
A palavra volátil significa “que voa, tem asas”. Assim olhada à primeira vista, encanta a imaginação e a sensibilidade. Quem já não desejou voar e ganhar espaços infinitos, dependente apenas de suas asas? No entanto, em seu sentido figurado a evocação não é tão positiva. Volátil é alguém cuja opinião ou ponto de vista muda com facilidade; inconstante, volúvel; que não é firme ou permanente; inconstante, mutável.
A palavra parece-nos adequada para definir as relações humanas hoje em dia. São, em sua maioria, relações sem firmeza, sem compromissos em longo prazo, sem permanência e, portanto, carentes ou vazias de sentido. Mudam com extrema facilidade. Voláteis, portanto.
Relações voláteis geram identidades igualmente voláteis. Incertas. Mutantes. Formam-se a partir delas personalidades autoreferenciadas, de uma autonomia não livre, mas compulsiva. São, além disso, identidades temporárias, que podem ser apagadas e substituídas por outros rótulos. A memória, atrofiada pelo ritmo da vida líquida pós-moderna, ensina que esquecer é o melhor, a fim de poder reescrever na lousa apagada uma nova identidade. Hoje me auto compreendo assim, amanhã já será diferente. São igualmente identidades plurais, abertas, sem escolhas ou decisões em que empenhem a vida.
Os vínculos admitidos são aqueles que cabem nas redes, como Facebook, Orkut etc. Ali não se depende de relações afetivas que pesam e tiram mobilidade. E quando a comunicação não mais interessar, pode-se cortá-la com a ligeireza de um clique. E novamente mergulhar na mais profunda solidão e vazio de sentido a que este estado de coisas condena o sujeito pós-moderno. A única relação que não o ameaça é aquela que ele estabelece com o seu eu, convertido no mortal espelho de Narciso. Voltar-se para si mesmo é a única instância dotada de certa permanência em um mundo complexo, incerto e inevitável.
A interioridade humana, hoje, vai se convertendo em um novo paradigma emergente. O que se dá, de fato, é um estreitamento da interioridade, que se vive em grande medida pelo fluxo sempre em movimento das sensações que absorvem, não favorecendo o encontro profundo com o próprio eu e tampouco com o outro.
Por um lado, trata-se de um sintoma extremamente positivo, uma vez que denota o advento da já iniciada recuperação do espiritual como dimensão de importância iniludível. Por outro lado, esse voltar-se para dentro de si mesmo pode incluir, e inclui, a tentação de esconder-se em si mesmo e terminar não conseguindo daí sair. E a consequência é o estreitamento da própria interioridade que tem como resultado o fechamento ao outro. E uma terrível e desesperadora solidão. Os postos instáveis de trabalho nas grandes empresas, os espetáculos maciços de diversão, os transportes que levam de um lugar a outro incontáveis pessoas que viajam juntas sem encontrar-se, propiciam conexões funcionais e passageiras, que não deixam rastro na pessoa que se desloca sem pausa pelo mundo líquido.
O vazio que isso gera já é bastante para denunciar que o ser humano é constituído pelo primado da alteridade. Apenas nos olhos do outro vejo quem sou e descubro minha identidade. A intimidade do sujeito humano só existe habitada pela presença de um Mistério.
A volta à interioridade como paradigma não pretende ser, portanto, um ensimesmamento do eu. Mas sim a condição indispensável para o reconhecimento da Presença que habita o humano. E esse reconhecimento, por sua vez, exigirá da pessoa um êxodo, uma saída de si, em direção ao outro, humano e divino, numa relação em que é imperioso entrar para re-encontrar-se e re-conciliar-se com sua identidade perdida. A volatilidade é inimiga desse fundamental encontro marcado desde toda a eternidade.
A palavra parece-nos adequada para definir as relações humanas hoje em dia. São, em sua maioria, relações sem firmeza, sem compromissos em longo prazo, sem permanência e, portanto, carentes ou vazias de sentido. Mudam com extrema facilidade. Voláteis, portanto.
Relações voláteis geram identidades igualmente voláteis. Incertas. Mutantes. Formam-se a partir delas personalidades autoreferenciadas, de uma autonomia não livre, mas compulsiva. São, além disso, identidades temporárias, que podem ser apagadas e substituídas por outros rótulos. A memória, atrofiada pelo ritmo da vida líquida pós-moderna, ensina que esquecer é o melhor, a fim de poder reescrever na lousa apagada uma nova identidade. Hoje me auto compreendo assim, amanhã já será diferente. São igualmente identidades plurais, abertas, sem escolhas ou decisões em que empenhem a vida.
Os vínculos admitidos são aqueles que cabem nas redes, como Facebook, Orkut etc. Ali não se depende de relações afetivas que pesam e tiram mobilidade. E quando a comunicação não mais interessar, pode-se cortá-la com a ligeireza de um clique. E novamente mergulhar na mais profunda solidão e vazio de sentido a que este estado de coisas condena o sujeito pós-moderno. A única relação que não o ameaça é aquela que ele estabelece com o seu eu, convertido no mortal espelho de Narciso. Voltar-se para si mesmo é a única instância dotada de certa permanência em um mundo complexo, incerto e inevitável.
A interioridade humana, hoje, vai se convertendo em um novo paradigma emergente. O que se dá, de fato, é um estreitamento da interioridade, que se vive em grande medida pelo fluxo sempre em movimento das sensações que absorvem, não favorecendo o encontro profundo com o próprio eu e tampouco com o outro.
Por um lado, trata-se de um sintoma extremamente positivo, uma vez que denota o advento da já iniciada recuperação do espiritual como dimensão de importância iniludível. Por outro lado, esse voltar-se para dentro de si mesmo pode incluir, e inclui, a tentação de esconder-se em si mesmo e terminar não conseguindo daí sair. E a consequência é o estreitamento da própria interioridade que tem como resultado o fechamento ao outro. E uma terrível e desesperadora solidão. Os postos instáveis de trabalho nas grandes empresas, os espetáculos maciços de diversão, os transportes que levam de um lugar a outro incontáveis pessoas que viajam juntas sem encontrar-se, propiciam conexões funcionais e passageiras, que não deixam rastro na pessoa que se desloca sem pausa pelo mundo líquido.
O vazio que isso gera já é bastante para denunciar que o ser humano é constituído pelo primado da alteridade. Apenas nos olhos do outro vejo quem sou e descubro minha identidade. A intimidade do sujeito humano só existe habitada pela presença de um Mistério.
A volta à interioridade como paradigma não pretende ser, portanto, um ensimesmamento do eu. Mas sim a condição indispensável para o reconhecimento da Presença que habita o humano. E esse reconhecimento, por sua vez, exigirá da pessoa um êxodo, uma saída de si, em direção ao outro, humano e divino, numa relação em que é imperioso entrar para re-encontrar-se e re-conciliar-se com sua identidade perdida. A volatilidade é inimiga desse fundamental encontro marcado desde toda a eternidade.
segunda-feira, 24 de novembro de 2014
NEM TUDO É DEUS, MAS DEUS SE REVELA EM TUDO.
Carlos Mesters, o mais popular biblista do Brasil, sublinha que há no Antigo Testamento dois decálogos, o da Aliança e o da Criação. O da Aliança surgiu primeiro, embora o outro já existisse. Ocorre que o povo de Deus, por não levar a sério o da Aliança, não tinha olhos para perceber o Decálogo da Criação.
Ao longo dos 400 anos da monarquia (de 1000 a 600 a.C.), Javé, o Deus libertador do Êxodo, foi reduzido a um ídolo manipulado pelos poderes civil e religioso para legitimar a corrupção e a ganância dos reis. E ninguém dava ouvidos às denúncias dos profetas. Até que Nabucodonosor, rei da Babilônia, invadiu a Palestina em 587 a.C. e destruiu Jerusalém.
O choque da dominação e do exílio abriu os olhos do povo de Deus para o Decálogo da Criação: “O ritmo da natureza, do sol, da lua, das estações, das chuvas, das estrelas, das plantas, revela o poder criador de Deus” – afirma Mesters. “É a expressão do bem-querer do Deus Criador, da pura gratuidade! É uma certeza que não falha. É a prova de que Deus não rejeitou seu povo. Nossa fraqueza pode levar-nos a romper com Deus (como de fato aconteceu), mas Deus não rompe conosco, pois cada manhã, através da sequência dos dias e das noites, Ele nos fala ao coração”.
Nossa visão do mundo interfere em nossa visão de Deus, assim como o modo de concebermos Deus influi na visão que temos da vida e do mundo. Ao longo de 1.000 anos predominou, no Ocidente, a cosmovisão de Ptolomeu, que considerava a Terra o centro do Universo. Isso favoreceu a hegemonia espiritual, cultural e econômica da Igreja, encarada pela fé como imagem da Jerusalém Celeste.
Com o advento da Idade Moderna, graças à nova cosmovisão de Copérnico, logo completada por Galileu e Newton, constatou-se que a Terra é apenas um pequeno planeta que dança em torno da própria cintura (24 horas, dia e noite) e do sol (365 dias, um ano). O paradigma da fé deu lugar à razão, a religião à ciência, Deus ao ser humano. Passou-se da visão geocêntrica à heliocêntrica, da teocêntrica à antropocêntrica.
Agora, a modernidade cede lugar à pós-modernidade. Mais uma vez, nossa visão do Universo sofre radicais mudanças. Newton cede lugar a Einstein, e o advento da astrofísica e da física quântica nos obrigam a encarar o Universo de modo diferente e, portanto, também a ideia de Deus.
Se na Idade Média Deus habitava “lá em cima” e, na Idade Moderna, “aqui embaixo”, dentro do coração humano, agora conhecemos melhor o que o apóstolo Paulo quis dizer ao afirmar: “Ele não está longe de cada um de nós, pois nele vivemos, nos movemos e existimos, como alguns dentre os poetas de vocês disseram: ‘Somos da raça do próprio Deus’.
A física quântica, que penetra a intimidade do átomo e descreve a dança das partículas subatômicas, nos ensina que toda a matéria, em todo o Universo, não passa de energia condensada. Em que a física quântica modifica nossa visão do Universo? Ela nos livra dos conceitos de Newton, de que o Universo é um grande relógio montado pelo divino Relojoeiro e cujo funcionamento pode ser bem conhecido estudando cada uma de suas peças. A física quântica ensina que não há o sujeito observador (o ser humano) frente ao objeto observado (o Universo). Tudo está intimamente interligado. O bater de asas de uma borboleta no Japão desencadeia uma tempestade na América do Sul... Tudo que existe coexiste, subsiste, pré existe, e há uma inseparável interação entre o ser humano e a natureza. O que fazemos à Terra provoca uma reação da parte dela. Não estamos acima dela, somos parte e resultado dela; ela é Pacha Mama ou, como diziam os antigos gregos, Gaia, um ser vivo. Deveríamos manter com ela uma relação inteligente de sustentabilidade.
Esse novo paradigma científico nos permite contemplar o Universo com novos olhos. Nem tudo é Deus, mas Deus se revela em tudo. Nossa visão religiosa é agora pananteísta. Não confundir com panteísta. O panteísmo diz que todas as coisas são Deus. O pananteísmo, que Deus está em todas as coisas. E Jesus nos ensina que Deus é amor, essa energia que atrai todas as coisas, desde as moléculas que estruturam uma pedra às pessoas que comungam um projeto de vida.
Como dizia Teilhard de Chardin, no amor tudo converge, de átomos, moléculas e células que formam os tecidos e órgãos do nosso corpo às galáxias que se aglomeram múltiplas nesta nossa Casa Comum que chamamos, não de Pluriverso, mas de Universo.
Ao longo dos 400 anos da monarquia (de 1000 a 600 a.C.), Javé, o Deus libertador do Êxodo, foi reduzido a um ídolo manipulado pelos poderes civil e religioso para legitimar a corrupção e a ganância dos reis. E ninguém dava ouvidos às denúncias dos profetas. Até que Nabucodonosor, rei da Babilônia, invadiu a Palestina em 587 a.C. e destruiu Jerusalém.
O choque da dominação e do exílio abriu os olhos do povo de Deus para o Decálogo da Criação: “O ritmo da natureza, do sol, da lua, das estações, das chuvas, das estrelas, das plantas, revela o poder criador de Deus” – afirma Mesters. “É a expressão do bem-querer do Deus Criador, da pura gratuidade! É uma certeza que não falha. É a prova de que Deus não rejeitou seu povo. Nossa fraqueza pode levar-nos a romper com Deus (como de fato aconteceu), mas Deus não rompe conosco, pois cada manhã, através da sequência dos dias e das noites, Ele nos fala ao coração”.
Nossa visão do mundo interfere em nossa visão de Deus, assim como o modo de concebermos Deus influi na visão que temos da vida e do mundo. Ao longo de 1.000 anos predominou, no Ocidente, a cosmovisão de Ptolomeu, que considerava a Terra o centro do Universo. Isso favoreceu a hegemonia espiritual, cultural e econômica da Igreja, encarada pela fé como imagem da Jerusalém Celeste.
Com o advento da Idade Moderna, graças à nova cosmovisão de Copérnico, logo completada por Galileu e Newton, constatou-se que a Terra é apenas um pequeno planeta que dança em torno da própria cintura (24 horas, dia e noite) e do sol (365 dias, um ano). O paradigma da fé deu lugar à razão, a religião à ciência, Deus ao ser humano. Passou-se da visão geocêntrica à heliocêntrica, da teocêntrica à antropocêntrica.
Agora, a modernidade cede lugar à pós-modernidade. Mais uma vez, nossa visão do Universo sofre radicais mudanças. Newton cede lugar a Einstein, e o advento da astrofísica e da física quântica nos obrigam a encarar o Universo de modo diferente e, portanto, também a ideia de Deus.
Se na Idade Média Deus habitava “lá em cima” e, na Idade Moderna, “aqui embaixo”, dentro do coração humano, agora conhecemos melhor o que o apóstolo Paulo quis dizer ao afirmar: “Ele não está longe de cada um de nós, pois nele vivemos, nos movemos e existimos, como alguns dentre os poetas de vocês disseram: ‘Somos da raça do próprio Deus’.
A física quântica, que penetra a intimidade do átomo e descreve a dança das partículas subatômicas, nos ensina que toda a matéria, em todo o Universo, não passa de energia condensada. Em que a física quântica modifica nossa visão do Universo? Ela nos livra dos conceitos de Newton, de que o Universo é um grande relógio montado pelo divino Relojoeiro e cujo funcionamento pode ser bem conhecido estudando cada uma de suas peças. A física quântica ensina que não há o sujeito observador (o ser humano) frente ao objeto observado (o Universo). Tudo está intimamente interligado. O bater de asas de uma borboleta no Japão desencadeia uma tempestade na América do Sul... Tudo que existe coexiste, subsiste, pré existe, e há uma inseparável interação entre o ser humano e a natureza. O que fazemos à Terra provoca uma reação da parte dela. Não estamos acima dela, somos parte e resultado dela; ela é Pacha Mama ou, como diziam os antigos gregos, Gaia, um ser vivo. Deveríamos manter com ela uma relação inteligente de sustentabilidade.
Esse novo paradigma científico nos permite contemplar o Universo com novos olhos. Nem tudo é Deus, mas Deus se revela em tudo. Nossa visão religiosa é agora pananteísta. Não confundir com panteísta. O panteísmo diz que todas as coisas são Deus. O pananteísmo, que Deus está em todas as coisas. E Jesus nos ensina que Deus é amor, essa energia que atrai todas as coisas, desde as moléculas que estruturam uma pedra às pessoas que comungam um projeto de vida.
Como dizia Teilhard de Chardin, no amor tudo converge, de átomos, moléculas e células que formam os tecidos e órgãos do nosso corpo às galáxias que se aglomeram múltiplas nesta nossa Casa Comum que chamamos, não de Pluriverso, mas de Universo.
sábado, 22 de novembro de 2014
NOSSO COMPROMISSO NÃO É COM A VITÓRIA, MAS COM A LUTA.
O mundo vivia os dias sombrios do Holocausto. Em nome da primazia da raça ariana, Hitler e o nazismo pregavam o extermínio dos judeus. A atriz Ruby Dee narra a epopeia de um grupo de judeus em fuga, buscando a fronteira onde poderiam ter segurança. Formado por cerca de 60 pessoas – homens, mulheres e crianças - todas da mesma aldeia, os fugitivos eram obrigados a enfrentar a floresta, comendo o que podiam, viajando sobretudo à noite, para não caírem nas mãos dos nazistas. Alguns morreram pelo caminho.
Depois de semanas de fuga, um idoso, falando em seu nome e em nome de outros idosos, declarou: somos um estorvo, continuem sem nós, assim é possível que vocês sejam salvos. A resposta foi imediata: “As mães precisam descansar de vez em quando. Portanto, em vez de ficarem aí sentados e morrerem, por favor, peguem as crianças e andem até onde puderem”. Um novo espírito motivou o grupo. Os idosos pegaram as crianças e começaram a andar e andaram até onde puderam. Até a segurança além das fronteiras. Eles haviam descoberto uma razão para viver.
Fato semelhante é narrado pelo escritor francês Antoine Saint Exupéry. Seu avião espatifou-se entre as catedrais de gelo dos Andes. Sua primeira intenção: deixar que o frio e o gelo colocassem um ponto final em seu sofrimento. Mas ele refletiu: meus restos mortais jamais serão encontrados no fundo das geleiras e minha esposa não receberá o seguro. Se ela pensa que estou vivo, tem certeza que estou caminhando. Saint Exupéry deu o primeiro passo. Depois caminhou três dias e três noites, galgando a montanha. Quando ninguém mais acreditava, o milagre aconteceu e ele foi salvo. O segredo foi ter dado o primeiro passo. Isto lembra a afirmação de Jean Cocteau: ele não sabia que era impossível. Foi lá e fez.
Na realidade, ignoramos nossas possibilidades. Nossos limites ainda não foram testados. Nas Olimpíadas são estabelecidos recordes, considerados quase impossíveis de serem superados. Isso não impede que sejam superados. E continuarão sendo superados, desde que acreditemos nisso e descubramos uma boa razão para tentar.
A vida é um dom divino, um dom maravilhoso que nos convida à superação. “Sim, nós podemos” foi a legendária motivação de Obama. A vida é uma só. Cada gesto é irrepetível e por isso merece toda a intensidade. O genial Charles Chaplin escreveu: “A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos”.
Isto não significa que podemos realizar todos os sonhos. Isso não está ao nosso alcance. Ao nosso alcance está a capacidade de lutar. Nosso compromisso não é com a vitória, mas com a luta. Este é o limite que Deus nos pede.
Depois de semanas de fuga, um idoso, falando em seu nome e em nome de outros idosos, declarou: somos um estorvo, continuem sem nós, assim é possível que vocês sejam salvos. A resposta foi imediata: “As mães precisam descansar de vez em quando. Portanto, em vez de ficarem aí sentados e morrerem, por favor, peguem as crianças e andem até onde puderem”. Um novo espírito motivou o grupo. Os idosos pegaram as crianças e começaram a andar e andaram até onde puderam. Até a segurança além das fronteiras. Eles haviam descoberto uma razão para viver.
Fato semelhante é narrado pelo escritor francês Antoine Saint Exupéry. Seu avião espatifou-se entre as catedrais de gelo dos Andes. Sua primeira intenção: deixar que o frio e o gelo colocassem um ponto final em seu sofrimento. Mas ele refletiu: meus restos mortais jamais serão encontrados no fundo das geleiras e minha esposa não receberá o seguro. Se ela pensa que estou vivo, tem certeza que estou caminhando. Saint Exupéry deu o primeiro passo. Depois caminhou três dias e três noites, galgando a montanha. Quando ninguém mais acreditava, o milagre aconteceu e ele foi salvo. O segredo foi ter dado o primeiro passo. Isto lembra a afirmação de Jean Cocteau: ele não sabia que era impossível. Foi lá e fez.
Na realidade, ignoramos nossas possibilidades. Nossos limites ainda não foram testados. Nas Olimpíadas são estabelecidos recordes, considerados quase impossíveis de serem superados. Isso não impede que sejam superados. E continuarão sendo superados, desde que acreditemos nisso e descubramos uma boa razão para tentar.
A vida é um dom divino, um dom maravilhoso que nos convida à superação. “Sim, nós podemos” foi a legendária motivação de Obama. A vida é uma só. Cada gesto é irrepetível e por isso merece toda a intensidade. O genial Charles Chaplin escreveu: “A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos”.
Isto não significa que podemos realizar todos os sonhos. Isso não está ao nosso alcance. Ao nosso alcance está a capacidade de lutar. Nosso compromisso não é com a vitória, mas com a luta. Este é o limite que Deus nos pede.
quinta-feira, 20 de novembro de 2014
COMEÇAR TUDO DE NOVO
Cada vez que leio e medito a parábola do Filho Pródigo, ou do Pai misericordioso, encontro tesouros que enriquecem a vida no meio dos pequenos detalhes que tecem esta página incomparável da Escritura. Depois que o jovem tomou nas mãos a liberdade, decidiu sair de casa levando a herança; depois que a liberdade foi virando prisão e a herança lhe foi roubada pela ilusão; depois que se viu no meio dos porcos e na trágica negação da comida com que estes se alimentavam, sentado no fundo do poço, o jovem “caiu em si”, isto é, deu-se conta.
O jovem deu-se conta! Do que? Ao cair em si, certamente lembrou seu passado e como era a vida na casa do seu Pai. A experiência vivida lhe deu um critério de julgamento de seu momento presente desolador. Ao cair em si deu-se conta do cenário que o envolvia e a fome que sentia. Mas, o que mais o fez cair em si foi o confronto com o coração do Pai, de braços estendidos e as mãos abertas a oferecer pão em abundância, até mesmo para os empregados.
Ao cair em si, o jovem deu-se conta que, apesar de tudo, a vida está cheia de possibilidades de superação. O melhor para a vida ainda é possível. Os horizontes para um futuro novo estão abertos para quem se dispõe a levantar e caminhar para frente. Não há graça maior do que poder começar tudo de novo. Ali, até os fracassos podem ser uma escola para não voltar a repetir os mesmos erros.
Cada um de nós, no cotidiano da vida, carrega consigo um pouco do filho pródigo. Um impulso natural nos impele a vagar em busca de uma liberdade que, facilmente, nos leva à decepção. Não sabemos bem o momento em que saímos de casa, nem a quantia de herança que levamos conosco ou quanto já gastamos inutilmente.
No percurso de nosso viver, cada um tem sua história. Pode ser melhor ou pior, mas, na verdade, é sempre única. O que não podemos permitir, neste caminho, é viver levados pela onda, nem de nossas ilusões, nem na carona de quem nos conduz a lugar nenhum. Necessitamos do permanente cuidado para nos dar conta do que estamos fazendo com a vida.
Quantas vezes ouvimos pessoas dizerem: “A vida é assim mesmo, pouco ou nada se tem a esperar!” E assim vão levando seus dias numa triste rotina de uma tentadora acomodação. Pior ainda é envolver-se na onda avassaladora da alienação que não permite mais a pessoa “cair em si”, obrigando-a a ser massa de manobra da cultura de morte.
Na medida em que avançamos no caminho e no tempo, mais sentimos a necessidade de crer que um novo mundo é possível, uma nova sociedade é possível, uma família mais integrada e feliz é possível e ser uma pessoa convertida e santa é possível.
Para darmos este salto de qualidade é fundamental que comecemos por nos dar conta de que a vida pode ser muito mais, que a convivência familiar e social pode ser muito melhor. Admitindo esta realidade, somos chamados a começar por nós, levantando-nos e pondo-nos a caminho, sem ficar esperando pelos outros.
O jovem deu-se conta! Do que? Ao cair em si, certamente lembrou seu passado e como era a vida na casa do seu Pai. A experiência vivida lhe deu um critério de julgamento de seu momento presente desolador. Ao cair em si deu-se conta do cenário que o envolvia e a fome que sentia. Mas, o que mais o fez cair em si foi o confronto com o coração do Pai, de braços estendidos e as mãos abertas a oferecer pão em abundância, até mesmo para os empregados.
Ao cair em si, o jovem deu-se conta que, apesar de tudo, a vida está cheia de possibilidades de superação. O melhor para a vida ainda é possível. Os horizontes para um futuro novo estão abertos para quem se dispõe a levantar e caminhar para frente. Não há graça maior do que poder começar tudo de novo. Ali, até os fracassos podem ser uma escola para não voltar a repetir os mesmos erros.
Cada um de nós, no cotidiano da vida, carrega consigo um pouco do filho pródigo. Um impulso natural nos impele a vagar em busca de uma liberdade que, facilmente, nos leva à decepção. Não sabemos bem o momento em que saímos de casa, nem a quantia de herança que levamos conosco ou quanto já gastamos inutilmente.
No percurso de nosso viver, cada um tem sua história. Pode ser melhor ou pior, mas, na verdade, é sempre única. O que não podemos permitir, neste caminho, é viver levados pela onda, nem de nossas ilusões, nem na carona de quem nos conduz a lugar nenhum. Necessitamos do permanente cuidado para nos dar conta do que estamos fazendo com a vida.
Quantas vezes ouvimos pessoas dizerem: “A vida é assim mesmo, pouco ou nada se tem a esperar!” E assim vão levando seus dias numa triste rotina de uma tentadora acomodação. Pior ainda é envolver-se na onda avassaladora da alienação que não permite mais a pessoa “cair em si”, obrigando-a a ser massa de manobra da cultura de morte.
Na medida em que avançamos no caminho e no tempo, mais sentimos a necessidade de crer que um novo mundo é possível, uma nova sociedade é possível, uma família mais integrada e feliz é possível e ser uma pessoa convertida e santa é possível.
Para darmos este salto de qualidade é fundamental que comecemos por nos dar conta de que a vida pode ser muito mais, que a convivência familiar e social pode ser muito melhor. Admitindo esta realidade, somos chamados a começar por nós, levantando-nos e pondo-nos a caminho, sem ficar esperando pelos outros.
terça-feira, 18 de novembro de 2014
TUDO É NEGÓCIO E FEIRA DE VAIDADES.
Estamos em tempos de montagem de governos. Há disputas por cargos e funções por parte de partidos e de políticos. Ocorrem sempre negociações, carregadas de interesses e de muita vaidade. Neste contexto, se ouve citar um tópico da inspiradora oração de São Francisco pela paz “é dando que se recebe” para justificar a permuta de favores e de apoios onde também rola muito dinheiro. É uma manipulação torpe do espírito generoso e desinteressado de São Francisco. Mas desprezemos estes desvios e vejamos seu sentido verdadeiro.
Há duas economias: a dos bens materiais e a dos bens espirituais. Elas seguem lógicas diferentes. Na economia dos bens materiais, quanto mais você dá bens, roupas, casas, terras e dinheiro, menos você tem. Se alguém dá sem prudência e esbanja perdulariamente acaba na pobreza.
Na economia dos bens espirituais, ao contrario, quanto mais dá, mais recebe, quanto mais entrega, mais tem. Quer dizer, quanto mais dá amor, dedicação e acolhida (bens espirituais) mais ganha como pessoa e mais sobe no conceito dos outros. Os bens espirituais são como o amor: ao se dividirem, se multiplicam. Ou como o fogo: ao se espalharem, aumentam.
Compreendemos este paradoxo se atentarmos para a estrutura de base do ser humano. Ele é um ser de relações ilimitadas. Quanto mais se relaciona, vale dizer, sai de si em direção do outro, do diferente, da natureza e até de Deus, quer dizer, quanto mais dá acolhida e amor mais se enriquece, mais se orna de valores, mais cresce e irradia como pessoa.
Portanto, é “dando que se recebe”. Muitas vezes se recebe muito mais do que se dá. Não é esta a experiência atestada por tantos e tantas que dão tempo, dedicação e bens na ajuda aos flagelados da hecatombe socioambiental ocorrida nas cidades serranas do Rio de Janeiro, quando centenas morreram e milhares ficaram desabrigados? Este “dar” desinteressado produz um efeito espiritual espantoso que é sentir-se mais humanizado e enriquecido. Torna-se gente de bem, tão necessária hoje. Quando alguém de posses dá de seus bens materiais dentro da lógica da economia dos bens espirituais para apoiar aos que tudo perderam e ajudá-los a refazer a vida e a casa, experimenta a satisfação interior de estar junto de quem precisa e pode testemunhar o que São Paulo dizia: “Maior felicidade é dar que receber”. Esse que não é pobre se sente espiritualmente rico.
Vigora, portanto, uma circulação entre o dar e o receber, uma verdadeira reciprocidade. Ela representa, num sentido maior, a própria lógica do universo como não se cansam de enfatizar biólogos e astrofísicos. Tudo, galáxias, estrelas, planetas, seres inorgânicos e orgânicos, até as partículas elementares, tudo se estrutura numa rede intrincadíssima de inter-retro-relações de todos com todos. Todos co-existem, inter-existem, se ajudam mutuamente, dão e recebem reciprocamente o que precisam para existir e co-evoluir dentro de um sutil equilíbrio dinâmico.
Nosso drama é que não aprendemos nada da natureza. Tiramos tudo da Terra e não lhe devolvemos nada nem tempo para descansar e se regenerar. Só recebemos e nada damos. Esta falta de reciprocidade levou a Terra ao desequilíbrio atual.
Portanto, urge incorporar, de forma vigorosa, a economia dos bens espirituais à economia dos bens materiais. Só assim restabeleceremos a reciprocidade do dar e do receber. Haveria menos opulência nas mãos de poucos e os muitos pobres sairiam da carência e poderiam sentar-se à mesa comendo e bebendo do fruto de seu trabalho. Tem mais sentido partilhar do que acumular, reforçar o bem viver de todos do que buscar avaramente o bem particular. Que levamos da Terra? Apenas bens do capital espiritual. O capital material fica para trás.
O importante mesmo é dar, dar e mais uma vez dar. Só assim se recebe. E se comprova a verdade franciscana segundo a qual ”é dando que recebe” ininterruptamente amor, reconhecimento e perdão. Fora disso, tudo é negócio e feira de vaidades.
segunda-feira, 17 de novembro de 2014
NÃO VAMOS EXAGERAR.
Acho que posso dizer que creio em Deus e acho que foi Ele que fez os cereais, os tubérculos, as frutas, os peixes, as aves, os répteis, as águas, o ciclo das águas, o verde, o clima e as estações. Só não posso dizer que estou certo em tudo o que penso saber sobre Ele. Há milhões de coisas que não sei sobre Deus e sua obra. Os cientistas também não sabem! Por isso é que o mundo tem tantas religiões e tantas teorias e doutrinas. Está todo mundo tateando e milhões garantindo que acharam! Deus contou para eles. A ciência já provou!... E há os que entendem que acharam um pouco.
O cientista diz que tudo pode ser explicado. Se Deus existe não foi Ele que fez a Terra girar como gira! Mas eu creio num Deus que quis exatamente isto: a Terra girando como gira, inclinando-se como se inclina, para que houvesse temperatura adequada ao tipo de vida que o planeta tem. Acho que não se trata de acaso. Para mim, Ele é o autor de todas as vidas e tem um plano para todas elas, desde o pequeníssimo animal que vive duas horas ao que vive trezentos anos.
Há quem não creia. Eu creio! Se são mais inteligentes do que eu? Aceito um debate. Quem disse que ateus ou crentes são mais inteligentes, só porque não creem ou só porque creem? Não há mais elementos a serem considerados neste debate?
O cientista diz que tudo pode ser explicado. Se Deus existe não foi Ele que fez a Terra girar como gira! Mas eu creio num Deus que quis exatamente isto: a Terra girando como gira, inclinando-se como se inclina, para que houvesse temperatura adequada ao tipo de vida que o planeta tem. Acho que não se trata de acaso. Para mim, Ele é o autor de todas as vidas e tem um plano para todas elas, desde o pequeníssimo animal que vive duas horas ao que vive trezentos anos.
Há quem não creia. Eu creio! Se são mais inteligentes do que eu? Aceito um debate. Quem disse que ateus ou crentes são mais inteligentes, só porque não creem ou só porque creem? Não há mais elementos a serem considerados neste debate?
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